terça-feira, abril 05, 2011

INÍCIO DE NOVA TEMPORADA "INVICTA FILMES"



O CINEMA AMERICANO NOS ANOS 30,
O CINEMA DA GRANDE DEPRESSÃO
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PORTO - BIBLIOTECA ALMEIDA GARRETT
Entrada gratuita

CICLO FRED ASTAIRE /GINGER ROGERS - O MUSICAL NOS ANOS 30

7 de Abril de 2011
CHAPEU ALTO (Top Hat), de Mark Sandrich 
(EUA, 1935);
com Fred Astaire e Ginger Rogers, 101 min; M/ 6 anos.
Apresentação do ciclo por Lauro António.

FRED ASTAIRE E GINGER ROGERS
A INICIAR O CICLO
“O CINEMA AMERICANO NOS ANOS 30,
DA GRANDE DEPRESSÃO”

A iniciar o ciclo “O Cinema Americano nos Anos 30, da Grande Depressão”, a “Invicta Filmes” apresenta uma selecção de obras da dupla Fred Astaire e Ginger Rogers, durante o qual serão exibidas oito películas interpretadas por esta famosa dupla (e uma outra, a final, com a reunião de Fred Astaire e Rita Hayworth). Dos filmes previstos poderá referir-se rapidamente um, “Voando para o Rio de Janeiro” (Flying Down to Rio), de Thornton Freeland (EUA, 1933), cujo interesse maior reside no facto de ser a primeira obra onde aparecem Fred Astaire e Ginger Rogers a trabalharem em conjunto. De resto, o filme é relativamente desinteressante, bastante previsível e ainda pouco representativo do trabalho posterior da dupla, que aqui não ultrapassa o “apontamento” de secundários.
Outra película relativamente “insignificante” (no contexto da filmografia da dupla) é “Bailado da Saudade” (The Story of Vernon and Irene Castle), de H. C. Potter (EUA, 1939), que se resume a uma biografia de um casal de bailarinos célebres, Vernon e Irene Castle, concebida de forma convencional, não muito brilhante em cinema. O empreendimento não beneficiou ninguém. Nem os biografados, que viram as suas existências algo distorcidas e romanceadas para se encaixarem nas personalidades de Fred Astaire e Ginger Rogers, nem estes últimos, que foram forçados a um tipo de trabalho que não era efectivamente aquele em que eles melhor se afirmavam. Dito isto, restam algumas belas películas musicais com uma estrutura narrativa muito semelhante, mas possuindo uma agilidade e uma frescura indesmentíveis. Referimo-nos, sobretudo, a “Chapéu Alto” (Top Hat, 1935), “A Alegre Divorciada” (The Gay Divorcee, 1934), “Siga a Marinha” (Follow the Fleet, 1936), “Vamos Dançar?” (Shall we Dance?, 1937), “Quero Sonhar Contigo” (Carefree, 1938), todos de Mark Sandrich, “Ritmo Louco” (Swing Time), de George Stevens (1936)e a tal excepção, “Nunca Serás Rico” (You'll Never Get Rich), de Sidney Lanfield (EUA, 1941), com Fred Astaire e Rita Hayworth.

1. Uma época - Os nove filmes apresentados neste ciclo (particularmente os de Sandrich e Stevens) reconstituem com certa justeza uma época da América. Indo de 1933 (Voando para o Rio de Janeiro) até 1939 (Bailado da Saudade), os filmes parecem reflectir uma década de alegria e inocência, de confiança no futuro e de descomplexada superficialidade que fica neles documentada. Não poderia ser mais enganosa esta imagem. Após o crash bolsista de 1929 a América entrara num período de completo desnorte económico e social, com falências e bancarrota, encerramento de fábricas e despedimentos, ruína rural, pobreza, miséria. O quase contemporâneo “As Vinhas da Ira”, de John Ford (1940), e o muito posterior “A Rosa Púrpura do Cairo”, de Woody Allen (1985), oferecem um bom retrato destes tempos. Este último explica mesmo o grande sucesso de obras como estas de Fred Astaire e Ginger Rogers: o cinema era (é) uma fábrica de sonhos que ajudava a suportar o cinzento da existência diária. A crítica marxista achou que esta “fábrica de sonhos” era a forma alienante da indústria “domesticar” as massas. O filme de Woody Allen, com uma visão mais moderna e compreensiva dos fenómenos sociais, não põe totalmente de lado esta hipótese, mas acredita que o cinema “fábrica de sonhos” é igualmente uma forma de ajudar a ultrapassar o negrume da crise.
Para além destes aspectos, destas histórias douradas de príncipes e princesas que encontram o seu par, e dançam de felicidade em ambientes de luxo e elegância, que referem o espírito de um tempo e de um espaço determinados, os filmes do presente ciclo testemunham ainda uma maneira idílica ou utópica de viver, com os seus hábitos e usos, e todos os elementos externos que a condicionam (e são por ela condicionados): arquitectura, moda, decoração, etc.
2. A decoração - Sob o ponto de vista de decoração é Wan Nest Polglasc quem domina nos dois filmes de Sandrích e ainda no de Stevens. Trata-se de um decorador pouco conhecido (hoje em dia), mas que possuía um estilo muito próprio, de inequívoco bom gosto, dentro da sumptuosidade de certos cenários (a “Veneza” de “Ritmo Louco”, o “cabaret” de “Chapéu Alto”, ou todo o bailado no interior do um navio, em “Vamos Dançar”), onde é visível uma grande ingenuidade de processos e uma estilização de formas quase sempre destinadas a se apagarem durante o “número” de dança. O cenário, tal como a realização, era ainda na década de 30 um elemento acessório que não procurava definir a personalidade do seu autor, mas sim “servir” o que era considerado essencial num “musical”, isto é, os “números” de dança.
3. A estrutura - Nesta época, num “musical”, todos os elementos se destinavam a “servir” o lado coreográfico do filme. A própria estrutura dramática se comportava da mesma forma. Quase todas as obras onde apareciam Fred Astaire e Ginger Rogers eram baseadas nos encontros e desencontros das duas personagens por eles interpretadas. A intriga era ligeira, em estilo de “vaudeville”, tendo como centro de interesse um equívoco que se prolongava ao longo de toda a obra e se esclarecia no final. O ritmo de comédia é lento, os “gags” espaçados e desenvolvidos pausadamente. Tudo concorre, portanto, para a criação de um clima que irá culminar num dos diversos “números” musicais que intercalam a acção. Por outro lado, é curioso referir a maneira como esses “números” surgem no interior da intriga de forma perfeitamente assimilada. O “número” não resulta isolado, mas é um elemento motor que faz progredir a acção.
4. O musical - O   filme   musical,   na   década   de 30, era ainda um espectáculo subsidiário de um outro — o “music-hall”. Desta forma, o elemento importante de uma película musical era efectivamente o “número” musical. A ele tudo o mais se deveria submeter. Argumento e realização serviam esses elementos, bem assim como a própria cenografia. Com Fred Astaire e Ginger Rogers o essencial eram os seus duetos dançados, diálogos de emoção que caminhavam, através da simetria, do entendimento perfeito, para a intimidade do casal. Com uma técnica de sapateado impecável, Fred Astaire ia por vezes mais longe e, em cada filme, ele próprio coreografava um “número” onde intervinha normalmente só. No máximo do seu talento, Astaire deslumbrava pela imaginação e elegância, em momentos de verdadeira antologia - em “Ritmo Louco”, Astaire dança com as suas próprias sombras, num bailado notável; em “Vamos Dançar”, Petrov ensaia com um disco riscado que não sai do mesmo sítio e o obriga a acompanhá-lo, etc. Mas é ainda nos momentos de grande entendimento da dupla que melhor se define a sensibilidade e invenção do Fred Astaire e Ginger Rogers. Em “Chapéu Alto”, um bailado a dois, com Ginger Rogers, saída de “Marienbad”, repleta de plumas que evoluem ao sabor da música; em “Ritmo Louco”, toda a sequência final, com Fred Astaire e Gínger Rogers descobrindo-se verdadeiramente num “cabaret” deserto; ou esse espantoso bailado final de “Vamos Dançar”, onde Fred Astaire descobre/destapa igualmente Ginger Rogers por detrás da sua própria máscara.
5. Os intérpretes: Astaire e Rogers não são só bailarinos impecáveis e insuperáveis. A dupla vai mais longe. Astaire, tal como Stan Laurel (o “Estica” de uma outra dupla famosa), é um cómico de uma delicadeza e de uma elegância impressionante. Os “gags” nascem com uma espontaneidade admirável, perante a estupefacta descontracção de Astaire e o ar sonhador de Ginger Rogers. Ambos irradiam um “charme” muito especial que os anos ajudam a cimentar, criando-lhe um certo ar de descoberta.
Nas suas melhores obras, Fred Astaire e Ginger Rogers aparecem enquadrados por um grupo de actores de belíssimos recursos que é justo destacar. Referimo-nos, sobretudo, ao “casal” Edward Everett Horton e Helen Broderick e também ao “mordomo” Eric Blode. 

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