quarta-feira, janeiro 31, 2007

PORQUE SIM!

Eu e a minha mãe, areias de Aveiro

A minha irmã e a minha mãe, areias da Ericeira

Dia 11 voto sim.
Por quê?
Não sei se a minha opinião interessa a alguém, mas voto sim para que quem vota não possa não abortar e que quem pense ou sinta de maneira contrária possa ter liberdade de pensar e sentir dessa forma.
Um filho tem-se porque se deseja.
Não falo da velha questão do corpo da mulher que é dela, não falo do bla, bla, bla sobre a mulher e não sei que mais (e o homem? não decide nada? não mete para ali nem prego nem estopa?, não terá o mesmo direito de decidir?), não falo de questões morais ou falsamente morais, não falo da divindade da vida humana, sobretudo não falo da “divindade” da vida humana com representantes de religiões que pregaram a morte, que queimaram em fogueiras, que matam na Irlanda ou na Bósnia, que se curvaram a nazis e comunistas, não, não falo dos argumentos da Igreja Católica (de uma certa Igreja Católica) nem dos abjectos papelinhos que distribuem pelas caixas de correio, não falo dos tontos argumentos de uns e outros e de algumas confrangedoras discussões, nas rádios, nas televisões, nos jornais, nos blogues, não falo dos bárbaros abortos clandestinos, não falo da lei, das semanas, não falo nem do que sei nem do que não sei.
Falo de algo muito simples:
Um filho tem-se porque se deseja.
O voto no sim é um voto político, puramente político e democrático: voto sim para dar a liberdade a cada um decidir por sim ou não.
Não percebo como, numa dita democracia que se quer humanista, se pode sequer colocar a questão de outra maneira: voto sim por que quero que cada criança que nasça neste meu país, nasça do amor de um homem e de uma mulher que a desejam.
Voto sim para que o mundo possa ser melhor, com mais amor, com menos barbárie, com liberdade, com responsabilidade.
Voto sim porque sei que os meus pais me desejaram.
Voto sim porque desejei o filho que tenho.
Não entendo que sequer se possa pôr a questão de outra maneira.
Voto sim para que os que vão votar não, possam continuar a votar não. Em liberdade. Em democracia.

Eu e o minho filho Frederico, areias do Algarve

Eu e o meu filho Frederico

sexta-feira, janeiro 26, 2007

LIVROS - Portugal Património


PORTUGAL
PATRIMÓNIO
Devo dizer que não li. Folheei. Devo dizer que assisti ao lançamento no CCB e fiquei impressionado. “Portugal - Património”, da autoria de dois investigadores que devotaram vários anos das suas vidas à recolha de tudo o que diga respeito ao património de Portugal, entendida a acessão de “património” de uma forma muito lata, não só os monumentos, não só a arte e cultura, mas também a natureza. “Uma árvore”, por exemplo. Trata-se de um exaustivo inventário da autoria de Álvaro Duarte de Almeida e Duarte Belo, que representa o maior investimento editorial de sempre do Círculo de Leitores: 500 mil euros.
Outros números também foram apresentados e demonstram bem a ambição desta mega operação: 60 mil referências, oito mil fotografias seleccionadas entre as mais de 600 mil efectuadas pelo fotógrafo Duarte Belo, 300 desenhos, 300 mil quilómetros percorridos em oito anos de um trabalho que envolveu 60 pessoas e resulta em dez volumes a publicar a partir deste mês de Janeiro (o primeiro saiu no dia 24), ao ritmo de um por cada dois meses. Cada volume conta com cerca de 500 páginas, organizados por capítulos segundo unidades territoriais que fogem à tradicional divisão administrativa do País (por distrito ou concelho) e opta por uma divisão cartográfica. A acompanhar o trabalho dos dois autores, temos a consultoria científica de José Mattoso, historiador, e ainda do especialista em História de Arte, Paulo Pereira, e da revisão linguística de Teresa Belo. O primeiro volume, dedicado ao ”Porto e Minho”, foi posto à venda com um preço de lançamento de 29,90 euros, mas os restantes nove serão vendidos a 34,90 euros cada.
Acho que vale a pena apostar. Uma obra de referência, única em Portugal, mas não só. É bom revisitar o nosso património e valorizá-lo devidamente. Não me pagaram para a publicidade, mas acho que vale a pena elogiar devidamente este esforço.

CINEMA - Apocalypto

APOCALYPTO
(...) Regressemos ao filme. Acabada a perseguição inicial, os caçadores trazem a presa para a aldeia onde esta é distribuída por todos, e onde se assiste a várias cenas da “vida quotidiana dos maias”, mostrando a sua alegria de viver, a sua ânsia de liberdade, o seu gosto pela arte da luta e o seu pendor muito especial para uma generosa disseminação de sangue em magnânimas doses, quer se trate de sacrifícios, humanos ou animais, quer de outras pertinentes actividades que a isso se prestem (esventrar um tapir, retirar coração, fígado e testículos e comer tudo ainda quente, é um bom exemplo).
Definido está o ambiente que preside ao conceito de “bom selvagem”. Olhando para aqueles quadros idílicos somos levados a acreditar que Rosseau tinha toda a razão e que as lendas que sobrevivem sobre a civilização maia são as melhores. Mas rapidamente o quadro idílico se altera com o aparecimento de uma outra tribo rival que cerca a aldeia, incendeia as palhotas, mata velhos, viola mulheres, aprisiona homens maduros, e deixa as crianças vagueando pelas margens da coluna de prisioneiros que é conduzida para uma das cidades mais célebres, para aí serem utilizados como escravos na construção dos grandes templos. De entre todos os guerreiros, um, “Pata de Jaguar”, consegue primeiro fugir, depois ser arrebanhado como os outros, mas todos sabemos que a ele estão atribuídas tarefas maiores. Ele é o protagonista. Será durante o seu sacrifício que o céu se esconde, será ele o único a ultrapassar a prova da corrida no estádio da cidade, será ele a emprenhar-se pelo terreno de trigo e a alcançar a floresta. Será ele o perseguido, será ele o que ousa enfrentar os chefes religiosos e militares, será ele a olhar o mar nas derradeiras imagens do filme e a ter a noção de que a partir dali tudo será muito diferente.(...)

Excerto de um texto a aparecer na revista "História", de Fevereiro de 2007..


segunda-feira, janeiro 22, 2007

LIVROS - Philip Roth

Philip Roth:

"O Animal Moribundo"
Philip Roth é definitivamente um dos maiores escritores norte americanos vivos. Li dele agora “O Animal Moribundo” e devo confessar que, por várias razões, o livro me tocou profundamente. Alguém leu uns textos meus e me disse: “Relembram-me “O Animal Moribundo””. Fui ler. È verdade. Seguramente, com a distância do talento a distinguir-nos. Mas as preocupações estão lá e as formas de as enfrentar também.
“O Animal Moribundo" é um escritor, professor universitário, de sessenta e alguns anos, que sente a velhice aproximar-se e a morte rondar. Encontra Consuela, de origem cubana, muito mais nova que ele, ardente e apaixonada. O que se conta é o angustiante encontro de um homem a caminho da velhice e de uma mulher, na sua plenitude, ao encontro da morte. O resultado é brilhante, notável, arrasador, escrito com a secura de um Hemingway, mas com o olhar do início de século XXI. Não percam esta viagem ao mais secreto da alma humana. Um escritor verdadeiramente invulgar, um romance de uma densidade e força inusitadas.
Deixo-vos aqui três pinceladas que me marcaram sobremaneira. Funcionem elas como aperitivo para a lauta refeição.


Philip Roth, O Animal Moribundo

“(…) Por muito que saibamos, por muito que pensemos, por muito que maquinemos, compactuemos e planeemos, não somos superiores ao sexo. É um jogo muito arriscado. Um homem não teria dois terços dos problemas que tem se não se aventurasse a ser fodido. É o sexo que traz a desordem às nossas vidas normalmente ordenadas. Eu sei isto tão bem como qualquer outra pessoa. Toda e qualquer vaidade regressa para troçar de nós. Lê o “DonJuan”, de Byron. No entanto, que podemos nós fazer se temos sessenta e dois anos e estamos convencidos de que nunca mais voltaremos a ter ao nosso alcance uma coisa tão perfeita? Que fazemos se temos sessenta e dois anos e a ânsia de aproveitar seja o que for que seja aproveitável não poderia ser mais forte? Que fazemos se temos sessenta e dois anos e tomamos consciência de que todas aquelas partes do corpo até então invisíveis (rins, pulmões, veias, artérias, cérebro, intestinos, próstata, coração) estão a começar a tornar-se desoladoramente patentes, enquanto o órgão mais conspícuo ao longo de toda a nossa vida está condenado a mirrar até à insignificância?
Não me interpretes mal. Não se trata de, por intermédio de uma Consuela, podermos cair na ilusão de pensar que regressamos uma última vez à nossa juventude. Não é possível sentir mais a diferença relativamente à nossa juventude. Na energia dela, no seu entusiasmo, na sua ignorância juvenil, na sua sabedoria juvenil, a diferença é dramatizada em cada instante. Nunca há a mínima dúvida de que é ela, e não nós, quem tem vinte e quatro anos. Só um grande idiota sentiria que é de novo jovem. Se nos sentíssemos jovens, seria uma armadilha. Longe de nos sentirmos jovens, sentimos o tormento do futuro ilimitado dela em comparação com o nosso futuro limitado, sentimos ainda mais do que normalmente o tormento de todos os derradeiros dons que fomos perdendo. É como jogar basebol com um grupo de miúdos de vinte anos. Não que nos sintamos com vinte anos por jogarmos com eles. Notamos a diferença durante cada segundo de jogo. Mas pelo menos não estamos sentados nas linhas laterais.
O que acontece é o seguinte: sentimos lancinantemente que estamos velhos, mas de uma maneira nova.” (pag.s 36-37)

“(…) Enquanto cresci, o homem não era emancipado no reino sexual. Era um homem de segunda apanha. Era um ladrão no reino sexual. Surripiávamos uma apalpadela. Roubávamos sexo. Adulávamos, suplicávamos, lisonjeávamos, insistíamos - todo o sexo exigia luta, tinha de ser disputado aos valores, senão à vontade da rapariga. O conjunto de regras determinava que tínhamos de impor a nossa vontade à rapariga. Era assim que ela era ensinada a manter o espectáculo da sua virtude. Ficaria con­fuso se uma rapariga comum se oferecesse, sem uma infinita importunação, para quebrar o código e praticar o acto sexual. Porque ninguém, de qualquer dos sexos, tinha alguma noção de que recebia à nascença um direito erótico. Era desconhecido. Ela podia, se estivesse caída por nós, concordar com uma punhe­ta - que significava essencialmente usar a nossa mão com a dela como um encaixe -, mas que alguém consentisse alguma coisa sem o ritual do cerco psicológico, de perseverante e monomaníaca tenacidade e exortação, bem, isso era impensável. Não havia, com certeza, possibilidade de conseguir um broche a não ser usando de uma perseverança sobre-humana. Eu consegui um em quatro anos de universidade. Era tudo quanto nos era permi­tido. Na cidade rústica das Catskill, onde a minha família tinha um pequeno hotel de férias e eu atingi a maioridade nos anos quarenta, a única maneira de ter sexo consensual era ou com uma prostituta ou com alguém que fora a nossa namorada durante a maior parte da nossa vida e com quem toda a gente calculava que íamos casar. E nesse caso pagávamos o que devía­mos, pois frequentemente casávamos com ela.” (pag.61)

“(…) A última pessoa a tomar estas questões a sério foi John Milton, há trezentos e cinquenta anos. Alguma vez leram os seus panfletos sobre o divórcio? No seu tempo, isso valeu-lhe muitos inimigos. Estão aqui, estão entre os meus livros com as margens densamente anotadas nos anos 60. “O nosso Salvador abriu para nós esta arriscada e acidental porta do casamento para no-la fechar como o portão da morte...?” Não, os homens não sabem nada - ou procedem voluntariamente como se não soubessem - a respeito do lado difícil e trágico daquilo em que vão entrar. Na melhor das hipóteses, pensam estoicamente: Sim, eu compreendo que mais cedo ou mais tarde vou renun­ciar ao sexo neste casamento, mas será a fim de ter outras coisas mais valiosas. Mas compreenderão aquilo de que estão a abdicar? Ser casto, viver sem sexo... bem, como encararão as derrotas, os compromissos, as frustrações? Ganhando mais dinheiro, ganhando todo o dinheiro que puderem? Fazendo todos os filhos que puderem? É uma ajuda, mas não é a mesma coisa. Porque a outra coisa se baseia no seu ser físico, na carne que nasce e na carne que morre. Porque só quando fodemos é que tudo aquilo de que não gostamos na vida e tudo aquilo que nela nos derrota é puramente, ainda que momentaneamente, vinga­do. Só então estamos mais limpamente vivos e somos mais lim­pamente nós mesmos. A corrupção não é o sexo, a corrupção é o resto. O sexo não é apenas fricção e divertimento superficial. O sexo é também vingança contra a morte. Não esqueçam a morte. Não a esqueçam nunca. Sim, o sexo também é limita­do no seu poder. Eu sei muito bem a que ponto é limitado. Mas, digam-me, há algum poder maior? (pag. 63)

“(…) Tocava Beethoven e masturbava-me. Tocava Mozart e masturbava-me. Tocava Haydn, Schumann, Schubert e masturbava-me com a imagem dela no pensamento. Porque não podia esquecer os seios, os seios plenos, os mamilos e a maneira como ela con­seguia envolver neles o meu pénis e acariciar-me assim. Outro pormenor. Um último pormenor e paro. Estou a tornar-me um pouco técnico, mas isto é importante. Este foi o contacto que fez de Consuela uma obra-prima de volupté. Ela é uma das poucas mulheres que conheci que se vinha empurrando a vulva para fora, empurrando-a involuntariamente como o corpo macio, não segmentado e espumoso de uma bivalve. A primeira vez apanhou-me de surpresa. Sentimo-la e temos uma sensação da fauna desse outro mundo, de qualquer coisa vinda do mar. Como se fosse relacionado com a ostra, o polvo ou a lula, uma criatura oriunda de quilómetros abaixo e eternidades atrás. Normalmente, vemos a vagina e podemos abri-la com as nossas mãos, mas no seu caso ela abria-se como se florescesse, a cona na sua própria forma, emergindo do seu esconderijo. Os pequem lábios eram expelidos para fora, entumesciam para fora, e era muito excitante, aquela tumefacção viscosa e sedosa, estimulante ao contacto e estimulante para os olhos. O segredo extasiadamente exposto. Schiele teria dado os seus caninos para o pintar. Picasso tê-lo-ia transformado numa guitarra.
Quase nos vimos de a ver vir-se. Consuela revirava os olhos quando era assim para ela. Os seus olhos voltavam-se para cima e só podíamos ver as escleróticas, e também isso valia a pena ver. Tudo nela valia a pena ver. Fosse qual fosse a agitação causada pelo ciúme, fosse qual fosse a humilhação e a infinda incerteza, sentia-me sempre orgulhoso quando a fazia vir-se. Às vezes nem sequer nos importamos se uma mulher se vem ou não: acontece apenas, a mulher parece encarregar-se disso por si mesma e não é da nossa responsabilidade. Não é um acontecimento com outras mulheres; a situação é suficiente, há excitação bastante e isso nunca está em questão. Mas com Consuela, sim, com ela era definitivamente uma responsabilidade que me cabia e sempre, sempre, uma questão de orgulho.” (pag. 88-89)
Philip Roth, "O Animal Moribundo", ed. Dom Quixote. Ficção Universal.

(ver mais sobre PHILIP ROTH AQUI)

TEATRO EM LISBOA - O Que Diz Molero

O Que Diz Molero

No Teatro Nacional de D. Maria II, “O Que Diz Molero”, o festejado romance de Dinis Machado, lançado há 30 anos, serve de base a um magnífico espectáculo de teatro, num excitante trabalho de adaptação do encenador brasileiro Aderbal Freire-Filho. E digo “adaptação” para marcar desde já uma posição.
Aderbal Freire-Filho é conhecido por introduzir um conceito novo, o de “romance-em-cena”, conceito criado no início da década de 90, quando decidiu pôr em palco uma obra literária sem mudar uma palavra do texto original. O romance chamava-se “A Mulher Carioca aos 22 anos”, de João de Minas, e foi a primeira experiência, a que se seguiram outras, como “O Púcaro Búlgaro”, de Campos de Carvalho, ou este ““O Que Diz Molero”, diálogo entre duas personagens que lêem um relatório sobre “um rapaz” que nunca é referido pelo nome próprio, e que é o centro de uma picaresca aventura que, partindo de um popular bairro de Lisboa, extravasa pela imaginação para cenários de todo o mundo.
Aderbal Freire-Filho afirma agora que “se tivesse encenado este romance há mais tempo seria tentado a fazê-lo com apenas dois actores.”O que vemos em cena inicialmente são dois actores que começam a ler o relatório, mas passando a palavra a outros quatro que vão reinventando personagens, dezenas e dezenas de figuras que revivem no palco as situações descritas por Dinis Machado. O efeito é notável, de imaginação, de humor, de invenção, de inteligência. Para o que concorre também o belíssimo e eficaz cenário de José Manuel Castanheira, director artístico adjunto do D. Maria II, que já trabalhou com mais de 60 encenadores, e que, em 1999, conheceu em Madrid este director cearense, com quem, desde então, tem feito vários trabalhos no Brasil. O cenário amontoa de forma orgânica dezenas de arquivos de metal, com gavetas que escondem adereços de cena e acendem luzes e definem espaços e locais. Excelente, como excelente é o desenho de luzes que rasgam a penumbra geral.

“O romance-em-cena só existe para dizer que o que está posto no palco não é a adaptação de um romance, é o próprio (romance)”, explicou o encenador. Ora a verdade é que, sendo embora o romance que está em cena, não é o romance que está em cena. É o romance, sim, palavra por palavra (enfim, com muitos cortes: “Fizemos uma versão para preguiçosos e pessoas que sofriam da coluna...”, ironizou o encenador), mas é o romance numa nova linguagem, “lido” por alguém, “interpretado” por um elenco, encenado, “adaptado”.
Depois de dois anos em cena em várias cidades brasileiras (Rio de Janeiro, São Paulo, festivais de teatro, etc.) e de ter sido apresentada no Uruguai e na Holanda, este espectáculo de Aderbal Freire-Filho que chega agora a Lisboa, demonstra bem o entusiasmo do encenador pelo livro de Dinis Machado há mais de 25 anos. Explica: “Abri o livro e fiquei absolutamente deslumbrado com as primeiras páginas. Apaixonei-me pelo livro nessa época”. A representação tinha, inicialmente, cerca de cinco horas, e está agora reduzida a metade, mas o que vemos é um preciso trabalho de encenação que merece inteiramente a atenção e o carinho do público português. O magnífico elenco mostra-se coeso e divertido na forma como joga com as palavras e as situações, como usa todos os artifícios da arte cénica para levar a água ao seu moinho. Como cita e dispersa referências literárias, teatrais, cinematográficas.
O romance de Dinis Machado já tinha sido representado, em teatro, em Portugal, em 1994, numa adaptação teatral de Nuno Artur Silva, com interpretação de José Pedro Gomes e António Feio, com encenação deste último.

Dinis Machado nasceu em 1930, em Lisboa. Apesar de ser inicialmente um jornalista ligado sobretudo ao desporto, fez crítica cinematográfica, além de ter participado das comissões organizadores de diversos festivais e ciclos cinematográficos para a Casa da Imprensa de Lisboa. Dedicou-se também à edição de banda desenhada, tendo sido chefe de redacção das revistas “Tintin” e “Spirou”. Escreveu três livros policiais sob o pseudónimo de Dennis McShade: "Mão Direita do Diabo", "Mulher e Arma com Guitarra Espanhola" e "Réquiem Para D. Quixote". Além de "O Que Diz Molero", escreveu: "Discurso de Alfredo Marceneiro a Gabriel Garcia Márquez", "Reduto Quase Final" e “Gráfico de Vendas com Orquídea”
“O Que Diz Molero” é um dos maiores êxitos editoriais portugueses, com mais de cem mil exemplares vendidos, e traduzido para francês, alemão, espanhol, romeno e búlgaro.

Encenação: Aderbal Freire-Filho
Actores: Gilray Coutinho, Thelmo Fernandes, Isio Guelman, Rachel Iantas, Savio Moll, Cláudio Mendes.
A peça ficará em cartaz, de terça-feira a domingo, até 4 de Fevereiro, no Teatro Nacional de D. Maria II.

domingo, janeiro 21, 2007

TEATRO EM LISBOA - O Principezinho

O PRINCIPEZINHO

no Teatro Politeama

Um jovem aviador passa pelos céus de um deserto, quando o avião perde altitude e abocanha a areia. O aviador sai íleso, mas descobre-se perdido. Adormece na areia.


“E foi assim que, nessa noite, adormeci deitado na areia, a milhares de milhas de qualquer local habitado. Sentia-me mais isolado do que um náufrago numa jangada no meio do oceano. Podem, portanto, imaginar qual não foi a minha surpresa quando, ao nascer do dia, fui acordado por uma vozinha que dizia:
-Se faz favor... desenha-me uma ovelha!
-O quê?
-Desenha-me uma ovelha...
Pus-me de pé de um salto, como se tivesse sido atingido por um raio. Esfreguei os olhos energicamente. Olhei com toda a atenção. E vi um menino verdadeiramente espantoso, que me observava com um ar muito sério… “

1.

No programa que autografa à entrada do Teatro Politeama, dedicando-o “aos meninos que vão assistir ao seu espectáculo”, Filipe La Feria tem um texto onde explica as razões que o levaram a esta encenação: “Li "O Principezinho" quando tinha a tua idade e nunca mais esqueci. Ele ensinou-me a ver com os olhos do coração. Sempre desejei convidar-te para vires ao meu Teatro, ao meu planeta, para te apresentar o meu Principezinho. Tenho a certeza que nunca o irás esquecer e que ele te irá acompanhar durante toda a viagem maravilhosa da tua vida.”
No espectáculo, o Principezinho ouve a Raposa explicar que o essencial não é “o que se vê”, mas “o que se sente com o coração”. Esta frase julgo ser a razão principal do sucesso desta obra. Este apelo ao mais íntimo e ao mais secreto da compreensão humana, onde se esconde a poesia e o amor. Ora Filipe La Féria não consegue restituir toda a poesia e toda a envolvência da obra de Antoine de Saint-Exupéry, muito embora toda a sua boa vontade e a qualidade que este espectáculo apresenta.
Diga-se que tudo leva a crer que o relativo fracasso se deve a duas questões. Primeira: para tornar o espectáculo não muito longo, La Feria condensou o texto, e retira-lhe alguma poesia, para apresentar dele um quase esqueleto. Descarnado. Segundo: as apetências tecnológicas, sobretudo o vídeo de que se socorre vezes em demasia, tiram secreta magia ao que se devia pressentir e não “ver”. Ou seja: “vê-se” demasiado e “sente-se” pouco.
Mas abstraindo isso, há bons momentos neste espectáculo: tudo o que se passa somente entre o Aviador (Hugo Rendas) e o Principezinho (Martin Penedo ou Ruben Silva) é comovente e sedutor e decorre num bom cenário com a assinatura de Rita Torrão. Algumas das tradicionais figuras que povoam o universo de Saint-Exupéry são bem defendidas, como a Raposa (Hugo Goepp), o Vaidoso (Daniel Gorjão), o Bêbado (Tiago Martins), o Homem de Negócios (Tiago Isidro), o Acendedor de Candeeiros e Geógrafo (Sérgio Moreno), a Serpente (Andrea Gaipo) ou a Vendedora de Comprimidos (Sofia Cruz). No vídeo aparecem a Flor (Sara Cabeleira), e o Rei (Joaquim Barros). A tradução especialmente executada para o efeito é escorreita e clara.

2.
Uma nota á margem. Antes do espectáculo se iniciar, à porta do Politeama centenas de jovens aguardavam a entrada. Uns com país e familiares, outros com professores. Cinquenta e tal eram alunos de uma escola, putos com quinze anos, mais coisa menos coisa, e a berraria era intensa. Pensei: vai ser bonito com “estes selvagens todos lá dentro”. Enganei-me redondamente. Os “selvagens” não se ouviram. O silêncio foi total, as palmas e os aplausos os exigidos no sítio certo. O que quer dizer que quando a magia existe, “os selvagens” deixam de o ser. No teatro, se calhar nas salas de aula. Uma lição de pedagogia. E “O Principezinho” não é a “Floribela”.

3.

Quem foi Antoine de Saint-Exupéry?

Antoine-Jean-Baptiste-Marie-Roger de Saint-Exupéry, nascido a 29 de Junho de 1900, em Lyon, foi escritor, ilustrador e piloto durante a II Guerra Mundial. Passou a infância em casa de uma tia, perto de Ambérieu, estudou em Sainte-Croix-du-Mans, na Suíça e em Paris, onde se preparou para entrar na Escola Naval. Reprovado na oral do exame de admissão, resolve ingressar em Belas-Artes. Em 1921, começou a cumprir o serviço militar em Estrasburgo, no ramo da Aviação, o que lhe traça o destino. Depois de sair da tropa, em 1923, tem vários empregos. Começa a escrever e, em 1925, publica a sua primeira narrativa cuja acção se situa no mundo da aviação. Em 1926, Saint-Exupéry entra, como piloto, para a companhia Latéc transporte do correio entre Toulouse e Dacar. Seguidamente, é nomeado chefe de escala do porto de Juby, no Rio do Ouro. É nessa época que escreve “Courrier Sud” (“Correio do Sul”) (1929).

Acompanhado por Mermonz e Guillamet, parte para a América do Sul, a fim de estudar a possibilidade de criação de novas linhas aéreas nesse continente. Em 1931, publica “Vol de Nuit” (“Voo Nocturno”), que alcança um sucesso bastante considerável. Entretanto, a companhia Latécoère abre falência e Saint-Exupéry tenta, em vão, em 1935 e ao serviço da Air France, bater o recorde aéreo Paris-Saigão. Em 1939, tenta fazer a ligação aérea de Nova Iorque à Nova Terra do Fogo: gravemente ferido, passa largos meses de convalescença em Nova Iorque. É então que publica “Terre des Hommes” (“Terra dos Homens”). Durante a II Guerra Mundial, faz parte do Exército de Libertação, mas devido à sua idade, é proibido de pilotar. Não obstante, insiste para que lhe sejam atribuídas missões: a 31 de Julho de 1944, levanta voo de Borgo, na Córsega. Desaparecido em combate, no Mar Mediterrâneo, durante uma missão de reconhecimento sobre as cidades de Grenoble e Annecy, este facto acrescenta à sua lendária fama de escritor, uma mítica e romântica auréola. A 3 de Novembro de 44, em homenagem póstuma, recebeu as maiores honras do exército. Porém, o seu corpo e os escombros do avião nunca foram encontrados. Durante a II GM, publicou três obras: “Pilote de Guerre” (“Piloto de Guerra”), “Lettre à un Otage” (“Carta de um Refém”) e “Le Petit Prince” (“O Principezinho”), em 1943.
As suas obras apresentam características muito próprias e obsessões visíveis, como a aviação, a guerra, a solidão do protagonista. Também escreveu artigos para várias revistas e jornais de França e outros países, sobre a guerra civil espanhola ou a ocupação alemã da França.

"O Principezinho" (1942) é unanimemente considerada a sua obra-prima. Foi escrito durante o exílio nos Estados Unidos1943 - onde o autor se tinha refugiado desde a invasão da França pelos nazis, na 2ª Guerra Mundial -, tendo sido aí publicado no ano seguinte. Posteriormente foi considerado o livro francês mais vendido em todo o mundo (cerca de 80 milhões de exemplares), com 400 a 500 edições. Segundo o jornal francês "L'Express", "Le Petit Prince" é a obra literária mais traduzida no mundo, a seguir à Bíblia, tendo sido publicado em 160 línguas ou dialectos, incluindo o aranês, o amazigh e o xhosa, uma das 11 línguas oficiais da África do Sul. No Japão existe até um museu para a personagem principal do livro, um jovem sonhador de cabelos louros e cachecol vermelho, "O Principezinho". Em resposta à questão "Qual é o livro do século?" colocada pela "Sondagem do Século" do jornal "Le Parisien-Aujourd'hui" de Novembro de 1999, foi eleito o livro "O Principezinho"!

4.

Um excerto de “O Principezinho”

XXI
Foi então que apareceu a raposa.
- Bom dia! - disse a raposa.
-Bom dia! – respondeu, educadamente, o principezinho, que se voltou para trás, mas não viu nada.
-Estou aqui – disse a voz – debaixo da macieira.
- Quem és tu? - perguntou o principezinho. - És muito bonita…
- Sou uma raposa – respondeu a raposa.
- Anda brincar comigo – pediu o principezinho. - Estou tão triste…
- Não posso ir brincar contigo – disse a raposa. - Ninguém foi capaz de me cativar…
-Ah, desculpa! – disse o principezinho.
Mas, depois de ficar pensativo durante um bom bocado, acabou por perguntar:
- O que quer dizer “cativar"?
-Tu não és daqui – disse a raposa. - De que é que andas à procura?
- Ando à procura dos homens – respondeu o principezinho. - O que quer dizer “cativar"?
- Os homens – continuou a raposa – têm espingardas e passam a vida a caçar. É muito chato! Também fazem criação de galinhas. É o seu único aspecto interessante. Andas à procura de galinhas?
-Não – disse o principezinho. – Ando à procura de amigos. O que quer dizer “cativar"?
- É uma coisa que já caiu no esquecimento – respondeu a raposa. – Quer dizer “criar laços..."
-Criar laços?
- Isso mesmo – disse a raposa. - Para mim, por enquanto, tu não passas de um rapazinho igual, sem tirar nem pôr, a cem mil rapazinhos. E não me fazes qualquer falta. E tu não sentes também a minha falta. Para ti eu não passo de uma raposa igual a cem mil raposas. Mas se tu me cativares, passaremos a sentir a falta um do outro. Para mim passarás a ser único no mundo. E para ti eu também serei única no mundo...
- Começo a perceber – disse o principezinho. - Há uma flor… eu acho que ela me cativou...
- É muito possível – disse a raposa. - Vê-se de tudo, ao cimo da Terra...
-Oh! Mas não é na Terra – disse o principezinho.
A raposa pareceu muito intrigada:
- Noutro planeta, então?
-Sim.
- E nesse planeta há caçadores?
-Não.
- Isso sim, isso é interessante! E galinhas?
-Não.
-Não há nada perfeito – suspirou a raposa.
E imediatamente retomou a sua ideia:
- A minha vida é uma monotonia. Caço galinhas e os homens caçam-me a mim. Todas as galinhas são semelhantes entre si e todos os homens são semelhantes entre eles. Portanto, aborreço-me um bocado. Mas se tu me cativares, será como se o sol entrasse na minha vida. Reconhecerei um ruído de passos de entre todos os outros passos. Os outros passos far-me-ão fugir para debaixo de terra. Os teus far-me-ão sair para fora da toca, como se fossem música. E depois, repara: estás a ver lá ao fundo, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é, portanto, inútil. Os campos de trigo não me fazem lembrar nada. E isso é uma tristeza! Mas os teus cabelos são da cor do ouro. Portanto, depois de me cativares, vai ser maravilhoso! O trigo, que é dourado, há-de fazer-me pensar em ti. E então hei-de gostar do som do vento no trigo...
A raposa calou-se e ficou a olhar durante muito tempo para o principezinho:
- Por favor... cativa-me! - implorou, por fim.
- Eu gostava muito – respondeu o principezinho –, mas não tenho muito tempo. Tenho amigos para descobrir e muitas coisas para conhecer.
- Só conhecemos o que cativamos – disse a raposa. - Os homens já não têm tempo para conhecer o que quer que seja. Compram tudo feito, nas lojas. Mas como não existem lojas de amizade, os homens já não têm amigos. Se queres ter um amigo, cativa-me!
- O que é que tenho de fazer? - perguntou o principezinho.
- É preciso ter imensa paciência – respondeu a raposa. – Para começar, sentas-te, um pouco afastado de mim, assim, na relva. Eu espreito-te pelo canto do olho e tu não dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal entendidos. Mas, a cada dia que passa, poderás sentar-te um pouco mais perto...
No dia seguinte, o principezinho regressou.
- Era melhor vires sempre à mesma hora – explicou a raposa. - Se tu vieres, por exemplo, às quatro da tarde, eu começo a ficar feliz logo às três horas. À medida que o tempo passa, vou ficando cada vez mais feliz. Às quatro horas estarei já inquieta e agitada; descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vieres a uma hora qualquer, nunca saberei quando é que hei-de começar a embelezar o meu coração… os rituais são indispensáveis.
- O que é um ritual? - perguntou o principezinho.
- É uma coisa que, infelizmente, também caiu no esquecimento – respondeu a raposa. - É o que faz com que um dia seja diferente dos outros, uma hora diferente das outras. Os meus caçadores, por exemplo, têm um ritual. Às quintas-feiras vão dançar com as raparigas da aldeia. Por isso a quinta-feira é um dia maravilhoso! Vou passear até à vinha. Se os caçadores fossem dançar num dia qualquer, todos os dias seriam iguais e eu não teria férias.
E foi assim que o principezinho cativou a raposa. E, quando se aproximou a hora da partida:
-Ah! – suspirou a raposa... - Vou chorar.
- A culpa é tua – disse o principezinho. - Eu não te queria fazer mal, mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Pois quis – concordou a raposa.
- Mas agora vais chorar! - disse o principezinho.
- É claro que sim – respondeu a raposa.
- Então não ganhas nada com isso!
- Ganho – afirmou a raposa. - Por causa da cor do trigo…
Depois acrescentou:
- Vai ver as rosas mais uma vez. Vais perceber que a tua é única em todo o mundo. Depois volta aqui para me dizer adeus e eu vou ter um presente para te oferecer: um segredo.
O principezinho foi, uma vez mais, ver as rosas.
-Vocês não se parecem absolutamente nada com a minha rosa, vocês ainda não são nada – disse-lhes ele. - Ninguém vos cativou e vocês não cativaram ninguém. Vocês são tal e qual como era a minha raposa. Não passava de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas eu fiz dela uma amiga e agora ela é única em todo o mundo.
E as rosas ficaram todas abespinhadas.
- Vocês são muito bonitas, mas são vazias – disse ele ainda. - Não se pode morrer por vocês. É claro que um transeunte desprevenido poderá confundir a minha rosa convosco. Mas ela, sozinha, é mais importante do que vocês todas juntas, porque foi ela que eu reguei. Porque foi ela que eu coloquei debaixo da redoma. Porque foi ela que eu abriguei com o biombo. Porque foi por ela que eu matei as lagartas (excepto duas ou três, por causa das borboletas). Porque foi a ela que eu ouvi lamentar-se, vangloriar-se, ou mesmo, uma vez por outra, calar-se. Porque ela é que é a minha rosa.
E o principezinho regressou para junto da raposa:
- Adeus – disse ele...
- Adeus – disse a raposa. – Agora vou contar-te o meu segredo. Um segredo muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos...
- O essencial é invisível para os olhos – repetiu o principezinho, para nunca mais esquecer.
- Foi o tempo que tu dedicaste à tua rosa que fez com que ela seja tão importante.
- Foi o tempo que eu dediquei à minha rosa... – repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
- Os homens esqueceram esta verdade – disse a raposa. - Mas tu não podes esquecer. Tu tornaste-te responsável para sempre por aquilo que cativaste. Tu és responsável pela tua rosa...
- Sou responsável pela minha rosa... – repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
(Tradução de Maria Eduarda Colares).


O Principezinho
Um espectáculo de Filipe La Féria, segundo "Le Petit Prince" de Antoine Saint-Exupéry, Editions Gallimard, 1946 (Tradução: Maria Eduarda Colares); Adaptação, figurinos e encenação de: Filipe La Féria; Música de: António Leal e Telmo Lopes; Vídeos: Pedro Alegria, Ricardo Fernandes e Rui Fernandes; Ilustrações de vídeo: Gonçalo Viana; Coreografia e assistência de encenação: Inna Lisniak; Direcção de cena: Sérgio Moreno; Adereços: Luís Stoffel, Nuno Elias e Rita Torrão; Cenário: Rita Torrão; Guarda-roupa: Helena Brandão, Catita Soares e Helena Resende; Desenho de luz: Jorge Carvalho; Direcção de montagem: Fernando Mendes
Intérpretes: Hugo Rendas, Martin Penedo ou Ruben Silva, Hugo Goepp, Daniel Gorjão, Tiago Martins, Tiago Isidro, Sérgio Moreno, Andrea Gaipo, Sofia Cruz, Sara Cabeleira, Joaquim Barros.
De 2ª a 6ª, às 11h00 e 15h00 (para escolas mediante reserva prévia); Sábados, Domingos e Feriados às 15h00


O Principezinho em selos

Ao procurar elementos sobre Saint-Exupery e o seu "Principezinho",
descobrimos imensas reproduções de selos franceses
e de todo o mundo,
o que dá bem a imagem mítica a nível mundial desta obra.
Aqui ficam alguns exemplos:







o silvar das enxadas

Cumpriu-se o ritual: da terra à terra.
Na tarde cálida, a terra castanha, de um castanho sangue, de uma castanho magoado, dorido.
Terra desentranhada, esventrada, cortada pelos golpes das enxadas, que abriram a vala.
Para se cumprir de novo o ritual, as enxadas subiam ao céu, e em rasgões certeiros, rigorosos, hipnóticos, desciam rápido à terra, enterravam-se nela, golpeavam, e num movimento súbito, ritmado, ritualizado, ganhavam força, suspendiam a terra-sangue no alto e faziam-na tombar nesse vão assombrado que medeia entre a memória e o esquecimento.
“Doutor, afaste-se”, ouvi dizer. Não me afastei, aguentei firme o golpear da terra, inebriado, a enxada a subir e a descer silvando, a enterrar-se na terra, a salpicar de dor o fato, a chicotear o sobretudo cinzento escuro, alguma bate-me de raspão na face, outra fulmina os presentes, e a enxada continua a carregar pelo ar blocos de terra castanha, sangrenta, sequiosa de vida e de morte para nova vida.
O rasgão aberto nessa terra-mãe está finalmente repleto, saciado de uma terra de um castanho pesado, duro, sangrento. São blocos soltos, de terra livre que respira, antes de, mais tarde, no silêncio dos actos que se escondem, ser rebatida, martirizada, espalmada, comprimida. Agora, ali fica à aragem da tarde, repleta de flores circunstanciais.
Comigo trago nos ouvidos o silvar das enxadas subindo ao céu com veemência, descendo depois à terra num bailado de uma violência ritualizada, vital. São quatro enxadas que sobem e descem, compassadas. Fulminantes. Da terra à terra. Cada gesto, o rasgar da memória. De golpe certeiro.


(imagem roubada, sem licença, mas com ternura, da "Bandida")

sexta-feira, janeiro 19, 2007

EXPOSIÇÃO DE PINTURA - MANUEL AMADO

PINTURA DE
MANUEL AMADO
Manuel Amado (n. 1938), arquitecto e pintor, inaugurou nova exposição na Galeria de Pintura do Rei D. Luís no Palácio Nacional da Ajuda. Chama-se “O Espectáculo vai começar” e só quem conheça mal o pintor se admirará por o tema desta mostra, grandiosa em quantidade e inesperada pela concepção, ser o teatro, melhor ainda os bastidores do teatro.
Manuel Amado é arquitecto por formação, mas foi actor por devoção e paixão familiar durante muitos anos da meninice. Filho de Fernando Amado, um dos fundadores da Casa da Comédia, cedo se apaixonou pela "commedie dell’ arte", e esse mesmo universo vamos encontrar reproduzido nos quadros que integram esta exposição: arlequins, pantaleões, pierrots, polichinelos andam paredes meias com referências a Cocteau, Ricardo III, fantasmas da ópera, Xerezades, Pandoras e outros temas maiores da mitologia teatral.
Mas Manuel Amado não se limita a reproduzir o real num hiper realismo que, de tão hiper, toca o surrealismo (não por acaso foi amigo de Cesariny, Cruzeiro Seixas e outros da mesma inspiração). As suas composições são de uma extrema originalidade, a cena é quase sempre vista dos bastidores, as personagens são quase sempre silhuetas recortadas que se aguentam em pé mercê de evidentes estruturas de madeira que as sustentam, os teatro quase sempre estão desertos de espectadores (ou quando os há são manchas informes) sendo o todo marcado pela ausência. A cadeira é de Jean Cocteau, mas é a ausência que assinala a presença. O motivo é a cena teatral, mas raramente vista do lado do espectador de teatro, mas da perspectiva de um contra-regra que movimenta títeres inanimados. Uma visão interior do teatro, um olhar de quem ama o espectáculo, mas se seduz sobretudo pelo mistério da sua concepção, mágica, íntima, secreta.

A exposição "O espectáculo vai começar", de Manuel Amado, está aberta todos os dias, excepto às segundas-feiras, das 12h00 às 18h30, até 17 de Março de 2007, na Galeria de Pintura do Rei D. Luís, no Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa.
São 50 óleos sobre tela de linho, que contam com um catálogo com reprodução a cores das obras e ainda textos de João Pinharanda, comissário da exposição, Paulo Teixeira Pinto, Presidente do Millennium bcp e Elísio Summavielle,
Presidente do IPPAR.

Estão a tornar-se demasiado familiares estes corredores

Estão a tornar-se demasiado familiares estes corredores. A entrada para as urgências, o silvo da ambulância pelas ruas, o táxi atrás, a tentar não perder contacto, o registo e a falta de memória que a ansiedade provoca, nome, morada, número não sei de quê, o quê?, quem?, não interessa, preciso de auxílio, socorra-me, salve-o, salve-a, que importa o nome e o número, mas importa, e ali se fica até chegar à triagem, quais as doenças?, que aconteceu?, por que está assim?, quais os medicamentos que toma?, não sei, não me lembro, sei que está assim, mal, salve-a, salve-o, mede-se a tensão e a diabetes, o pulso, e a seguir vêm os corredores, as macas de colchões azuis e lençóis com a marca do hospital. Os serviços. As esperas. Hoje neurologia. Noutro dia medicina, cardiovasculares, ortopedia. As esperas. Os exames. O rádio X. A ecografia. As análises. A espera num banco, rodeado de tantos que esperam como eu, com macas atravessadas, cadeiras de rodas, gritos de dor, gemidos e silêncios de quem já não pode gemer ou gritar. Os que protestam pela demora, “estou aqui há quatro horas e ainda não me trataram, não vejo médicos, por onde andam?, É para isto que pagamos impostos?”, e os que esperam brandamente que sejam atendidos, os que juntam à dor a timidez de estarem vivos, desculpem o incómodo, fui atropelada, desculpem estar aqui a ocupar vez. Continue AQUI

o filho, a mãe, o neto.

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Mãe, terceiro dia



Eu e a minha mãe, praias de Aveiro, anos felizes.

terça-feira, janeiro 16, 2007

Mãe, segundo dia

Mãe

como te quero recordar

para sempre

pintada com muito amor e desejo

pelo meu pai

Exposição Lauro Corado - Aveiro Dezembro 2003

sábado, janeiro 13, 2007

TEATRO EM LISBOA - Fedra

FEDRA

Encenar clássicos deverá ser uma das funções prioritárias de qualquer companhia de teatro, estatal ou não estatal. Afinal é nos clássicos que se encontra a base e a génese, o viso e o fermento de todo o teatro posterior, digo mais de toda a filosofia e de todo o pensamento que se lhes seguiu. Esquecer os clássicos em teatro é o mesmo que esquecer toda a época do cinema mudo, toda a filosofia e toda a literatura clássicas. Ninguém deve esquecer os antepassados. É nas lições do passado, para o Bem ou para o Mal, que se constrói o presente e se vai encontrar e projectar o futuro.
Posto isto, encenar clássicos, sobretudo alguns clássicos é difícil. Encenar, hoje em dia, Racine (1639-1699), o jansenista, austero e puritano, é obra. Deve colocar-se numa encenação de qualquer obra sua o maior dos cuidados.
A “Fedra” que subiu a cena no Maria Matos, com encenação de Ana Tamen, é um desastre. Vamos por partes.
“Fedra” é um texto difícil, denso e complexo, escrito numa poética dodecassilábica. Há quem diga que é imensamente chato e desactualizado. Rege-se por valores e códigos morais e literários que não são os de hoje, mas é interessante confrontá-lo com os valores e os códigos de hoje. Uma encenação em prioritariamente de estabelecer como meta duas funções: restituir e clarificar o texto na sua pureza inicial, e torná-lo acessível ao público de hoje nas suas intenções e propostas. O espectáculo do Maria Matos é negação completa das duas opções. Os actores não trabalharam o texto, não foram dirigidos ou foram tão mal escolhidos, que sai do teatro sem ter percebido nada do texto. Uns comem as palavras, outros pontuam mal, outros nunca deviam estar num palco com Racine. Raros se salvam, e as que se salvam (sim, são as mulheres!), salvam-se mais por mérito seu, do que por qualquer outro mérito alheio.
Racine aparece aqui, no entanto, numa exemplar tradução de Vasco Graça Moura. Ele sim faz todo o esforço para clarificar e tornar acessível o verbo do dramaturgo francês. Uma tradução o mais fiel possível, elegante, ágil, que se ouve com prazer. O que se colocou no palco foi a opasização desta tradução. Não só porque o texto foi destruído, como também porque a encenação o tornou ridículo.
Se o cenário de Vera Castro é, plasticamente, muito bom, que dizer de uma marcação que faz os actores esfregarem-se pelas paredes, arrastarem-se pelo chão, ou contorcerem-se (com dores de barriga?) no palco, em posses “esculturais” de um ridículo confrangedor? Se o jogo de luzes de Jorge Ribeiro é bom, nada mais o merece.
É triste sair de um teatro com a sensação de tempo perdido, e mais grave ainda com a sensação de não se ter percebido nada do que se viu. À saída do espectáculo, não era só eu a lamentar-me, mas a quase totalidade dos espectadores. Realmente “dizer” Racine não é o mesmo que falar numa telenovela. Em Racine o texto é prioritário, é por textos como estes que se percebe a diferença que há em representar e “representar”. “Representar como quando se está a falar no café” é uma coisa, muito diferente de representar um texto. Ponham um bom texto na boca de um mau actor ou de um bom actor mal dirigido, e veja-se a desgraça. Está visto.
De que fala “Fedra”?
Escrita por Racine a partir do texto clássico do grego Eurípedes, a tragédia funda-se na recuperação do mito de Fedra, mulher de Teseu e rainha de Atenas, que se apaixona pelo seu enteado Hipólito. Este é um amor proibido, quase incestuoso, que Fedra esconde de todos até ao dia em que Teseu é dado como morto. Aí, Fedra revela-se a Hipólito, na precisa altura em que se anuncia que Teseu, afinal, não morreu. Hipólito, porém, não ama Fedra, ama Arícia, filha de inimigos da família, e também ela um amor proibido. Perante tantas contrariedades, a tragédia explode. Perante esta intriga que recorda obviamente telenovelas mexicanas e melodramas de cortar à faca, o que faz a diferença é a densidade da palavra e o rigor de uma encenação que a sirva. Ana Tamen, a encenadora, confessou o seu fascínio pela “dimensão desmesurada e mortal que a paixão atinge” na tragédia. Lamentavelmente nunca o consegue transmitir.
Como também quase não há crítica de teatro neste país, é altura de se começar a chamar os bois pelos nomes. Este jogo de panelinhas e amizades suspeitas que domina em grande parte da crítica só pode ser funesta. Longe vão os tempos em que, depois de uma estreia, se lia “a verdade” de cada crítico sobre o que vira, e onde se assistia por vezes a monumentais pateadas. Agora é este desconsolo de palmas a pedido e de um encolher de ombros desprestigiante para os actores e técnicos que construíram os espectáculos. Este país perdeu a genica, perdeu o sentido crítico, perdeu a garra criativa?

Fedra
Encenação Ana Tamen; Tradução: Vasco Graça Moura; Co-produção: Grupo Cassefaz; Cenografia e Figurinos: Vera Castro; Desenho de Luz: Jorge Ribeiro; Movimento: Peter Michael Dietz; Músicos: Nuno Oliveira e Sara Jonatas; Percursão Pedro Calado.
Interpretação: Beatriz Batarda (Fedra), Pedro Carmo (Hipólito), Alexandre de Sousa (Teseu), Cristina Bizarro (Enone), Cândido Ferreira (Terâmenes), Adelina Oliveira (Pânope), Sara Carinhas (Arícia), Kjersti Kaasa (Isménia).
Em cena no Teatro Maria Matos, até 18-02-2007 (4ª a sáb. 21H30; dom. 17H)

sexta-feira, janeiro 12, 2007

SER PROFESSOR

Este ano não estou a dar aulas por decisão minha. Mas adoro dar aulas. Nunca tive problemas com alunos. Mas as aulas que eu dou são especiais. Dar aulas na universidade, a alunos de cursos de cinema e audiovisual, é uma prenda dos céus. Só lá estão os que lutam por lá estar. Os que gostam do que vão aprender. Por isso, este "dar aulas" meu não tem paralelo com outros "dar aulas" de milhares de professores. Não só em Portugal, mas um pouco por todo o lado.
Mas estamos em Portugal, é aqui que é preciso fazer alguma coisa. Tem de ser feito alguma coisa, rapidamente. O estado a que o ensino chegou é alarmante. Por culpa de quem?
Acho que por culpa de todos, mas os menos culpados são os alunos. Governos, ministros, leis, professores, instalações, país, todos são muito mais "culpados".
O mais grave terão sido aqueles anos de completa barafunda que se seguiram ao "25 de Abril", onde, depois da prepotente ditadura chegou a demissão completa, muito por culpa de uma esquerda idiota que julgou que a autoridade não fazia falta a ninguém. Ora eu, que sou de esquerda, e não abdico de me considerar de esquerda, acho que a autoridade faz falta, sobretudo para que a sua ausência não conduza à ditadura.
Para se ensinar é preciso paz nas salas de aulas. Que não há. É preciso autoridade, disciplina, que não há. É preciso o aluno ouvir o professor, que não ouve. É preciso respeito pelo próximo, quer seja o colega, o professor ou o administrativo. Respeito, que não há.
No blogue "Divas e Contrabaixo", dei por um link para outro blogue, "Palavras em Linha", indicação que segui, e que proponho também aos meus leitores. É um belissimo "grito", muito bem escrito, assinado por uma professora, "Elipse", de Lisboa, que "tem de voltar lá amanhã", e depois de amanhã, e no dia seguinte.
É a condição de ser professora, hoje, em Portugal. É muito bem escrito. É terrível. FICA AQUI.
Na imagem, um filme maior, sobre o tema: "Sementes de Violência" (Blackboard Jungle), de 1955, uma realização de um mestre um pouco esquecido, Richard Brooks, com argumento de retirado de um romance de Evan Hunter, com interpretação de Glenn Ford. A não perder.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

ENCONTRO DE BLOGUES DE CINEMA

ENCONTRO DE BLOGUES DE CINEMA
ÚLTIMAS

1º ENCONTRO NACIONAL
DE BLOGUES DE CINEMA

(Famafest, Famalicão,
Março de 2007)

NOVAS DATAS:
16 a 24 de MARÇO DE 2007

O I Encontro Nacional de Blogues de Cinema vai ter lugar em Famalicão, durante o próximo "Famafest" (Cinema e Literatura), entre 16 e 24 de Março (o Encontro ocupará sexta, sábado e domingo, 16, 17 e 18). Os participantes terão direito a um livre transito para todo o festival, se assim pretenderem, e a organização do festival vai providenciar, junto de hotéis, residenciais e restaurantes para obter “preços módicos” para os inscritos. Para lá das sessões de trabalho e debate, o festival vai organizar sessões especiais com obras particularmente dedicadas ao evento (entre Vanguardas dos Anos 20 e o Expressionismo, veja adiante).
A reunião terá apenas um propósito: debater ideias e criar condições de uma maior eficácia de comunicação. Não será aceite qualquer tipo de condicionante, quer tenha a ver com sexo, idade, raça, credo político, religioso, estético, cinematográfico. Não será tolerada qualquer tipo de tentativa de manipulação dirigista. Uma voz, um blogue, uma possibilidade de expor as suas ideias. Não será tolerada qualquer tentativa de coarctar a liberdade individual, a não ser aquela que reponha a liberdade dos restantes, se ela estiver ameaçada. Nesta perspectiva, poderá sair deste primeiro encontro uma Associação Portuguesa de Blogues de Cinema (e afins), cuja regra número um terá de ser o escrupuloso respeito pela liberdade de pensar e de se expressar de cada associado.
Efectuem a inscrição neste blogue. (em anexo, AQUI, pode ver a lista dos blogues que até agora se manifestaram interessados. Aproveito para pedir uma confirmação para este blogue, nos comentários desta nota).


1º ENCONTRO NACIONAL
DE BLOGUES DE CINEMA

BLOGUES DE CINEMA
Os Melhores de 2006

Na sessão de abertura do I Encontro Nacional de Blogues de Cinema, vai ser anunciado qual o Blogue Nacional de Cinema que conquistou, entre os seus pares, o título de “O Melhor Blogue de Cinema de 2006”, e também o de “O Melhor Blogue Português de Cultura.” A cada um será atribuído um Diploma autenticado pelo Famafest.
Terminada a votação, aqui ficam os nomes dos blogues citados:

BLOGUES DE CINEMA
Os Melhores de 2006

Acossado, O
Ainda não começámos a pensar
Amarcord IIIIIIII
Aranhas, As III
Brain-mixer II
Cineásia II
Cineblog IIII
De que raio é que ele está a falar?
Estado Civil
Fila do meio
Filmes de Culto
Grindhouse
Hollywood
Imagens Perdidas
Last Picture Show
Mise en Abyme II
Mulholand Drive
Obscuridades da 7º Arte
Pasmos Filtrados III
Plano 9
Play It Again III
Royale With Cheese III
Viver contra o tempo
Wasted Blues III
Zona Negra IIII

BLOGUES DE CULTURA
Os Melhores de 2006


A a Z
Amor atrevido, Um
Amor e ócio
Arrastão
Arte da fuga, A
Aspirina b
Bandida II
Big Blog is watching You (Merdinhas)
Blasfémias
Cidadesurpreendente
Contraculturalmente
Da literatura
Divas e Contrabaixos
Erotismo na cidade III
Espaço de Crítica Artística
Fadista Valéria Mendez
Foram-se os anéis
Grande Loja do Queijo Limiano
Guilhermina suggia
Hoje há conquilhas
Indústrias Culturais II
Insurgente, O
Indústrias Culturais
Intruso, O IIII
Kontratempos
Lápis Exilis
Luminescências
Melhor Anjo, O
Mouco
Miniscente
Miss Pearls
Origem das Espécies, A
Passado/Presente
Passengers
Piano IIII
Portugal dos Pequeninos
Raim
Republica e Laicidade
Saudades do futuro
Sem Pénis nem Inveja
Senhora Sócrates, A
Sentido das Palavras, O
Volto Num Segundo

1º ENCONTRO NACIONAL
DE BLOGUES DE CINEMA


TEMA PARA “WORK SHOP"

Votação final:

22 votos
AS VANGUARDAS NAS DÉCADAS DE 20 A 40.
20 votos:
EXPRESSIONISMO, HISTÓRIA E PERMANÊNCIA
4 votos:
GRIFFITH

1º ENCONTRO NACIONAL
DE BLOGUES DE CINEMA


“OS MELHORES FILMES DE 2006”
1) Atendendo a que vai haver um “Encontro Nacional de Blogues” durante o “Famafest 2007” – IX Festival Internacional de Cinema e Vídeo (Cinema e Literatura), de Famalicão;
2) atendendo a que se está a proceder à votação do tema de um “Work Shop” para acompanhar o “Encontro”;
3) atendendo a que se está igualmente a eleger “O Melhor Blogue de Cinema de 2006”;
4) resolveu-se instituir o galardão “Os Melhores Filmes de 2006” para premiar os filmes estreados em Portugal, durante o ano de 2006, e mais votados pelos blogues de cinema (e afins, ou seja: blogues de cultura com presença forte de cinema);
Para tanto, convocam-se os autores de blogues portugueses a enviarem a este blogue (Lauro António Apresenta) uma lista de “Os 10 Melhores Filmes estreados em Portugal em 2006”.
Cada autor de blogue só pode enviar uma lista de “Os 10 Melhores Filmes estreados em Portugal em 2006”.
A votação vai estender-se de 1 de Janeiro de 2006 a 31 de Janeiro de 2007.
A lista de filmes estreados em Portugal durante o ano de 2006 pode consultar-se AQUI, constituindo uma base de trabalho para os futuros votantes;
Na contagem final, os 10 títulos que forem mais votados terão direito a um diploma a ser atribuído durante o “Encontro”. O mais votado de todos terá direito a um diploma especial, referente ao “Melhor Filme estreado em Portugal em 2006”.


Filmes votados até agora:



007 - Casino Royale III
Amants Réguliers, Les
Babel IIIIII 6
Bittersweet Life, A II 2
Black Dahlia, The II 2
Breakfast On Pluto
Brokeback Mountain
Caché III 3
Capote III 3
Cars II 2
Children of Men III 3
Cielo Gira, El
Clerks II 2
Coisa Ruim
Colour Me Kubrick
Da Vinci Code, The
Dans Paris III 3
Departed, The: Entre Inimigos IIIIIII 7
Descent, The
Devil's Rejects, The II 2
Enfant, L’
Fast and the Furious: Tokyo Drift, The
Good Night, and Good Luck.
Hills Have Eyes, The
History of Violence, A IIIII 5
Inconvenient Truth, An III 3
Inside Man
Irresistíble
Jarhead
Juventude em Marcha, de Pedro Costa
Kiss Kiss Bang Bang
Lady in the Water IIIII 5
Lisboetas II 2
Little Miss Sunshine IIIII 5
Marie Antoinette IIII 4
Mary
Matador, The
Match Point IIIIIIII 8
Miami Vice II 2
Munich IIIII 5
New World, The IIIII 5
Nobody knows
Paradise Now
Prairie Home Companion, A
Prestige, The
Profissão: Repórter
Proposition, The
Rapace
Science des Rêves, La
Superman Returns
Syriana II 2
Tale Of Two Sisters, A
Temps Qui Reste, Le
That Thing You Do
Two for the Money
United 93
V for Vendetta II 2
Volver IIII 4
Walk the Line
Water
World Trade Center
(Para ver cada votação de blogue, ver AQUI)

quarta-feira, janeiro 10, 2007

VIAGEM AO NORTE, 5 Serralves


ANOS 80 EM SERRALVES


“ANOS 80: UMA TOPOLOGIA”, inaugurou-se a 11 de Novembro do ano passado, na Fundação de Serralves, e vai estar patente ao público até 25 de Março de 2007. Comissariada por Ulrich Loock e Sandra Guimarães, esta produção da Fundação de Serralves revisita os anos 80 no campo das artes plásticas e procura mostrar como muita da arte de hoje reflecte “esse legado, embora negando ou ignorando esse passado.” Apesar de globalmente a mostra se apresentar algo decepcionante, não pela exposição em si, mas pelas próprias produções artísticas desse período, “reconsiderar os anos 80 pode servir como ferramenta para destacar e reflectir sobre alguma da arte do presente.” Esta exposição de grandes dimensões que utilizará todos os espaços do Museu, reúne pela primeira vez em Portugal um conjunto muito significativo de obras fundamentais de uma década que também enquadrou a abertura internacional da arte portuguesa, se bem que essas mesmas obras só agora sejam vistas pela primeira vez no país.
Uma panorâmica a não perder, é óbvio, quanto mais não seja para se perceber quão hesitantes e indefinidos foram os caminhos da arte nessa década. Nada excitantes, vistos agora de relance, os Anos 80 reflectem todavia uma época de transformações profundas em todos os campos. Para melhor se entender os propósitos da mostra, transcreve-se um texto introdutório fornecido pela Fundação de Serralves:

PORQUÊ OS ANOS 80?
Nessa década, o mundo assistiu a mudanças significativas nos campos político, social e cultural. Estas geraram novos desenvolvimentos, de grande alcance, cujos desfechos se têm revelado nos anos que agora vivemos.
Os anos 80 foram a década da maior mudança cultural e política no chamado mundo ocidental depois do fim da Segunda Guerra Mundial. Foram um período de incubação para a globalização que marcaria o período seguinte até aos nossos dias.

Em 1978-79 tiveram lugar vários acontecimentos que marcaram o início da década de 80: a eleição de um papa polaco (1978) – um primeiro indício da erosão do poder soviético e da perturbação do equilíbrio de terror Leste/Oeste, até então mais ou menos estável; a revolução islâmica no Irão (1979) – a emergência do Islão como um novo poder; a primeira fertilização in vitro bem sucedida (1978) – a perda do sentido de um lugar natural para a vida humana; a publicação de A Condição Pós-Moderna de Jean-François Lyotard (1979) – a afirmação da desintegração das grandes narrativas de modernidade. Os anos 80 terminam nitidamente com a queda do Muro de Berlim em 1989 – com esse acontecimento o confronto Leste/Oeste tal como era visto até então dissolve-se, seguindo-se um período em que a predominância da cultura ocidental e dos respectivos valores é fundamentalmente posta em causa. Uma das primeiras expressões dessa nova situação é a exposição parisiense “Magiciens de la terre” (1989).

Apresentando obras pertencentes ao último momento histórico antes da globalização, “Anos 80: Uma Topologia” organiza-se em torno de grupos geográficos (o mapeamento geográfico da arte mundial, porém, é abandonado sempre que um argumento estético se revela mais forte do que o argumento topológico). A exposição mostra – com raras excepções – obras originárias da Europa e das Américas. Apesar de adoptar uma perspectiva europeia, inclui contributos de todo o universo da arte e ao mesmo tempo abre algumas janelas para locais de menor visibilidade, como Istambul (Gülsün Karamustafa), Atenas (George Hadjimichalis, Apóstolos Georgiou), Santiago do Chile (Eugenio Dittborn), Moscovo (Ilya Kabakov) ou Abidjan (Frédéric Bruly Bouabré).
A exposição centra-se em obras que dão forma, em particular, à incerteza contemporânea acerca do lugar da arte na sociedade contemporânea e, de uma maneira geral, às incertezas culturais e políticas da época. Assim, nem inclui obras que pretendem oferecer novas (velhas) certezas (por exemplo, o regresso a tradições e mitologias locais, formas de arte estabelecidas e representadas na Transavanguardia italiana, na Wilde Malerei alemã, ou a obra de americanos como Julian Schnabel, David Salle e Eric Fischl), nem inclui obras que reagem com um distanciamento cínico à situação contemporânea (Jeff Koons). Aquilo a que aqui se assiste (após o período da arte conceptual, baseada na linguagem dos anos 70) é o regresso do objecto – mas um objecto que gera um lugar suspenso, um lugar sem lugar, o não-lugar da atopia. Assiste--se ainda ao regresso do corpo – mas um corpo fragmentado, traumatizado, hibidrizado. Nessa medida “Anos 80: Uma Topologia” apresenta – em contradição com algumas das leituras comuns na década – uma perspectiva particular e partidária sobre um período rico em obras enformadas por referências críticas à arte mais avançada dos anos 60 e 70 (e não o seu desprezo ou a sua rejeição), criando novas constelações com base em precedentes da história recente.”


A acompanhar a exposição, um excelente volume antológico foi colocado á disposição do público e do leitor interessado. Como sempre, nas publicações saídas da Fundação Serralves, uma obra de referência, de consulta obrigatória
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