SABINA FREIRE
Manuel Teixeira Gomes, que foi Presidente da República de Portugal entre 6 de Outubro de 1923 e 11 de Dezembro de 1925, nasceu a 27 de Maio de 1860, em Vila Nova de Portimão. Passou a sua meninice num meio burguês e rico, “numa casa espaçosa e cheia de conforto, sol e flores”. Filho de José Libânio Gomes, comerciante de figos secos, e de Maria da Glória Teixeira Gomes, foi educado pelos pais até entrar no Colégio de São Luís Gonzaga, em Portimão. Aos 10 anos é enviado para o Seminário de Coimbra, frequentando depois a Universidade, onde estuda Medicina. Abandona a universidade, viajando para Lisboa, onde irá dar livre curso às suas inclinações artísticas e a uma vida de certa boémia, entrando no círculo de Fialho de Almeida e João de Deus e conhecendo diversos vultos da cultura literária da época, como Marcelino Mesquita, Gomes Leal e António Nobre.
O pai continuou a apoiá-lo financeiramente, permitindo que Manuel Teixeira Gomes prossiga uma carreira ligada às artes, na literatura, na pintura ou na escultura, acabando por se dedicar à literatura, tornando-se todavia amigo de grandes mestres, como Columbano Bordalo Pinheiro ou Marques de Oliveira. Depois passa ao Porto, onde conhece Sampaio Bruno, tendo colaborado em revistas e jornais, entre eles "O Primeiro de Janeiro" e "Folha Nova" (e “A Luta”, em Lisboa).
Viaja por quase toda a Europa, norte de África e Próximo Oriente, quase sempre em representação comercial da família, para negociar os produtos agrícolas produzidos pelas propriedades do pai (frutos secos, nomeadamente amêndoa e figo). "Fiz-me negociante, ganhei bastante dinheiro e durante quase vinte anos viajei, passando em Portugal poucos meses." (escreve em "Miscelânea"). Após a implantação da República, é nomeado ministro plenipotenciário de Portugal em Inglaterra. Em 11 de Outubro de 1911 apresenta as suas credenciais ao rei Jorge V do Reino Unido, em Londres, cidade onde então se encontrava a família real portuguesa no exílio. A sua simpatia e afabilidade, a sua cultura e civilidade fizeram dele um conviva requisitado, até nos palácios reais.
É de Paris que Afonso Costa sugere a candidatura de Manuel Teixeira Gomes, representante do Partido Democrático. Foi eleito Presidente da República a 6 de Agosto de 1923, viria a demitir-se das suas funções a 11 de Dezembro de 1925, num contexto de grande perturbação política e social. A sua vontade em dedicar-se exclusivamente à literatura foi a sua justificação oficial para a renúncia. Escreveu: "A política longe de me oferecer encantos ou compensações converteu-se para mim, talvez por exagerada sensibilidade minha, num sacrifício inglório. Dia a dia, vejo desfolhar, de uma imaginária jarra de cristal, as minhas ilusões políticas. Sinto uma necessidade, porventura fisiológica, de voltar às minhas preferências, às minhas cadeiras e aos meus livros."
A 17 de Dezembro de 1925, embarca no paquete holandês "Zeus" rumo a Bougie (Argélia), que ele considerava "uma Sintra à beira-mar”, num auto-exílio voluntário, mantendo-se depois sempre opositor frontal ao regime de Salazar, nunca regressando em vida a Portugal. Morreu em 1941 e só em Maio de 1950 os seus restos mortais voltaram à Pátria. As filhas, Ana Rosa Teixeira Gomes Calapez e Maria Manuela Teixeira Gomes Pearce de Azevedo estiveram presentes na cerimónia de "regresso", uma ocasião que veio a tornar-se numa das mais controversas manifestações populares ocorridas na já cidade de Portimão nos tempos da ditadura de Salazar.
Deixou uma importante obra literária, integrada em correntes da época, decadentistas, nefelibatas e uranista (termo que na altura procurava definir uma tendência para a homossexualidade masculina). Há quem levante suposições sobre as suas inclinações sexuais, mas sabe-se que, aos 39 anos, Manuel Teixeira Gomes amou uma bela jovem algarvia de quem terá duas filhas. Chamava-se Belmira das Neves e era oriunda de uma família de pescadores, o que, para a família de Teixeira Gomes terá causado engulhos ao casamento.
Teixeira Gomes terá talvez marcado mais a literatura do que a política. Em 1899 publica "Inventário de Junho", em 1904 "Agosto Azul" e em 1909 "Gente Singular". Toda a sua obra literária está repassada de figuras algarvias (é considerado o escritor do Algarve). A primeira namorada era de Ferragudo, personagens suas são de Aljezur ou Bensafrim, "Sabina Freire" é uma viúva de Portimão.
Manuel Teixeira Comes é uma excepção no panorama dos presidentes da 1ª República. Todas as noites jogava às cartas com o seu secretário. Há quem o considere “um "Corto Maltese" (com mais uns anos) que passa pelo Palácio de Belém até concluir que uma tarefa não era para ele.”
Principais obras: Cartas sem Moral Nenhuma (1904), Agosto Azul (1904), Sabina Freire (1905), Desenhos e Anedotas de João de Deus (1907), Gente Singular (1909), Cartas a Columbano (1932), Novelas Eróticas (1935), Regressos (1935), Miscelânea (1937), Maria Adelaide (1938) ou Carnaval Literário (1938).
“Sabina Freire” é pois de 1905. Crítica severa a costumes políticos e sociais, expressa-se como um drama a roçar o melodrama, e é como tal que deve ser visto. A história põe frente a frente duas mulheres, Sabina Freire e Maria Freire, uma nora, outra sogra, que têm pelo meio o marido e filho, Júlio Freire, que se vê envolvido num conflito fatal de ódios à flor da pele. Maria Freire é uma latifundiária provinciana, algarvia, conservadora, puritana e austera, e Sabina Freire é todo o contrário, uma sequiosa hedonista, irrequieta e temperamental, provocadora e sedutora. Pelo meio, oportunistas e medíocres representantes da política, e dos serviços. O combate faz-se entre as duas mulheres, e todos os outros são personagens secundárias. É um combate sem tréguas. Que conduzirá à tragédia. Esta é uma peça que só assim se pode entender.
Foi esta peça que, em 2009, as companhias do Theatro Circo (Braga) e a do Teatro da Cerca de São Bernardo (Coimbra) levaram à cena, em co-produção, com encenação de Rui Madeira, e interpretação de um elenco constituído por Solange Sá (Sabina), Sílvia Brito (Maria Freire), André Laires (Júlio), Ricardo Kalash (Epifânio), Jaime Soares (Dr. Fino), Carlos Feio (Padre Correia e Procurador Ferreira), António Jorge (Augusto César e Ministro), Miguel Magalhães (Josezinho Soares), Lina Nóbrega (Josefina). O resultado não podia ter sido mais confrangedoramente dramático, pelas premissas que lhe falsearam o caminho. Transformando o melodrama em grotesca paródia, com personagens caricaturais, e dando ao todo um pretensioso sentido jocoso, perde-se todo o sentido e fica um artificioso enredo que é doloroso acompanhar. Neste equívoco total, difícil é descortinar se o elenco tem ou não valor, ainda que, aqui e ali, pareça existir material humano digno de outros voos. A vontade de modernizar a todo o custo, de facilitar ao gosto do público, quase sempre dá maus resultados. É o caso.
(algumas notas sobre Manuel Teixeira Gomes foram recolhidas do site da Presidência da República, dedicado a “Antigos Presidentes”)
O pai continuou a apoiá-lo financeiramente, permitindo que Manuel Teixeira Gomes prossiga uma carreira ligada às artes, na literatura, na pintura ou na escultura, acabando por se dedicar à literatura, tornando-se todavia amigo de grandes mestres, como Columbano Bordalo Pinheiro ou Marques de Oliveira. Depois passa ao Porto, onde conhece Sampaio Bruno, tendo colaborado em revistas e jornais, entre eles "O Primeiro de Janeiro" e "Folha Nova" (e “A Luta”, em Lisboa).
Viaja por quase toda a Europa, norte de África e Próximo Oriente, quase sempre em representação comercial da família, para negociar os produtos agrícolas produzidos pelas propriedades do pai (frutos secos, nomeadamente amêndoa e figo). "Fiz-me negociante, ganhei bastante dinheiro e durante quase vinte anos viajei, passando em Portugal poucos meses." (escreve em "Miscelânea"). Após a implantação da República, é nomeado ministro plenipotenciário de Portugal em Inglaterra. Em 11 de Outubro de 1911 apresenta as suas credenciais ao rei Jorge V do Reino Unido, em Londres, cidade onde então se encontrava a família real portuguesa no exílio. A sua simpatia e afabilidade, a sua cultura e civilidade fizeram dele um conviva requisitado, até nos palácios reais.
É de Paris que Afonso Costa sugere a candidatura de Manuel Teixeira Gomes, representante do Partido Democrático. Foi eleito Presidente da República a 6 de Agosto de 1923, viria a demitir-se das suas funções a 11 de Dezembro de 1925, num contexto de grande perturbação política e social. A sua vontade em dedicar-se exclusivamente à literatura foi a sua justificação oficial para a renúncia. Escreveu: "A política longe de me oferecer encantos ou compensações converteu-se para mim, talvez por exagerada sensibilidade minha, num sacrifício inglório. Dia a dia, vejo desfolhar, de uma imaginária jarra de cristal, as minhas ilusões políticas. Sinto uma necessidade, porventura fisiológica, de voltar às minhas preferências, às minhas cadeiras e aos meus livros."
A 17 de Dezembro de 1925, embarca no paquete holandês "Zeus" rumo a Bougie (Argélia), que ele considerava "uma Sintra à beira-mar”, num auto-exílio voluntário, mantendo-se depois sempre opositor frontal ao regime de Salazar, nunca regressando em vida a Portugal. Morreu em 1941 e só em Maio de 1950 os seus restos mortais voltaram à Pátria. As filhas, Ana Rosa Teixeira Gomes Calapez e Maria Manuela Teixeira Gomes Pearce de Azevedo estiveram presentes na cerimónia de "regresso", uma ocasião que veio a tornar-se numa das mais controversas manifestações populares ocorridas na já cidade de Portimão nos tempos da ditadura de Salazar.
Deixou uma importante obra literária, integrada em correntes da época, decadentistas, nefelibatas e uranista (termo que na altura procurava definir uma tendência para a homossexualidade masculina). Há quem levante suposições sobre as suas inclinações sexuais, mas sabe-se que, aos 39 anos, Manuel Teixeira Gomes amou uma bela jovem algarvia de quem terá duas filhas. Chamava-se Belmira das Neves e era oriunda de uma família de pescadores, o que, para a família de Teixeira Gomes terá causado engulhos ao casamento.
Teixeira Gomes terá talvez marcado mais a literatura do que a política. Em 1899 publica "Inventário de Junho", em 1904 "Agosto Azul" e em 1909 "Gente Singular". Toda a sua obra literária está repassada de figuras algarvias (é considerado o escritor do Algarve). A primeira namorada era de Ferragudo, personagens suas são de Aljezur ou Bensafrim, "Sabina Freire" é uma viúva de Portimão.
Manuel Teixeira Comes é uma excepção no panorama dos presidentes da 1ª República. Todas as noites jogava às cartas com o seu secretário. Há quem o considere “um "Corto Maltese" (com mais uns anos) que passa pelo Palácio de Belém até concluir que uma tarefa não era para ele.”
Principais obras: Cartas sem Moral Nenhuma (1904), Agosto Azul (1904), Sabina Freire (1905), Desenhos e Anedotas de João de Deus (1907), Gente Singular (1909), Cartas a Columbano (1932), Novelas Eróticas (1935), Regressos (1935), Miscelânea (1937), Maria Adelaide (1938) ou Carnaval Literário (1938).
“Sabina Freire” é pois de 1905. Crítica severa a costumes políticos e sociais, expressa-se como um drama a roçar o melodrama, e é como tal que deve ser visto. A história põe frente a frente duas mulheres, Sabina Freire e Maria Freire, uma nora, outra sogra, que têm pelo meio o marido e filho, Júlio Freire, que se vê envolvido num conflito fatal de ódios à flor da pele. Maria Freire é uma latifundiária provinciana, algarvia, conservadora, puritana e austera, e Sabina Freire é todo o contrário, uma sequiosa hedonista, irrequieta e temperamental, provocadora e sedutora. Pelo meio, oportunistas e medíocres representantes da política, e dos serviços. O combate faz-se entre as duas mulheres, e todos os outros são personagens secundárias. É um combate sem tréguas. Que conduzirá à tragédia. Esta é uma peça que só assim se pode entender.
Foi esta peça que, em 2009, as companhias do Theatro Circo (Braga) e a do Teatro da Cerca de São Bernardo (Coimbra) levaram à cena, em co-produção, com encenação de Rui Madeira, e interpretação de um elenco constituído por Solange Sá (Sabina), Sílvia Brito (Maria Freire), André Laires (Júlio), Ricardo Kalash (Epifânio), Jaime Soares (Dr. Fino), Carlos Feio (Padre Correia e Procurador Ferreira), António Jorge (Augusto César e Ministro), Miguel Magalhães (Josezinho Soares), Lina Nóbrega (Josefina). O resultado não podia ter sido mais confrangedoramente dramático, pelas premissas que lhe falsearam o caminho. Transformando o melodrama em grotesca paródia, com personagens caricaturais, e dando ao todo um pretensioso sentido jocoso, perde-se todo o sentido e fica um artificioso enredo que é doloroso acompanhar. Neste equívoco total, difícil é descortinar se o elenco tem ou não valor, ainda que, aqui e ali, pareça existir material humano digno de outros voos. A vontade de modernizar a todo o custo, de facilitar ao gosto do público, quase sempre dá maus resultados. É o caso.
(algumas notas sobre Manuel Teixeira Gomes foram recolhidas do site da Presidência da República, dedicado a “Antigos Presidentes”)
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