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quinta-feira, dezembro 17, 2015

RECORDANDO "A GUERRA DAS ESTRELAS" EM 1977


A GUERRA DAS ESTRELAS

Agora que se anuncia a estreia de mais um episódio da saga "A Guerra das Estrelas", recorde-se o que escrevi, em 1977, na estreia, e depois 1981, na reposição, quando era crítico no "Diário de Noticias". 


GEORGE LUCAS: A GUERRA DAS ESTRELAS

Possivelmente os mesmos que, em 1963, torceram o nariz aquando da estreia de “2001” (nessa altura a ficção científica não era um valor cultural solidariamente implantado), olham agora de soslaio esta “A Guerra das Estrelas”. E para diminuir o filme de George Lucas estabelecem comparações, servindo-se já do “2001”. Como se fosse possível atacar “Fanfan la Tulipe”, em nome de “O Mundo e Seus Pés”.
“A Guerra das Estrelas” pretende ser uma maravilhosa aventura no espaço. E consegue-o. De que maneira! Uma galáxia dominada por um despótico tirano assiste à insurreição. A revolta é o tema do filme de George Lucas, que se inscreve na melhor tradição do cinema de aventuras norte-americano, de Errol Flynn a “O Comboio Apitou Três Vezes”.
As trucagens são brilhantes, mas o menos importante nesta obra-prima da aventura, da audácia, do arrojo, do humor. Mesmo num plano filosófico, o filme se revela de grande riqueza e complexidade, permitindo-se inovações de certa monta, como por exemplo o lugar ocupado pelo Homem neste universo povoado por seres das mais diversas configurações e origens. Temos assim, finalmente, o Homem a viver com outros seres, sentindo-se um entre vários habitantes do espaço. O que até agora o cinema não nos tinha dado com a clareza e exemplaridade deste “Star War”.
Ao lado do Homem, androides que relembram Bucha e Estica e “saloons” espaciais onde o “Muppet Show” marca “rendez vous”. A banda sonora recorda os “cartoons” do «Buq's Bunny» e o Cavalo de Troia recolhe “robots” usados para revenda. Peter Cushing e Alec Guiness defrontam-se ainda nesta luta pelo poder e pela liberdade com espadas de raio Laser, enquanto a “princesa” e Luke tentam a destruição da estação de guerra. Emocionante.
(D. N.) - 1977


A GUERRA DAS ESTRELAS DE GEORGE LUCAS (REVISÃO)

A década de 70, quando a aventura épica e generosa que fizera a lenda do cinema americano, parecia desaparecer, sob uma onda de violência descompassada, de mercenarismo e hipocrisia, eis que George Lucas descobre que afinal os heróis resistem nas suas brancas indumentárias e Tom Mix, o cavaleiro íntegro, poderia continua a sua gesta, agora nas estrelas.
“Star Wars”, com a data de 1977, é isso mesmo, um regresso à idade da inocência do cinema americano, repescando aqui e ali influências de uma adolescência dourada passada no interior de salas escuras, povoadas pelo ruído das lanças dos torneios do príncipe Valente, os saltos de Tarzan, as naves espaciais de Buck Rodgers e Flash Gordon em “serials” de dezenas de parte, ou as cavalgadas de Gary Cooper ou John Wayne nas pradarias do Oeste. Entre dezenas de outras referências possíveis, crescem as personagens desta “A Guerra das Estrelas”, onde os bons são mesmo bons e os maus intrinsecamente mau. Não há complexidades psicológicas nesta obra de uma linearidade gratificante, porque inteiramente assumida enquanto tal e por isso mesmo defendida. Luke Skywalker, a quem os tiranos mataram os pais, vive uma aventura que comporta apenas as cores puras da armadura de um cavaleiro da corte do rei Artur, aqui em busca da suprema “força”. A princesa Leia Organa apenas se distingue das virginais damas medievais, por quem se terçavam lanças em mortais duelos de honra desagravada, por uma ou outra réplica mais ousada, um outro gesto mais intempestivo. Mas Darth Vader é obviamente a personificação do Mal, simbolicamente assinalado por uma máscara e uma silhueta que impedem toda a identificação com o espectador.
A única figura de contornos mais imprecisos será o oportunista Hans Solo, que, todavia, deixa falar o coração no momento derradeiro e regressa à luta e ao campo da honra em defesa dos fracos e dos oprimidos. Desesperando de qualquer retribuição monetária ou honraria. Ben Kenobi, por seu turno, é o ideal arquétipo que se persegue, a fonte de inspiração que se tenta continuar, depois de se ter provado merecê-la. Do burlesco, uma dupla de “robots”, C3PO e R2D2, prolongam desajustamento Bucha e Estica e o seu discreto humor, invadido pela ternura. Chewbacca, “esse enorme tapete rolante mal cheiroso”, como lhe chamava a princesa, introduziu-nos no entanto num universo onde tudo é possível de acontecer, onde os humanos perderam o centro do mundo, sendo uns entre vários, princípio de cooperação cósmica cuja lição é depois continuada, por exemplo nos “Encontros Imediatos”, de Spielberg.
Aventura pela aventura, A Guerra das Estrelas é a afirmação lúcida de uma arte que se alimenta do movimento, da acção, do ritmo e de uma imaginação feérica de contos de fadas, onde, para valorizar devidamente o Bem, são imprescindíveis os muito maus. Há um maniqueísmo que nunca se procura encobrir sob falsas roupagens de intelectualismo ou filosofice. A pretensão está ausente desta movimentada aventura que restitui ao espectador um prazer quase perdido: num sofisticado reino interplanetário, povoado por robots e seres estranhos (de antologia a sequência do “saloon” onde, lado a lado, coexistindo sem qualquer estranheza, se descobrem as figuras mais inconcebíveis, os heróis do “western” voltam a cavalgar, por sua dama e por el-rei. Ao público resta embarcar nesta nave espacial de direcção à distância, e percorrer nela o quarto de brinquedos mágicos de um feiticeiro chamado George Lucas.
(D. N.) - 1981 


quinta-feira, janeiro 15, 2015

"Manhã Submersa" no Fundão




LAURO ANTÓNIO NO FUNDÃO

O realizador de cinema Lauro António, autor do filme Manhã Submersa, baseado no romance homónimo de Virgílio Ferreira, vai participar na mesa redonda “Fundão Raízes identitárias e representações do espaço urbano” que vai ter lugar, no Fundão, na moagem. Cidade do Engenho e das Artes no próximo sábado, dia 17, a partir das 15 horas. O evento contará também com a participação do jornalista Fernando Paulouro, do professor a UBI Domingos Vaz e do presidente da Câmara do Fundão Paulo Fernandes, moderados por Pedro Miguel Salvado. Recorde-se que "Manhã Submersa", filme que será projectado na sessão, teve no Fundão,e principalmente no seu antigo seminário, a geografia da sua história. Para Pedro Novo, comissário da exposição "Um Destino, Coisa Simples" em que a mesa redonda se enquadra, considera que estas leituras plurais são fundamentais para entender e compreender a “grande diversidade de imagens que o tecido urbano produziu e emite. O Fundão é um dos casos interessantes de ser analisado, pois encontramos representações desde a poesia até à literatura passando pelo cinema. É este diálogo continuado e este cruzar de olhares que queremos associar à mostra”. A exposição vai itinerar a partir de 17 de Janeiro para o Museu dos Lanifícios na Covilhã, Beira Interior, seguindo depois para a Lisboa Roca Gallery em Abril e mais tarde para a Castelo Branco. Estando neste momento a ser acordados novos espaços no território nacional para que possa estar patente até ao final do ano. (nota dos organizadores)

in Jornal do Fundão

sábado, setembro 28, 2013

PORTUGAL SUBMERSO

FERNANDO DACOSTA
Portugal submerso

Um dos grandes cineastas portugueses, que tem suspensa a sua carreira como a maior parte dos nossos melhores realizadores, foi esta semana alvo de uma assinalável homenagem em Setúbal. Promovida por João Pereira Bastos, director do (magnífico) Fórum Luísa Todi, naquela cidade, ele, Lauro António, viu juntarem-se à sua volta diversos nomes de projecção intelectual que lhe manifestaram, em noite de invulgar vibração, um pouco do reconhecimento que lhe é devido.
Para lá do cinema, ou seja, para lá dos inesquecíveis filmes seus - "Manhã Submersa" é-nos uma referência -, Lauro António destacou-se como crítico, dramaturgo, ensaísta, conferencista, escritor, produtor, professor, marcando como poucos várias áreas culturais e convivenciais do país.
Os seus "Vavadiando", no café Vává de Lisboa, são pérolas nas tertúlias que (ainda) restam, como o são os ciclos de divulgação cinematográfica e os festivais temáticos que desenvolve em incansável e preciosa acção cultural por quase toda a comunidade - sem que a SEC o tenha alguma vez percebido.
A literatura e o teatro têm-lhe sido, depois do cinema, motores de actuação, pelo que escritores, encenadores, actores, realizadores, jornalistas, críticos estiveram presentes na confraternização agora aberta, a que se associaram músicos, fadistas, técnicos, fotógrafos, etc.
Se a cultura serve, como dizia Jorge de Sena, para mostrar aos outros e a nós próprios que somos melhores do que os outros e nós próprios julgamos  ser, então todos estamos em dívida para com Lauro António - é que ele acredita, e faz-nos acreditar (pela cultura, pelo convivia, pelo afecto) que podemos ser melhores do que aquilo que somos.


                                In Jornal “I”, quinta-feira, 26 de Setembro de 2013




sábado, setembro 21, 2013

DIA 23 DE SETEMBRO: NO LUÍSA TODI, 21 HORAS



LUÍSA TODI HOMENAGEIA LAURO ANTÓNIO

No próximo dia 23 de Setembro, o Fórum Luísa Todi, em Setúbal, presta a Lauro António uma homenagem que tem vindo a ser preparada ainda no âmbito dos recentemente celebrados 30 anos de "Manhã Submersa" - o filme, segundo obra homónima de Vergílio Ferreira - marco incontornável na história do cinema português e, simultaneamente, dos 50 anos de carreira do realizador, crítico de cinema, ensaísta, dinamizador cultural, professor, director de festivais de cinema.
Um espectáculo sobre a vida e obra do crítico de cinema Lauro António realiza-se na segunda-feira à noite, no Fórum Municipal Luísa Todi, em Setúbal, com a presença do homenageado, no qual participam personalidades do mundo das artes. O espectáculo, com início às 21h00, o primeiro do ciclo “Luísa Todi homenageia…”, é coordenado por Frederico Corado.
Ao longo da noite são recordados momentos desde a infância à actualidade da vida de Lauro António, sem esquecer muitos pormenores que enriqueceram a vivência do homenageado, inclusivamente projectos que chegou a idealizar mas que nunca foram concretizados.
Amigos e colegas de profissão de Lauro António sobem ao palco do Fórum Luísa Todi para recordar momentos que passaram juntos. Maria do Céu Guerra, Lia Gama, João Perry, Vicente Alves do Ó, Manuel Neves, Jorge Silva Melo, Fernando Dacosta, Jorge Paixão da Costa, António Victorino d’Almeida e Duarte Victor são personalidades que vão recordar e partilhar memórias com Lauro António e o público.
O espectáculo inclui momentos musicais com Cátia Garcia, Pedro Galveias e Hugo Rendas, a colaboração de Alexandre Amendoeira e ainda a estreia da representação de “Um Monólogo do Rei Vitorioso”, escrito por Lauro António aos 19 anos e publicado na época em livro.
A noite termina com a exibição de “Manhã Submersa”, longa-metragem de 1980 realizada por Lauro António, que, além de crítico de cinema, foi igualmente realizador, encenador, ensaísta, professor e autor de programas de rádio e televisão.
Lauro António é o exemplo de uma vida de paixão pela 7ª arte. Como realizador, assinou, para além de “Manhã Submersa”, “O Vestido Cor de Fogo”, “Mãe Genoveva”, Paisagem Sem Barcos”, “A Bela e a Rosa”, “Casino Oceano”, “Vamos ao Nimas”, “Bonecos de Estremoz”, a série “A Paródia”, “Vergílio Ferreira numa Manhã Submersa”, “Prefácio a Vergílio Ferreira”, “Humberto Delgado: Obviamente, demito-o!”, entre outros.
Mas não só na realização a paixão pelo cinema tem dominado os 50 anos de actividade profissional de Lauro António. Sempre ao serviço da divulgação e amor pelo cinema de qualidade, o cineasta tem-se dedicado ao ensino universitário, foi programador de salas de cinema, director de festivais de cinema em Portugal e membro de inúmeros júris, internacionalmente. Teve o seu próprio programa na TVI, “Lauro António Apresenta…”, que continua a ser uma referência na programação televisiva em Portugal, para além de ser responsável por variadíssimas masterclasses sobre cinema.
Esta homenagem tem ainda o objectivo de lançar precisamente mais uma dessas actividades em prol da divulgação do cinema, que irá ter lugar, já no próximo mês de Outubro, nesta mesma sala que acolhe a homenagem, o Fórum Luisa Todi, em Setúbal, e cujo programa se encontra já disponível para divulgação.
Os bilhetes para o espectáculo custam três euros e podem ser adquiridos na bilheteira do Fórum Luísa Todi ou no site.
informação de imprensa, divulgada pelo Forum Luísa Todi.

quarta-feira, setembro 04, 2013

Valter Hugo Mãe fala de "Manhã Submersa"


Autobiografia imaginária / Valter Hugo Mãe
Manhã Submersa


Vergílio Ferreira precisava de ser ressuscitado. Mesmo que muitos me digam que ele nem era simpático, andava de cara fechada, reagia pouco bem aos leitores, era severo, um daqueles cidadãos de antigamente cheios de infernos para se culpar e culpar os outros. O Vergílio Ferreira, ainda que difícil de aturar, precisava de ficar vivo e escrever sempre mais para traduzir o intraduzível de que tantas vezes dependemos. Essas máquinas todas sofisticadas que o mundo já tem são muito tolas se não servem para eternizar a vida de alguém. E não me venham dizer que os escritores são eternos, porque os livros do Vergílio Ferreira nunca estiveram tão bonitos [Quetzal] e não me parece que muita gente lhes esteja a pegar. Deve andar tudo maluco. Também urge ir pelas ruas mandar para a cadeia todos quantos não leem Vergílio Ferreira.
Sou a favor de cadeias para crimes de desperdício de maravilha. Quem tem acesso à maravilha e a despreza não pode reclamar da falta de amores, da falta de felicidade.
Volto sempre ao Manhã Submersa. Passei um tempo em estadias breves num seminário de Famalicão, nunca fui forçado a nada, mas tive muito da tentação inexplicável de me sacrificar, abdicar de mim para cumprir uma função exclusivamente dedicada aos outros. Não era uma ideia burra, era apenas uma ideia exagerada. Achava que estar vivo efetivamente me obrigava, e achava que podei pensar e sentir acerca da miséria alheia me condenava à necessidade de intervir. Não poderia ser outra coisa senão um missionário.
Ainda vivi naquele Portugal de casas frias, as poucas cores, os adultos tristes, cansados, pobres, a esperança inteira e tão mal fundada na graça divina. Lembro-me bem da beatitude em meu redor, a senhoria tão religiosa, as tias, a família muito grande, a minha ingenuidade. Eu era um rapaz perfeito para a virtude. Tantas vezes me disseram que haveria de crescer para padre, com a fé toda e a vida resolvida de trabalho, teto e comida. Tinha um medo profundo do que pudesse ser o futuro. Sentia que crescer era ir ao contrário da vontade ou das coisas
naturais.
Hoje estive a rever o filme do Lauro António e poucos filmes me fascinam e magoam tanto quanto este. A sua plasticidade austera, o severo das personagens, a música desoladora e bela,
tudo me impressiona. Compadeço-me com ver o rapaz, sempre a honra da família nas mãos, completamente encurralado pela candura, esforçando-se para aceitar um destino avesso.
Lembro- me de ler pela primeira vez o livro do Vergílio Ferreira e de tentar não dar um rosto ao miúdo, nem que fosse o meu. Tinha-Ihe muita compaixão e sentia-me intimidado. De algum modo, não arranjava coragem para o conhecer ou nunca teria coragem para pensar que poderia ser eu. Compreendia tão bem porque cada coisa lhe acontecia, eram-me tão inteligíveis as suas razões e a sua tristeza que não podia chegar demasiado perto, para não tomar a ficção por realidade.
O Lauro António deu um rosto ao miúdo e podia ser que me salvasse definitivamente de me confundir com ele. Mas há qualquer coisa na maneira como a memória fica que se vai apoderando das diferenças e dizendo que elas são apenas aparentes. Com a idade, sobretudo no que diz respeito à infância, as coisas revelam -se- nos e quase. sempre correspondem às nossas mais estranhas e inconfessáveis ideias. Eu sei que parte de mim deveria andar missionária em África. Isso nunca ninguém me apagará da consciência. Por outro lado, o ser um bocado lingrinhas e dado a dores de cabeça e todo ocupado com livros e histórias não promete muito um missionário. Provavelmente, ao fim de um mês, estaria com os paludismos todos e o calor demasiado esmaga-me o cérebro, e ia faltar-me a mordomia das casas que temos, o café, a roupa da Zara, a estreia de outro filme, os livros.
O que queria dizer era que o Lauro António também devia ser acusado de crime contra o desperdício da maravilha. Isto porque ficou grandemente pelo Manhã Submersa e O Vestido
Cor de Fogo. Um homem que faz destes filmes não pode esquecer-se. Havia de haver escolas verdadeiras. Daquelas públicas que pudessem continuar a ser públicas, para toda a gente, integradoras, generosas, onde se ensinassem as pessoas exatamente para a maravilha. E, depois, havia toda a gente se pôr a ler o livro e a ver o filme. A tirar notas, fazer testes sobre
isso como quem gosta de fazer testes, porque estudar ia ser perfeito. Era fundamental que pensássemos acerca daquela realidade e que pensássemos acerca de como um livro e um filme podem ser tão intensos e guardar dentro partes de gente como para sempre vivas, vigentes, com sentido.
O Vergílio Ferreira não estou a ver quem ressuscite. Resta ler. O Lauro António, desnecessitado de ressurreições, há que consciencializar-se das suas obrigações. Que isto de filmar como filma não lhe dá o direito de recusar-se a voltar ao grande cinema. Depois de Ferreira e Sena, José Cardoso Pires ou Urbano Tavares Rodrigues ficariam muito lindos.


In “Jornal de Letras”, 4 de Setembro de 2013

terça-feira, novembro 20, 2012

BERNARDO SANTARENO NO CARTAXO


Última exibição de “O Crime da Aldeia Velha”, no Centro Cultural do Cartaxo. Última exibição que teve o propósito de homenagear o escritor no dia do seu aniversário. Para o efeito escrevi algumas palavras, relembrando o dramaturgo, que li no final do espectáculo, no palco perante todo o elenco:
 

SOBRE BERNARDO SANTARENO

 

Se fosse vivo, Bernardo Santareno, o autor desta peça que acabaram de ver, completaria hoje 92 anos. Ribatejano por nascimento (foi em Santarém que nasceu no dia 19 de Novembro de 1920), Bernardo Santareno era o pseudónimo literário do cidadão António Martinho do Rosário, que fez estudos no Liceu Nacional de Sá da Bandeira, na sua terra natal, onde permaneceu até 1939, após o que viajou até à capital do reino para frequentar os cursos preparatórios para a Faculdade de Medicina, na Universidade de Lisboa. Em 1945, transferiu-se para a Universidade de Coimbra, e aí se licenciou em medicina psiquiátrica, em 1950.

Iniciou a sua carreira profissional como médico, entre 1957 e 1958, a bordo dos navios “David Melgueiro”, “Senhora do Mar” e também do navio-hospital “Gil Eanes”, acompanhando as campanhas de pesca do bacalhau. Ao mesmo tempo, foi desenvolvendo a sua capacidade literária, inicialmente na poesia, publicando em edições de autor três volumes (1954, “Morte na Raiz”, 1955, “Romances do Mar”, e 1957, “Os Olhos da Víbora”), onde se esboçam já alguns dos seus temas e obsessões, nomeadamente a presença do mar como elemento dramático e a opressão do homem, vítima dos mais diversos condicionalismos sociais, morais ou políticos. O mar estaria igualmente presente no seu volume de narrativas “Nos Mares do Fim do Mundo”.

Num país onde a dramaturgia é rara e medíocre, salvo raras excepções, poucas mais para além de Gil Vicente, de António José da Silva, dito “o Judeu”, de António Ferreira, António Patrício ou de Almeida Garrett, Bernardo Santareno ocupou rapidamente o lugar de dramaturgo por excelência do século XX português. As suas primeiras obras teatrais surgiram em 1957, num volume editado pelo autor e que agrupava “A Promessa”, “O Bailarino” e “A Excomungada”. Depois surgem “O Lugre” e “O Crime de Aldeia Velha”, ambas de 1959; “António Marinheiro ou o Édipo de Alfama”, de 1960; “Os Anjos e o Sangue”, “O Duelo” e “O Pecado de João Agonia”, de 1961; e “Anunciação”, de 1962, todas elas integrando uma estética muito pessoal, que aliava um realismo de características sociais a uma imagética poética, escolhendo temas onde a natureza humana era escalpelizada nos seus contrastes mais gritantes, com a paisagem natural por cenário privilegiado, condicionando o drama e mesmo a tragédia a que a acção quase sempre conduz. 

Foi em meados dos anos 60, tinha eu pouco mais de vinte anos, quando conheci pessoalmente Bernardo Santareno. Em 1964, acompanhara a estreia de “O Crime de Aldeia Velha” no cinema, numa adaptação de Manuel Guimarães, meu amigo e vizinho da Avenida de Roma, e companheiro de boas conversas no Café Vavá. Cheguei mesmo a escrever uma crítica para a revista “O Tempo e o Modo”, onde sublinhava algumas das virtudes e certas limitações do filme que, globalmente, representava uma boa aposta do cinema nacional, numa altura em que o Novo Cinema Português começa a movimentar-se, permitindo que Manuel Guimarães deixasse de ser o quase solitário e quixotesco cineasta da oposição ao regime.

Por essa altura, Santareno era já um autor consagrado e eu um jovem universitário que escrevia sobre cinema e teatro, paixões de sempre, com pretensões a dramaturgo e cineasta. Eu escrevera três peças em um acto, que um editor da altura achou por bem publicar, graça que para sempre fiquei a dever a Fernando Luso Soares. No meu arrojo juvenil, decidi entregar o original a Bernardo Santareno para lhe pedir umas palavras de apresentação do livro, se ele achasse que as pecinhas as mereciam. Por esses tempos, os cafés eram pontos, certos e seguros, de encontro e de tertúlia. Bernardo Santareno era acessível de encontrar em Lisboa, numa pastelaria, confeitaria ou café da Rua Alexandre Herculano, mesmo ao lado de uma editora prestigiada da época, a Ática, que tinha no seu catálogo nada mais do que Fernando Pessoa, Sebastião da Gama, Mário Sá Carneiro e outros tais. Era igualmente a editora de Santareno, e talvez para estar próximo dela, ele frequentava a confeitaria “Paraíso”. Era fácil vê-lo sentado, quase sempre à entrada, numa mesa do lado direito, jornal ou livro na mão, sozinho ou acompanhado por amigos, a bica à frente, sobre o mármore do tampo da mesa. Foi aí que o fui encontrar, foi aí que me apresentei e lhe passei para as mãos o original que ele teve a gentileza de ler e de prefaciar com palavras estimulantes para o que ele considerava ser “um homem de teatro”.

Depois dessa atrevida e insólita apresentação, Santareno revelou-se sempre um homem afável e atento, disponível e encorajador para com os jovens que procurava estimular e alentar. Foram para mim preciosas as suas palavras que me ajudaram a persistir num caminho, apesar dele não ter sido maioritariamente teatral, mas mais ligado ao cinema. Mas nunca abandonei o teatro, quanto mais não seja como espectador apaixonado, e não me espantaria muito que parte desta paixão a tenha passado a outros, como se pode ver pela presença aqui ao lado do meu filho Frederico Corado.

Voltando a Bernardo Santareno e a meados dos anos 60, devo dizer que o meu contacto com o dramaturgo se foi mantendo, em várias ocasiões, por diversas razões. Tenho comigo uma entrevista que lhe fiz para uma revista de espectáculos que então existia, e onde eu colaborava regularmente, a “Plateia”, e onde o autor falava da feliz experiência de ter tido nesse ano de 1967 dois textos seus em cena, “A Promessa” e “António, Marinheiro”, e de ansiar pela estreia em palcos dos seus novos trabalhos que iniciavam, segundo o próprio reconhecia, um novo ciclo no interior da sua obra. “O Judeu” e “O Inferno”, as peças referidas, davam mostras de uma maior intervenção política e social, muito próximas de uma estética brechetiana, o que seria continuado com “A Traição do Padre Martinho” (1969), “Português, Escritor, 45 Anos de Idade” (1974), “Os Marginais e a Revolução” (um volume agrupando quatro originais, “Restos”, “A Confissão”, “Monsanto”, “Vida Breve em Três Fotografias”, 1979) e “O Punho” (que só viria a ser publicado postumamente, em 1987).

Bernardo Santareno pode dizer-se que foi um dos raros portugueses que escreveu tendo em vista o palco, o espectáculo, o contacto com o público, tendo em conta duas vertentes essenciais: por um lado, criar textos de qualidade literária invulgar, que não se satisfazem apenas com a sua existência em livro, mas que aspiram a uma natural respiração no palco. Só aí se completam e se dão por concluídos. Por outro lado, todas as suas obras permitem uma leitura pessoal, de autor, definida por um conjunto de temas constantes e quase direi obsessivos: a luta pela dignificação do ser humano, pelos seus direitos essenciais, em confronto com preconceitos de todo o tipo, quer sejam sexuais, religiosos, económicos, raciais, políticos, sociais.

O que se compreende inclusive pela sua própria postura perante a vida, como declarado defensor da liberdade perante a opressão e, mais ainda, como assumido "homossexual discreto", que via na diferença uma discriminação de que ele mesmo se sentia vítima. Quase toda a sua obra se sente possuída por essa mácula de um “pecado” pessoal que se assume perante o ostracismo geral, tema aliás dominante em “O Crime de Aldeia Velha”, onde uma mulher, só porque é “diferente”, é queimada viva, mercê da intolerância e do fanatismo obscurantista de uma populaça em histeria. Curioso é verificar o papel dos dois elementos da Igreja que surgem nesta obra, desempenhando papéis racionais e contemporizadores, o que demonstra igualmente a abertura do dramaturgo para leituras não demagógicas, ele que noutras obras também criticou a atitude da Igreja em contextos diversos. 

Voltei a cruzar-me com Santareno, por altura da estreia de “A Promessa”, versão cinematográfica de António Macedo da sua peça homónima. Estávamos em 1973, o filme foi um quase escândalo, mas anunciavam-se já tempos novos, que pouco depois iriam desembocar num Abril de cravos. O convívio da obra de Santareno com o cinema ficou por essas duas adaptações, mas, na televisão, iria continuar, com a adaptação de “Português, Escritor, 45 Anos de Idade”, numa realização de Artur Ramos, em 1975, numa recriação de “O Crime de Aldeia Velha”, partindo de uma encenação de Carlos Avilez, em 1997, e, finalmente, em 1999, com a versão televisiva de “Vida Breve em Três Fotografias”, dirigida por Fátima Ribeiro.

Bernardo Santareno morreu cedo, aos 59 anos, em Carnaxide, Oeiras, no dia 30 de Agosto de 1980. Num dos livros que dele possuo, com estimada dedicatória, ele enviava “um grande abraço e a esperança artística no dramaturgo”. Lamento ter-lhe defraudado as esperanças no dramaturgo, mas o amor ao teatro, esse mantém-se. Aqui estou para responder presente às suas esperanças, acompanhado pelo meu filho que vai certamente cumprir novas e renovadas esperanças artísticas e teatrais.  

Lauro António
Cartaxo, 19 de Novembro de 2012

quarta-feira, junho 06, 2012

OS CINEMAS DA EUROPA - CONVITE


LANÇAMENTO DE UM NOVO LIVRO
Na próxima terça-feira, dia 12 de Junho, no Auditório Municipal Maestro César Batalha, em Oeiras (Galerias Alto da Barra), pelas 17 horas, será vista e comentada a obra-prima "O Mundo a Seus Pés", de Orson Welles, integrada na "masterclass" "Cinema Americano" (1930-1960). 
Logo a seguir, pelas 19 horas, ocorrerá o lançamento do livro "Os Cinemas da Europa", relativo ao ciclo do ano passado. 
OS CINEMAS DA EUROPA
de Lauro António
O actual mapa da Europa é constituído por 50 países, dos quais 27 pertencem à CE, 5 se candidatam a sê-lo, 17 não aderiram nem o pretendem fazer, e um que proclamou unilateralmente a sua independência. Da Islândia à Grécia, de França ao Azerbaijão, de Espanha à Suécia, de Renoir a Parajanov, de Dreyer a Eisenstein, de Fritz Lang a Aki Kaurismaki, de Buñuel a Oliveira, que identidade?
Em termos de cinema, que Europa é esta?
A resposta a esta pergunta foi o tema de sessões que ocuparam uma “masterclass”, durante o ano de 2011, no Auditório Municipal César Batalha, nas Galerias do Alto da Barra, em Oeiras, através da qual Lauro António, realizador, crítico e professor de cinema, tentou aproximar-se de alguns dos aspectos que podem ou não definir, cinematograficamente, a identidade nacional e continental e descortinar como o cinema interage com a originalidade de cada país, a sua história, a sua cultura, os seus valores mais intrínsecos.
Em cada sessão foi abordado um país, uma cinematografia, e um filme específico de um cineasta particularmente significativo. Do resultado desse trabalho, e das folhas de sessão semanalmente distribuídas pelos espectadores, surgiu a presente obra que agora se apresenta ao público, numa edição da Câmara Municipal de Oeiras.

segunda-feira, março 12, 2012

FLORBELA



NOTAS PESSOAIS SOBRE DUAS "FLORBELAS"

Em 1979, quando andava ainda à procura de locais para filmagem de sequências para o meu filme “Manhã Submersa”, encontrei num alfarrabista um pequeno opúsculo com a vida de Florbela Espanca, escritora de uma obra que já tinha lido parcialmente, mas cuja vida, carregada de peripécias e de um significado muito especial, me fascinou sobremaneira. Nessa altura julgava que fazer cinema em Portugal poderia ser difícil, mas ainda assim possível. Enquanto organizava a pré-produção da “Manhã Submersa” resolvi ler tudo quanto havia sobre Florbela, e visitar, com o meu então assistente de realização, Mário Damas Nunes, os locais por onde passou Florbela Espanca. Passamos por Vila Viçosa, Évora e Matosinhos, para lá de vários locais de Lisboa e, inclusivé, uma localidade no Algarve. Compilei elementos, falei com familiares e amigos, descobri histórias que nunca tinham sido contadas. Um velho barbeiro de Vila Viçosa contou-me que, ainda miúdo, ele e Florbela, juntos com outros jovens, costumavam brincar perto do cemitério local e que, já sedutora e apreciadora de flores, Florbela o levava a saltar o muro do cemitério, e ir buscar flores que depois ofertava à bela futura poetisa.
Depois foram os tempos de rodagem de “Manhã Submersa” e tempos depois comecei a escrever um guião para um filme intitulado “Florbela”. Enviado o mesmo a um concurso do IPC, tive um pequeno subsídio para a sua rodagem que, no entanto, não permitiria nunca terminar a obra (o subsídio era de 12.000 contos!). Nunca toquei no subsídio e tentei, por várias formas, arranjar uma co-produção. Nessa altura um produtor e distribuidor, Fernando Fernandes, da Imperial Filmes, procurou, na medida das suas possibilidades, encontrar parceiros estrangeiros para o projecto. Um dia, apareceu-me com uma proposta de um produtor espanhol a quem dera a ler o guião, e que estaria disposto a comparticipar desde que se “fizessem alguns acertos” e o filme fosse sobre uma poetisa ninfomaníaca, e que se introduzissem algumas cenas para condimentar o projecto à sua maneira. Expliquei, delicadamente, que esse não era o propósito do meu projecto e que agradecia muito, mas muito obrigado e até à próxima. Depois apareceu um brasileiro, igualmente interessado, desde que a protagonista fosse uma actriz brasileira. Ainda hoje estou em duvida se fiz bem, mas recusei. Florbela era uma poetisa portuguesa e eu queria uma actriz portuguesa para o papel (na altura tinha pensado em Lia Gama ou Teresa Madruga, e se há coisa que sou é teimoso nas minhas ideias). Mais uma recusa e assim se foi passando o tempo e o subsídio prescreveu. 
Nunca fiz o filme, que pretendia ser um vasto painel sobre a vida de Florbela desde o seu nascimento em Vila Viçosa até à sua morte em Matosinhos. A minha ideia era uma viagem entre o sol alentejano e a sua luz forte de planície em flor, até ao soturno e lúgubre quarto nortenho onde se terá ou não suicidado. No filme ficaria a dúvida que eu próprio tenho (e mantenho). Apeles seria então João Perry, e relembro ainda outros actores com quem gostaria de ter contado nesta aventura, como Rui Mendes, um dos maridos, José Severino, Sinde Filipe, José Nuno Martins, João Maria Tudela, José Wallenstein, Jorge Vale, Ana Zanati, entre outros. Haveria uma curta aparição da Rainha D. Amélia (destinado a Milú ou a Maria Dulce) e D. Carlos (David Silva). E uma das cenas que me tinha apaixonado na altura seria Florbela a passear pela planície alentejana e ouvir um poema seu cantado num acampamento de ciganos (Cidália Moreia a cantar “Amar, Amar, Perdidamente”). Apareceria, igualmente, o encenador Jorge Listopad, que iria interpretar o papel do italiano Guido Batteli. A música seria de Carlos Paredes, com um ou outro excerto da ópera “Traviata”. De resto, o filme estava todo na minha cabeça, local onde se escrevem, filmam e montam os filmes antes de se dar início à primeira take. Depois, é fazer coincidir, o mais aproximadamente que se possa, o que se tem em mente com as possibilidades da realidade, tendo em conta sempre que por vezes a improvisação pode ser boa conselheira, tirando partido de um ou outro ajustamento de última hora.
O filme não se fez. Não houve ajustamento possível à realidade.
Uma das poucas coisas boas que o projecto me trouxe foram algumas conversa com Agustina Bessa Luís, que tinha escrito uma biografia sobre Florbela, e que leu o meu argumento e sobre ele manifestou a sua opinião. Foram conversas muito curiosas, algo divergentes na interpretação, que todavia me aproximaram da escritora, de que sou profundo admirador e amigo incondicional.
Anos depois, retirei do argumento uma peça de teatro que mantenho inédita. Assim creio que se manterá, pois mobilizava um vasto elenco e uma multiplicidade de cenas. 

Correram os anos, e em meados de 2011, recebi um telefonema do Vicente Alves do Ó para interpretar um pequenino papel no seu projecto, já em final de rodagem, “Florbela”. Explicou-me que era uma forma de não esquecer o meu projecto. Achei muito simpático e generoso da sua parte e assim apareci, nas vestes de “visconde”, a fazer um perninha no filme agora em exibição. A simpatia de Vicente Alves do Ó levou-o a convidar-me a subir ao palco do S. Jorge na noite da antestreia, ao lado do elenco e da equipa técnica. Não esqueço a amizade demonstrada e não muito vulgar entre oficiais do mesmo ofício. Acho que os meus camaradas de geração a única coisa que fizeram (alguns deles, os mais influentes) foi dizer entre eles que “esse gajo (eu) nunca mais volta a filmar” e até agora cumpriram a praga. Por isso, soube-me bem este aceno vindo de um jovem que nem sequer me conhecia pessoalmente.
Creio que, apesar disso, posso ter uma opinião serena sobre o filme. Um projecto completamente diferente do meu, mas que julgo muito interessante, filmado com sensibilidade, um certo pendor classicista, romântico e efusivo como se impunha, sensual e misterioso, como deveria ser, confinando-se a um curto período da vida da poetisa, uma época marcada pelo seu casamento com Carlos Lage e a morte do irmão Apeles. Não pretende, pois, ser uma visão da vida e obra de Florbela Espanca, mas apenas um assomo, um sobrevoar sobre momentos furtivos, mas intensos de uma atribulada existência que marcaria gerações de portugueses.
A cuidada reconstituição dos ambientes, a qualidade da fotografia, o colorido, o sentido plástico de (quase) toda a obra fazem deste filme uma aposta ganha e do seu realizador um nome a seguir com todo o interesse. É um cinema de autor que procura público e o merece. Sobretudo ainda porque conta com um elenco magnífico. Dalila Carmo é esplêndida em Florbela Espanca, e a sua interpretação ficará para sempre como referência. Nunca tive dúvidas do seu talento, desde os seus tempos de menina e moça, quando a convidei para membro do júri do Cine Eco. Apenas cumpriu as promessas. Mas Ivo Canelas, em Apeles, Albano Jerónimo, em Mário Lage, António Fonseca, em João Espanca, Rita Loureiro, em Sophia D'Arriaga, Anabela Teixeira, em Júlia Alves, e restantes actores, mostram como estamos bem representados nesta área. O seu trabalho por vezes é brilhante, de eficiência e sobriedade, de segurança e entrega. Sem excessos, sem vedetismos fáceis. Sabe bem ver representar assim. Em português. 
Para o meu gosto, mas como digo, é apenas para o meu gosto, existem apenas duas ou três cenas que acho que descolam um pouco de todo o restante estilo e que maculam um pouco o resultado final. Refiro-me a certas sequências “oníricas”, com folhas de papel a voar ou focos de neve e mãos pelo ar, que julgo tentarem recriar uma “poética” florbeleana e que é o que de mais discutível tem alguma Florbela e este “Florbela”. Mas, mesmo assim, “Florbela” de Vicente Alves do Ó é um belo filme que julgo merecer ser visto por todos. Já é altura do cinema português ter um sucesso comercial que nos prestigie e não nos envergonhe.
Um abraço amigo para o Vicente, do seu (improvisado) “visconde”.

sábado, novembro 05, 2011

JÚRI NO FEST'A FILM, Montpellier, França


Altura ainda para apresentar algumas obras minhas, entre as quais "Manhã Submersa". 
Depois conto como foi.

quarta-feira, março 30, 2011

"MANHÃ SUBMERSA", HOJE NO LICEU CAMÕES

 : 

"MANHÃ SUBMERSA"
hoje, a partir das 15 h, no liceu Camões

Numa iniciativa do ABC Cine Clube de Lisboa, será apresentado hoje, dia 31 de Março, a partir das 15 horas, no antigo liceu Camões, o filme "Manhã Submersa". A exibição integra-se num ciclo dedicado a filmes adaptados de obras literárias de antigos professores deste liceu, onde, no caso vertente, Vergílio Ferreira leccionou. A projecção será seguida de debate com o realizador.

 

sábado, dezembro 04, 2010

ENTREVISTA NO JORNAL "I"

:
LAURO ANTÓNIO:
"O cinema é como a maionese.
Umas vezes sai bem,
outras vezes não"
    

Foto de Nelson D'Aires
Sábado, 4 de Dezembro de 2010
Entrevista com Lauro António
para ler tudo clicar aqui

 

por Luís Leal Miranda

Com 50 anos de carreira, Lauro António é um dos maiores provadores de maionese. Assinala-se também os 30 anos de "Manhã Submersa" a sua maior investida no mundo dos molhos

Afastado da imprensa por vontade própria, o homem que Herman José deixou para a posteridade como Lauro Dérmio está reformado do ensino mas não deixou de ensinar cinema - através de workshops ou pequenos cursos. Quem quiser ler um dos mais antigos críticos portugueses pode fazê-lo no blogue "Lauro António Apresenta". Ali, continua a defesa do bom cinema mantendo o conselho do velho amigo Lauro Dérmio, "always watch good movies".

Os críticos de cinema são todos realizadores frustrados?

Nunca senti essa frustração. Escrever sobre cinema ajuda-me a compreender os filmes, a perceber o que gosto ou não de cinema - de certa maneira, foi a minha escola. Para além disso, sou do tempo de uma legião de cineastas que começaram por ser críticos como o Godard ou o Truffaut. Era um percurso normal daquela época: o João César Monteiro, o Fernando Lopes ou o António Pedro Vasconcelos começaram como críticos.

Quando estreou "Manhã Submersa", como foi mudar para o outro lado da trincheira?

O "Manhã Submersa" não foi muito criticado porque estreou primeiro em Cannes, onde foi muito bem recebido - e cá em Portugal gosta-se muito do que é bom lá fora. No filme seguinte já levei pancada de meia noite.

E como lidava com isso?

Às vezes é doloroso, quando se sente que é injusto. Mas é uma sensação engraçada. Fiz um filme chamado "Vestido de Cor de Fogo" que não foi tão bem recebido assim. Na altura fiquei magoado mas agora vejo que nem tudo correu bem ali. O cinema é um pouco como uma maionese: nós metemos para lá todos os ingredientes, juntamos aquilo tudo da mesma maneira e às vezes sai bem outras vezes não. Nunca sai da mesma maneira. Hoje ao ver "Manhã Submersa" reconheço que é melhor que o "Vestido Cor de Fogo", mas fi-lo com o mesmo entusiasmo.

Nunca teve problemas por dizer mal de realizadores portugueses?

Uma vez, ainda durante o Estado Novo, disse mal de um realizador - não vou dizer o nome - que me meteu em sarilhos. Era um tipo de quem até gostava mas um dia fez um filme com uma lente caríssima, daquelas polifacetadas, e filmou uma história que era só aviões a passar. Acusei-o de novo riquismo num texto e ele pôs-me em tribunal por difamação. Para além disso disse que era um perigoso comunista e tinha propaganda em casa. Estava na tropa quando apareceu a PIDE em casa e me revirou aquilo tudo à procura de panfletos. Estiveram lá um dia todo a vasculhar, a ver com muita atenção livros de autores que parecessem russos.

E como terminou esse caso?

Fui a tribunal com uma série de testemunhas, outros críticos, realizadores, para me defenderem. Nesse dia ele não apareceu - pôs um atestado de doença ou qualquer coisa do género. A data do julgamento seguinte era 25 de Abril de 1974. Não houve julgamento, como é óbvio. No dia seguinte vou ao tribunal e descubro que ele me tinha perdoado.

Mesmo depois desse caso, nunca teve um cuidado especial em criticar filmes portugueses?

Não, nada disso. Sempre tive cuidado em relação a todos os filmes porque também os faço. Às vezes até posso ser mais acintoso, mas tenho o cuidado de pensar "se eu lesse isto, o que sentiria?". Mas ainda assim desanco de alto a baixo em coisas horríveis que têm aparecido por aí: o "Second Life", o "Crime do Padre Amaro", o "Amália" que são abaixo de cão. Mas não é por serem portugueses, é pelo desprezo tão grande que têm pelo espectador.

Lembra-se de quando começou a interessar-se por cinema?

Praticamente desde que me conheço. Lembro-me de ser muito miúdo, com dois, três anos, ir ao cinema com os meus pais e ficar ao colo deles tardes inteiras. Nasci em Lisboa mas fui para Portalegre novo porque o meu pai era professor e foi colocado. Tinha uns 12 anos quando comecei a escrever pequenos textos sobre cinema.

Eram sobre o quê?

A maior parte das vezes eram declarações de amor a actrizes como Audrey Hepburn; também gostava muito da Sarita Montiel, uma actriz espanhola de musicais. Quando voltei a Lisboa comecei a escrever mais a sério nos jornais, mas nada disso era pago. Só comecei a receber quando fui para uma revista chamada "TV Guia".

Foi aí que começaram os problemas com a censura.

Fui corrido por causa de uma crítica que escrevi sobre um filme do [actor italiano] Totó, veja lá, "Polícias e Ladrões". O filme tinha umas referências sociais grandes que eu descrevi; e nisto um leitor escreveu para a revista a dizer que eu era um perigoso comunista. Lá fui chamado pelo chefe de redacção - isto era o início dos anos 60 - que me mandou embora.

Mas voltou à carga.

Em 1968 comecei a escrever no "Diário de Lisboa", isto numa altura em que os jornais não tinham crítica de cinema diária. Havia só uns senhores, uns jornalistas velhotes da casa, que andavam de cinema em cinema a sacar os programas. Os papéis tinham uns resumos do guião e eles retiravam isso para pôr no jornal. Entretanto o Eduardo Prado Coelho e eu fizemos uma proposta ao "Diário de Lisboa" para começar a escrever crítica diária.

Escreviam todos os dias?

Todos os dias, de uma maneira um bocado eufórica. Via o filme, ia para casa a correr, deixava a namorada pendurada enquanto fazia a crítica e depois deixava o texto pregado na porta com um pionés. De madrugada lá ia alguém do jornal buscar o texto.

Era fácil dizer mal?

Sim, até ao dia em que a associação que agrupava os cinemas escreveu uma carta a dizer: "Se esses senhores continuam a escrever aí nós retiramos a publicidade." Mas os tipos do "Diário de Lisboa" não se ficaram e em vez de aceitar a ameaça publicaram a carta na capa, acusando a associação dos cinema de tentativa de censura.

Consequência?

A imprensa transformou-nos em heróis nacionais. Depois de uma semana com este assunto na berlinda a ameaça foi retirada. Mais tarde outros jornais viriam a ter críticos de cinema todos os dias. Mas fomos os pioneiros a fazer crítica diária.

Tinham um poder enorme nessa altura. Não é verdade?

Sim, e vou dar-lhe um exemplo. Certa semana o Berna estreia um filme chamado "Soldado Azul" , uma história de um massacre de índios na América. Ora isto aconteceu durante a guerra do Vietname e o filme era uma alegoria a isso mesmo, um facto que veladamente eu descrevi na minha crítica. O filme não estava a ter muito sucesso mas de repente disparou. Nisto eu passo um dia pelo cinema e o porteiro vem falar comigo. Diz "oiça lá o senhor fez cá uma revolução, isto está cheio de gente com o ''Diário de Lisboa'' debaixo do braço para ver o seu filme sobre o Vietname". Lembro-me que passado uns tempos chega um filme do Arthur Penn chamado o "Pequeno Grande Homem" que era para ser estreado no Monumental e não aparece em sala. Nisto o distribuidor foi informado que o filme foi à censura e foi cortado - um filme de cowboys de aventuras, sem nada de político. O homem vai tentar saber o que se passou e descobre que lhe proibiram o filme porque, sim senhor, era um filme de cowboys, mas depois vinha o Lauro António dizer que era do Vietname e estava tudo lixado.

sábado, novembro 27, 2010

JOSÉ RAPOSO CONVIDA


O cineasta é o convidado de mais uma tertúlia do Centro Cultural do Cartaxo, dinamizada por José Raposo

Lauro António é o convidado de José Raposo para vir ao bar do Centro Cultural do Cartaxo (CCC) no dia 28 de Novembro, a partir das 21h30, para mais uma tertúlia da autoria que promete ser bem recheada de histórias e memórias.
O realizador de “Manhã Submersa” está neste momento a celebrar, simultaneamente com o 30º aniversário desta sua obra, os 50 anos de carreira como crítico, cineasta, professor de cinema, director de festivais e autor de uma vasta obra escrita.
São 50 anos de uma vida dedicada à paixão pelo cinema que têm muito que contar. Neste último domingo do mês, será a vez de Lauro António passar para o outro lado da câmara e de ser José Raposo a anunciar "luzes, câmara, acção!".
Esta é a terceira edição da rubrica do CCC “José Raposo Convida”, que já trouxe ao Cartaxo António Montez e João Baião.
in Noticias do Ribatejo @ Seg, 22/11/10
Ver AQUI programação do Centro Cultural do Cartaxo

quarta-feira, novembro 24, 2010

LANÇAMENTO DE LIVRO NA BOOK HOUSE

TEMAS DE CINEMA:
GRIFFITH, WELLES E KUBRICK


Paula Amaro, da DinaLivros, José Duarte, da Faculdadde de Letras da Universidade Clássica, e Lauro António, durante a sessão de lançamnto do livro, na Book House, do Dolce Vita, no Saldanha. Agradável fim de tarde, a falar de livros e cinema, numa sala cheia de amigos (quem nós lê, por definição, é um amigo. Enfim, gostamos de pensar que assim seja). (fotos MEC)