Mostrar mensagens com a etiqueta Steven Soderbergh. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Steven Soderbergh. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, outubro 10, 2013

CINEMA: POR DETRÁS DO CANDELABRO


POR DETRÁS DO CANDELABRO
Michael Douglas (em cima) e o verdadeiro Liberace (em baixo)

Devo dizer que nunca fui tocado pela arte e o virtuosismo de Liberace. Quando eu era miúdo e ele um ídolo, a sua excentricidade afastava-me desse pianista showman que tinha programa de televisão e tudo e era um dos homens mais ricos do showbiz norte-americano.
Wladziu Valentino Liberace nasceu West Allis, a 16 de Maio de 1919 e viria a falecer, em Palm Springs, a 4 de Fevereiro de 1987, vítima de SIDA. Vinha de uma família de músicos e tudo indicava que se tornaria num pianista clássico. Mas um dia, durante um dos seus primeiros recitais, quando chegou aos encores, em vez de um trecho clássico, optou por algo mais ligeiro e esta escolha iria mudar a sua carreira.
Liberace era um pianista extraordinariamente treinado sob o ponto de vista da escola tradicional do piano, mas que ousou o inesperado: usar toda a sua arte não apenas num repertório clássico, mas também na música popular. Além de tocar, ele cantava e dançava. A sua celebridade cresceu e rapidamente se tornaria o "Liszt de Las Vegas". Nunca interpretava Chopin ou Berlin (ou quem quer que fosse) sem lhes dar um cunho muito pessoal. Aparecia de Rolls Royce em cena, com aparatosas capas, rodeado de corpo de baile, cantava e dançava e era o mais bem pago de todos. A sua fortuna pessoal permitia-lhe coleccionar automóveis de marcas de topo, pianos históricos e mobiliário, além de possuir um guarda-roupa que fazia inveja a qualquer teatro de vaudeville. Tinha um programa de televisão a nível nacional, orgulhava-se dos seus “protegidos” e ostentava trejeitos que denunciavam homossexualidade de que alguns meios de comunicação o acusavam. Ele negou sempre e processou os acusadores. No seu período áureo recebeu mais de cinco milhões de dólares anualmente, o que lhe permitia ter cinco luxuosas mansões. A última aparição pública de Liberace foi em Novembro de 1986, no Radio City Music Hall, em Nova Iorque. Três meses após esta despedida, morria, com 67 anos, por complicações causadas pelo vírus da SIDA, na residência de Palm Springs, na Califórnia.


Um dos seus últimos “protegidos”, Scott Thorson, escreveu uma autobiografia (de colaboração com Alex Thorleifson), a que deu o título “Behind the Candelabra: My Life With Liberace”. Foi esta obra que deu origem ao filme de Steven Soderbergh, tendo sido adaptada a cinema pelo argumentista Richard LaGravenese. Aborda os últimos anos da vida de Liberace e a relação amorosa e sexual que durou seis anos entre Liberace e Scott Thorson. As memórias são evidentemente pessoais e vistas sob a perspectiva de Scott Thorson e o filme assume esta óptica sem nunca a por em causa.
O elenco escolhido é magnífico, sobretudo os protagonistas, Matt Damon na figura algo cinzenta de Scott Thorson, que se confessa bissexual e oscila entre o amante incondicional e o arrivista à procura de riqueza fácil, e Michael Douglas, numa composição absolutamente fabulosa de Liberace, de uma subtileza notável, mesmo nos momentos de maior exuberância. Este ano os Oscars de actores principais não parecem suscitar nenhum suspense. Cate Blanchett, em “Blue Jasmine” e Michael Douglas, em “Por Detrás do Candelabro” arrumam as contam à priori.


Mas, para lá do virtuosismo da interpretação, o filme é ainda magnificamente realizado por um inspirado Steven Soderbergh que encena com brilho esta vida de excessos, recriando a vida íntima de Liberace com pudor, mas não se furtando a cenas que facilmente poderiam cair no ridículo, e que ele segura com mão de mestre, ao mesmo tempo que nos oferece a féerie dos seus concertos e aparições públicas. Distante de início, com a câmara fixa, próximo e hesitante nas sequências finais, rodadas com a câmara à mão, pelo próprio realizador (que, além da realização, assina ainda fotografia e montagem), “Por Detrás do Candelabro” é uma lição de cinema. Curiosamente, este filme não foi produzido por nenhum dos grandes estúdios de cinema americanos, nunca foi estreado em salas nos EUA, tendo sido directamente lançado na televisão por cabo (quem o produziu foi a NBO, que assim permitiu ao realizador concretizar este projecto longamente amadurecido). De resto, Steven Soderbergh, um dos mais interessantes cineastas do actual cinema norte-americano, um homem que tem alternado ao longo da sua filmografia obras de grande público, como “Os Onze do Oceano” e sequelas, e outras de um certo experimentalismo, como “Sexo, Mentiras e Vídeo”, anunciou que o cinema para ele tinha acabado, dadas as condições de produção que existem hoje na América. Ele vai ficar-se pela televisão e pelo vídeo, que lhe oferecem maior liberdade.

POR DETRÁS DO CANDELABRO
Título original: Behind the Candelabra

Realização: Steven Soderbergh (EUA, 2013); Argumento: Richard LaGravenese, segundo obra de Scott Thorson e Alex Thorleifson; Produção: Susan Ekins, Gregory Jacobs, Michael Polaire, Jerry Weintraub; Música: Marvin Hamlisch; Fotografia (cor): Steven Soderbergh (como Peter Andrews); Montagem: Steven Soderbergh (como Mary Ann Bernard); Casting: Carmen Cuba; Design de produção: Howard Cummings; Direcção artística: Patrick M. Sullivan Jr.; Decoração: Barbara Munch; Guarda-roupa: Ellen Mirojnick; Maquilhagem: Christine Beveridge, Kate Biscoe, Stephen Kelley, Marie Larkin, Yvette Stone; Direcção de produção: Julie M. Anderson, David Kirchner, Michael Polaire; Assistentes de realização: Gregory Jacobs, Jody Spilkoman, Lynn Struiksma; Departamento de arte: Nicole Balzarini, Greg Berry, Karen Higgins, Jessica Ripka, Eric Sundahl, Karen Teneyck; Som: Larry Blake; Efeitos especiais:  Josh Hakian, David Waine; Efeitos visuais: Thomas J. Smith; Companhia de produção: HBO Films; Intérpretes: Michael Douglas (Liberace), Matt Damon (Scott Thorson), Dan Aykroyd (Seymour Heller), Rob Lowe (Dr. Jack Startz), Debbie Reynolds (Frances Liberace), Scott Bakula (Bob Black), Tom Papa (Ray Arnett), Nicky Katt (Mr. Y), Cheyenne Jackson (Billy Leatherwood), Paul Reiser (Mr. Felder), Boyd Holbrook (Cary James), David Koechner, Eddie Jemison, Randy Lowell, Tom Roach, Shamus Cooley, John Smutny, Eric Zuckerman,Jane Morris, Garrett M. Brown, Pat Asanti, Casey Kramer, James Kulick, Bruce Ramsay, Paul Witten, Deborah Lacey, Susan Todd, Nicky Katt, Austin Stowell, Francisco San Martin, Anthony Crivello, Mike O'Malley, Kiff VandenHeuvel, Nikea Gamby-Turner, Charlotte Crossley, Josh Meyers, Harvey J. Alperin, Jerry Clarke, Lisa Frantz, Shaun T. Benjamin, John Philip Kavcak, etc. Duração: 118 minutos; Distribuição em Portugal: Zon Audiovisuais; Classificação etária: M / 16 anos; Data da estreia em Portugal: 19 de Setembro de 2013.

sábado, maio 19, 2012

CINEMA: UMA TRAIÇÃO FATAL


UMA TRAIÇÃO FATAL
Steven Soderbergh é um realizador com quem simpatizo bastante, desde os tempos de “Sexo, Mentiras e Vídeo” (1989). Em cada seu filme sente-se o prazer do cinema, quer sejam obras decisivamente pessoais, mais experimentais, quer se trate de outras mais “comerciais”, mas ainda assim muito marcadas pelo seu estilo. Depois, é um “faz tudo” e faz tudo bem, escreve, realiza, produz, fotografa, monta, etc, etc. e não pára de trabalhar. Chega aos três filmes por ano: em 2011, realizou “The Last Time I Saw Michael Gregg”, “Contágio” e “Uma Traição Fatal”, não falando noutras actividades suas como produtor (ainda em 2011 produziu para outros realizadores “Roman Polanski: Odd Man Out”, “Temos de Falar Sobre Kevin” e “His Way”).
“Uma Traição Fatal” vem na linha da sua série “Ocean's Eleven - Façam as Vossas Apostas” (2001), “Ocean's 12” (2004) e “Ocean's 13” (2007), procurando erguer uma obra de acção intensa, sem grandes preocupações de plausibilidade, jogando no divertimento pelo divertimento. O argumentista Lem Dobbs (o mesmo de “Kafka” e “O Falcão Inglês”, ambos de Soderbergh, e ainda de “Sem Saída” ou de “Cidade Misteriosa”) acompanha a peregrinação de uma espia norte-americana, “não oficial”, Mallory Kane (Gina Carano) que nos é apresentada nas imagens iniciais num café de estrada, onde é vítima de uma cilada engendrada pelo traidor inglês Kenneth (Ewan McGregor), que terá sido seu marido no passado. Foge num carro pedido de empréstimo a um estupefacto Scott (Angarano), a quem depois se entretém a contar parte da sua movimentada vida, introduzida em flashbacks no filme. Depois tudo é cada vez mais confuso e caótico, percebendo-se que anda ao serviço de um americano de nome Coblenz (Douglas) que a tinha enviado a Barcelona, e depois a Dublin, em parceria com um agente da MI6, Paul (Fassbender), tudo isto resvalando de emboscada em emboscada e de demonstrações de artes marciais em demonstrações de artes marciais, que só têm um fito: a vingança e a limpeza do nome de Mallory, filha de um retirado escritor a viver no México. Deve acrescentar-se que, em questões de limpeza, Mallory Kane é um ás, não fosse a simpática Gina Carano uma expert em artes marciais e cenas de pancadaria avulsas, levando tudo à frente, a solo ou em grupo, só com punhos ou contra gangs armados de metralhadoras. Uma espécie de “Kill Bill”, de Tarantino, mas sem metade da graça, ainda que a narrativa esteja sempre à altura do estilo fluído e elegante de Soderbergh. Acontece, porém, que o exercício é desconcertantemente desmiolado e oco, parecendo que roda no vazio, sem âncora a que se agarrar. Saltitando de cidade em cidade, de país em país, qual guia turístico com roteiro para cumprir, a aventura acaba por aborrecer um pouco, que nem a fotografia de Peter Andrews (pseudónimo de próprio Soderbergh), nem a montagem de Mary Ann Bernard (outra vez Soderbergh sob disfarce) logram minimizar. 
Saúde-se, no entanto, a vedeta da companhia, bonita e destemida, a ameaçadora Gina Carano, que relembra a já mítica Lisbeth Salander, de “Millenium”, o que deixa adivinhar uma nova geração de heroínas a povoar o cinema contemporâneo. Mulheres fatais (mas muito diferentes das antigas mulheres fatais do “film noire”) que conduzem o seu próprio jogo depois de fustigadas por sucessivos desencantamentos e traições masculinas. Gina Carano tem tudo para regressar mais vezes e ser bem-vinda.
“Haywire” não é um mau filme, mas sabe a muito pouco, sobretudo assinado por Soderbergh, e mesmo um entretenimento sem pretensões merece um pouco mais. Como a série “Ocean's Eleven” o demonstrava.
Além de Gina Carano, andam por aqui ainda Michael Fassbender, Ewan McGregor, Michael Douglas, Antonio Banderas, Bill Paxton, Mathieu Kassovitz, entre outros, pouco mais do que a facturar uns milhares de dólares.
UMA TRAIÇÃO FATAL
Título original: Haywire
Realização: Steven Soderbergh (EUA, Irlanda, 2011); Argumento: Lem Dobbs; Produção: Ken Halsband, Gregory Jacobs, Alan Moloney, Michael Polaire, Tucker Tooley; Música: David Holmes; Fotografia (cor): Peter Andrews (Steven Soderbergh); Montagem: Mary Ann Bernard (Steven Soderbergh); Casting: Carmen Cuba; Design de produção: Howard Cummings; Direcção artística: Iñigo Navarro; James F. Oberlander, Anna Rackard; Decoração: Barbara Munch; Guarda-roupa: Shoshana Rubin; Maquilhagem: Marie Larkin, Michelle Vittone; Direcção de Produção: Julie M. Anderson, Nicos Beatty, Noëlette Buckley, Bernat Elias, David Kirchner, Michael Polaire; Assistentes de realização: Jim Corr, Catherine Dunne, Eric Glasser, Gregory Jacobs, Jody Spilkoman; Departamento de arte: Robert J. Carlyle, Amahl Lovato, Roberta Marquez Seret, Chad Owens, Schuyler Telleen, Schuyler Telleen, Pilar Valência; Som: Andrew Felton, Thomas W. Jordan, Edwardo Santiago, Dennis Towns; Efeitos especiais: Ron Bolanowski, Kevin Hannigan, Juan Ramón Molina; Efeitos visuais: John Kennedy, Tim Morris; Companhias de produção: Relativity Media, Bord Scannan na hEireann / Irish Film Board / The Irish Film Board; Intérpretes: Gina Carano (Mallory Kane), Michael Fassbender (Paul), Ewan McGregor (Kenneth), Michael Douglas (Coblenz), Antonio Banderas (Rodrigo), Bill Paxton (John Kane), Mathieu Kassovitz (Studer), Julian Alcaraz (Victor), Eddie J. Fernandez (Barroso), Lluís Botella Pont (Helpful Guy), Aaron Cohen (Jamie), Maximino Arciniega (Gomez), Anthony Brandon Wong (Jiang), James Flynn, Karl Shiels, Bobby Burns, Al Goto, R.A. Rondell, John Wylie, Todd Thatcher Cash, Edward A. Duran, Derick Pritchard, J.J. Perry, Michael Angarano, Debby Lynn Ross, Tim Connolly, Natascha Berg, etc. Duração: 93 minutos; Distribuição em Portugal: Atalanta Filmes; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 10 de Maio de 2012.