sexta-feira, abril 20, 2007

FUTEBOL: "GERIR O RESULTADO"

GERIR O RESULTADO

E MATAR O ESPECTÁCULO



O futebol é um espectáculo, antes de tudo o mais.
Um espectáculo a que o público assiste nos estádios, pagando bilhetes caros, ou que assiste em casa, pela televisão, na maior partes dos casos em canais codificados, pagos, e que não são baratos.
Tal como outro espectáculo qualquer tem um tempo de duração delimitado: normalmente 90 minutos, podendo por vezes ir até aos 120, ou mesmo mais, se há lugar à marcação de grandes penalidades.
Começa a ser prática corrente, no entanto, de há uns anos a esta parte, comentadores opinarem, treinadores, jogadores e directores explicarem o porquê do espectáculo não ter a duração inicialmente anunciada: após 20 minutos de muito bom futebol, a equipa Y “geriu o resultado”, “economizou esforços”, “deixou passar o tempo”, e etc. Sim, porque no próximo fim de semana “se avizinha um jogo difícil”, “porque jogaram duas vezes na mesma semana”, porque “o plantel é reduzido e há que compensá-lo”, etc.
Ora bem, o espectador paga um bilhete para ver um jogo com 90 minutos de espectáculo, não para ver 20 minutos do bom futebol e 70 de ronceirice. Há dois dias vi o meu Sporting, à semelhança de outros jogos seus, e de muitos outros jogos de outras equipas, oferecer-me 20 minutos de muito bom futebol, que arrasou o Beira Mar, e depois prolongar o sofrimento por mais 70 minutos de “faz de conta que estou aqui”. Estava entusiasmado de início, adormeci a meio, e no final roía as unhas na perspectiva de uma catástrofe. Não pode ser!
Vamos lá analisar o problema:
1º Os jogadores são muito bem pagos porque têm uma vida profissional curta e intensa: certo!
2º Os bilhetes são caros, porque tudo é dispendioso nesta indústria: certo!
3º Os espectadores querem bons espectáculos, ou afastam-se dos estádios (não falando já das ordinarices das claques e da violência dos energúmenos, o que motivaria um outro comentário): certo!
4º Por que jogam as equipas duas vezes na semana? Por abaixo-assinado do público e porque o futebol é uma indústria cara, que necessita cada vez mais de receitas? Obviamente que a resposta é a segunda: certo!
5º Se jogam duas vezes por semana é para os clubes terem mais receitas para poderem comprar e pagar melhores jogadores, com melhores contratos e ordenados, para poderem dar melhores espectáculos e conquistarem títulos. Ora só uma equipa pode ganhar o campeonato, mas todas devem dar o máximo como espectáculo: certo!
6º O que sucede é uma perversidade enorme que coloca do avesso toda a lógica de um espectáculo: “hoje só jogamos 20 minutos no máximo das nossas possibilidades, para que o senhor espectador nos venha ver no próximo fim-de-semana dar outra vez 20 minutos (ou o que for) do nosso máximo.” E o senhor espectador volta a pagar um bilhete para ver um espectáculo de que só vê uma parte. Algo como ir ao cinema assistir ao anunciado “Miami Vice” e ver uma excelente curta-metragem sobre Miami e o Vice, e depois passarem a restante hora e meia a projectar publicidade. Ou como comprar bilhete para uma peça de teatro, ou um concerto, e o actor principal, ou o cantor, dar meia hora ao seu melhor e depois deixar o palco solitário ou o concerto entregue à orquestra: o actor ou o cantor “foram descansar que amanhã tem outro concerto! De grande responsabilidade!” O público que compreenda, não se pode estar sempre a cem por cento: errado!
Enfim, algo que não entra na cabeça de ninguém!
Apetece dizer: se não podem jogar ao sábado e à quarta, que optem por jogar apenas um dia por semana, mas que o façam com total profissionalismo. Não têm tantas receitas? Pois não, mas não enganam tanto o público.
Os estádios estão cada vez mais vazios. Não percebem porquê? A questão não será tanto baixar o preço dos bilhetes (o que ajudava), mas subir a qualidade geral do espectáculo: conforto nas bancadas, segurança, desportivismo na convivência, e profissionalismo no desempenho.
Última nota: para cúmulo, acho que não são os jogadores que têm a culpa maior. Mas todo este circo que anda à volta deles, a estimular esta forma de vida. “Estranha forma de vida”.
Quanto ao meu Sporting, se não tivesse economizado esforços nalguns jogos, “gerindo os primeiros 45 minutos” na ideia de que “somos melhores e havemos de lá chegar”, hoje estavam com o campeonato na mão. Mas perder com Paços de Ferreira e empatar com Aves, em casa, não pode acontecer, nem com a ajuda da mão de Deus e seja lá de que jogador e de que árbitro complacente.
Ontem dormi meia hora a ver futebol, a ver o meu Sporting, e acordei rabugento, é a verdade! Futebol sudorífero, francamente!, era só o que faltava!

1 comentário:

Ana Paula Sena disse...

O futebol já não é o que era! lol
À semelhança de muitas outras coisas, é agora muito científico. :)
A.P.