quarta-feira, agosto 31, 2011

MEDIDAS CONTRA A CRISE

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CONTABILISTAS CONTRA A CRISE
Um casal de contabilistas bancários chega ao consultório de um médico terapeuta sexual.
- O que posso fazer por vocês? Pergunta o médico.
O homem responde:
- Doutor, o senhor poderia observar-nos enquanto fazemos sexo? 
O médico fica um pouco espantado, mas concorda...
Quando a sessão de sexo termina, o médico diz:
- Não há nada de errado na maneira como vocês fazem sexo...
E, cobra €70,00 pela consulta.

Isto repete-se por várias semanas!
O casal marca horário, faz sexo sem nenhum problema, paga ao médico e deixa
o consultório.

Finalmente o médico, resolve perguntar:
- Mas o que é que vocês estão a tentar descobrir?
Responde o homem:
- Nada de especial doutor. É que ela é casada e eu não posso ir à casa dela.Eu também sou casado e ela não pode ir até minha casa. No Hotel Vila Galé, um quarto custa €140,00. No Hotel Ibis custa €100,00. Aqui pago €70,00, com acompanhamento médico, direito a atestado para faltar ao trabalho, sou reembolsado em €42,00 pelo SAMS e ainda consigo uma dedução de €19,20 no IRS.  
Tudo calculado o custo é de 8,80 €.

terça-feira, agosto 30, 2011

FUTEBOL: QUESTÕES CLUBISTICAS

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O SPORTING ESTÁ DE VOLTA?
Em relação a jogadores, treinadores, direcções, árbitros, a chamada pré-época é precisamente para isso: para preparar a época. Durante a pré-época pode desculpar-se tudo. Quando a época começa, ainda se pode dar o desconto de um jogo ou outro menos bem conseguido. Mas chega uma altura em que é preciso dizer basta!
Acontece com o Sporting Clube de Portugal, o meu clube desde que me conheço e aquele por que regularmente sofro.
O jogo de domingo impõe algumas perguntas, que se orientam para vários destinatários. Vamos a elas:
- O que leva o SCP a marcar um jogo difícil da Liga para um domingo quando jogou para a Europa na quinta-feira? O Braga e o Nacional jogaram na mesma quinta-feira e só voltam a jogar na segunda; o Benfica jogou na quarta e só volta a jogar na segunda. O Porto jogou na sexta e viu o seu jogo da Liga adiado. O SCP e o Guimarães jogaram na quinta e voltaram a campo no domingo e ambos levaram, em casa, 3 golos e averbaram respectivas derrotas. O SCP não tem dirigentes que zelem pelos seus interesses? Não tem estatuto para se impor como o fizeram Braga, Benfica e Porto?
- A arbitragem nos jogos do SCP só é razoável com árbitros dos distritais. A pandilha profissional é o que se vê: golos mal anulados e penaltis por marcar. Não me venham dizer que é mera coincidência. Tanta asneira junta não é coincidência. O que é então?
Um dirigente do Sporting critica a arbitragem e as virgens ofendidas decretam greve. Todos os outros dirigentes multiplicam-se em críticas e nada lhes acontece. Nem uma virgem se sente maculada. Não há ninguém que ponha cobro a esta vergonhosa dualidade de critérios? No futebol não há justiça?
- O Sporting em 3 jogos perdeu 7 pontos. Se não fossem os árbitros poderia ter perdido apenas 2. Sim, o futebol praticado pelo Sporting não é bom. Os 16 novos  reforços até agora não trouxeram nada nem de novo, nem de reforço. Aceito que precisam de tempo para se ambientarem. Talvez o mesmo tempo que Coentrão levou a adaptar-se ao Real Madrid, para só dar um exemplo português. Mas no Sporting tudo é diferente, para tudo voltar a ser igual. Compraram pinheiros encorpados para a defesa, mas estes não conseguem dar meia volta, no caso do americano, ou vêm tocados pelo míldio. São ainda Polga e Carriço os melhores da companhia, depois de muitas experiências malogradas. Mas os golos continuam a entrar por alto, como antigamente.
- Um jogador do Sporting remata e, logo a seguir, vai para o balneário a torcer-se com dores. O que se passa? Não serão muitos os casos clínicos para uma equipa que fez sete jogos a sério? Não serão demasiados os jogadores vindos de fora a precisarem de cuidados médicos? Por que será que alguns grandes clubes vendem certos jogadores a preços módicos? Era bom saber o que se passa, pois as coincidências são muitas também aqui.
- A equipa de futebol do Sporting precisa urgentemente de aconselhamento psicológico. Não basta dizer, antes da época começar, que vai ser campeã, quando à terceira jornada já deixou pelo caminho todas as hipóteses de o ser. Teve, na apresentação aos sócios, uma casa cheia para ver o Valência marcar 3 e tudo leva a crer que, a partir de agora, só os masoquistas do costume voltem a Alvalade. O Sporting joga mal, tem os árbitros como inimigos especiais, e a pouca sorte como companheira semanal. O Sporting voltou sim, para atirar ao poste e falhar golos de baliza aberta. A crise de confiança é total, a perca de bolas uma constante, os passes transviados o pão-nosso de cada jornada.
- O Sporting não tem Messis nem Ronaldos, mas tem alguns bons jogadores que ficaram e alguns novos que prometem. Mas falta organização à equipa, falta estofo de vencedores, falta a fibra de lutar contar a sorte e contra os árbitros, falta uma “equipa”. Assim, arrisca-se a lutar com o Vitória de Guimarães contra a descida de divisão.
Eu, que sou um sportinguista sofredor e dos sete costados, não exijo um Sporting campeão. Exijo apenas um Sporting que lute de igual para igual, que pratique bom futebol e que não humilhe os seus sócios e simpatizantes sempre que sobe a um relvado. E que não seja humilhado por árbitros sem categoria. Não é exigir muito. Apenas o razoável.

sexta-feira, agosto 26, 2011

TEATRO: O PRISIONEIRO DA SEGUNDA AVENIDA


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O PRISIONEIRO DA SEGUNDA AVENIDA 
ESTREOU EM CAMPOLIDE

E pronto. Aconteceu. Estrearam. Obviamente que estive na estreia, e gostei. Podem dizer: pudera, a mulher traduz, o filho encena, a nora interpreta e ainda andam por lá amigos. Pois é verdade, mas acho que consigo ser imparcial.
Não tinha visto nada até à estreia. Conhecia Neil Simon, com ele me estreei eu no teatro, como assistente de encenação do saudoso Artur Ramos, numa peça chamada “A Guerra do Espanador” (The Odd Couple), com um elenco de luxo, Raul Solnado, Armando Cortez, Barroso Lopes, e alguns mais. Neil Simon é um dramaturgo excelente, misturando humor, crítica social, dramatismo, e sabendo muito bem, sobretudo, penetrar na alma humana. É um bom retratista da América, e isso mesmo se pode ver nesta comédia amarga que se estreou no Sport Lisboa e Campolide, “O Prisioneiro da Segunda Avenida”. Onde se fala de crise nos EUA, de desemprego e de desespero, de corrupção e gatunagem, e daquelas coisas todas do costume que normalmente acompanham as crises, depois de as provocarem. A peça é de 1971, o que prova que as crises existem há muito (mas algumas são mais profundas que outras) e deu um filme quatro anos depois, relativamente interessante, assinado por Melvin Frank, com excelentes desempenhos de Jack Lemmon e Anne Bancroft. Lembro-me que se estreou no desaparecido Berna, e que o fui ver na estreia, ainda como crítico de cinema diário, na companhia do meu pai. Acho que foi a última vez que fui ao cinema sozinho com o meu pai. Ficou registada a efeméride.
Agora, a peça estreia, com muito boa tradução de Maria Eduarda Colares, e uma inventiva encenação. Mas convém contextualizar: Sport Lisboa e Campolide não tem uma sala de teatro, tem um ginásio com piso de cimento, onde a marcha do bairro ensaia. O Frederico andou por lá a fazer um filme sobre a marcha deste ano e afeiçoou-se ao bairro e às pessoas. O inverso também parece ter acontecido e lá veio a ideia de transformar o ginásio num palco, com cadeiras a circular a cena e a casa de Mel e Edna a ser invadida diariamente por oitenta turistas que pagam 5 euros para ver as desgraças do casal em momento de crise. Ele foi despedido, não sabe como o dizer à mulher, e entra em depressão. Com 51 anos, não consegue emprego (pelo ordenado que lhe pagavam arranjam 2 de 25 a quem pagam metade) e acaba por ser Edna a ir ao combate e arranjar emprego, onde tem a mesma desdita e entra em depressão. Mas nem tudo acaba mal, descansem.
A companhia não teve um tuste de subsídio, arranjou-se com a prata da casa e a prata da casa dos amigos, improvisou sistemas cénicos, pintou o chão, limpou varreu e depois de duas semanas de intensos ensaios, estreou. Temia o pior. Puro amadorismo amarrado por cordas e boa vontade. Nada disso. Não é seguramente um espectáculo genial, mas é obra recomendável e afaga o ego de quem a ele se entregou de alma e coração (não tinham mesmo mais nada para entregar, que por ali, logo se vê, são todos pindéricos). Mas também há talento. E muito. Isso descobre-se à primeira vista, mesmo por baixo das imperfeições.
A encenação e a forma de resolver o espaço disponível, da responsabilidade de Frederico Corado, é muito meritória, tem coisas muito boas, vê-se que com outros meios, outro galo cantaria. Mas este já acorda de madrugada com um bom som.
Paulo César, que conhecia, sobretudo, da revista, aguenta bem a composição de Mel, Nuanceado, podia, aqui e ali, ser um pouco mais comedido (nomeadamente no início do segundo acto), mas globalmente resulta bem. Cátia Garcia, a Edna, consegue disfarçar a sua juventude para este papel e tem bonitos momentos de entrega e de interioridade. Carlos Martins tem ainda um pequeno trabalho.
Com tão poucos meios e tão rudimentares, pode dizer-se que “O Prisioneiro da Segunda Avenida” ultrapassa em muito as expectativas e aí está a desafiar uma visita. Vai ver que se sente bem, sentado no interior da sala de estar de Mel e Edna, a saborear com humor e alguma amargura os dramas e os banhos de água fria deste casal que depositou grandes esperanças na “american way of life” e… ficou um pouco baralhado com o resultado. Mas talvez o campo de férias resulte e se safem. Como a companhia. Boa sorte para todos.
 Para mais informações veja no FB em “O Prisioneiro da Segunda Avenida”.

sábado, agosto 20, 2011

TEATRO: O PRISIONEIRO DA SEGUNDA AVENIDA


O PRISIONEIRO DA SEGUNDA AVENIDA 
EM CAMPOLIDE

Dia 25 deste mês de Agosto estreia a peça “O Prisioneiro da Segunda Avenida”, do dramaturgo norte americano Neil Simon. Comédia crítica sobre a vida americana e a crise (esta nos anos 70, muito amena em relação à actual, mas ainda assim muito difícil para muita gente), este é um texto subtil e mordaz, entre o humor e o drama, que deu em cinema (1975) um filme muito interessante, assinado por Melvin Frank, com excelentes desempenhos de Jack Lemmon e Anne Bancroft.
A tradução de  "The Prioner of Second Avenue" é da Maria Eduarda Colares, a encenação é do Frederico Corado, a interpretação do Paulo César, Cátia Garcia e Carlos Martins.
O espectáculo vai subir a cena no Sport Lisboa e Campolide, de 5ª a Domingo, de 25 Agosto a 4 de Setembro,com entradas a um preço único de 5€. (Reservas para 93 962 9012). 
Eu não vi nada, e devo advertir desde já que a minha família anda metida nisto até aos cabelos.  Mas esta montagem é feita sem um tostão de subsídio de qualquer espécie, é coisa de carolas que amam o teatro, e isso merece-me todo o carinho. Por isso, aqui fica o aviso: O Prisioneiro da Segunda Avenida está a partir de 25 em Campolide.

Neil Simon e o cartaz da versão hollyoodesca

MORREU RAUL RUIZ

Raul Ruiz era chileno e gostava de Portugal. Trabalhou várias vezes no nosso país e deu-nos, a fechar, esses magnificos "Mistérios de Lisboa". Morreu agora, com 70 anos e uma vasta filmografia, cheia de belos filmes.
Aqui fica a minha homenagem.
Na foto: Raul Ruiz com o produtor Paulo Branco, durante a rodagem de "Os Mistérios de Lisboa". Contava realizar a seguir "As Linhas de Torres". Já não será ele, infelizmente, a assinar a obra.

terça-feira, julho 26, 2011

FESTIVAL DE AVANCA, 2011

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 DEBATE SOBRE CINEMA E CENSURA
Leonor Areal, CIMJ, Centro de Estudos Media e Jornalismo, Universidade Nova de Lisboa  (“A Censura no Cinema Português: um estudo caso - Manuel Guimarães”), Ana Bela Morais, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (“A censura ao corpo nos primeiros anos do governo de Marcello Caetano”), Lauro António, que moderou a sessão, Paulo Cunha, CEIS20, Universidade de Coimbra, ("Uma Censura depois da extinção da Censura: o caso dos filmes eróticos e pornográficos (1974-76)").

quinta-feira, julho 14, 2011

FESTIVAL DE TEATRO DE ALMADA 2011 - 4

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 Notas Rápidas

CHEF (Chefe), com texto a partir de “Uma Modesta Proposta”, de Jonathan Swift, com a colaboração de Guillermo Calderón. Encenação de Jaime Lorca. Produção do Tearo Viaje Inmóvel, Santiago do Chile | Chile.

Um chefe de cozinha em apuros económicos resolve concorrer a um “reality show”, na televisão, para ultrapassar a crise. Mas a televisão quer espectáculo e “receitas” cada vez mais inusitadas. Que tal propor a venda dos bebés dos pobres para alimento de excelência dos ricos?  A ideia não é nova, noutro contexto, visando a Irlanda do seu tempo, já tinha sido dada por Jonathan Swift, num texto provocatório, de nome “Uma Modesta Proposta”. Escrita, dirigida e protagonizada por Jaime Lorca, “Chef” é uma tragicomédia sobre as fraquezas e as obsessões da natureza humana, através de uma sátira corrosiva à sociedade contemporânea, tendo a gastronomia e a televisão como pretexto para abordar o tema da fome no mundo e da desigualdade social cada vez mais gritante.
O cenário é uma cozinha decadente. O actor é Jaime Lorca, excelente. A encenação é inventiva e ácida, controlada ao milímetro, num espaço criteriosamente desenhado para cumprir a função. O resultado: um grande espectáculo de teatro político, onde se castigam os costumes através do riso.
Jaime Lorca já é um velho conhecido do Festival de Almada. Em 1996, o seu espectáculo “Viagem ao Centro da Terra” foi eleito como “Espectáculo de Honra”. Em 2007, “Gulliver” viria a obter a mesma distinção. Ele animou e dirigiu durante dezoito anos o projecto “La Troppa”, a que se segue es “Viaje Inmóvil”.

Intérpretes: Daniela Montt, Jaime Lorca; Cenário: Carlos Rivera, Rodrigo Ruiz, Manuel Paredes; Figurinos: Loreto Monsalve; Desenho de luz: Tito Velásquez; Desenho de som: Antonio Palácios; Música: Juan Salinas; Fotografia: Cláudio Pérez; Ass. de dramaturgia e direcção de actores: Cristián Ortega; Produção: Andrea Gutiérrez Travesía Producciones; Língua: Espanhola; Duração: 1H10. 


AMNÉSIA (Amnésia), de Jalila Baccar e Fadhel JaÏbi; Encenação de Fadhel Jaïbi; Criação do Teatro “Familia Productions”, Tunes (Tunísia).

Em 1994, o Festival de Almada apresentou “Família”, onde se revelou um grupo tunisino desconhecido na Europa. Voltaram em 1997 e em 1999, e agora Fadhel Jaïbi regressa com o grupo e “Amnésia”. Em boa hora. Trata-se de um espectáculo absolutamente inesquecível, com onze actores magníficos, num cenário vazio, apenas acompanhados por cadeiras e alguns outros (poucos) adereços, onde nos contam uma história “edificante”, sobre um chefe político de um qualquer país africano (não seria a própria Tunísia?) que, na noite do seu aniversário, sabe pela televisão que foi destituído do Governo. O partido a que pertence substitui-o por outro (certamente igual a ele, tão déspota e corrupto como), e ele é preso e colocado em residência fixa. Tenta fugir para o estrangeiro e é impedido. Fechado na sua biblioteca, fica queimado quando esta arde e é posteriormente internado num hospício por mostrar “sinais de confusão mental”. Tudo como mandam as regras.
Também como mandam as regras (estas as cénicas) funciona este belíssimo e vigoroso espectáculo, com actores que se multiplicam em papéis e oferecem um autêntico vendaval de obsessivo rigor e invenção. Magnífico jogo de luzes e de música valorizam uma marcação sóbria mas fulgurante. Entusiasmante.
Vamos às notas colhidas no Festival de Almada: Fadhel Jaïbi (n. 1945) é encenador, autor, realizador e um nome fundamental do teatro árabe contemporâneo. Fez os seus estudos em França (1967/1972) e dirigiu o Conservatório de Arte Dramática da Tunísia entre 1974 e 1978. Em 1976, fundou com Jalila Baccar a companhia “Nouveau Théâtre” de Tunis e, em 1993, “Familia Productions”. Em 2003, o realizador tunisino Mahmoud dedicou-lhe o documentário “Fadhel Jaïbi, un Théâtre en Liberté”. Quanto a Jalila Baccar (n. 1952) é actriz de teatro, de cinema e de televisão e, desde 1976, acompanha Fadhel Jaïbi em todas as suas criações, sendo muitas vezes co-autora dos seus textos: é o caso, nomeadamente, de “Comedia” (1991), “Família” (1993), “Les Amoureux du Café Désert” (1995) e, agora, “Amnésia”. No cinema, foi dirigida, entre outros, por Nicolas Klotz e Randa Chakal Salbag.”

Intérpretes: Jalila Baccar, Fatma Ben Saîdane, Sabah Bouzouita, Ramzi Azaiez, Moez M’rabet, Lobna M’lika, Basma El Euchi, Karim El Kefi, Riadh El Hamdi, Khaled Bouzid, Mohammed Ali Kalaî; Cenário: Kaîs Rostom; Figurinos: Anissa B’diri; Desenho de luz: Fadhel Jaïbi; Música: Gérard Hourbette; Dramaturgia: Jalila Baccar, Fadhel Jaïbi; Ass. de encenação: Narjes Ben Ammar; Ass. de figurinos: Jalila Madani; Operação de luz:  Naîm Zaghab; Língua: Árabe, legendado em português; Duração: 2H00. 


A RAINHA LOUCA, Ópera de Alexandre Delgado; Libreto de Alexandre Delgado, a partir de “O Tempo Feminino”, de Miguel Rovisco; Direcção musical de Alexandre Delgado; Encenação de Joaquim Benite; Criação do Centro Cultural de Belém e Festival de Almada, Almada, Lisboa (Portugal).  

Excelente criação da ópera “A Rainha Louca”, com música e libreto (a partir de “O Tempo Feminino”, de Miguel Rovisco), da inspirada responsabilidade de Alexandre Delgado, e encenação de Joaquim Benite. “A Rainha Louca” é D. Maria I, que vamos encontrar, no fim da vida, enclausurada na sua dor e loucura. Estamos no final do século XVIII, a Rainha ainda não partiu para o Brasil, onde iria morrer, lamenta a sua má sorte, os funestos acontecimentos em Portugal, e em França, a braços com uma revolução que cortou a cabeça à realeza. Tem à sua cabeceira uma criada negra, Rosa, e a rígida Duquesa de Lafões. É visitada por quatro damas da corte que lhe traçam um retrato pitoresco e delirante da realidade social portuguesa da altura. Uma das damas parece adormecida até se descobrir que está morta. A morte perpassa por estas salas sem janelas.
D. Maria I é vista sob um duplo prisma, ora se sublinha o seu amor às artes e às letras, à educação, como a sua loucura e fanatismo. Mas na hora da morte, José Bonifácio da Silva exaltou “o nobre carácter, o bondoso coração, a prudência de entendimento e a constância de ânimo.” A ópera interessa-se mais pelo retrato da rainha como reflexo de uma época.
A partitura musical é riquíssima e exemplar. As vozes das sopranos e meio soprano são belíssimas (pena não se perceber melhor o texto, que é de boa qualidade) e a encenação de Joaquim Benite sublinha o essencial, com rigor e inventiva, num cenário austero, onde explode a melodia e as paixões abafadas.
Notas do Festival: Compositor e violetista, Alexandre Delgado (Lisboa, 1965) estudou na Fundação Musical dos Amigos das Crianças e foi aluno de composição de Joly Braga Santos e Jacques Charpentier. Tem composições suas para música de câmara, música concertante e música vocal. Autor da ópera de câmara O Doido e a Morte, venceu o 1.º prémio do Conservatório de Nice em 1990 e o Prémio Jovens Músicos em 1987. É director do Festival de Música de Alcobaça.
Director do Festival de Almada (que criou há 27 anos) e da Companhia de Teatro de Almada, Joaquim Benite, desde o seu primeiro espectáculo em 1971 (“O Avançado-centro Morreu ao Amanhecer”, de Agustin Cuzzani), encenou mais de uma centena de peças de autores portugueses e estrangeiros. Em 2008, dirigiu, para o Teatro Nacional de São Carlos, a ópera de Mozart “La Clemenza de Tito”. Como reconhecimento público da sua vasta e rica carreira possui numerosas distinções: é Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e da Ordem do Mérito Civil de Espanha, e Cavaleiro da Ordem das Artes e das Letras de França. Possui ainda a Medalha de Honra da Cidade da Amadora, a Medalha de Ouro da Cidade de Almada, a Medalha de Mérito do Distrito de Setúbal e a Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura.

Intérpretes: Sopranos Ana Ester Neves, Ana Paula Russo e Teresa Cardoso Meneses, Meio-soprano Maria Luísa de Freitas, e a actriz Nilma Santos, OrchestrUtopica;  Correpetidores João Paulo Santos, Jan Wierzba; Cenário e figurinos: Jean-Guy Lecat; Desenho de luz: José C. Nascimento; Col. Coreográfica: Jean Paul Bucchieri; Dir. de montagem: Carlos Galvão, Guilherme Frazão; Caract. e cabeleiras: Sano de Perpessac; Ass. de encenação: Rodrigo Francisco; Ass. de cenografia e figurinos: Joana Ferrão; Ass. de produção: Paulo Mendes; Língua: Português; Duração 1H15. Estreia absoluta.

quarta-feira, julho 13, 2011

FESTIVAL DE TEATRO DE ALMADA 2011 - 3

 
A “Commedia dell’Arte” no cinema
 
Pode dizer-se que as relações entre o teatro e o cinema têm sido muito frequentes, desde o aparecimento do cinema, mas sobretudo, e compreensivelmente, desde o sonoro. Diga-se que nem sempre com bons resultados, pois se desde sempre o teatro foi considerado arte nobre, o cinema iniciou-se como divertimento de feira que foi buscar alguma legitimidade cultural ao adaptar, ou melhor dizendo “ilustrar”, peças de renome para este novo meio de expressão. Mas se o teatro sempre esteve de mãos dadas com o cinema, a verdade é que a “Commedia dell’ Arte” nunca despertou um verdadeiro entusiasmo entre os cineastas, com raras e honrosas excepções. A que se deve este divórcio, não se percebe totalmente, mas talvez se possa encontrar alguma explicação no facto da “Commedia dell’ Arte” ter algumas características que a afastam do cinema. Enquanto a “Commedia dell’ Arte” parte do fixo (texto e personagens) para a improvisação, o cinema parte da representação para a fixar num registo inalterável.
Sendo popular e vivendo do improviso, itinerante e taxativa nas suas personagens típicas, a “Commedia dell’ Arte” não parece enquadrar-se bem no que costuma ser “a adaptação cinematográfica de uma peça de teatro”. Não existindo propriamente peças, antes temas que as personagens vão desenvolvendo ao longo de cada representação, muitas vezes interagindo directamente com o público, difícil será haver adaptações ao cinema, com excepção de uma ou outra obra de Molière ou Goldoni.
Mas o tom e o espírito da “Commedia dell’ Arte” não deixou de estar patente, e ao seu jeito ser homenageado, nalguns títulos inesquecíveis da sétima arte. Desde logo em “Os Rapazes da Geral” (Les Enfant du Paradis), de Marcel Carné (França, 1945), com Arletty, Jean-Louis Barrault, Pierre Brasseur, onde o tema permitia abordar a Ocupação Nazi da França, o que transformou os três anos de rodagem quase clandestina numa verdadeira epopeia. Obra-prima incontestável, que Truffaut um dia disse trocar a realização dos seus trinta e tal filmes pela possibilidade de assinar este, acaba por ser um hino ao amor e ao teatro. Como se diz na obra, “Les Enfants du Paradis” ne sont pas beaux, ils sont heureux, tout simplement ».
Outra obra-prima chama-se “A Comédia e a Vida” (Le Carrosse d’ Or), de Jean Renoir (França, 1953), com Anna Magnani, magnífica reconstituição da vida de uma companhia teatral por terras da América Latina, inspirada livremente em “Carrosse du Saint Sacrement”, de Prosper Mérimée. Renoir lança-se num retrato voluptuoso e feérico, visualmente esplendoroso, tendo como base o teatro e, sobretudo, a “Commedia dell’ Arte” com as suas convenções e liberdade, interpelando a sempre sugestiva dualidade entre a arte e a vida. Anna Magnani resplandece, num papel feito à sua medida.
“Scaramouche”, de George Sidney (EUA, 1952), com Stewart Granger, Janet Leigh e Eleanor Parker, é outro clássico que não se pode esquecer. Integrando-se no género do filme de aventuras, de capa e espada, tão popular nos anos 50, “Scaramouche” não deixa de evocar uma companhia de teatro da “Commedia dell’ Arte”, sendo a personagem central um epígono de uma das figuras típicas desse género teatral.
“Cyrano de Bergerac”, do francês Jean-Paul Rappeneau (França, 1990), com Gérard Depardieu, Anne Brochet e Vincent Perez, é seguramente a melhor versão da vida aventurosa do célebre poeta e actor Hercule-Savinien de Cyrano de Bergerac (6.III.1619 – 28.VII.1655), que Edmond Rostand tornaria imortal com a sua peça de 1897. Anteriormente já Mel Ferrer, nos EUA, havia interpretado o papel, numa obra homónima de 1950. O mesmo herói inspirara “Roxanne”, que Fred Shepsi (EUA, 1987) actualizaria para os nossos dias, numa versão curiosa, interpretada por Steve Martin e Daryl Hannah.
Molière conta igualmente com duas criações da sua vida que se cruza obviamente com a “Commedia dell’ Arte”. Uma dirigida pela encenadora Ariane Mnouchkine (França, 1978), que depois de montar o seu espectáculo nos palcos franceses o levou ao cinema com igual sucesso. Interpretado por Philippe Caubère, Marie-Françoise Audollent e Jonathan Sutton, este “Moliére” é indispensável para quem goste de cinema e teatro. Uma nova obra sobre o mesmo dramaturgo surgiu em França em 2008, com assinatura de Laurent Tirard e Roman Duris no papel de Molière.
Para os interessados, pode ainda citar-se algumas incursões operáticas. “Cyrano de Bergerac”, ópera de Fraco Alfano, com libreto de Henri Cain, segundo Edmond Rostand, de que conhecemos com a interpretação de Roberto Alagna (França, 2005) e a celebérrima “Cosi Fan Tutti”, de Mozart, ópera bufa em dois actos, numa curiosa versão do “Teatro de Marionetes de Salzburgo”, com a Orquestra Sinfónica de Londres, apresentação de Peter Ustinov, com Teresa Berganza e Pelar Lorengar.

domingo, julho 10, 2011

FESTIVAL DE TEATRO DE ALMADA 2011 - 2

Notas rápidas


5. ICH SCHAU DIR IN DIE AUGEN, GESELLSCHAFTLICHER VERBLENDUNGSZUSAMMENHANG! (Olho-te nos olhos, contexto de ofuscação social!), de René Pollesch, com texto e encenação de René Pollesch. Criação do Volksbühne Am Rosa-Luxemburg –Platz Berlim (Alemanha).
Um palco aberto, sem cenários. Um piano e uma bateria ao fundo. Um actor. Vestido, despido, só de cuecas, ora fala ora evolui em silêncio, ora atira com a roupa e os sapatos para a plateia, ora invectiva os espectadores, ora filosofa sobre a essência da vida. Ora toca piano, ora ataca a bateria, ora evolui com uma laçada de balões ora é içado por uma gigantesca bola luminosa. “O teatro não é a sombra da vida”, começa por dizer, com o que parece arrumar com uma certa ideia de teatro representação da realidade.
Este exercício para um actor só pode parecer de início provocação gratuita. Não o é, descobre-se à medida que o tempo passa e as reflexões filosóficas, bem ao estilo alemão, se vão adensando. É provocação, bem humorada e por vezes irada, mas o que se repensa é a existência do homem neste mundo conflituoso, onde a crise económica e financeira se abate sobre todos de forma dramática. O jornal “Bild”, de Berlim, no dia seguinte à estreia, em Janeiro de 2010, na Volksbühne, escreveu: “A crise financeira acaba por se revelar como o tema real do espectáculo. Esta performance grandiosa parece tão sem sentido como pagar resgates a banqueiros falidos, mas é muito mais barata”.
René Pollesch, um dos mais prestigiados autores e encenadores do teatro alemão contemporâneo, escreveu e encenou este espectáculo que Fabian Hinrichs interpreta de forma brilhante, numa demonstração de “homem dos sete ofícios” que desarma a assistência e a conquista rapidamente.
As informações do Festival dizem que René Pollesch, nascido em 1967, “estudou no Instituto de Estudos Teatrais de Giessen, foi aluno de Heiner Müller e Georges Tabori, estagiou no Royal Court Theatre de Londres, traduziu e adaptou Ovídio, Shakespeare, Joe Orton, entre outros, e dirigiu o Teatro de Lucerna e o Schauspielhaus de Hamburgo. Entre 2002 e 2007 trabalhou na Volksbühne, como director artístico da Sala Prater, e foi considerado pela prestigiada revista Theater Heute como um dos melhores dramaturgos alemães, após inquérito realizado junto dos leitores. Em 2001 e 2006, Pollesch recebe o Dramatist Prize da cidade de Mülheim, e, em 2007, é-lhe atribuído o Viennese Nestroy Prize.”
Quanto a Fabian Hinrichs, a mesma fonte diz-nos que, nascido em 1976 em Hamburgo, estudou em Bochum e tem trabalhado nos principais teatros alemães, além de ter já uma vasta filmografia e numerosos prémios de representação no seu curriculum, nomeadamente o de Melhor Actor do Ano, em 2010, pela sua interpretação na peça agora apresentada no Festival de Almada. “Ao despersonalizar-me perante estranhos”, diz Hinrichs sobre o acto de representar, “fico mais próximo do público e mais próximo de mim próprio do que jamais poderia ficar em qualquer outra área da minha vida”.
A peça é uma provocação irónica sobre os desmandos do mundo, procura questionar a interactividade entre o palco e o público, mas até nesse aspecto é irónica, pois são raros os espectáculos mais interactivos. Fabian Hinrichs quebra a barreira tradicional da boca de cena e no final agradece, visivelmente entusiasmado, os aplausos frenéticos do público. Afinal, palco e plateia continuam a funcionar como sempre.

Intérprete: Fabian Hinrichs; Cenário e figurinos: Bert Neumann; Desenho de luz: Frank Novak; Dramaturgia: Aenne Quiñones; Tradução: José M. Vieira Mendes; Língua: Alemão, legendado em português; Duração: 1H30.


UN CERTAIN SONGE, UNE NUIT D’ÉTÉ (Um Certo Sonho, uma Noite de Verão), a partir de Shakespeare; Texto e encenação de Richard Demarcy; criação do “Le Naïf Théâtre” (Paris, França).

Excelente divertimento, politizado qb, este que Richard Demarcy e a sua multicultural companhia Naïf Théâtre nos oferecem, partindo de “Sonho de uma Noite de Verão”, do eterno Shakespeare. É o encenador quem o diz: “Shakespeare é o Mundo, os Mundos entrecruzados, inspirando-se no Grande Todo, tanto do cosmos estrelado e dos mistérios e poderes da natureza como das histórias, conflitos e sonhos dos homens”. Neste espectáculo, onde tudo se mistura num todo ao mesmo tempo caótico e homogéneo, há franceses, africanos, asiáticos, até portugueses (por sinal, um excelente), mesclam-se as cores da pele, as vozes, os idiomas, ao mesmo tempo que se amalgamam o teatro, a mímica, a música, o canto e a dança, casando-se a realidade com a fantasia, o burlesco com o feérico, a crítica com a ironia. E sempre poético.
Hora e meia de torrencial loucura cénica, onde a intriga de Shakespeare é reinventada mas respeitada na sua essência, revivida por um grupo de actores notáveis, extremamente bem dirigidos e orquestrados. Um regalo para os sentidos e um alerta para as consciências. O teatro é aqui uma lição de alegria e um estimulante refúgio para a aspereza do dia a dia. 
Richard Demarcy é um dos nomes de referência do teatro francês vanguardista e alternativo, a partir dos anos sessenta do século XX. Dramaturgo, ensaísta e encenador, é autor de mais de uma trintena de peças e encenou mais de quarenta espectáculos. Publicou, no final dos anos sessenta, um ensaio que foi importante para toda uma geração – “Elements d’une Sociologie du Spectacle”. É o autor do texto, e também o encenador, do primeiro espectáculo do Centro Cultural de Évora, em Janeiro de 1975: “A Noite do 28 de Setembro”. É também autor de quatro peças sobre a revolução portuguesa, apresentado em Portugal no Teatro “A Comuna”, no Festival d’Avignon e no Festival de Outono (Paris). Em 1999, participou no Festival de Almada com a companhia africana “Sanza Théâtre”, com a peça “Ubu dechâiné”, que escreveu e encenou. Alguns anos antes apresentou “Oyé Luna”, peça inspirada num conto português e criada em Cabo Verde. É pai do encenador Emmanuel Demarcy-Mota, director do Théâtre de La Ville e do Festival de Outono de Paris (sendo a mãe a actriz portuguesa Teresa Mota). (Biografia recolhida nas folhas do Festival).

Intérpretes: António da Silva, Bruno Daveze, Chrysogone Diangouaya, Léontina Fall, Jean Lacroix Kamga, Guy Lafrance, Nicolas Le Bossé, Gersende May, Lomani Mondonga, Ngau Domingas Afonsina, Aline Stinus, Yilin Yang; Cenário: Richard Demarcy; Figurinos: Jean Lacroix Kamga, Richard Demarcy; Música e canto: António da Silva, Léontina Fall, Yilin Yang; Fotografia: Brigitte Pougeoise; Direcção de cena: Kudzo do Tobias, Yvan Osadcii; Língua: Francês, legendado em português;    Duração: 1h40. 

Eu sei que pode ser de uma injustiça extrema destacar, de entre um elenco todo ele excelente, uma presença. Mas Aline Stinus, que vimos no espectáculo de Richard Demarcy, Tocou-me particularmente. Se olharem para a foto acho que percebem por quê. Aém do mais é de uma elegância extrema, tem este sorriso doce e sabe representar. Um bom futuro!

sexta-feira, julho 08, 2011

FESTIVAL DE TEATRO DE ALMADA 2011 - 1

 
Notas rápidas

1. FÁBULA BUFA (Fabula Buffa), a partir de Dario Fo, com Ciro Cesarano e Fabio GORGOLINI, e a colaboração artística de Carlo Boso.

Inauguração em grande da 28ª edição do Festival de Teatro de Almada, com a apresentação de ”Fábula Bufa”, a partir de um belíssimo texto de Dario Fo, que recria, em termos de actualidade, a estrutura cénica da “Commedie dell’Arte”. Dois excelentes actores, Ciro Cesarano e Fabio Gorgolini, que contaram com a colaboração artística de Carlo Boso, formado no Piccolo Teatro di Milano, onde trabalhou com Peppino de Filippo, Giorgio Strehler e Ferruccio Soleri, e encenou mais de quarenta obras. Boso foi director do Carnaval de Veneza entre 1983 e 1994 e dirigiu companhias em Veneza, Milão e Treviso. Em 2004, fundou nos arredores de Paris, nos estúdios criados em 1904 por Charles Pathé, a Académie Internationale des Arts du Spectacle. São dele estas palavras sobre “Fábula Bufa”: “quisemos dar vida a uma forma espectacular destinada a acordar a esperança numa sociedade enfraquecida por um vazio existencial e relembrar, ainda assim, que o teatro, sob todas as suas formas, mesmo as mais burlescas, permanece uma arma poderosa”.
O espectáculo, que conta apenas com dois actores em cena, recria um burlesco de enganos onde um cego e um paralítico invocam o milagre da cura, para depois se revoltarem contra ela, “pois assim terão de trabalhar” e ninguém lhes dá esmolas. Jesus é evocado na cruz e vilipendiado pelos pedintes, mas é dele a última palavra de esperança numa sociedade nada pacífica, mas onde o lugar do actor e do cómico permanece inalterável e essencial para manter o alento do cidadão comum e lhe dar o conforto de uma alegria.
Segundo a documentação do Festival, “Ciro Cesarano e Fabio Gorgolini, formados por Carlo Boso na sua Escola de Montreuil e licenciados em História do Teatro pela Universidade de Bolonha, criaram em Paris, em 2006, a companhia Teatro Picaro com o objectivo de encontrar uma linguagem teatral capaz de conciliar a herança tradicional com as temáticas contemporâneas na concretização de um teatro simultaneamente popular, social, burlesco e poético”.  Conseguem-no plenamente com um trabalho de altíssima qualidade, quer ao nível da palavra, quer no do gesto, da pantomima ou da acrobacia.
Um espectáculo para recordar e que introduziu da melhor forma o tema central da edição deste ano do Festival de Teatro de Almada, que presta homenagem à “Commedie dell’ Arte”-


2. SANTA JOANA DOS MATADOUROS, de Bertolt Brecht, com encenação de Bernard Sobel Colaboração artística de Francis Seleck e Eric Castex

Bernard Sobel, encenador francês de créditos firmados, regressou ao Festival de Almada para dirigir um espectáculo com interpretação de alunos finalistas da Escola Superior de Teatro e Cinema e alunos recém-formados da ACT – Escola de Actores. Uma experiencia inédita e particularmente sugestiva. Creio que não inteiramente lograda, mas ainda assim muito estimulante, tanto mais que deu a conhecer uma nova geração de aspirantes a actores portugueses, onde se vislumbra muita qualidade para futuros voos.
Brecht é um dramaturgo genial, criador de um teatro didáctico de intenções declaradamente comunistas, mas que ultrapassa esse circunstancialismo histórico com a grandeza da sua palavra, vigorosa e poética, e pela clareza das suas intrigas, que procuram desmontar jogos de poder e de interesses criados. As lutas de classe entre os poderosos e os explorados do mundo podem ser acusadas de algum esquematismo, mas são fascinantes de acompanhar. “Santa Joana dos Matadouros” não será das suas obras-primas (“Mãe Coragem e seus filhos”, “O Círculo de Giz Caucasiano, “A Alma Boa de Tzé Chuan”, “A Mãe” ou “Ascensão e Queda da Cidade de Mahagonny”), mas é muito interessante, sobretudo por trazer para o palco um tema violento e agressivo como o da exploração do comércio da carne, numa Chicago em plena crise de 1929.
Acontece que a forma escolhida por Bernard Sobel para encenar este espectáculo, um longo e largo corredor no meio de duas bancadas de espectadores, por onde evoluem duas dezenas de actores, que vão trocando de papéis, não terá sido a melhor para clarificar as intenções da peça. Mas revela-se estimulante como experiência, e revela um bom conjunto de promessas.
Santa Joana é uma jovem que ingressou no Exército de Salvação para aliviar a miséria dos trabalhadores dos matadouros de Chicago, e que acaba vítima das contradições de um capitalismo selvagem que só olha ao lucro.
Citando fontes do Festival, Bernard Sobel (n. 1935) é o criador do Teatro de Gennevilliers, uma cidade da periferia de Paris, onde desenvolveu a sua acção de director e encenador entre 1963 e 2006. Foi em 1963, depois de fazer a sua formação no Berliner Ensemble, então dirigido por Helene Weigel, viúva de Brecht, que Sobel se instalou em Gennevilliers, onde começou por fundar o Ensemble Théâtral de Gennevilliers (ETG), um grupo de jovens actores e investigadores que adoptou um estatuto amador, cuja intenção era contribuir para o nascimento de uma forma teatral diferente das que existiam nessa época. Entre os autores que apresentou, contam-se Vichnevski, Koplov, Volokhov, Erdman, Heiner Müller, Kleist, Schiller, Lessing, Lenz, Heinrich Mann, Grabbe e, naturalmente, Brecht. Mas é também um especialista de Molière, de quem encenou várias obras, e o seu repertório inclui muitos outros autores clássicos e modernos, como Eurípedes, Marlowe ou Sarah Kane. Após deixar a direcção do Teatro de Gennevilliers, por ter atingido o limite de idade, Sobel fundou a sua própria companhia, tendo dirigido textos de Olecha, Mayenburg e Kleist.

Intérpretes: Alice Medeiros, Ana Cris, Bartolomeu Paes, Carlos Gomes, Catarina Rosa, Daniel Fialho, Diogo Tavares, Eduardo Breda, Elisabete Pedreira, Joana Campos, Joana de Verona, José Mata, José Redondo, Mafalda Jara, Marco Trindade, Rita Miranda, Sara Reis, Sofia Vitória, Tomás Tojo, Vera Barreto; Tradução: Manuel Resende; Cenário: Pierre Setbon, Guilherme Frazão; Figurinos: Mina Ly; Música e canções Olivier Bernaux; Desenho de luz: Guilherme Frazão; Som: Bernard Vallery; Fotografia: Rui Carlos Mateus; Ass. de figurinos: Bárbara Pinto, Inês Pereira, Lydia Neto; Ass. de dramaturgia: Miguel Curiel, Nuno Pontes; Duração: 2H40.


3. MOI, RODIN (Eu, Rodin), de Patrick Roegiers, com encenação de Mihai Maniutiu. Criação do Teatro Nacional Radu Stanca Sibiu (Roménia).

As relações entre Rodin e a sua discípula e amante Camille Claudel estiveram na origem de “A Paixão de Camille Claudel”, um belíssimo filme de Bruno Nuytten, com Gérard Depardieu e Isabelle Adjani. Soube agora que, em 2002, o Museu Guggenheim de Bilbau convidou o coreógrafo belga Marc Bogaerts para criar uma performance com interpretação de Esther Cloet. Um ano depois, o dramaturgo francês Patrick Roegiers juntou-se ao projecto, escrevendo o monólogo “Eu, Rodin”. A fusão da dança com as palavras deu-se no Teatro Nacional Radu Stanca de Sibiu, sob a direcção do encenador romeno Mihai Maniutiu, com interpretação de Constantin Chiriac.
Nada de mais decepcionante. A peça é um monólogo sem qualquer dramaticidade. A encenação é antiquada, obsoleta, de um gosto estético deprimente. A representação tonitruante e o bailado que a acompanha um apêndice sem graça nem convicção. “Eu, Rodin” afirma-se “um espectáculo sobre o amor e o poder, sobre a criação e a destruição, que coloca em cena, e em confronto, a escultora Camille Claudel (1864-1943) e o seu mestre e paixão, o escultor Auguste Rodin (1840-1917). Trata-se de uma criação em que Camille “dança” a sua relação com Rodin, e em que este “fala” através de um monólogo. Infelizmente, para mim, não passou de uma enorme maçada apesar de só durar uma hora.

Intérpretes: Constantin Chiriac, Esther Cloet; Tradução: Anca Maniutiu; Cenário: Iuliana Vîlsan, Mihai Maniutiu; Figurinos: Iuliana Vîlsan; Coreografia: Marc Bogaerts; Língua: Romeno, legendado em português; Duração: 1H00.


4. THE JEW (O Judeu), a partir de “The Jew of Malta”, de Christopher Marlowe; criação colectiva de Mundo Perfeito | Dood Paard | Maria Matos Teatro Municipal (Lisboa, Amesterdão).

Deve ser uma heresia o que vou dizer, dado que muitos consideram “O Judeu de Malta” “uma das obras-primas da dramaturgia universal”, Mas a verdade é que acho esta peça de um racismo aviltante, de um anti semitismo sem desculpa, só comparável ao “Judeu Juss”, filme aberrante do período nazi. Christopher Marlowe (1564-1593) é um dos grandes dramaturgos do período isabelino, contemporâneo de Shakespeare. Pode ter sido um mestre no sec. XVI, mas encenar esta peça no sec. XXI não me parece muito sensato. Mesmo que a mesma tente actualizar a mensagem (o que se calhar ainda a torna mais odiosa).
Retirando este aspecto, a encenação do colectivo é magnífica com um primeiro tempo em que, à vista dos espectadores, se constrói todo o cenário, sobrecarregando-o de elementos dispersos até à exaustão, para num segundo momento, se assistir à sua desagregação. Numa peça de mentiras e embustes, a relação entre o texto e a sua encenação é perfeita, ainda que à primeira vista o possa não parecer. Os actores são excelentes, quase todos portugueses a debitarem um texto inglês. Fica o senão, essencial, do significado racista desta história de ganância e vingança que se situa em Malta, ponto de cruzamento de religiões, de culturas e entreposto de rotas de comércio.
Parece ter estado na origem de “O Mercador de Veneza”, de William Shakespeare.
Socorrendo-me das notas do Festival, “Mundo Perfeito”, companhia que nasceu em 2003, tem apresentado o seu trabalho na Europa, Médio Oriente e América do Sul. Além de promover o trabalho artístico de Tiago Rodrigues, que partilha a direcção com Magda Bizarro, esta companhia tem apostado na nova dramaturgia, na criação colectiva e nas colaborações entre artistas portugueses e internacionais. Quanto ao grupo “Dood Paard” (em português, “Cavalo Morto”) foi fundado em Amesterdão em 1993. O seu trabalho, frequentemente politizado e de tom provocatório, inclui dramaturgos como Ésquilo, Shakespeare, Oscar Wilde, Edward Albee, Arthur Schnitzler ou Thomas Bernhard. Sem director, o trabalho colectivo e a autonomia são as principais características deste grupo.

Actores e criadores do espectáculo: Carla Maciel, Gillis Biesheuvel, Gonçalo Waddington, Kuno Bakker, Manja Topper, Tiago Rodrigues e ainda os técnicos André Calado, Julian Maiwald, René Rood; Adaptação: Paul Evans; Tradução: Joana Frazão; Comunicação: Raymond Querido; Produção; Dood Paard Marten Oosthoek; Produção: Mundo Perfeito Magda Bizarro; Residência artística: Espaço Alkantara; Língua: Inglês, legendado em português; Duração: 2H00.

domingo, junho 26, 2011

TEATRO: A FLOR DO CACTO


 A FLOR DO CACTO
Jean-Pierre Grédy e Pierre Barillet escreveram uma trentena de peças de teatro entre 1949 e o início da década de 90. Comédias de boulevard, sem grandes pretensões, um arzinho de crítica de costumes e algum humor, baseado em trocas e baldrocas, situações equívocas, encontros e desencontros. A herança de Georges Feydeau, Georges Courteline ou Eugène Labiche, mas sem a graça destes. Em 1964, estrearam “Fleur de Cactus”, no Théâtre des Bouffes-Parisiens, com algum sucesso e logo despertaram o interesse da Broadway americana que adaptou a peça para os seus palcos numa versão de Abe Burrows, que também a encenou. “Cactus Flower” estreou-se em Dezembro de 1965, no Royale Theatre, permaneceu dois anos en cena, passando depois para o Longacre, perfazendo um total de 1234 representações, que terminaram em Novembro de 1968. Do elenco original faziam parte Lauren Bacall, Barry Nelson, Brenda Vaccaro, Burt Brinckerhoff, Lloyd Bridges, Kevin McCarthy, e Betsy Palmer. Êxito de público, portanto.

Pouco depois, em 1969, o argumentista preferido de Billy Wilder, I.A.L. Diamond adaptou a peça a filme, que Gene Saks dirigiu de fora escorreita, com um bom conjunto de intérpretes, Walter Matthau, Ingrid Bergman, e Goldie Hawn, que iria ganhar um Óscar com esta sua estreia no cinema. Os actores vão bem, os diálogos são divertidos, escritos com alguma subtileza e graça, a adaptação do palco ao ecrã é muito aceitável. Não estamos na presença de uma comédia daquelas que figuram no palmarés das nossas boas recordações, mas não envergonhava.
Julian é dentista, solteiro e mulherengo, e para assim se manter dizia às suas conquistas que era casado e pai de três filhos. Até ao dia em que encontra Toni, uma miúda com idade para ser sua filha, por quem se apaixona a sério. Depois é o costume, mas ao contrário. Julian tem de arranjar uma mulher para mostrar a Toni e assim convencê-la de que é realmente casado e pai de filhos e de que a sua mulher está disposta e até interessada no divórcio. Quem ele vai recrutar é a sua fiel assistente de clínica, a enfermeira Stephanie que, por sua vez, está apaixonada pelo seu dentista. Estão a ver o resto? Qui pro quos para dar e vender, até à solução final. Comédia para dispor bem, mas não mais do que isso. 
Mas em 2010, surgiu uma nova adaptação para cinema, “Just Go With It” assim se chama agora, com realização de Dennis Dugan e interpretação de Adam Sandler, Jennifer Aniston e Brooklyn Decker. O resultado é triste, das piores coisinhas vistas ultimamente. O esforço dos argumentistas que adaptaram a comédia original foi no sentido de polvilharem o todo com muitas imagens vistosas de belas mulheres e entrecortá-las com diálogos grosseiros e graças escatológicas, num primarismo de cortar a respiração e tirar a pica a qualquer espectador que não seja atrasado mental. O dentista passou a cirurgião plástico (claro, para se poderem ver e se falar de mamas e outros apêndices femininos e masculinos), e o resto, que tem escala no Hawai, ajusta-se às premissas.    
Lembro-me de ter visto, no Monumental, em 1967, o original de Barillet & Grédy numa versão de Jerónimo de Bragança, encenada por Manuel Santos Carvalho, com Laura Alves na protagonista, ao lado de Paulo Renato, Carlos José Teixeira, Alina Vaz, Rui Mendes, Ângela Ribeiro, Alexandre Vieira e Alda Pinto. Os cenários eram de Pinto de Campos e do espectáculo guardo boa memória, sem que todavia a peça me tenha convencido por aí além. 
É essa mesma “Flor do Cacto” (a original) que agora Filipe La Féria recupera para o seu Politeama. Pode dizer-se que a peça continua a não deslumbrar, é uma comédia de verão, produzida em “low cost”, como o próprio encenador confessa, com uma divertida adaptação a Portugal, diálogos, personagens e situações, sem desfigurar a estrutura original. Os diálogos mantêm a graça, as figuras, caricaturais, nalguns casos, são interessantes pelos “bonecos” estereotipados que desenham, e o todo é vistoso, como manda a estética de La Féria. Mas estamos longe do melhor que o conhecido encenador já nos deu. Do elenco, que não deslumbra, dado que não tem personagens para impor, mas silhuetas, fazem parte Rita Ribeiro, Carlos Quintas, Nuno Guerreiro, e ainda os que melhor se adaptaram a esta estética de quase “cartoon”, Vítor Espadinha, Helena Rocha, Hugo Rendas, Patrícia Resende e Bruna Andrade.