A Eduarda fotografou o Poker, e acho que ficou bem. É o meu gato, o "nosso" gato.
Quando ele foi "adoptado", eu tinha para aí sete gatos (cheguei a ter nove, num sexto andar de Lisboa, mas com óptimas varandas para os suportar), depois uns foram dados (os mais novinhos, de uma ninhada recente), a seguir os mais velhos morreram (que saudades do Batman e do Spike, ambos pretinhos!), a Mariana morreu também de overdose de ninhadas, acho eu, e o castanhinho, o adorável e rebelde “Xarope” fugiu para a liberdade pela segunda vez e foi atropelado na avenida. Foi um desgosto imenso. Ficou o Poker. Falando do Poker apetece-me recordar os outros.
O primeiro de todos foi o Batman. Era noite escura, acabara de sair do Vává, seriam para aí três da manhã (nessa altura o café fechava às duas e ficávamos parados à porta a falar até às tantas), no estacionamento em frente ouvia-se um miar contínuo, desesperado, miudinho. Os amigos foram embora, e eu andei uma boa meia hora a espreitar por baixo dos carros, até descobrir um tufo de pelo preto, que apanhei, trouxe para casa, acordei a Eduarda que dormia, olha a surpresa que tenho aqui, ela olhou, e o Batman foi adoptado logo ali. Depois veio a Mariana, veio pequenina e magrinha, foi a Eduarda que a descobriu nas traseiras do prédio onde trabalhava. Era uma ninhada enorme, abandonada, ela e as amigas disputaram os rebentos, e chamou-lhe Mariana porque, justificou, tinha sido um “amor de perdição”. O Batman e a Mariana tiveram uma primeira ninhada, tempos depois, que eu ajudei a pôr no mundo. Quase todos cinzentinhos (“saíram” muito bem, os amigos disputaram-nos, eram lindos de morrer) e um preto que ninguém queria, a não ser o Frederico. Ficou o”seu gato”, e era o Spike (o Fred andava à volta de Spike Lee!). Depois houve ninhadas e mais ninhadas, os amigos ficaram saturados de ofertas, tivemos de pôr termo aquele despautério. Mas a Mariana entretanto morreu. Idade e total ausência de controlo de natalidade. Ficaram só o Batman e o Spike. A morte da Mariana causou profunda depressão cá em casa e para desanuviar a S. foi a casa da Tia Nena, que tinha lá uma ninhada, e trouxe-nos o “Xarope”, o mais irrequieto gato da minha vida. Uma gracinha! Uma coisa fofa! Isso mesmo: o gato a que se dizem todas as enormidades, a que se chama todos os estereótipos. Era mesmo fofo e arranhava, e brincava e fugia. Um dia fugiu e esteve dois meses desaparecido. Encontrei-o no jardim do porteiro, numa caixa de cartão, todo esventrado, carne à vista, certamente por uma dentada de cão. Aventura-se na rua, fugira escada abaixo, e fora dar a mau destino. O porteiro recolhera-o, mas não sabia que era meu. Recuperei-o, chamei de urgência um veterinário, e na cozinha, em cima do mármore da banca, com um lençol por baixo, foi operado e cozido durante horas. Recuperou de tal forma que ninguém diria que estivera no estado em que o recolhera. Mas, alguns anos depois, a vertigem da liberdade voltou a fazê-lo fugir escada abaixo, nunca soubemos quando, mas dois dias depois percebemos com que destino. Não me alongo em descrições pois não são boas de recordar.
Fiquou o Poker que também tem uma história para contar. Tinha eu nessa altura muitos gatos, apareceu-me na escada, a miar à minha porta, um gatinho já com uns mesinhos (reparem sexto andar de um prédio das avenidas novas, ou foi milagre ou foi ali posto por alguém). Miava e, quando o apanhei, esticou-se todo como uma madeira. Era difícil de agarrar. Bem procurei pelo dono, perguntei por todo o lado se alguém perdera o gato que estava à minha porta e nada. Ficou. Sempre com as unhas espetadas e o corpo hirto como um varapau. Um dia teve uma doença qualquer, já não recordo, ficou murchinho e perdido a um canto até ir a um veterinário. Ficou hospitalizado durante uma semana. Voltou rijo como um marmelo. Mas doce. A enroscar-se em nós, a procurar-nos, a andar atrás de nós como um cão (um cão daqueles chatos, que não largam o dono!). Ficou até hoje. É uma delícia de gato. Só tem um defeito, um mijinho de quando em vez em jornais, revistas e mesmo nalguns livros de estimação. Um dia mesmo, mijou-me as “frequências” dos meus alunos do Porto, que eu estava a corrigir e deixara em cima da mesa da sala. Foi muito envergonhado que tive de devolver frequências mijadas. Acho que o Poker não tinha nada contra os alunos e a sua manifestação de saber. Apenas adorou o cheiro do papel.
Está ali em cima, e é muito bonito, o meu gato. O nosso gato.
domingo, maio 06, 2007
O MEU GATO "POKER" E OS OUTROS
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17 comentários:
Faltou falar de um gato (macho) branco com manchas castanhas (n me lembro do nome) ao qual eu chamava "Pricesa" e que talvez por isso, um dia me tenha arranhado de tal forma as mãos, que, passados talvez 7 ou 8 anos..., ainda sejam muito visíveis as marcas. Acho que ficarão para sempre.
Sei que não foi por lhe chamar "Princesa", os gatos, são como as pessoas não gostam de ser agarrados e eu nesse dia "decidi" que o tinha de agarrar... e pelas costas!!
Ainda hoje tento tirar partido da lição que ele me deu.
Gatos são uma espécie muito especial mesmo e eu rendo-me à sua sedução e ganho um respeito enorme por quem os respeita e os estima. Porque as pessoas que gostam de tudo fácil os odeiam, preferem os cães, tolinhos e humildes. Gatos nunca são humildes ou dependentes. Mas são fofos, mesmo quando têm mau feitio ( o que é quase sempre!). Fico com a frase que li algures: "Os cães cismam de pensar que são gente, os gatos têm certeza".
A Eduarda tem um olhar fantástico para fotos, ele está mesmo lindo esse Poker.
também chamar princesa a um gato que tinha a sua dignidade tem de ter os seus custos!
É bom relembrar a nossa familia felina.
A minha sogra que me gostaria de comer lá vai dizendo: "és um gato" e eu de vez em quando até mio só para enternecer...
Eu sou mais pelos canídeos.
Bjs
os ronrons dos gatos são uma ternura.
beijosssssssss com miaus
B.
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Lauro
Lauríssimo, adorei adorei adorei ler este texto ! Adorei mesmo ...
Também adoro gatos e tenho boas histórias para recordar ...
Ri-me com
""as “frequências” dos meus alunos do Porto "" baptizadas com um xixizinho do POCKER ! Ai as coisas BOAS da vida às vezes são tão simples e tão especiais.
Nota : a fotografia da Eduarda está *** ** estrelas !
É impossível não nos perdermos com ele!!! A mistura do cinzento com o branco é irresistível!!! E depois aquele ar pachorrento, é adorável!!!
Beijo
Delicioso "retrato de família", comentado...
Uma bonita história de gatos!
A foto mostra um gato com ar de muito esperto. O texto e a foto formam um todo muito natural.
Beijinhos para L.A e M.
Por acaso vim parar a este Blogue...e gostei imenso! Vou voltar:)))
Aliás voltarei... se assim o permitir!! :)))
Gringa, sirva-se sempre que quiser.
pela parte que me toca, agradeço, desvanecida, os elogios.
Nota: apesar da incontinência pontual (...) o poker não é um "gato fedorento"
M: Tomara eu que fosse fedorento, como os outros, eu ria-me com oprazer e ele estava "bem na vida".
Minha sumiu esta noite...
E ao falar de seus tantos gatos, lembrava da minha em cada palavra sua... Mikau é seu nome, branca de olhos azul e verde...
Já começo sentir a falta que ela me faz...
Seu roronar e o me receber todas as vezes que chego na nossa casa...
Não queria que tivesse ido...
Gostaria que estivesse em meu colo agora como sempre...
Obrigada por me fazer senti-la mais uma vez...
Camilla
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