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segunda-feira, junho 09, 2008

FAIAL, IV

SOCIEDADE "AMOR DA PÁTRIA"

FAIAL, III

UMA ARQUITECTURA MUITO ESPECIAL
E A SOCIEDADE "AMOR DA PÁTRIA"

A arquitectura da cidade da Horta, no Faial, não será totalmente surpreendente (porque a influência, em diáspora, do português se nota um pouco por todo o lado), mas é muito característica e, sobretudo, belíssima. Andar simplesmente pelas ruas do Faial é um espectáculo. Cada casa encerra uma história, algumas um mistério, todas um encanto fortíssimo. Da mais humilde à mais trabalhada ou opulenta.A presença de portugueses de posses, que para ali foram por vontade própria ou exilados, ao lado de alemães, holandeses (ou os "flamengos"), ingleses e tantos outros oferecem à ilha, em especial à cidade da Horta, uma configuração admirável.Entre os vários edifícios, frente aos quais tive de parar e olhar com maior detença (e quase todos seriam, e quase todos mereceriam mais do que o olhar passageiro de quem descobre, ou redescobre, o prazer da cidade), um há que merece atenção muito especial.
Trata-se daquele que alberga a Sociedade “Amor da Pátria”, construído, ao que me informa um “Guia do Património Cultural”, entre 1931 e 1934, sob o traço do arquitecto Norte Júnior, obedecendo a toda uma simbologia maçónica que ali explode em magnificência. A Sociedade “Amor da Pátria” foi fundada em 1856, e veio a instalar-se neste edifício em finais da década de 30 do séc. XX. Encontra-se ao fundo da Rua D. Pedro IV, lado a lado com um Império ("Império dos Nobres" ou "Império de Reconhecimento e Beneficência”).A entrada da “Sociedade “Amor da Pátria” é fabulosa, com dois dragoeiros majestosos incrustados na recuada escadaria, existindo na fachada dois brasões em alto-relevo (um da “muy leal” cidade da Horta, outro o escudo de Portugal), aflorando ainda, a toda a volta do edifício, um friso, igualmente em relevo, de hortênsias que, não sendo flores autóctones dos Açores, agora funcionam como seu símbolo maior. O efeito é deslumbrante. No interior abundam os símbolos maçónicos, mas, infelizmente, espero vê-los numa outra oportunidade.
Ficam alguns exemplos desta visita, a merecer atenção redobrada numa próxima viagem:

afinal a "Fredonia", dos Irmãos Marx, existe: assim se chama este edificio

Secretaria Regional do Ambiente

escola primária

museu da cidade
teatro faialense
repartição de finanças

quarta-feira, junho 04, 2008

FAIAL, II

A MULHER DE PORTO PIM

Ler é uma actividade apaixonante, e nunca se lê duas vezes o mesmo livro de idêntica maneira. Assim como não há duas pessoas a ler de forma semelhante o mesmo romance. Mas há obras que sofrem oscilações vibrantes e inesperadas. “A Mulher de Porto Pim” (1) foi, para mim, uma delas. Li-a quando saiu na tradução portuguesa e gostei. “Donna di Porto Pim e Altre Storie” assinalava a passagem do escritor pelos Açores e reunia num pequeno volume vários textos sobre este arquipélago que marcou decisivamente a sua vida. “Naufrágios, Destroços, Passagens, Distâncias” era uma das partes em que a obra se subdividia, a outra era “De Baleias e Baleeiros” e aí aparecia “Mulher de Porto Pim. Uma história”. Uma história de amor e morte, trágica, sensual, com cantos de encantar moreias e mulheres. Coisa que me enfeitiçou, na época.
Anos depois, visitei o Faial, e descobri o verdadeiro Porto Pim. Não tinha levado comigo o livro, mas de regresso a Lisboa, rebusquei na incongruente biblioteca até descobrir o tímido volume, e a história de Tabucchi teve um outro sabor. Apaixonei-me mesmo por ela. Comecei a sonhar fazer dele um filme. Não uma longa-metragem, não, mas uma curta de vinte ou trinta minutos, curta como o conto, mas densa e trágica como as palavras no-lo restituem. Percebi ao relê-lo, depois de conhecer o cenário natural, que o conto era muito melhor do que pressentira de início. Tabucchi tinha tido a percepção plena da magia do lugar e nele tinha inscrito uma daquelas histórias mágicas que transformam um lugar num mito. Mas só se descobre isso, lendo o conto e “estando” fisicamente no local. Hoje não se vai à Horta sem se visitar Porto Pim. E não se passa por ali sem se evocar Tabucchi.
É uma baía de águas claras, que tem na memória noites de pesadelo na caça à baleia e que recolhe no fundo do mar o vermelho vivo do sangue de baleias e de pescadores, que guarda destroços de outras eras, que deixa passar a aragem quente de fins de tarde na fina areia da praia ou nas esplanadas de tabernas e cafés que a rodeiam.
Ao lado, transformada em museu, conserva a última “fábrica de baleia”, cuja existência e história resguardada o “Patrão Manel” zelosamente vai contando aos visitantes com o olhar azul de uma nostalgia compreensiva para com os tempos modernos. Vemos as fotos, e nelas como que se trancava o cachalote, se matava e se rebocava a baleia em botes ou baleeiras de cerca de doze metros de comprido por dois de largo (quando as baleias oscilavam entre os quinze e os dezoito, por vezes atingindo os vinte e dois metros de comprimento). Vemos e sentimos a carne da baleia a ser cozida, ser espremida pela maquinaria, ser transformada em farinha, o óleo a escorrer, a alimentar uma população pobre e dorida, que retirava do mar quase todo o sustento.

Vemos lá em cima, no Monte da Guia, em noites de bonança ou tempestade, nas coloridas palavras do Patrão Manel, o vigia a perscrutar o horizonte, em busca de um qualquer jacto de água que denunciasse a presença de uma baleia ou de um grupo delas, ouvimos o foguete a estalejar no ar, vemos os pescadores, alertados, a reunirem-se para se lançarem ao mar na perseguição de uma presa vital, o arpão que voa em direcção à vitima desejada, a lâmina a enterrar-se na carne, a baleia a mergulhar até ao fundo do oceano, a baleeira cá em cima à espera do regresso do animal ferido, que vem à tona da água respirar e ganhar fôlego, e ser novamente arpoado, uma e outra vez, e mais ainda, até doer as mãos e os dedos ficarem em ferida, e assiste-se às tentativas da presa para se libertar das cordas que a tolhem, a resistência cada vez menor, mais rarefeita, a perca das forças, a entrega à faca até sentir já a carne retalhada, o sangue a explodir em jactos e a tingir o oceano, e a baleia ainda viva, a respirar na areia da praia, com os costados golpeados, a pele metalizada, a carne rubra, o sangue, as vísceras a descoberto, o âmbar escondido no interior dos intestinos, os ossos a esfarelarem-se no mecanismo triturador… A gesta trágica e violenta de uma caçada que foi legalmente extinta por decreto em 1984, mas que ainda hoje se pratica nalguns países. Furtivamente. A fábrica do Faial fechou, porém, dez anos antes, em 1974.
Nesta baía lutou-se, sofreu-se, amou-se, e houve mesmo uma mulher que ouviu um antigo pescador cantar numa voz de menino, como outrora cantara às moreias e as trazia ao engodo para a morte. Desta feita o pescador cantou, e uma mulher que provocava os seus desejos numa taberna do porto, abriu-lhe a porta de casa, deixou-o entrar e, encostada ao varandim da janela, deixou-se amar. Promessas que não cumpriria. Mais tarde, seria baleia arpoada ou moreia assassinada. Diz no final o pescador: “Só numa coisa não me tinha mentido, descobri-o no processo. Chamava-se mesmo Yeborath. Se isso pode ter importância. “
Por aqui passou a magia de mulheres fatais, de Casablanca ou Gilda.
Uns amigos do Cine Clube da Horta emprestaram-se, para ver no portátil, num quarto de hotel que acordava ao som de um galo insistente, o dvd de “Dama de Porto Pim” (2), uma realização do espanhol José Antonio Salgot, sobre o conto de Tabucchi. Emma Suárez (Lucía), Antonio Resines (Español) e Sergio Peris-Mencheta (Lucas) são os protagonistas desta tragédia cinematográfica que não tem ponta por onde pegar, a começar desde logo pelo desperdício de uma história que só pode mesmo ser filmada em Porto Pim, no Faial, e que o desinspirado realizador transladou para uma inexpressiva Tazones, nas Astúrias, o que retira qualquer ressonância mágica a esta fabulosa história de cantores-pescadores de moreias, de baleias e de mulheres, por onde perpassa um tom de destino que se cumpre, guiado pelo olhar cativante de um misterioso rosto feminino. O que fica não é nada de tão provável suculenta ementa.
No interior da Taberna do Pim (que quer dizer “abrigo” em flamengo), com a porta aberta sobre a baía, imagino a São José Lapa no papel da fatal desconhecida que destroça corações, vestida de branco, e o Rogério Samora no pescador que troca a caça à baleia por cantigas de amor numa taberna do porto, o “Bote”. E revejo a cena do encontro inicial. Ele olha-a e sente-se perdido. “Dei-lhe os bons-dias e perguntei-lhe em que podia ser-lhe útil. Indicou-me a mala que estava a seus pés. Leva-a ao “Bote”, disse-me na minha língua. O “Bote” não é um lugar para senhoras, disse eu. Eu não sou uma senhora, respondeu, sou a nova patroa. “
Situação digna de um clássico de culto. A mulher de porto Pim. A magia de porto Pim. Cai a noite. Corta!


(1) “Donna di Porto Pim” saiu em Itália em 1983. António Tabucci, italiano de Vecchiano (localidade perto de Pisa), nascido em 1943, era então director do Instituto Italiano di Cultura em Lisboa. Depois passou a professor de Literatura Portuguesa na Universidade de Génova, e continua a ser um escritor muito bem recebido pelos portugueses, que dele conhecem a obra de ficcionista, onde se destacam, para lá de “A Mulher de Porto Pim”, “Notturno Indiano” (Nocturno Indiano, 1984), “Piccoli Equivoci Senza Importanza” (Pequenos Equívocos sem Importância, 1985), “Il Filo dell' Orizzonte” (O Fio do Horizonte, 1986), excelente adaptação ao cinema por Fernando Lopes, “I Volatili del Beato Angélico” (Os Voláteis do Beato Angélico, 1987), “I Dialoghi Mancati” (Chamam ao Telefone o Senhor Pirandello, 1988), “L'Angelo Nero” (O Anjo Negro, 1991), “Requiem: un'Allucinazione” (Requiem, 1992), “Sogni di Sogni” (Sonhos de Sonhos, 1992), “Sostiene Pereira” (Afirma Pereira, 1994), que deu também origem a um filme homónimo, realizado por Roberto Faenza, com Marcello Mastroianni, e igualmente rodado em Portugal, “Gli Ultimi Tre Giorni di Fernando Pessoa” (Os Três Últimos Dias de Fernando Pessoa, 1994) ou “La Testa Perduta di Damasceno Monteiro” (A Cabeça Perdida de Damasceno Monteiro, 1997) ou “La Gastrite di Platone” (1998), “Marconi, se Ben mi Ricordo” (1997), “Si sta facendo sempre più tardi. Romanzo in forma di lettere” (2001), “Tristano muore. Una vita” (2004).
Apaixonado por Portugal, crítico e tradutor italiano de Fernando Pessoa. Tabucchi apaixona-se pela poesia de Pessoa nos anos 60, ainda na Sorbona, e no regresso a Itália frequenta aulas de português para melhor perceber melhor o poeta. Sobre Pessoa escreveu obra variada, para lá de ensaios: “Pessoana mínima” (1987), “Un baule pieno di gente. Scritti su Fernando Pessoa” (1990), (1994), “Dove va il romanzo” (1995, essay), “Carlos Gumpert, Conversaciones con Antonio Tabucchi” (1995), L'Automobile, la Nostalgie et l'Infini” (1998), “Gli Zingari e il Rinascimento” (1999), “Ena poukamiso gemato likedes (Una camicia piena di macchie. Conversazioni di A.T. con Anteos Chrysostomidis”, 1999), “Autobiografie altrui. Poetiche a posteriori” (2003), etc.

(2) Titulo original: Dama de Porto Pim
Realização: José Antonio Salgot (Espanha, 2001); Argumento: Jacobo López-Vilasaló, José Antonio Salgot, segundo conto de António Tabucchi; Música: Mario de Benito; Fotografia (Cor): Javier G. Salmones; Montagem: José María Biurrún; Casting: Julio Gavilanes; Design de produção: Gil Parrondo; Guarda-roupa: Gumersindo Andrés; Maquilhagem: Cristóbal Criado, Viuda de Ruiz; Direcção de produção: Salvador Ginés; Departamento de arte: Jose Antonio Mateos; Som: Jorge Lerner, José Nogueira; Efeitos visuais: El Khadir Palomo Yusef; Produção: Eduardo Campoy, Juan Gona; Companhias de produção: Creativos Asociados de Radio y Televisión, Gonafilm S.L.;
Intérpretes: Emma Suárez (Lucía), Antonio Resines (Español), Sergio Peris-Mencheta (Lucas), José Manuel Cervino (Eduino), Ismael Martínez (Miguel), May Heatherly (Mrs. Burnes), Armando del Río (Hans), Olegar Fedoro (Pierre), Bea Segura (Maria), Oriana Bonet (Mercedes), Denis Rafter (Mr. Perrin), Maite Blasco (Madame Perrin), José Antonio Izaguirre, Xavier Sandoval, Patricia Mendy, Pep Guinyol, Teresa del Olmo, etc.
Duração: 90 minutos, Estreia em Espanha: 9 de Novembro de 2001; Locais de filmagem: Tazones, Astúrias, Espanha.
(todas as fotos são do autor, com a compreensível excepção da baleia)

segunda-feira, junho 02, 2008

FAIAL, I

NO PETER CAFÉ SPORT

Um dos símbolos do Faial é o “Peter Café Sport”, local de romagem obrigatória para lobos-do-mar e turistas em peregrinação, mas também para os fiéis habitantes da ilha ou os simples apreciadores de referências gastronómicas.
Há cerca de uma dezena de anos estivera na Horta e daí para cá poucas diferenças senti. Neste caso não quer dizer que a terra não tenha evoluído. Apenas se manteve igual. Serena à superfície, com uma actividade sísmica intensa nos seus subterrâneos, mágica na sua paisagem, o límpido oceano a bordejá-la, o verde das pastagens e do (raro) arvoredo a subir encosta acima, as casas da cidade permanecem de um traçado nobre, da mais modesta à mais exuberante, a despertar a nossa curiosidade à medida que andamos, um comércio parado no tempo, cafés que recordam o passado, um porto de abrigo que se tornou escala entre a Europa e as Américas, a memória de milhares de viagens e de viajantes que deixam a sua colorida marca no chão e nas paredes deste ancoradoiro único onde nascem e morrem esperanças e se suspendem paixões. De paraísos perdidos, de mulheres ou homens de olhos faiscantes, de Moby Dicks que se perseguem até à morte. Assim é a história da Humanidade que aqui encontra registo miniaturista e “naif”.
Entre-se no “Peter Café Sport”. São velhas e sólidas cadeiras e mesas de madeira, estas com tampos de mármore, numa boa tradição de taberna reabilitada. Numa das paredes um mapa-mundo da “Cable and Wireless Limited”, e depois uma profusão imensa de estandartes e bandeirinhas que se sobrepõem, autocolantes, placas comemorativas, brasões de barcos, bilhetes escritos em todas as línguas, apelos, informações. Pedidos de “crew” para viagens. “Foi um prazer conhecer-te…”. “To Sophie”, ali se encontra um bilhete em papel fechado que todos aceitam como inviolável até à provável, ou improvável, chegada da anunciada Sophie. Uma enorme águia de madeira, num castanho-escuro e duro, de bem abertas e negras asas, segura nas fortes patas duas entrelaçadas bandeiras de Portugal. Está por cima do balcão principal, donde fumegam malgas brancas com uma excelente e forte sopa de peixe, mas também pastéis de bacalhau, rissóis, tartes várias, cervejas e gin tónico (o célebre “gin do mar” ou o “gin à memória”). Desse balcão sai e entra, com bandejas carregadas, uma empregada brasileira de olhos doces e t-shirt da casa, “Whale Whatching - Peter”, com as calças descaídas deixando entrever uma faixa da barriga, pele rosada e umbigo a descoberto. Há este balcão de bebidas e comidas ao fundo, e um outro, à esquerda de quem entra, este reservado a pagamentos, tabacos e “souvenirs.” O “Peter” não é só já um café, mas por cima do estabelecimento tem, no primeiro andar, um pequeno museu do mar, da pesca à baleia, da escultura em osso e dente de baleia, e, crescendo do seu lado esquerdo, estende-se também uma loja que vende um pouco de tudo, de t-shirts a brincos, de livros turísticos a objectos regionais.
No próprio café há pequenas vitrinas com as prateleiras repletas de objectos de dente de baleia, de madeira de figueira, alargando a recordação para o mar e os barcos, a caça à baleia, o horizonte do Atlântico. Um Atlântico que basta olhar através das portas para se vislumbrar para lá da esplanada.
A iluminação é discreta, mesmo de dia, mais clara do que à noite, onde impera o dourado velho das lâmpadas. Nas paredes e nas montras, lanternas antigas azuis e brancas, relógios e aparelhos vários da arte de marear. Nas mesas, a pausa para um café ou uma cerveja, os gins da tradição ou uma refeição mais demorada. Franceses, irlandeses, nórdicos à escolha, americanos e ingleses, uma babilónia de línguas, de olhares, de cabelos hirsutos ou de carecas rapadas à lamina, cabelos em rabo de cavalo, presos atrás, ou soltos, ou atados por uma fita vermelha em redor da testa. Há homens para todos os gostos, rostos tisnados pelo sol, barbas longas, ou simples bigodes, calções, calças militarizadas ou curtas, t-shirts lisas de cores claras ou escuras, ou estampadas com barcos e símbolos de companhias de navegação. Botas cardadas, chinelos, ténis, mais ligeiros ou mais carregados, sandálias, socas. Entra um casal que capta o olhar de todos: ele de cabeça rapada à máquina zero, de longos bigodes louros e farfalhudos, alto e espadaúdo, sacola às costas, ela loura, t-shirt azul-marinho a escorrer-lhe pelo corpo alto mas franzino, seios a anunciarem-se soltos por baixo do algodão, longos dias de travessia do oceano nos braços e nas mãos. No balcão pedem duas cervejas que trazem até à porta, onde se encostam confortavelmente, acendem cigarro e cigarrilha e ficam a olhar o mar e a beber.
Mas dentro do café, em diversas mesas, vão-se sucedendo os cabelos louros de mulheres de meia-idade e os grisalhos de homens que passaram grande parte da sua vida no mar ou em portos de abrigo como este. São velhos lobos-do-mar com muitas histórias para contar que as vão desfiando a mulheres louras, sempre louras, de longos cabelos escorridos, ou encaracolados, que os ouvem e os incitam com o olhar para novas aventuras. Marítimas ou não. Estes são os seres que vivem no habitat natural, onde se cruzam com burgueses de visita, burocratas em momentos de relaxe, artistas em busca de inspiração, turistas que registam o instante.
Lá ao fundo, ancorados no porto, os iates, os barcos de recreio, os botes de ilusão que atravessam os oceanos do mistério, de ondas encrespadas ou de cálidas marés que povoam os sonhos do homem, sonhos de conquistas e de aventuras que se estendem desde a “Odisseia” ou da “Ilíada” até “Moby Dick” ou “O Velho e o Mar”. Há ainda “Mau Tempo no Canal” que une o Faial ao Pico, mesmo ali à frente. E “Gente Feliz com Lágrimas”. Passando por “A Mulher de Porto Pim”. Mas esta fica para uma próxima história.