segunda-feira, abril 18, 2011

POLÍTICA

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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 
POUCO POLÍTICAS 

Ler o caderno principal do “Expresso” ao fim-de-semana é motivo para criar uma angústia existencial para o resto da semana. Quase sempre já se conheciam as notícias, mas vê-las assim, todas ao lado umas das outras, não deixa de piorar consideravelmente a perspectiva. Esta semana não foi nem muito melhor nem muito pior, mas os factos são assustadores:

1) Pedro Passos Coelho, aquele rapaz bem apessoado e bem falante, que agora dirige o PSD (e, devo confessar, em quem cheguei a depositar esperanças, apesar do mesmo não ser representante do meu tradicional espectro político) andou durante muito tempo a dizer que Sócrates levara para a UE uma decisão de PEC IV que não dera a conhecer a ninguém, nem sequer ao “principal partido da oposição”. Por causa dessa falta de “solidariedade” institucional acabaria mesmo por provocar o derrube do governo de Sócrates. Afinal agora vem dizer que Sócrates reuniu com ele na véspera de partir para a conferência europeia. Afinal quem mentiu?

2) Fernando Nobre, que andou por aí a afirmar que tinha visto uma criancinha a roubar comida a uma galinha e que ganhou votos à custa de uma campanha pela cidadania para a Presidência da República, afinal já não se importa de ser cabeça de lista para deputados do PSD por Lisboa, desde que seja imediatamente eleito Presidente da Assembleia da República. Não chegou a nº 1 “independente”, mas passa rapidamente a ser candidato a nº 2 “dependente”.
Mas há mais: concorre a cabeça de lista para deputados do PSD por Lisboa, mas jura que nunca será deputado. Só Presidente da Assembleia da República. Portanto o eleitor vota num nome que afinal não o irá representar. Interessante concepção de cidadania. Venha-me cá dizer mais vezes que a vida política portuguesa está a precisar de um abanão e que o que é bom é a sua cidadania. Cidadania desta, não obrigado! Prefiro a vida política portuguesa, onde, se há alguns aldrabões, também há muita gente séria (pena é que a gente séria tenha tão pouco talento e este quase só apareça nos aldrabões).

3. O Caso Cavaco – BPN. Em julgamento, o director do BPN, é acusado de ter vendido a Cavaco Silva e a uma filha deste 250.000 acções do citado banco. Oliveira Costa comprara-as a 2,1 e vendeu-as a Cavaco Silva e filha por 1 euro cada. Perdeu, de um minuto para o outro, 275.000 euros. Mais tarde, algum tempo antes do BPN ser conhecido pelas trafulhices em que andava metido, Cavaco Silva e filha venderam as acções, creio que a 2,4. Ganharam umas coisinhas. Oliveira Costa perdeu umas coisinhas. Nada de grave, já que eram amigos. Cavaco Silva, agora Presidente da República de uma República falida, é o “garante” dessa República. Mas, quando o negócio ocorreu, já deixara de ser Primeiro-Ministro e ainda não era Presidente e “garante” desta República, era um simples professor universitário, afirmam, para explicar a legalidade do acto. Resta perguntar: qualquer professor universitário se pode candidatar à mesma transacção? Dava-me tanto jeito! Mas se calar é preciso ser PM antes, e futuro PR.

4. O FMI entrou em Portugal e anda a estudar as nossas contas. Vai ter um certo trabalho, é certo. Mas parece que acha que o país deve pagar juros de 3,5 ao longo de cinco ou mais anos de reestruturação da economia portuguesa, para atenuar os efeitos da recessão. A UE, pelo contrário, acha que os juros devem ser de 5,5 e estenderem-se por apenas 3 anos. Quem não aguentar que desista. E os finlandeses (alguns, mas numerosos) acham que não têm nada de pagar a factura dos povos do sul. Abençoado espírito europeísta.  

5. Entretanto, o Senado norte-americano inquiriu e descobriu falcatruas a dar por um pau na actividade daquelas abençoadas agências de “rating” que andam por aí a pregar moral e desvalorizar economias de países “não cumpridores”. Parece que as agências e os bancos e as seguradoras andam todos de mãos dadas para aumentar determinados lucros, que por sinal lhe dizem respeito, directamente a eles, os interessados. Basta ler o artigo de Robert Fishman, no “New York Times”, para se perceber como funciona a marosca. Mas já se tinha percebido há muito. Isto anda tudo ligado, e não somos só nós que andamos a viver acima das possibilidades. Quem anda a delapidar a economia mundial é essa corja de especuladores que brinca com o dinheiro dos outros neste global casino virtual.

6. Agora para se conhecer o pensamento do RP, há que ler o seu “Facebook”, transformado não em “Diário do Governo”, mas em “Pensamento do Dia” da Presidência da República. Ainda há quem diga que o Presidente não fala!...

7. Reparam que bastou os banqueiros, concertados, começarem a dizer que não emprestam mais dinheiro a Portugal, para os políticos todos irem de mão beijada pedir ajuda ao FMI? Viram bem como a coisa funcionou? Hoje, o primeiro deu uma entrevista, no dia seguinte foi outro, depois mais um, finalmente nem foi necessário o restante pessoal escalado intervir, que o pedido ao FMI já estava em processamento. Claro que já se tinha compreendido há muito quem manda nos países (não é só Portugal, não fiquem a pensar que isto se destina só a nós, é geral). Os governos geram as pequenas contas caseiras. Mas o Big Brother global das multinacionais, esse está atento ao essencial. Capitalismo selvagem?, claro! Mas não parece haver outro, de Washington a Pequim, de Moscovo a Tripoli.

8. Nesta altura, quando se vislumbra para daqui a muito pouco que não haverá “estado social” para ninguém, e que, segundo Medina Carreira, o seu entrevistador do “Expresso”, Ricardo Costa, já só terá direito a uma “reforma simbólica”, o que nos resta? Indignarmo-nos, pois então, mas a indignação terá de ser construtiva. Pensar o que se pode fazer para alterar este estado de coisas e introduzir maior justiça neste mundo que, desde Reagan e os Bushs, mais os imperadores da China e outros quejandos, mais não faz do que precipitar-nos a todos nas mãos de uma ditadura financeira que não olha a nada a não ser o lucro, fácil e desmedido.

9. O que nos vale é que Futre foi contratado para fazer a publicidade ao “Licor Beirão”, com “soluções à Portuguesa”. Por exemplo: “À beira do precipício não daremos passos em frente” ou “Um governo com 19+1: 19 amigos e mais um para trabalhar”. Haja alento!