
Anteriormente, porém, em 1977, Nixon pretendeu organizar um regresso à vida pública, procurando de alguma forma recuperar a imagem perdida. Foi por isso que aceitou encontrar-se com David Frost, apresentador de shows de variedades e entrevistador de celebridades mediáticas, que tivera alguns programas de certo sucesso em Inglaterra, mas que caíra em desgraça e se encontrava então na Austrália. Forst e Nixon eram por esse tempo “anjos caídos” que viviam tempos de exílio forçado. Ambos combatentes de têmpera, ambos pretendiam um regresso em grande. As seis entrevistas que ficaram combinadas (por um chorudo pagamento de 600 mil dólares, quase todos saídos do bolso de Frost) seriam, portanto, um combate público em que só poderia “haver um vencedor”. Ou um “combate combinado” que assim teria dois vencedores, o que também chegou a ser ventilado nesse momento.


Mas o filme pode (e deve) ser visto ainda sob outros pontos de vista, nomeadamente o das relações entre os meios de comunicação social e o poder instituído. Nixon era pessoa que, a bem ou a mal, “sabia” tratar com a comunicação social. Os seus processos eram quase sempre mafiosos, mas o filme relembra como “as coisas” se podem estruturar. A começar desde logo pelo próprio caso Watergate, que, na base, tem precisamente este problema: como calar certas vozes incómodas da oposição nos jornais? Foi para saber como que colaboradores da Casa Branca resolveram entrar em instalações do Partido Democrata para recolher informações. Ao serem descobertos, desbloquearam toda a tramóia que haveria de liquidar Nixon.

A forma como a televisão (e toda a comunicação social por arrasto) dialoga com o poder é outra questão delicada que o filme aborda, com alguma subtileza, mas mostrando bem o jogo de influências, sobretudo quando se apostam fortunas numa transmissão e se arriscam carreiras. O início da obra é esclarecedor, desvendando os mecanismos que estão na base dos projectos e como os mesmos se montam ou desmontam.

Retirado de uma peça de teatro de Peter Morgan, que também a adaptou a cinema, “Frost/Nixon” não perde esse intimismo de “filme de câmara”, conseguindo sustentar o confronto (“aproxima-te mais dele, para o intimidares, olha-o nos olhos, interrompe-o para o enervares, não o deixes monologar sobre o que quer”, aconselham os colaboradores de Frost ao apresentador, que até aí garantia a Nixon muito à vontade). A adaptação é por isso boa, mantendo certamente as virtualidades da peça que foi sucesso em Londres e na Broadway, procurando novos valores narrativos, sem desvirtuar o essencial. Informação adicional: Frank Langela e Michael Sheen também interpretavam os mesmos papéis no teatro que agora recriam no cinema.

Resumindo: não será o grande cinema norte americano, mas é definitivamente o cinema norte americano liberal, que investiga, que denuncia, que tenta clarificar, tomar partido, defender causas, e mostrar que, no final, numa democracia, por muitos erros que se cometam, há sempre mecanismos que permitem de alguma forma remediar o mal. Claro que para quem não acredita nas democracias representativas, este filme não faz mais do que salvar a face. Aceitamos até a crítica, desde que nos mostrem alternativas, e alternativas viáveis. Mas não serão certamente exemplos do passado, carregados de prepotência, tortura e morte, que nos irão fazer mudar de ideias. Por isso achamos este filme um bom exemplo do que o cinema pode fazer para interferir na realidade e ajudá-la a mudar, para melhor.

Curiosidade suplementar; parece que este projecto antes de ser entregue a Ron Howard passou por várias mãos que o cobiçavam: Martin Scorsese, Mike Nichols, George Clooney, Sam Mendes ou Bennett Miller foram alguns.
FROST/NIXON
Título original: Frost/Nixon
Realização: Ron Howard (EUA, França, Inglaterra, 2008); Argumento: Peter Morgan, segundo peça de teatro de sua autoria; Produção: Tim Bevan, William M. Connor, Eric Fellner, Brian Grazer, Todd Hallowell, Ron Howard, Kathleen McGill, Peter Morgan, Louisa Velis; Música: Hans Zimmer; Fotografia (cor): Salvatore Totino; Montagem: Daniel P. Hanley, Mike Hill; Casting: Janet Hirshenson, Jane Jenkins; Design de produção: Michael Corenblith; Direcção artística: Brian O'Hara, Gregory Van Horn; Decoração: Susan Benjamin; Guarda-roupa: Daniel Orlandi; Maquilhagem: Colleen Callaghan, Edouard F. Henriques, Elizabeth Hoel, Karyn Huston, Sabine Roller, Justin Stafford; Direcção de Produção: Kathleen McGill; Assistentes de realização: William M. Connor, Todd Hallowell, Scott R. Meyers, Kristen Ploucha, Scott Schaeffer; Departamento de arte: Lorrie Campbell, Chad S. Frey; Som: Anthony J. Ciccolini III, Teri E. Dorman, Gary A. Hecker, Solange S. Schwalbe; Efeitos especiais: Chad Baalbergen, Jeff Miller; Efeitos visuais: Eric J. Robertson; Companhias de produção: Imagine Entertainment, Relativity Media, Studio Canal, Working Title Films; Intérpretes: Frank Langella (Richard Nixon), Michael Sheen (David Frost), Sam Rockwell (James Reston, Jr.), Kevin Bacon (Jack Brennan), Matthew Macfadyen (John Birt), Oliver Platt (Bob Zelnick), Rebecca Hall (Caroline Cushing), Toby Jones (Swifty Lazar), Andy Milder (Frank Gannon), Kate Jennings Grant (Diane Sawyer), Gabriel Jarret (Ken Khachigian), Jim Meskimen (Ray Price), Patty McCormack (Pat Nixon), Geoffrey Blake, Clint Howard, Rance Howard, Gavin Grazer, Simon James, Eloy Casados, Jay White, Wil Albert, Keith MacKechnie, Penny L. Moore, Janneke Arent, David Ross Paterson, Jennifer Hanley, Robert Pastoriza, Louie Mejia, Kevin P. Kearns, David Kelsey, James Ritz, Pete Rockwell, Ned Vaughn, Simone Kessell, Ben Pauley, Noah Craft, Talley Singer, Kaine Bennett Charleston, Gregory Alpert, Kimberly Robin, Michelle Manhart, Steve Kehela, Antony Acker, Jenn Gotzon, Googy Gress, Marc McClure, Joe Spano, etc. Duração: 122 minutos; Distribuição em Portugal: Lusomundo; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 22 de Janeiro de 2009.
FROST/NIXON
Título original: Frost/Nixon
Realização: Ron Howard (EUA, França, Inglaterra, 2008); Argumento: Peter Morgan, segundo peça de teatro de sua autoria; Produção: Tim Bevan, William M. Connor, Eric Fellner, Brian Grazer, Todd Hallowell, Ron Howard, Kathleen McGill, Peter Morgan, Louisa Velis; Música: Hans Zimmer; Fotografia (cor): Salvatore Totino; Montagem: Daniel P. Hanley, Mike Hill; Casting: Janet Hirshenson, Jane Jenkins; Design de produção: Michael Corenblith; Direcção artística: Brian O'Hara, Gregory Van Horn; Decoração: Susan Benjamin; Guarda-roupa: Daniel Orlandi; Maquilhagem: Colleen Callaghan, Edouard F. Henriques, Elizabeth Hoel, Karyn Huston, Sabine Roller, Justin Stafford; Direcção de Produção: Kathleen McGill; Assistentes de realização: William M. Connor, Todd Hallowell, Scott R. Meyers, Kristen Ploucha, Scott Schaeffer; Departamento de arte: Lorrie Campbell, Chad S. Frey; Som: Anthony J. Ciccolini III, Teri E. Dorman, Gary A. Hecker, Solange S. Schwalbe; Efeitos especiais: Chad Baalbergen, Jeff Miller; Efeitos visuais: Eric J. Robertson; Companhias de produção: Imagine Entertainment, Relativity Media, Studio Canal, Working Title Films; Intérpretes: Frank Langella (Richard Nixon), Michael Sheen (David Frost), Sam Rockwell (James Reston, Jr.), Kevin Bacon (Jack Brennan), Matthew Macfadyen (John Birt), Oliver Platt (Bob Zelnick), Rebecca Hall (Caroline Cushing), Toby Jones (Swifty Lazar), Andy Milder (Frank Gannon), Kate Jennings Grant (Diane Sawyer), Gabriel Jarret (Ken Khachigian), Jim Meskimen (Ray Price), Patty McCormack (Pat Nixon), Geoffrey Blake, Clint Howard, Rance Howard, Gavin Grazer, Simon James, Eloy Casados, Jay White, Wil Albert, Keith MacKechnie, Penny L. Moore, Janneke Arent, David Ross Paterson, Jennifer Hanley, Robert Pastoriza, Louie Mejia, Kevin P. Kearns, David Kelsey, James Ritz, Pete Rockwell, Ned Vaughn, Simone Kessell, Ben Pauley, Noah Craft, Talley Singer, Kaine Bennett Charleston, Gregory Alpert, Kimberly Robin, Michelle Manhart, Steve Kehela, Antony Acker, Jenn Gotzon, Googy Gress, Marc McClure, Joe Spano, etc. Duração: 122 minutos; Distribuição em Portugal: Lusomundo; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 22 de Janeiro de 2009.
2 comentários:
Este foi uma surpresa total, para mim!
Os actores são excelentes. O Frank Langella é extraordinario. A música é boa e o filme é bem feito.
No final, ainda me espicaçou para andar à procura sobre o caso Watergate, do qual não sabia quase nada...
Continuação do abraço, do
Helder
É interessante saber que os dois actores principais foram aqueles que interpretaram esta história no teatro. Uma mais valia para o filme. Aliás, penso que Howard só aceitou realizar este filme se contemplasse Langella e Sheen.
Enviar um comentário