“The Pillow Man”, de Martin McDonagh, é uma peça de teatro particularmente interessante nos temas que aborda, mas também muito inquietante na sua formulação. De todas as formas é um magnífico espectáculo de teatro, com uma forte e austera encenação de Tiago Guedes (mais conhecido como realizador de televisão e cinema: a ele se deve, por exemplo, a co-autoria de “Coisa Ruim”) e uma interpretação de uma qualidade média acima do normal em palcos portugueses, assinada por Albano Jerónimo, Gonçalo Waddington, João Pedro Vaz, e Marco D’Almeida.
Deduz-se do desenrolar da peça que nos encontramos num país europeu, debaixo de uma ditadura. Numa delegação da polícia, um escritor de histórias infantis, é interrogado. Ele escrevera algumas histórias para crianças bem perversas e outras de um sadismo inequívoco. Agora os agentes da autoridade confrontam-no com a semelhança das suas histórias e três mortes de crianças ocorridas recentemente. O interrogatório é violento, toda a peça é de um a tensão dramática quase insustentável. As histórias de Katurian, o escritor, vão sendo lidas, as versões dos crimes vão-se descobrindo, e uma das mais emblemáticas é mesmo a historio do “Homem Almofada” que convida as crianças a suicidarem-se, para assim não passarem por vidas de sofrimento que se avizinham. O homem almofada acabará por actuar no próprio irmão do escritor, que sofre de um atraso mental, se encontra fechado em casa, excepto dos dias em que resolve tornar reais as ficções de Katurian.
A construção dramática é simultaneamente simples e complexa, com vários registos de narrativas interligados, mas a encenação de Tiago Guedes torna-a clara sem a banalizar, muito pelo contrário. A direcção de actores é, também ela, muito boa, com destaque para os dois protagonistas.
O inquietante nesta história são as conclusões que a peça pode levar o espectador a retirar. Legitimamente. Que os Estados totalitários, servidos por polícias fortes, até têm razão de existir, tais as taras dos cidadãos que povoam as cidades e cometem crimes horrendos; que a arte deve ser regulada, seguida (censurada?) pois a perversidade de alguns criadores, pode levar cidadãos pouco preparados a re-inventar na realidade essas perversidades lidas, ouvidas, vistas.
Uma peça que justificaria um amplo debate, tanto mais que vai ficar seguramente como um dos grandes espectáculos encenados em 2006 nos palcos portugueses.
A nova direcção do Maria Matos (Diogo Infante, e quem o escolheu) está de parabéns pela forma como deu a volta a uma sala que se tornou excelente, agora com magnificas condições e uma boa programação.
Martin McDonagh é irlandês e escreveu antes de “The Pillow Man”, “The Cripple of Innishman”, “The Beauty Queen of Leenane”, “A Skull in Connemara”, “The Lieutenant of Inishmore” e “The Lonesome West”, afirmando-se como um dos grades dramaturgos actuais de língua inglesa, com uma propensão muito forte para temas violentos e humor negro.
“The Pillowman” estreou a 7 de Setembro no Teatro Municipal Maria Matos e estará em cena até 15 de Outubro, no horário de 4ª a sábado às 21h30, domingos às 17h00.
Encenação e tradução: Tiago Guedes; Interpretação: Albano Jerónimo, Gonçalo Waddington, João Pedro Vaz, e Marco D’Almeida; Cenário e animação: Jerónimo Rocha, Joana Faria, Nico Guedes; Figurinos: Carolina Espírito Santo; Música original: Hugo Leitão; Desenho de luz: José Álvaro Correia; Produção Teatro Maria Matos 2006; duração do espectáculo. 120 min; classificação M/16 anos.
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