segunda-feira, julho 29, 2013

TEATRO: MENINO DE SUA AVÓ

MENINO DE SUA AVÓ

“Menino de Sua Avó”, de Armando Nascimento Rosa, é uma boa surpresa. Escrita propositadamente para ser interpretada por Maria do Céu Guerra, que ao subir ao palco de “A Barraca” se faz acompanhar pelo actor Adérito Lopes, a peça divaga sobre uma possível relação muito estreita entre Fernando Pessoa e a sua avó Dionísia Estrela Seabra, que existiu de verdade, mas de que se não sabe, por ciência exacta, se manteve ou não com o poeta o tipo de relacionamento que a peça imagina. Para o caso não é importante. A avó Dionísia era louca, teve épocas passadas em Rilhafoles, e não será muito estranho que o poeta tenha sentido por essa personagem afecto e admiração. A primeira parte da obra é de uma grande coerência e interesse, com as conversas de Fernando Pessoa e Dionísia, em vida de ambos. Pessoa é ainda jovem, descobre a poesia e a vida, e anda ainda emerso no seu primeiro heterónimo, Alexander Search, que escrevia em inglês.
Menos conseguida é a segunda parte, sobretudo o início, quando Dionísia morre, o seu fantasma aparece a Fernando Pessoa, este se vai multiplicando em heterónimos e pseudónimos, prosseguindo o diálogo entre ambas as figuras, já depois da morte do poeta, mesmo depois da transladação dos seus restos mortais para os Jerónimos, e culminando na actualidade. O final é muito bem desenredado, com os actores a deixarem o palco e a instalarem-se na plateia para assistirem à peça que vai terminar para nós, espectadores mortais (e iniciar-se para eles).
O diálogo é inteligente e divertido, mesmo tendo em conta as situações referidas, o que, de certo modo, conduz a obra pelos terrenos de um discreto humor negro.
Portanto, a peça vale a pena. É uma boa revelação portuguesa, o que diga-se de passagem, é muito raro. Passemos à sua concretização em palco. Minimalista, sim, mas extremamente eficaz, sem deslumbramentos vanguardistas que muitas vezes resultam penosos. José Costa Reis assina a realização plástica e os respectivos figurinos, tudo de bom gosto e sobretudo de eficácia cénica. António Victorino d'Almeida compôs e interpretou temas originais para a banda sonora que se colam muito bem ao desenrolar do espectáculo, o que não é de espantar no maestro. Finalmente, falemos da interpretação. Adérito Lopes compõe Fernando Pessoa e derivados com graça e justeza. Não é fácil o seu trabalho, necessita de registos diversos, as mutações são discretas e sábio o resultado final. Maria do Céu Guerra está magnífica. Ela é, indiscutivelmente, uma das grandes actrizes da cena portuguesa, e aqui encontra-se no seu elemento natural, sensível e ligeiramente irónica, saboreando com graça e uma desenvoltura muito sua a loucura desta avó que faria as delícias de qualquer neto. Na primeira parte ela chega a ser sublime. Sabem aquela sensação que por vezes se tem, quando estamos sentados numa plateia, e nos apetece saltar para o palco e abraçar os actores? Pois bem, tive de esperar pelo final, para não parecer mal.
A peça terminou hoje a sua carreira n’ A Barraca, mas não desesperem, creio que vai voltar lá para Setembro. Merece-o.

O MENINO DE SUA AVÓ

Texto inédito de Armando Nascimento Rosa; Criação de Maria do Céu Guerra (em Dionísia Seabra Pessoa) e Adérito Lopes (em Fernando Pessoa); Encenação Partilhada; Apoio Rita Lello; Música original António Victorino d'Almeida; Harpa Ana Dias; Cenografia e figurinos José Costa Reis; Aderecista Marta Fernandes da Silva; Mestra Costureira Alda Cabrita; Montagem Mário Dias; Assistência Marta Soares; Vídeo Paulo Vargues; Sonoplastia Ricardo Santos; Iluminação Fernando Belo; Produção Executiva Paula Coelho e Inês Costa.

sábado, julho 27, 2013

SPORTING 2. REAL SOCIEDAD 0


Sporting!

Muito boa a estreia no Sporting Clube de Portugal em Alvalade, frente a uma boa equipa espanhola. Ganhou, mas o mais importante foi jogar bonito, mostrar personalidade, querer e devolver a esperanças aos associados e simpatizantes. Houve alguns aspectos que ainda não convenceram. Marcelo Boec esteve demasiado inseguro, Labiad não existiu, Cissé foi uma sombra, mas no global as indicações são boas. Não sei vamos jogar para os dois primeiros lugares da Liga, nem importa muito agora. O essencial é recuperar a equipa, dar espectáculo, lutar até ao fim. Isso parece estar assegurado. Boa sorte a Leonardo Jardim, que parece ter ajustado bem as pedras tacticamente e deu estofo físico ao conjunto. Obrigado a Bruno de Carvalho que tem dirigido com acerto e generosidade pessoal esta nova versão do “meu” SCP. Assim já apetece pagar quotas outra vez. 
E o equipamento alternativo é, finalmente, bonito. Longe da pimbalheira do ano passado.

sexta-feira, julho 26, 2013

BERNARDETTE LAFONT

Bernardette Lafont 
(26 de Outubro de 1938 - 25 de Julho de 2013)

Não há muito havia aqui escrito sobre Bernardette Lafont, a propósito de "Paulette". Uma excelente actriz e um símbolo de uma época. Pode ver aqui. E ver mais aqui.

quinta-feira, julho 25, 2013

CINEMA: DENTRO DE CASA



DENTRO DE CASA

“Dentro de Casa” é o nosso local de refúgio. Costuma ouvir-se mesmo dizer que fulano tal se refugiou “dentro de casa”. “Dentro de casa é o espaço de privacidade por excelência. Há quem chegue a casa, tire o casaco e vista o roupão, quem atire os sapatos para um canto e calce os chinelos. Se alguém sai à rua nestes preparos sujeita-se a ouvir reprimendas do estilo “sais assim à rua!”. Dentro de casa são permitidas liberdades que cá fora não o são.
Dentro de casa é, pois, a privacidade. Temos o direito à nossa privacidade. Quando alguém abusivamente invade esta privacidade, entra dentro de casa sem nossa autorização, sem ser convidado para isso, normalmente incorre em delito grave. Chama-se a polícia, pois seguramente houve assalto e roubo.
“Dentro de Casa” é nome de filme. Francês. Logo, no original chama-se “Dans la Maison”. Traz a assinatura de François Ozon, um dos cineastas franceses actuais que mais admiro. Nasceu em Paris, a 15 de Novembro de 1967, e desdobra-se em trabalho. Aos 21 anos já se iniciava na realização de curtas-metragens, dirige duas dezenas nos primeiros oito anos de actividade, e depois, desde 1997 que nos vai brindando com excelentes obras, discretas, intimistas, inteligentes, irónicas, observando com argúcia a vida familiar e as relações entre as pessoas. “Regarde la mer” é de 1997, “Les amants criminels”, de 1999, “Sob a Areia”, de 2000, mas é sobretudo depois de “8 Mulheres” (2002) e “Swimming Pool” (2003) que se torna notado internacionalmente. “O Tempo que Resta”, “Angel - Encanto e Sedução”, “O Refúgio”, “Potiche - Minha Rica Mulherzinha” são outras obras anteriores a “Dentro de Casa”, que é de 21012, e agora surge nos ecrãs portugueses, quando o autor ultima já um outro título, “Jeune & jolie”. 


“Dentro de Casa” é um filme extremamente sedutor e inquietante. Germain (Fabrice Luchini) é professor de literatura francesa num liceu, não num qualquer mas no Licée Gustav Flaubert, o que é desde logo um bom princípio: é um liceu piloto, onde os alunos usam farda, para o ambiente ser mais democrático, para ninguém se individualizar. Mas Claude Garcia (Ernst Umhauer), um seu aluno de dezasseis anos, sobressai de sobremaneira. Quando lhe pedem uma redacção sobre o seu melhor amigo na turma, ele resolve apontar a sua atenção para um colega, Rapha Artole, e começar a investigá-lo. Com o pretexto de o ajudar em matemática, instala-se dentro de casa dos Rapha Artole e vai descrevendo com alguma minucia o que vê e sente. Curiosidade suplementar: não é só Claude Garcia que se alimenta da vida dos Rapha Artole, mas também o seu professor, Germain, escritor frustrado, que vai sublimando a sua falta de talento e a sua curiosidade mórbida através dos escritos do aluno que ele vai estimulando, não hesitando sequer em viciar exames.
Este tipo de voyeurismo “literário” não deixa de ser perigoso e é seguramente obsceno. Com um tom discretamente irónico, por vezes nostálgico, François Ozon oferece-nos um retrato por vezes dilacerante da necessidade que alguns têm de viver a vida de outros. O jovem Claude, em vez de ver a sua telenovela diária no ecrã da televisão, como fazem milhões, resolve vivê-la e escrevê-la ele próprio através da observação da vida do seu colega Rapha, e a partir de certa altura também do pai e da mãe deste, Esther Artole (Emmanuelle Seigner), por quem se apaixona e a quem espia até durante o sono.
Se alguns criticam “Janela Indiscreta”, de Alfred Hitchcock, por ser um filme voyeurista, “Dentro de Casa” leva o voyeurismo a entrar dentro de casa de uma família, aí se instalar e sugar a suas vidas, não só para consumo do jovem Claude, mas também do seu voraz professor de literatura francesa. Trata-se de certa forma de um vampirismo literário, na sua aparência, para vampirismo existencial na sua essência.

Claro que pagam pelos erros cometidos, mas nada nos diz que se arrependam. No plano final, que relembra magistralmente “A Janela Indiscreta” de Hitchcock, lá vamos encontrar o ex-professor e o ex-aluno, sentados lado a lado, olhando um enorme ecrã de televisão constituído pelas janelas de um prédio, onde em cada uma delas se vai gerando uma situação que eles observam com voracidade.
Li algures numa crítica inspirada que este era um filme sobre o processo da criação literária e artística. Nada de mais contrário ao espírito do filme. Não há qui criação alguma, quanto muito destruição. A criatividade do aluno só é notada por razões extra-literárias, e sua qualidade só é notada pela lamentável mediocridade dos restantes alunos. O que aqui está implícito, ainda que de forma discreta, é uma crítica a este voyeurismo disforme em que as sociedades contemporâneas se abastecem. Aliás, o filme, sempre de forma serena e sem demagogias, olha com igual sentido crítico a vida familiar dos dois agregados que lhe estão no centro da atenção: German e a sua mulher, gerente de uma galeria de arte moderna muito excêntrica, e a família Rapha Artole, dependente dos negócios e dos chineses e apaixonada pelo basquetebol.
O argumento de “Dans la Maison” é da autoria do próprio François Ozon, adaptando livremente a peça de Juan Mayorga "El chico de la última fila", que em português se chamou “O Rapaz da Última Fila” e foi encenada por Jorge Silva Melo, nos Artistas Unidos. Mas julgo que entre peça e filme existem diferenças de abordagem significativas.
Os intérpretes são brilhantes, a começar pelo discreto Fabrice Luchini, o professor, mas também pela revelação de Ernst Umhauer, no papel de Claude Garcia. Kristin Scott Thomas, Emmanuelle Seigner, Denis Ménochet, Bastien Ughetto e Jean-François Balmer acompanham à altura. Sublinhe-se a realização, elegante, sóbria, púdica, de François Ozon.
Belo filme, de uma inteligência fina, que sabe bem saborear discretamente.

DENTRO DE CASA
Título original: Dans la Maison
Realização: François Ozon (França, 2012); Argumento: François Ozon, adaptando livremente a peça de Juan Mayorga ("El chico de la última fila"); Produção: Eric Altmayer, Nicolas Altmayer, Claudie Ossard; Música: Philippe Rombi; Fotografia (cor): Jérôme Alméras; Montagem: Laure Gardette; Casting: Sarah Teper; Direcção artística: Pascal Leguellec; Guarda-roupa: Pascaline Chavanne; Maquilhagem: Franck-Pascal Alquinet, Marie-Anne Hum, Gill Robillard; drecção de produção: Patricia Colombat, Karine Petite; Assistente de realização: Hubert Barbin; Departamento de arte: Manuel Demoulling, Thomas Morange, Thibaut Peschard; Som: Niels Barletta, Christophe Brajdic, Brigitte Taillandier; Efeitos visuais: Frederic Moreau, Sarah Moreau, Mikael Tanguy; Companhias de produção: Mandarin Films, Mars Distribution, France 2 Cinéma, FOZ, Canal+, Ciné+, France Télévision, La Banque Postale Images 5, Cofimage 23, Palatine Étoile 9, Région Ile-de-France; Intérpretes: Fabrice Luchini (Germain), Ernst Umhauer (Claude Garcia), Kristin Scott Thomas (Jeanne Germain), Emmanuelle Seigner (Esther Artole), Denis Ménochet (Rapha Artole, pai), Bastien Ughetto (Rapha Artole, filho), Jean-François Balmer (director do liceu), Yolande Moreau (as gémeas Rosalie e Eugénie), Catherine Davenier, Vincent Schmitt, Jacques Bosc, Stéphanie Campion, Diana Stewart, Ronny Pong, Jana Bittnerova, Nadir Azni, etc. Duração: 105 minutos; Distribuição em Portugal: Leopardo Filmes; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 18 de Julho de 2013.

quarta-feira, julho 17, 2013

CINEMA: LORE



LORE (2012)


Cate Shortland é australiana, nascida a 10 de Agosto de 1968, em Temora, anda pela meia-idade, começou a escrever e realizar curtas-metragens em finais dos anos 90, e depois de uma passagem pela televisão, onde dirigiu vários episódios de séries australianas, fez-se notar com “Salto Mortal” (2004), sua primeira longa-metragem, a que se segue esta belíssima “Lore” (2012), muito premiada em vários festivais. O cinema australiano tem-nos dado muito boas revelações, Cate Shortland é mais uma que passaremos a acompanhar com redobrado interesse.
Estamos no final da II Guerra Mundial, na Alemanha. O “bem-amado” Führer acaba de se suicidar e, algures em terra germânica, uma família de nazis que vestiram a farda da cabeça aos pés e interiorizaram bem o que era a “solução final” destrói documentação incómoda, faz as malas e parte, para se esconder algures na Floresta Negra. Mas as tropas americanas descobrem o casal que levam consigo e os cinco filhos, dois rapazes, duas raparigas e um bebé são deixados à deriva. Têm de atravessar meia Alemanha para chegarem perto de Hamburgo e reencontrar a casa da avó. O caminho é iniciático. Todos eles vão descobrindo as agruras de uma vida que nunca conheceram e aprendem a sobreviver na fome, na dor e no tirocínio da violência. Pelo meio dos atalhos da floresta, convivem com o anti-semitismo, põem à prova a “esmerada” educação da elite alemã do III Reich e preservam um pequenino bambi de porcelana que é a imagem da sua infância resguardada. Até aí.
A guerra, sobretudo a II Guerra Mundial, já deu milhares de filmes, algumas obras-primas, dezenas de títulos muito interessantes e toneladas de lixo. Mas quase sempre o conflito nos foi dado de um ponto de vista que se foi tornando estereotipado. De um lado, os bons, do outro os maus, olhamos para o sofrimento das vítimas do III Reich, os judeus nos campos de concentração, os soldados no campo de guerra, os nazis nas suas vilanias de gabinete que se repercutiam nas prisões, nas torturas, nos assassinatos maciços, nos genocídios, na barbárie. Um ou outro realizador e argumentista mais inspirado foram mais longe, matizando a análise e diversificando a colheita de elementos para observação crítica. Já se julgava ter visto tudo, mas há sempre um ponto de vista novo (ou quase novo).  


O filme de Cate Shortland – que nos recorda “O Laço Branco”, do austríaco Haneke - baseia-se num romance de Rachel Seiffert ("The Dark Room"). A escritora reside em Londres, nasceu em 1971, em Oxford, mas curiosamente tem pais de dupla nacionalidade: alemão um, australiano o outro. Tal como a produção do filme de Cate Shortland: australiana, alemã e inglesa. “The Dark Room”, lançado em 2001, teve uma recepção muito boa e andou pelas shortlists de vários prémios internacionais. Foi considerada uma das 20 maiores revelações jovens da revista “Granta”.
O filme parece seguir a estrutura do romance, aproximando-se delicadamente de um outro tipo de vítimas do nazismo: os filhos da Alemanha nazi, os filhos de oficiais SS, os netos de velhas avós que lamentam a morte do líder, “que tanto nos amava”, as crianças abandonadas pelos pais enclausurados em prisões aliadas (ou “campos”, como faz notar a mãe: “as prisões são para os criminosos, nós vamos para um campo”). É o drama dessas crianças educadas na loucura que o filme acompanha, sobretudo através da mais velha da família, a adolescente Lore, a única que consegue consciencializar o horror do racismo, da barbária instalada, da insanidade em que se atolava a bem amada Alemanha, cujos sonhos de preponderância e vitória conduziram ao holocausto e ao pesadelo.


Este é o filme da pequena história das famílias nazis, aquelas que interiorizaram a ideologia e a propagaram aos seus. Esta é a história dessas crianças que subitamente descobrem a mentira em que viveram até aí. Este é igualmente o olhar sobre os que, mesmo depois da guerra, e perante as fotografias do horror, se limitaram a dizer que “os americanos são uns mentirosos, falsificaram fotografias e apenas tentam destruir a imagem da Alemanha”. Ou de como um povo se descobre intoxicado sem remissão.
“Lore” é um filme admirável, conduzido com tacto, delicadeza, pudor, com uma fotografia excelente, e um elenco de actores absolutamente notável. Tudo indica que, apesar de uma ou outra escusada pirueta esteticista ao nível da imagem, nos encontramos desde já perante uma das grandes estreias de 2013 em salas portuguesas. Quem não viu, não deve perder.
Julgo que em Lisboa se encontra unicamente numa das salas do Corte Inglês. É de aproveitar.

LORE
Título original: Lore

Realização: Cate Shortland (Austrália, Alemanha,Inglaterra, 2012); Argumento: Cate Shortland, Robin Mukherjee, segundo romance de Rachel Seiffert ("The Dark Room"); Produção: Benny Drechsel, Liz Watts, Paul Welsh, Margaret Matheson, Linda Micsko, Kurt Otterbacher, Anita Sheehan, Vincent Sheehan, Karsten Stöter; Música: Max Richter; Fotografia (cor): Adam Arkapaw; Montagem: Veronika Jenet; Casting: Anja Dihrberg; Design de produção: Silke Fischer, Jochen Dehn; Direcção artística: Jochen Dehn; Guarda-roupa: Stefanie Bieker; Maquilhagem: Ulrike Borrmann, Antje Dahm, Kathrin Westerhausen; Direcção de produção: Colleen Clarke, Bec Cubitt, Thomas König-Mendler, Axel Unbescheid; Assistentes de realização: Karsten Frank, Barbara Schubert, Tanja Schuh; Departamento de arte: Lars Brockmann, Manuela Lobrecht, Remo Stecher; Som: Sam Petty; Companhias de produção: Rohfilm, Porchlight Films, Edge City Films; Intérpretes: Saskia Rosendahl (Lore), Nele Trebs (Liesel), Mike Weidner (Junger), Ursina Lardi (Mutti), Hans-Jochen Wagner (Vati), Nick Holaschke (bebé Peter), André Frid (Gunter), Mika Seidel (Jürgen), Sven Pippig, Philip Wiegratz, Katrin Pollitt, Hendrik Arnst, Claudia Geisler, Kai-Peter Malina, Ulrike Medgyesy, Katharina Spiering, Franziska Traub, Hanne B. Wolharn, Friederike Frerichs, Fabian Stumm, Tim Karasch, Daniel Kohl, Jan Peter Heyne, Jochen Döring, Birte Schnoeink, Lucas Reiber, Wanda Perdelwitz, etc. Duração: 109 minutos; Distribuição em Portugal: Alambique Destilaria de Ideias Unipessoal; Classificação etária: M/ 16 anos; Data de estreia em Portugal: 20 de Junho de 2013.

quarta-feira, julho 10, 2013

CINEMA: HOMEM DE AÇO



HOMEM DE AÇO


Inaugurou-se em Lisboa, no Colombo, uma sala IMAX, 3 D. Já tinha visto várias salas IMAX em diversas cidades, mesmo Vila Franca de Xira já tivera a sua.
IMAX é ecrã maior, maior precisão de imagem, som mais envolvente e mais potente. Em suma, mais de tudo.
Tudo o que tinha visto até hoje em salas IMAX explorava sobretudo as possibilidades das belezas naturais e do património arquitectónico, sempre bem acondimentado nalguns efeitos espectaculares. Muito espectáculo, é verdade, mas nada de muito especial em termos de cinema. Como não sou por natureza negativista nem radical, acredito que dali possam vir experiências a reter.
Mas não foi ainda com “Homem de Aço” que o IMAX se me impôs. Na verdade, cheguei apenas a uma constatação: se um filme é mau, em IMAX é muito pior. Foi esta a minha dolorosa conclusão.
Vejamos: nada tenho contra o “Super-Homem”. Muito pelo contrário. É dos heróis de banda desenhada de que mais gosto. E os filmes com Clark Kent/Superman, interpretados por Christopher Reeves, são dos meus favoritos no domínio dos “comics” norte-americanos adaptados ao cinema (juntamente com “Batman” e “Homem Aranha”).
Fui, pois, ver esta aventura pela curiosidade de experimentar o IMAX do Colombo, e de ver o que tinham feito ao Super-Homem nesta nova versão. Esportulei 10 euros para entrar na sala, munido de óculos e alguma boa vontade, tanto mais que Christopher Nolan, um cineasta que muito prezo, assina argumento e entra na produção, e a realização vinha assinada por Zack Snyder, que tinha dirigido um curioso “300”, muito visual e com algum bom gosto. Mas, quando à saída se entregam os óculos aos solícitos empregados que nos esperam à porta, meu Deus!, que alívio!


Este “Homem de Aço” procura ir aos alicerces da figura e perceber o que aconteceu a esta personagem antes de chegar a ser jornalista no “The Planet”. Tudo começa no planeta “Cripton” à beira de extinção, com facções rivais a disputarem o poder. Jor-El (Russell Crowe) é o pai de um bebé que é o primeiro desde há muito que nasce por processos “naturais”, e juntamente com a sua mulher, Lara Lor-Van (Ayelet Zurer), resolvem salvar o filho e enviá-lo para a Terra a bordo de uma nave. Mas o General Zod (Michael Shannon) fica furioso e jura vingar-se.
Há alguns anos, tinha eu um programa na TVI, um meu espectador habitual escreveu-me um dia comentado que determinado filme tinha muito bons efeitos “pirotécnicos”. Foi uma expressão que não mais esqueci. Pois bem, essas pirotecnias não eram nada comparadas com esta vertigem de imagens e sons que ensurdecem qualquer um e o deixam com os olhos em bico. Por isso, se tiver mesmo que ir ver “Homem de Aço” na sala IMAX, não fique nas primeiras dez filas da frente, que se arrisca a endoidecer. Mas, se for por mim, neste caso, o melhor mesmo é ficar à porta a ver o cartaz.
Com o super miúdo já na Terra, com pais adoptivos (Kevin Costner e Diane Lane), os super poderes começam a manifestar-se para grande felicidade dos efeitos especiais. Há desastres e ameaças de todo o tipo, numa galopante cavalgada para coisa nenhuma, onde chegam, esfalfados e quase sem habitantes nos EUA e arranha-céus em Nova Iorque. O espalhafato é mais que muito, mas qualquer tipo medianamente sensível agradecia que Christopher Reeves voltasse para voar discretamente pelos céus, com Lois Lane nos braços. Nesses filmes havia poesia e lirismo, e voar era uma forma de libertação.
Aqui o “sexy” Henry Cavill, que interpreta o papel de Super-Homem ou Homem de Aço, como preferirem (e, sim, há uma polícia que no final lhe chama “sexy”!), não voa, não é “nem um avião, nem um pássaro”, é um foguete lançado de Cape Canaveral que mal se começa a ver, desaparece no horizonte.
O filme de Zack Snyder tem outra característica tremenda. Dir-se-ia que vai terminar duas ou três vezes e quando se suspira pelo seu término, há sempre mais um vilão que sobrevive para mais uma tremenda contenda nos céus e na terra, com naves a estilhaçarem-se, carros aos soluços, edifícios a desmoronarem-se e a nossa paciência a esgotar-se.


É tudo mau? É tudo muito mau, e em grande, sim. Mesmo os actores que admiramos, e há vários, como as belas Amy Adams, Diane Lane, Antje Traue, Ayelet Zurer, e ainda Michael Shannon, Russell Crowe, Kevin Costner ou Laurence Fishburne, apetece perguntar que andam eles por ali fazer. E já agora, Christopher Nolan, que ideia foi esta de aparecer na produção e na escrita do argumento desta cegada planetária que entontece qualquer um?
É disto que certo público gosta actualmente? Deste completo embrutecimento dos sentidos? Desta descomunal anestesia geral? Bom, aqui não há cinema nenhum. Apetece implorar pelas séries Z de ficção científica dos anos 50 do século passado. Façam favor de não misturarem as coisas: cinema aqui encontra-se talvez numa das salas ao lado.

HOMEM DE AÇO
Título original: Man of Steel

Director: Zack Snyder (EUA, Canadá, Inglaterra, 2013); Argumento: David S. Goyer, Christopher Nolan, segundo personagens criadas por Jerry Siegel e Joe Shuster; Produção: Wesley Coller, Christopher Nolan, Charles Roven, Deborah Snyder, Emma Thomas; Música: Hans Zimmer; Fotografia (cor): Amir Mokri; Montagem: David Brenner; Casting: Kristy Carlson, Lora Kennedy; Design de produção: Alex McDowell; Direcção artística: Chris Farmer, Kim Sinclair; Decoração: Anne Kuljian; Guarda-roupa: James Acheson, Michael Wilkinson; Maquilhagem: Anji Bemben, Victoria Down, Suzi Ostos, Cheryl Pickenback; Direcção de produção: Lisa Gildehaus, Karen Jarnecke, James R. McAllister, Jim Rowe, Andrea Wertheim, Gregor Wilson, Jason Pomerantz (versão IMAX); Sirector de segunda unidade: Damon Caro; Assistentes de realização: Bruce Moriarty, Gordon Piper, Brian Sepanzyk, Clay Staub, Rhonda Taylor; Departamento de arte: Andrea Carter, Steve Jung, Carol Kiefer, Ben Mauro, Ed Natividad, Carie Wallis, Milena Zdravkovic; Som: Eric A.; Efeitos especiais: Allen Hall, Scott Kodrik, Joel Whist; Efeitos visuais: Valdone Cerniute, Sarah Cripps, Isabelle Fleck, Sofus Graae, Danny Huerta, Ashley Irving-Scott, Woojo Jeon, Abigail Mendoza, James Purdy, Max Rees, Rebecca Scott, Ged Wright, etc. Companias de produção: Warner Bros.; Legendary Pictures, Syncopy, DC Entertainment, Third Act Productions; Intérpretes: Henry Cavill (Clark Kent / Kal-El), Amy Adams (Lois Lane), Michael Shannon (General Zod), Diane Lane (Martha Kent), Russell Crowe (Jor-El), Antje Traue (Faora-Ul), Harry Lennix (General Swanwick), Richard Schiff (Dr. Emil Hamilton), Christopher Meloni (Colonel Nathan Hardy), Kevin Costner (Jonathan Kent), Ayelet Zurer (Lara Lor-Van), Laurence Fishburne (Perry White), Dylan Sprayberry (Clark Kent (13 anos), Cooper Timberline (Clark Kent (9 anos), Richard Cetrone, Mackenzie Gray, Julian Richings, Mary Black, Samantha Jo, Michael Kelly, Rebecca Buller, Christina Wren, David Lewis, Tahmoh Penikett, Doug Abrahams, Brad Kelly, David Paetkau, etc. Duração: 143 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia TriStar Warner Filmes de Portugal; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 27 de Junho de 2013. 

domingo, julho 07, 2013

FESTIVAL DE ALMADA: SALA VIP



SALA VIP

“Sala Vip” é um texto de Jorge Silva Melo, encenado por Pedro Gil. A peça é uma notável declaração de amor à vida, ao teatro, ao amor. A encenação é magnífica de sensibilidade, de criatividade, numa ligação entre o trágico e o humor, trespassada por um lirismo ácido.
Seis personagens numa sala de espera de um aeroporto. Pertencem todas a uma companhia de ópera. Perderam um voo, uma ligação, o que quer que seja. Perderam um contacto com quem tentam desesperadamente estabelecer uma ligação telefónica. Esperam. Perderam. “Sala Vip” é um lamento sobre a perda, a perda do amor, da juventude, da voz, das ilusões, alguém não volta a encontrar aquelas “deliciosas bolinhas de chocolate com Ovomaltine dentro”. ”Oh, baby, baby, it’s a wild world”, canta-se repetidamente. Perdeu-se o teatro. Perdeu-se a ópera. Perde-se a vida. ”Oh, baby, baby, it’s a wild world”. A sensação de perda avoluma-se, à medida que as personagens mudam de espaço, mas não alteram o desespero. O medo. Medo de tudo. De azeitonas, também.
Escreveu Pedro Gil: “Depois faremos das palavras do Jorge as nossas perguntas: e depois do sucesso? do dinheiro? do orgasmo? do amor? da juventude? E depois do teatro?”. Um mundo desaparece, “desaparece-me”, diz Jorge da Silva Melo. 
Neste panorama negro de desespero é, todavia, possível encontrar essa envolvente declaração de amor à vida, ao teatro, ao amor. Porque a peça é isso mesmo que transmite, porque a encenação é isso mesmo que sublinha, porque os actores é isso mesmo que encarnam. Num mundo em perda constante, temos ali à nossa frente a prova perfeita de que o teatro existe, o amor existe, a vida existe. E tenhamos esperança, haverá algures essas “deliciosas bolinhas de chocolate com Ovomaltine dentro.”
Se o texto é forte, intenso, poético, brutal por vezes, sensível sempre, a encenação é uma demonstração perfeita de maturidade, marcada no ritmo certo, com uma soberba direcção de actores, brilhante no pormenor. Jorge Silva Melo conseguiu encontrar em Pedro Gil o cúmplice perfeito. A mescla de trágico lirismo e de ironia prolonga-se por situações e citações invulgarmente bem conseguidas, desde à invocação do Dr. House à citação “actualizada” do mais célebre diálogo de “Johnny Guitar”. Aliás, as referências cinematográficas são contínuas e como me lembrei de “Violência e Paixão”, de Visconti, ao assistir à representação.
Do elenco fazem parte Andreia Bento, Maria João Falcão, Elmano Sancho, António Simão e João Pedro Mamede, todos eles brilhantes na sua apaixonante fragilidade, construída com uma força, um nervo, uma entrega notáveis. Quantos e tão bons actores há hoje em dia em Portugal!
Não errarei muito se disser que este será seguramente um dos melhores espectáculos de teatro levados à cena este ano em Portugal.

SALA VIP

Texto Jorge Silva Melo; Encenação Pedro Gil; Cenografia e Figurinos Rita Lopes Alves; Músico João Aboim; Luz Pedro Domingos; Com Andreia Bento, Maria João Falcão, Elmano Sancho, António Simão e João Pedro Mamede; Uma produção Pedro Gil, Artistas Unidos e Culturgest. Na Culturgest, de 6 a 9 de Julho. M / 16 anos. 

sábado, julho 06, 2013

FESTIVAL DE ALMADA: I.B.S.E.N.


I.B.S.E.N. 

de Miguel Castro Caldas

“I.B.S.E.N.” traz o nome do dramaturgo norueguês, mas é um original de Miguel Castro Caldas, que agarra nalgumas situações de peças do autor e as organiza a seu belo prazer, manipulando os textos, por vezes com alguma graça e ironia, por vezes desvirtuando-os. Dizem personagens da peça que Ibsen está velho e os seus textos não são para o público de hoje. Se esse é o pensamento de Miguel Castro Caldas o melhor seria deixar Ibsen em repouso. Este aspecto acho-o, portanto, muito controverso, no mínimo.
Mais discutível ainda é a apoteose final com uma manifestação contra as maiorias, exortando que são as minorias (“os sábios”, como se diz) quem deve dirigir a sociedade. Ora nós sabemos que por vezes as maiorias se enganam, mas temos a certeza de que as minorias erram sempre, para qualquer lado que se voltem. Começa-se logo por duvidar de quem é sábio. Quem o define? Quem é o sábio? O que defende o que nós queremos? Depois, os sábios podem ser historiadores e filósofos que proclamam a hegemonia da raça ariana, um grupo de economistas de superior inteligência que defendem o neo-liberalismo, ou uns iluminados defensores da ditadura do proletariado, temos para todos os gostos. Polémico é, portanto, no mínimo, o espectáculo. Que começa, aliás, com uma orientação curiosa, abordando a vida em família e a situação da mulher, para depois enveredar por caminhos ínvios.
De resto, os intérpretes são excelentes, tão bons que nos custa fazer distinções, mas Sara Carinhas é empolgante, e a encenação de Cristina Carvalhal bem inventiva e saborosa, acompanhada a rigor pela equipa técnica e artística ao seu serviço. Seria um belo espectáculo se….

I.B.B.S.M, de Miguel Castro Caldas; Encenação: Cristina Carvalhal; Cenografia e figurinos: Ana Vaz; Adereços: Stephane Alberto; Desenho de luz: José Álvaro Correia; Desenho de som: Sérgio Delgado; Apoio ao movimento: David dos Santos; Fotografia: Susana Paiva; Produção executiva: Mafalda Gouveia; Interpretação: André Levy, David dos Santos, Inês Rosado, João Lagarto, Luís Gaspar, Manuela Couto, Sara Carinhas, Sílvia Filipe, Stephanie Silva, e ainda Berta Bustorff, Carlos Colaço, Carmo Gelpi, Dora Martinez Pinto, Erica Rodrigues, Irene Sofia Vaz, Maria Angelina Mateus, Maria Helena Falé, Marisa Costa, Miguel Brinca, Miguel Viegas, Rita Pascácio, Sandra Cristina Chambel e Xavier Faria Lopes.

Teatro da Trindade, até dia 14 de Julho. Classificação: M/16 anos. 

A ÚLTIMA ENCENAÇÃO DE JOAQUIM BENITE


TIMÃO DE ATENAS


"Timão de Atenas" foi o último espectáculo encenado pelo Joaquim Benite", para a sua Companhia de Teatro de Almada (CTA), onde estreou duas semanas depois da sua morte. A seu lado esteve sempre Rodrigo Francisco que aprendeu com ele, o ajudou no que pode e ocupou o seu lugar posteriormente à frente da companhia e do seu célebre Festival de Teatro, cuja 30ª edição, a primeira sem Benite, se inaugurou no passado dia 4 de Julho.
A peça regressou em Junho ao palco do Teatro Nacional D. Maria II. Só nessa altura a fui ver, pois custou-me ir a Almada, sem Benite. Fomos companheiros de lides durante anos, no “Diário de Lisboa”, ele como crítico de teatro, eu de cinema, e acompanhei com amizade e estima o seu percurso. Sei que o mesmo aconteceu com ele em relação a mim. Por vezes podíamos estar anos sem nos vermos, mas a amizade era real e durável. Acompanhei a sua luta contra a doença e admirei a sua tenacidade, a sua persistência no seu amor ao teatro. No último Festival de Almada seguiu as representações e foi orientando o certame numa cadeira de rodas, nunca abandonando o cigarro que, vá-se lá saber se o consumia ou não, mas lhe dava um evidente prazer.
Escrita no início do século XVII, "Timão de Atenas" parece ter uma autoria polémica. Há quem afirme que se trata de uma obra escrita a quatro mãos, por Shakespeare e pelo poeta e dramaturgo seu contemporâneo Thomas Middleton (1580–1627). Nunca representada anteriormente em Portuga, já havia sido encenada por Joaquim Benite, em 2008, para uma apresentação no Festival de Teatro de Mérida, mas numa versão diferente da actual. Esta é mais económica em meios, mais atenta se possível ao texto e à sua importância crítica.
Benite era um apreciador compulsivo do grande teatro e dos textos eternos que ele respeitava escrupulosamente. A palavra tinha uma importância decisiva para ele. A encenação devia colocar-se ao seu serviço. À palavra e às ideias que a mesma desenvolve em palco. O texto de Shakespeare é rico e pertinaz na crítica: Timão é um grande senhor de Atenas que gosta de dispersar a sua fortuna entre amigos e necessitados. Por isso é bajulado e muito apreciado. Até ao dia em que se descobre falido, passando a eremita no deserto da sua solidão. Todos o abandonam, mas a vingança está para vir, quando descobre ouro debaixo de uma pedra que ocasionalmente levanta no seu percurso. E a roda da sorte volta ao inicio, mostrando que o vil metal amaldiçoa quem o detém, por muito que possa parecer que o ilumina.   
Com apenas um longo estrado em cena e meia dúzia de adereços, Joaquim Benite ergueu um espectáculo bastante interessante, a começar pela excelente tradução de Ivette Centeno, desenvolvida especialmente para esta encenação, cuja interpretação, infelizmente, é bastante desigual, destacando-se, todavia, Luís Vicente, Marques D"Arede, Paulo Matos, Ivo Alexandre e André Gomes, nos principais papéis.

“Timão de Atenas”, de William Shakespeare; Tradução Yvette K. Centeno; Cenário Jean-Guy Lecat; Figurinos Sónia Benite; Luz José Carlos Nascimento; Voz e elocução Luís Madureira; Movimento Jean-Paul Bucchieri; Consultoria musical Fernando Fontes; Intérpretes: Luís Vicente, Marques D"Arede, Paulo Matos, Ivo Alexandre, André Gomes, Alberto Quaresma, Manuel Mendonça, Miguel Martins, João Farraia, Pedro Walter, Celestino Silva, Ana Cris, Joana Francampos, Jeff de Oliveira.
A peça esteve em cena de 20 a 22 de Dezembro de 2012 e de 9 de Janeiro a 3 de Fevereiro de 2013, no Teatro Municipal de Almada, tendo sido reposta em Junho de 2013 no Teatro nacional D. Maria II, em Lisboa.

O trabalho de Joaquim Benite para esta peça deu ainda origem a um documentário da jornalista Catarina Neves, que será estreado durante o 30º Festival de Teatro de Almada. 

quarta-feira, julho 03, 2013

POLÍTICA À PORTUGUESA



O GABINETE DO DR. CALIGARI

Porquê “O Gabinete do Dr. Caligari” agora? No dia 3 de Julho de 2013, em Portugal?
Ora bem, este filme expressionista de 1920 conta uma história muito curiosa. O Dr. Caligari anda de feira em feira com o seu sonâmbulo César a ganhar a vida com espectáculos de sonambulismo. Mas, durante a noite, César vai liquidando os cidadãos. No final, na versão original, que as autoridades alemãs não permitiram que fosse estreada, o Dr. Caligari era o director de um hospício, um verdadeiro louco perigoso, assassino, que dirigia um manicómio. Os seus “doentes” eram consideravelmente menos perigosos que ele. “Apenas” se faziam passar por Napoleão ou outras personagens que tais.
O expressionismo foi a corrente estética que melhor retractou a sociedade alemã do estertor entre os loucos anos 20 e os tenebrosos anos da monstruosidade nazi.
Lamento dizê-lo, mas estamo-nos a aproximar muito desses tempos na Europa de hoje. Em Portugal, a esquizofrenia por que passamos não é um bom sinal. Parece que já estamos num qualquer gabinete de vários drs. Caligari. Nunca se viram tantos reunidos à volta de uma população que vão cozendo em brando lume.
Demite-se um ministro porque está farto e não lhe permitem trabalhar, segundo as suas próprias palavras. Metem no seu lugar uma sua subalterna que, infelizmente, nessa mesma altura atravessa uma crise de confiança grave. Um dos presidentes dos dois partidos da coligação bate com a porta, vai embora irrevogavelmente, e explica que o chefe do governo não lhe dá troco em nada e que ele está farto. Mas, horas depois, o outro dos presidentes dos dois partidos da coligação não aceita a demissão e afirma mais ou menos que nada se passou e tudo vai ficar bem depois de dormirem sobre o assunto. Para este homem nunca há problemas. Ainda há dias o vimos no seu melhor: se o défice público português aumentou no primeiro trimestre deste ano até 10,6% do PIB, prometeu que no próximo trimestre "ainda vai ser melhor". Pois, que dizer agora? Fugiram-lhe dois dos principais ministros? Isto resolve-se.
E nós olhamos e não acreditamos.
Mas há mais gabinetes nesta farsa. Alguém, num gabinete em Belém, apanha com este estado de coisas e pelos vistos vai dizendo que não quer uma crise “política” em cima da crise que vivemos. Ainda será preciso maior crise política do que esta que atravessamos? E qual a proposta? Pois daqui a uns dias ouvir os partidos políticos. Mas o senhor não ouve TV, rádio, não lê jornais? Há neste país alguém mais que precise de “ouvir os partidos”?
Pois eu sou capaz de lhe contar em cinco minutos o que dizem os partidos. O PSD afirma que está bem, afora umas desavenças com o seu colega de carteira, que não gosta da nova ministra. O CDS-PP aponta o dedo ao PSD e explica que este não o deixa ter uma palavra para resolver o problema. Quanto a PS, PCP, BE (e Verdes, não esquecer!) querem eleições já.
Lá fora, outros gabinetes vão mandando bitates para o ar e ameaças concretas: se não se portam bem, cortamos-lhes a mesada. As agências de rating e os bancos exercem o seu terror: há movimentações, corta-se nas bolsas e aumenta-se no crédito.

Enfim: uns bricam a aprendizes de feiticeiro e os outros todos comem por tabela. Tal está a moenga, hein!

segunda-feira, julho 01, 2013

ANTÓNIO RAMA



ANTÓNIO RAMA
Morreu o António Rama.

Nunca trabalhámos juntos, mas vi-o várias vezes pelas companhias por onde ele foi passando, a Casa da Comédia (onde se estreou em 1964), A Comuna, o Teatro Experimental de Cascais, o Teatro Nacional D. Maria II, onde se encontrava desde 1981. No cinema não foi muito assíduo, mas na televisão era um rosto muito conhecido. Admirava o seu amor ao teatro, o seu talento bem expresso nalguns trabalhos, a sua simpatia. O espectáculo em Portugal volta a ficar mais pobre. Infelizmente não consegui ver o seu último espectáculo, para o qual me tinha convidado. Foi há semanas atrás. Mas havemos de nos encontrar por aí, um dia destes.