segunda-feira, julho 17, 2006


“AS FILHAS DO BOTÂNICO”

“Les Filles du Botaniste” é uma realização de Sijie Dai, que nasceu na China (2.3.1954), em Putian, estudou História ainda na China e depois em Paris (Sorbonne) e cinema no IDHEC. Iniciou a carreira como escritor de certo sucesso em França, sobretudo com o romance “Balzac et la Petite Tailleuse Chinoise”, que adaptou ao cinema, em 2002. Antes deste título assinara “Chine, ma Douleur” (1989), Le Mangeur de la Lune (1994) e Tang le Onzième (1998).
“Balzac et la Petite Tailleuse Chinoise” é, até agora, a sua obra mais conhecida. Cinco prémios literários, venda em dezanove países, adaptação ao cinema, com passagem por Cannes, tudo isto para contar a história de dois jovens chineses, apanhados nas malhas da revolução cultural maoista, que são enviados para um campo de “re-educação” (o que aconteceu ao próprio Dai Sijie, entre 1966 e 1971). Exilado em Paris, Sijie Dai não tem o que se chama boas recordações da sua China natal. “Les Filles du Botaniste” volta a comprová-lo.

Estamos na década de 80, do século passado, mas o cenário e as personagens parecem evoluir numa Idade Média perigosamente real. Min, órfã desde os três anos, quando um tremor de terra lhe mata os pais, vive durante anos num orfanato. Um dia sai dali para ser estagiária de um célebre professor botânico, que mora desterrado do mundo, com An, uma abnegada filha que cuida do jardim, das plantas e sementes, e do pai. O botânico é homem austero, seco, rígido na pontualidade e na disciplina, amante das suas plantas, mas pouco dado a grandes emoções com os seus semelhantes. A estagiária traz-lhe, sem disso se aperceber, o melhor presente possível, um pássaro que não se cansa de repetir, sem ironia, “Viva o Presidente Mão!” Alias, ironia é algo que não há por aqueles lados. Nem ironia, nem sentimentos. Uma órfã de facto e uma órfã por circunstância encontram-se, acham-se atraentes (o que não é difícil, são-no mesmo) e acabam a esfregar as costas uma à outra, prosseguindo depois noutras intimidades que as deixam à beira do êxtase. Ou mesmo em plena erupção do êxtase. Compreende-se. Mas há pelo meio umas derivações que estragam o romance: Mr. Chen, o botânico, também tem um filho no exército, de nome Dan, que um dia regressa do Tibete (outra piscadela de olho) e se descobre igualmente muito agradado pela beleza de Min. Obviamente, Mr. Chen que quer o melhor para os filhos, desde que dentro da normalidade, quer Min para Dan, e o casamento realiza-se, perante a infelicidade do elenco feminino. Em viagem de núpcias, Min queria a companhia de An, mas Dan não quer e fica furioso quando, nessa noite, descobre que Min já não é virgem. Conversa daqui, bofetada dalém, pendura Min pelos braços do tecto e regressa ao Tibete (supõe-se, onde todos são virgens!). Neste entretém, Min regressa An, a coisa compõem-se (compõe-se até muito bem, devo dizer!), até ao dia em que Mr. Chen deixa de ter patas de pato para comer, e o jornal para ler, porque a filha anda completamente na lua. E assim, uma noite, ao procurar um medicamento para o coração, acaba por ir ter a um ataque de coração fatal, quando descobre Min e An a lavar as costas uma da outra, por entre vapores que não disfarçavam o acto. Mas Mr. Chen, antes de morrer, ainda tem tempo de acusar as amantes do crime e enviá-las para a morte, através de um “justo e sereno julgamento” das autoridades maoistas da época, que não toleravam esses amores “anti-naturais”.
Pois que a homossexualidade não era tolerada na China e era punida com a pena de morte, eis algo que é, no mínimo, interessante saber. Este caso poderia ser paradigmático, se o realizador não fosse tão retórico (o tremor de terra, o orfanato, o pai autoritário e prepotente, as raízes de Ginsen tão fálicas, as plantas carnívoras tão sexy, o militar bruto como as portas, o Tibete como referência de ocupação, etc. etc.). Sijie Dai tem medo que o espectador não perceba tudo e vai distribuindo pistas. Depois, transforma este jardim das delícias num cenário das mil e uma noites que chateia de tão rebuscado e decorativosinho. As meninas lambuzam-se ao som de uma musiquinha piegas que nunca mais acaba. Os rodriguinhos sucedem-se. O filme termina por se afundar com eles. Se o tema não fosse sério, quase apetecia gritar: “Viva o presidente Mao!” Entediante, é o termo.

AS FILHAS DO BOTÂNICO (“Les Filles du Botaniste” ou “The Chinese Bothanist's Daughters”), de Sijie Dai (França, Canadá, 2006), com Mylène Jampanoï, Xiao Ran Li, Fu Ling Dong, etc. 105 min.; M/16 anos.

1 comentário:

Anónimo disse...

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