JOSÉ RÉGIO
"NATAL"
Mais uma vez, cá vimos
Festejar o teu nascimento,
Nós, que, parece, nos desiludimos
Do teu advento!
Cada vez o teu Reino é menos deste mundo!
Mas vimos, com as mãos cheias dos nossos pomos,
Festejar-te, - do fundo
Da miséria que somos.
Os que à chegada
Te vimos esperar com palmas, frutos, hinos,
Somos - não uma vez, mas cada -
Teus assassinos.
À tua mesa nos sentamos;
Teu sangue e corpo é que nos mata a sede e a fome;
Mas por trinta moedas te entregamos;
E por temor, negamos o teu nome.
Sob escárneos e ultrajes,
Ao vulgo te exibimos, que te aclame;
Te rojamos nas lages;
Te cravejamos numa cruz infame.
Depois, a mesma cruz, a erguemos,
Como um farol de salvação,
Sobre as cidades em que ferve extremos.
A nossa corrupção.
Os que em leilão a arrematamos
Como sagrada peça única,
Somos os que jogamos,
Para comércio, a tua túnica.
Tais somos, os que, por costume,
Vimos, mais uma vez,
Aquecer-nos ao lume
Que do teu frio e solidão nos dês.
Como é que ainda tens a infinita paciência
De voltar, - e te esqueces
De que a nossa indigência
Recusa Tudo que lhe ofereces?
Mas, se um ano tu deixas de nascer,
Se de vez se nos calar a tua voz,
Se enfim por nós desistes de morrer,
Jesus recém-nascido!, o que será de nós?!
"NATAL"
Mais uma vez, cá vimos
Festejar o teu nascimento,
Nós, que, parece, nos desiludimos
Do teu advento!
Cada vez o teu Reino é menos deste mundo!
Mas vimos, com as mãos cheias dos nossos pomos,
Festejar-te, - do fundo
Da miséria que somos.
Os que à chegada
Te vimos esperar com palmas, frutos, hinos,
Somos - não uma vez, mas cada -
Teus assassinos.
À tua mesa nos sentamos;
Teu sangue e corpo é que nos mata a sede e a fome;
Mas por trinta moedas te entregamos;
E por temor, negamos o teu nome.
Sob escárneos e ultrajes,
Ao vulgo te exibimos, que te aclame;
Te rojamos nas lages;
Te cravejamos numa cruz infame.
Depois, a mesma cruz, a erguemos,
Como um farol de salvação,
Sobre as cidades em que ferve extremos.
A nossa corrupção.
Os que em leilão a arrematamos
Como sagrada peça única,
Somos os que jogamos,
Para comércio, a tua túnica.
Tais somos, os que, por costume,
Vimos, mais uma vez,
Aquecer-nos ao lume
Que do teu frio e solidão nos dês.
Como é que ainda tens a infinita paciência
De voltar, - e te esqueces
De que a nossa indigência
Recusa Tudo que lhe ofereces?
Mas, se um ano tu deixas de nascer,
Se de vez se nos calar a tua voz,
Se enfim por nós desistes de morrer,
Jesus recém-nascido!, o que será de nós?!
Imagem: "Natal, à noite", de Geertgen (1460/65, Leiden; 1490, Haarlen)
Óleo, 34 x 25 cm National Gallery, Londres
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