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segunda-feira, março 23, 2015

TEATRO: PIRANDELO


PIRANDELLO

Afirma a companhia “mala voadora”: “Pirandello” não é um espectáculo de Pirandello. Quer isto dizer: não é uma encenação de uma peça de teatro escrita por Pirandello. E, apesar de o seu nome dar título ao espectáculo, também não se trata de uma biografia do italiano Luigi Pirandello que nasceu em 1867 e morreu em 1936, autor multifacetado e distinguido com o Prémio Nobel da Literatura em 1934. Mas é a história de uma vida que vamos contar – a de um homem inventado por Pirandello no livro “Ele Foi Mattia Pascal”, ou “O Falecido Mattia Pascal”. Na verdade, não é bem essa história, mas uma parecida... Na verdade, a história que a mala voadora vai contar é a de Albano Jerónimo. O Falecido Albano Jerónimo”.
Aparentemente está tudo dito quanto ao texto que se apresenta como “Pirandello”. Tanto podia chamar-se “Pirandello” como “Shakespeare”, “Gil Vicente” ou “José Saramago”. Agarra-se numa obra de um autor, reduz-se a uma anedota, pega-se nessa anedota e constrói-se com ela um espectáculo essencialmente divertido, inventivo, graficamente de boa qualidade, muito bem interpretado e ponto.
Ainda o texto da “mala voadora”: “Pirandello”, um elogio da ficção, é um laboratório de meta-teatralidade em torno de um texto não-dramático do dramaturgo mais meta-teatral do século XX. Sobrepõe-se, ao abismo ficcional que caracteriza o romance, uma meta-teatralidade que não é aquela que Pirandello usa nos seus próprios textos dramáticos, mas uma outra, inventada a partir da narrativa não-dramática”. Com este texto fica-se a perceber o que foi pretendido. Apesar de um certo pretensiosismo de linguagem. Ou seja, o que se tenta é reduzir a narrativa dramática a uma não narrativa não dramática.
Uma visão moderna, sim, moderna, inscrevendo-se numa linha que tem vindo a vingar junto de certos grupos teatrais mais recentes, a estética de “mala voadora” é de uma grande coerência. Quem procura mais do que “espectáculo” não encontra. O vaudeville de Georges Feydeau é muito mais consistente. Aqui, o que funciona é a aparência. Os cenários de José Capela parecem construções de legos, passados pela imaginação de Robert Wilson, são muito bonitos e funcionam muito bem. Guarda-roupa a condizer. Tecnicamente há que dizer que tudo rola eficazmente, luz, som, etc. A interpretação é muito boa, quase não apetecendo sublinhar ninguém, ainda que Albano Jerónimo e Custódia Gallego o possam merecer, mas a verdade é que Anabela Almeida, David Cabecinha, David Pereira Bastos, Marco Paiva, Maria Ana Filipe, Mónica Garnel, Tânia Alves e Joana Costa Santos vão muito bem no registo escolhido. A encenação de Jorge Andrade é realmente muito imaginativa, cheia de achados de linguagem e de situações, o que transforma “Pirandello” num passatempo que se vê bem e se desfruta como uma taça de champanhe. A metáfora, porém, não funciona com todos. Eu, por exemplo, não gosto de champanhe, o que não quer dizer que não tenha gostado de ver o espectáculo. Mas chamar-lhe “Pirandello”, custa um bocado…

PIRANDELO

a partir de “Ele Foi Mattia Pascal”, de Luigi Pirandello; dramaturgia Jorge Andrade com David Cabecinha, Fernando Villas-Boas; direcção Jorge Andrade; cenografia José Capela com edição de imagem de António MV e José Carlos Duarte; figurinos José Capela; desenho de luz João d’Almeida; banda sonora Rui Lima e Sérgio Martins com a participação de alunos da Escola de Música do Conservatório Nacional; cabelos Carla Henriques; interpretação: Albano Jerónimo, Anabela Almeida, Custódia Gallego, David Cabecinha, David Pereira Bastos, Marco Paiva, Maria Ana Filipe, Mónica Garnel, Tânia Alves e Joana Costa Santos; produção mala voadora Manuel Poças e Joana Costa Santos; assessoria gestão/programação mala voadora: Vânia Rodrigues; coprodução TNDM II, Mala Voadora; M/12 anos; duração: 90 minutos; de 12 de Março a 4 de Abril de 2015.

domingo, julho 13, 2014

TEATRO: TRÊS MULHERES ALTAS



TRÊS MULHERES ALTAS


“Três Mulheres Altas”, de Edward Albee, é considerada uma das peças mais pessoais, mesmo autobiográficas em muito do seu traçado, do autor de “Quem Tem Medo de Virgínia Woolf?” que a escreveu pouco tempo após a morte da sua mãe adoptiva. É também dos seus trabalhos menos conhecidos e ainda bem que o Teatro Nacional de D. Maria II a deu a conhecer agora, pois se trata de um trabalho extremamente interessante, uma obra cénica de notável concepção, interligando em palco o discurso de três mulheres, em três fases distintas da sua vida, juventude, maturidade e velhice, que rapidamente se descobre serem a mesma pessoa, justapondo momentos diferentes da sua existência que dialogam entre si.
Esta dolorosa, e por vezes divertida, meditação sobre a vida (e a morte), sobre as relações humanas (aqui uma especial referência às relações com o filho, quase sempre ausente, seguramente uma das “culpas” a espiar por Albee), é um discurso intimista de uma agudeza de análise e de um humanismo que raras vezes se vê em palcos, com tal profundidade e clareza. Por entre um certo desespero, algum conformismo que roça também a revolta, e uma esperança sempre presente, “Três Mulheres Altas” ficará certamente como um dos bons espectáculos deste ano de 2014, servido por uma inteligente e límpida encenação de Manuel Coelho, inscrita num bom cenário de F. Ribeiro, plasticamente bonito e cenicamente eficaz.  As três mulheres oferecem matéria para Catarina Avelar brilhar num desempenho magnífico, Inês Castel-Branco demonstrar todas as suas qualidades e potencialidades e Paula Mora marcar igualmente uma boa presença. Um bom espectáculo, portanto, que se saúda



TRÊS MULHERES ALTAS (Three Tall Women), de Edward Albee; tradução Marta Mendonça; encenação Manuel Coelho; cenografia F. Ribeiro; figurinos Dino Alves; música original José Salgueiro; desenho de luz José Carlos Nascimento; cabelos e maquilhagem Carla Pinho; assistência de encenação José Neves; Intérpretes: Catarina Avelar, Inês Castel-Branco, Paula Mora e José Neves; produção TNDM II; M/16 anos. 

sábado, outubro 19, 2013

TEATRO: O ALDRABÃO

O ALDRABÃO
Antes de mais uma pequena anotação pessoal que vale o que vale. Julgo que muitas das peças, nomeadamente as comédias, da dramaturgia clássica greco-latina, estão demasiado datadas para hoje surtirem o efeito desejado. Não deixam de ser clássicos, mas só grandes encenações servidas por actores de eleição as tornam particularmente interessantes. De resto, estas comédias de senhores e escravos, de jovem suspirando por amores correspondidos ou não, neste caso de escravas sexuais que se pretendem libertar, já nem são muito divertidas nem muito críticas, por muito inteligentes e actualizadas que possam ser as encenações. Soam a questões de um passado remoto.
“O Aldrabão”, de Plauto, chama-se no original “Pseudolus” e é considerada uma das melhores comédias do autor, para alguns a sua obra-prima. Seja. O autor é um dramaturgo latino, da Roma Clássica, a peça decorre numa rua de Atenas, na Grécia antiga, e a encenação de João Mota, não sei se consciente ou inconscientemente, relembra nalguns aspectos a “commedia dell'arte”, quer pela representação frontal, diante de uma parede e porta de casa, quer pela forma caricatural como se apresentam as personagens.
O resultado não é desinteressante, e não sei se não vou dizer uma heresia, mas tomo-o como um elogio: o todo assemelha-se a um divertido espectáculo popular de troupe, com o seu quê de tropelia burlesca, satírica e mesmo brejeira. Neste aspecto, a actualização da tradução e o engenho da encenação funcionam bem, num belo cenário, e com alguns desempenhos a salientar, nomeadamente os de Rui Mendes e João Ricardo, num elenco onde surgem ainda Virgílio Castelo, Fernando Gomes, Carlos Vieira de Almeida, Rui Neto, Miguel Costa e  Miguel Raposo. Muito divertida a introdução protagonizada por João Mota, e que ajuda a enquadrar a obra no seu tempo e espaço. 


O Aldrabão, de Plauto; tradução Luís Vasco, adaptada a partir da tradução francesa de Édouard Sommer; versão cénica e encenação João Mota; cenografia João Mota e Eric da Costa; figurinos Carlos Paulo; desenho de luz José Carlos Nascimento; música original, direção musical e sonoplastia Hugo Franco; movimento Jean-Paul Bucchieri; Intérpretes: Virgílio Castelo, Rui Mendes, João Ricardo, Fernando Gomes, Carlos Vieira de Almeida, Rui Neto, Miguel Costa, Miguel Raposo e ainda figurantes: Diogo Tormenta, Guilherme Gomes, João Dantas, João Ventura, José Leite, Nuno Rodrigues, Rafael Gomes, Ricardo Teixeira, Sérgio Coragem e Simão Biernat; músicos Luís Bastos (sopros), Rini Luyks (acordéon e teclados) e Gonçalo Santuns (percussão); pintura de telão Silveira Cabral e Teresa Varela; confeção de adereços Teresa Varela; produção TNDM II; M/12 anos. 

sábado, julho 06, 2013

A ÚLTIMA ENCENAÇÃO DE JOAQUIM BENITE


TIMÃO DE ATENAS


"Timão de Atenas" foi o último espectáculo encenado pelo Joaquim Benite", para a sua Companhia de Teatro de Almada (CTA), onde estreou duas semanas depois da sua morte. A seu lado esteve sempre Rodrigo Francisco que aprendeu com ele, o ajudou no que pode e ocupou o seu lugar posteriormente à frente da companhia e do seu célebre Festival de Teatro, cuja 30ª edição, a primeira sem Benite, se inaugurou no passado dia 4 de Julho.
A peça regressou em Junho ao palco do Teatro Nacional D. Maria II. Só nessa altura a fui ver, pois custou-me ir a Almada, sem Benite. Fomos companheiros de lides durante anos, no “Diário de Lisboa”, ele como crítico de teatro, eu de cinema, e acompanhei com amizade e estima o seu percurso. Sei que o mesmo aconteceu com ele em relação a mim. Por vezes podíamos estar anos sem nos vermos, mas a amizade era real e durável. Acompanhei a sua luta contra a doença e admirei a sua tenacidade, a sua persistência no seu amor ao teatro. No último Festival de Almada seguiu as representações e foi orientando o certame numa cadeira de rodas, nunca abandonando o cigarro que, vá-se lá saber se o consumia ou não, mas lhe dava um evidente prazer.
Escrita no início do século XVII, "Timão de Atenas" parece ter uma autoria polémica. Há quem afirme que se trata de uma obra escrita a quatro mãos, por Shakespeare e pelo poeta e dramaturgo seu contemporâneo Thomas Middleton (1580–1627). Nunca representada anteriormente em Portuga, já havia sido encenada por Joaquim Benite, em 2008, para uma apresentação no Festival de Teatro de Mérida, mas numa versão diferente da actual. Esta é mais económica em meios, mais atenta se possível ao texto e à sua importância crítica.
Benite era um apreciador compulsivo do grande teatro e dos textos eternos que ele respeitava escrupulosamente. A palavra tinha uma importância decisiva para ele. A encenação devia colocar-se ao seu serviço. À palavra e às ideias que a mesma desenvolve em palco. O texto de Shakespeare é rico e pertinaz na crítica: Timão é um grande senhor de Atenas que gosta de dispersar a sua fortuna entre amigos e necessitados. Por isso é bajulado e muito apreciado. Até ao dia em que se descobre falido, passando a eremita no deserto da sua solidão. Todos o abandonam, mas a vingança está para vir, quando descobre ouro debaixo de uma pedra que ocasionalmente levanta no seu percurso. E a roda da sorte volta ao inicio, mostrando que o vil metal amaldiçoa quem o detém, por muito que possa parecer que o ilumina.   
Com apenas um longo estrado em cena e meia dúzia de adereços, Joaquim Benite ergueu um espectáculo bastante interessante, a começar pela excelente tradução de Ivette Centeno, desenvolvida especialmente para esta encenação, cuja interpretação, infelizmente, é bastante desigual, destacando-se, todavia, Luís Vicente, Marques D"Arede, Paulo Matos, Ivo Alexandre e André Gomes, nos principais papéis.

“Timão de Atenas”, de William Shakespeare; Tradução Yvette K. Centeno; Cenário Jean-Guy Lecat; Figurinos Sónia Benite; Luz José Carlos Nascimento; Voz e elocução Luís Madureira; Movimento Jean-Paul Bucchieri; Consultoria musical Fernando Fontes; Intérpretes: Luís Vicente, Marques D"Arede, Paulo Matos, Ivo Alexandre, André Gomes, Alberto Quaresma, Manuel Mendonça, Miguel Martins, João Farraia, Pedro Walter, Celestino Silva, Ana Cris, Joana Francampos, Jeff de Oliveira.
A peça esteve em cena de 20 a 22 de Dezembro de 2012 e de 9 de Janeiro a 3 de Fevereiro de 2013, no Teatro Municipal de Almada, tendo sido reposta em Junho de 2013 no Teatro nacional D. Maria II, em Lisboa.

O trabalho de Joaquim Benite para esta peça deu ainda origem a um documentário da jornalista Catarina Neves, que será estreado durante o 30º Festival de Teatro de Almada. 

quinta-feira, dezembro 15, 2011

TEATRO: QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF?

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 QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF?

NO CINEMA E NO TEATRO

As possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias têm aspectos muito positivos. Mal acabei de ver “Quem tem Medo de Virgínia Woolf’” no Teatro Nacional de D. Maria II, chegado a casa recordei o filme, com o simples gesto de introduzir o DVD no leitor. Algo impensável há anos atrás e que agora permite leituras quase simultâneas, comparações e revisões da matéria dada num ápice. Além de somar às duas horas e meia da peça os 125 minutos do filme. Juro que não foi masoquismo, mas um exercício muito interessante e proveitoso, para perceber estratégias e opções de encenação e realização. E de adaptação.
Claro que é difícil sustentar uma comparação entre a versão portuguesa e a que o filme nos oferece, mas, apesar disso, julgo meritório o esforço de actores e técnicos nacionais. Mas vamos por partes. 
“Who's Afraid of Virginia Woolf?”, a peça de Edward Albee, estreou no Billy Rose Theater, na Broadway, no dia 13 de Outubro de 1962, numa encenação de Alan Schneider, com um elenco constituído por Arthur Hill (George), Uta Hagen (Martha), Melinda Dillon (Honey) e George Grizzard (Nick). Esteve em cena durante dois anos, com 664 representações. Durante esse tempo, o elenco foi substituído. Entraram Henderson Forsythe, Eileen Fulton, Mercedes McCambridge e Elaine Stritch. E como a peça era muito longa, com uma duração que quase atingia as três horas, havia um elenco de substituição para algumas récitas, sobretudo matinées: Kate Reid (Martha), Shepperd Strudwick (George), Avra Petrides (Honey) e Bill Berger (Nick).
Um acontecimento para a época, dado que Albee não era um autor conhecido senão dos circuitos off-Broadway, onde já tinha estreado algumas peças em um acto, nomeadamente “The Zoo Story” (1958) ou “The Sandbox” (1959). Mas “Who's Afraid of Virginia Woolf?”, a princípio recebida com alguma relutância, em função sobretudo da sua linguagem desabrida e pouco habitual em palcos, haveria de recolher o Tony de 1963 para a melhor peça do ano e o Prémio do Círculo de Críticos Teatrais de Nova Iorque. Foi seleccionada para o Pulitzer de 63, mas a Universidade de Columbia, que patrocina o prémio, não permitiu que o mesmo fosse atribuído, com a justificação de que a obra continha alusões sexuais e obscenidades.
Como facilmente se percebe “Who's Afraid of Virginia Woolf?” é uma brincadeira que parte da canção do filme de animação de Walt Disney “The Three Little Pigs”, onde aparece a pergunta: "Who's Afraid of the Big Bad Wolf?". Dado que se trata de um peça que decorre em ambientes universitários, o trocadilho literário impunha-se sintoma de um certo snobismo intelectual.
Albee reúne dois casais na sala de estar da casa de um deles. A peça estrutura-se em três actos que o autor identifica: “Act One - "Fun and Games”, “Act Two - "Walpurgisnacht" e “Act Three - "The Exorcism".
A casa é a de George e Martha, que acabam de regressar de uma festa e que convidam para uma longa noitada um casal recém chegado ao campus universitário. George é professor de História numa universidade americana cujo reitor é o pai da sua mulher Martha. Nick e Honey são os debutantes, sendo que ele vem assegurar uma cadeira de biologia. O álcool já correra na festa de onde vêm, e continuará a circular abundantemente durante o resto da vigília. George e Martha gostam de ter plateia para os seus confrontos verbais. Tudo indica que esta é apenas mais uma das sua típicas discussões, onde se agridem sem pudor, onde deixam extravasar toda a sua frustração e tristeza. George sonha com a cátedra de História, mas não a alcança e Martha humilha-o por isso. Nick e Honey são, aparentemente, os cordeirinhos escolhidos para o sacrifício dessa noite. Eles são os espectadores de um “jeu de massacre” impiedoso, e Nick oferece-se mesmo para concretizar a vingança de Martha.
Mike Nichols passou a cinema esta peça em 1966 e escolheu para o reduzido elenco duas excelentes duplas de actors: Elizabeth Taylor (Martha) e Richard Burton (George), George Segal (Nick) e Sandy Dennis (Honey). A escolha de Burton e Taylor não poderia ter sido melhor, dado que a própria vida privada deste casal poderia ter algo a ver com a de George e Martha. De todas as formas, o que prevalece no filme, que consegue uma extraordinária tensão entre as personagens, servido pelo magnífico preto e branco do notável director de fotografia Haskell Wexler, é a oposição entre um casal carregado de passado, de traumas e frustrações, que explode (regularmente?) como forma de exorcizar esses fantasmas, e um novo casal, sem passado visível e nada assegurando que com muito futuro. O peso da representação dos actores é impressionante, tornado particularmente complexa a relação que se estabelece entre eles. Os três “rounds” deste cruel combate que chega a ser quase de vida ou de morte, não se esgotam numa simples definição. George e Martha coabitam odeiam-se mas também se amam. A sequência final é significativa. Eles estão ali para continuarem, para enlaçarem as mãos e, no próximo fim-de-semana, voltarem a envolver-se numa feroz disputa. Com amor e ódio.
Mike Nichols foi muito inteligente na forma como adaptou a peça ao ecrã, com curtas saídas da sala de estar, nunca permitindo que essas “excursões” cortassem a densidade e a tensão psicológica estabelecida entre as personagens.
Esta nova encenação portuguesa não é deslumbrante, mas cumpre eficazmente o regresso da obra às salas portuguesas. Surge depois das encenações de João Vieira, numa produção Vasco Morgado, em 1971, de Fernanda Lapa, no Teatro de Hoje, em 1990, e de Carlos Otero, no TAS, em 2000.
Com um belíssimo cenário de F. Ribeiro e um excelente desenho de luzes de Nuno Meira, este espectáculo do Teatro Nacional de D. Maria II, último da era Diogo Infante, conta com uma encenação sóbria, mas não muito inspirada, de Ana Luísa Guimarães e um elenco esforçado, com Virgílio Castelo e Maria João Luís, no casal que se auto destrói, e Romeu Costa e Sandra Faleiro nos visitantes inexperientes que assistem a um perigosos jogo de revelações, de mentiras e de ilusões perdidas.
“Se existir uma história daqui a alguns anos e eu fizer parte dela, atrevo-me a dizer que “Quem tem medo de Virginia Woolf?” será a peça que melhor se identifica com o meu nome”. Estas foram palavras proferidas por Edward Albee, no programa do espectáculo apresentado em 1996, em Londres. Ela é indiscutivelmente uma das grandes peças de teatro da dramaturgia do século XX. Só por isso valeu a pena a sua releitura pelo TNDM II.

QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF?
Título original: Who's Afraid of Virginia Woolf?
Realização: Mike Nichols (EUA, 1966); Argumento: Ernest Lehman, segundo peça teatral de Edward Albee; Produção: Ernest Lehman; Música: Alex North; Fotografia (p/b): Haskell Wexler; Montagem: Sam O'Steen; Design de produção: Richard Sylbert; Decoração: George James Hopkins; Guarda-roupa: Irene Sharaff; Maquilhagem: Gordon Bau, Ron Berkeley, Sydney Guilaroff, Jean Burt Reilly; Assistentes de realização: Bud Grace; Departamento de arte: Craig Binkley, Harold Michelson, Joseph Musso; Som: M.A. Merrick; Direcção de Produção: Richard Barr, Doane Harrison, Clinton Wilder; Genérico: Wayne Fitzgerald; Coreógrafo: Herbert Ross; Companhias de produção: Warner Bros. Pictures, Chenault Productions; Intérpretes: Elizabeth Taylor (Martha), Richard Burton (George), George Segal (Nick), Sandy Dennis (Honey), Agnes Flanaganm Frank Flanagan, etc. Duração: 131 minutos; Distribuição em Portugal: Astória Filmes; Classificação etária: M/ 17 anos; Estreia em Portugal: 1967.