quarta-feira, novembro 06, 2013

POLÍTICA E FOME


UM ANO SEM COMER PARA PAGAR A DÍVIDA
No “Público” de ontem podia ler-se:  - O ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, que na noite desta segunda-feira esteve em Ovar numa sessão de esclarecimento sobre o Orçamento do Estado para 2014, garante que não é através da injecção de dinheiro na economia que o país cresce. "A pura injecção de dinheiro na economia provoca distorção no sistema produtivo. A economia recupera quando há trabalho bem orientado e quando se consegue ser competitivo".
E continuava: - Para Nuno Crato, os sinais "ténues" de crescimento não podem ser ignorados. "Portugal entrou numa espiral responsável", refere. Mas antes, o governante lembrou que, neste momento, os portugueses teriam de "trabalhar mais de um ano sem comer e sem utilizar transportes só para pagar a dívida". "Estamos no sistema monetário do euro, não temos uma máquina de imprimir dinheiro", avisa o ministro, que faz questão de lembrar os sinais positivos.
Muito bem. Devo dizer que tinha a maior consideração por Nuno Crato, antes dele assumir a pasta de Ministro. Devo acrescentar que compreendo a frase e o significado da metáfora "trabalhar mais de um ano sem comer e sem utilizar transportes só para pagar a dívida". Mas também acho que se poderiam criar outras comparações, de belo recorte literário, para se chegar ao mesmo efeito dramático: “quantos lucros de grandes empresas seria necessário reduzir para pagar a dívida?” ou, numa outra direcção: “quantos portugueses reformados seria necessário exterminar para se pagar a dívida?”. Estilo “solução final” para endireitar as finanças. Ou então “quantos políticos, empresários, gerentes e equivalentes, corruptos, incompetentes, desnecessários, tapa buracos seria necessário despachar para pagar a dívida?” Reparem que só estou  a falar em “corruptos, incompetentes, desnecessários, tapa buracos”, porque acho que há muito boa gente que se salvava em todos esses cargos e a generalização só agrada a quem pretende desacreditar a democracia, para a substituir por algo da sua maior simpatia.
Voltado à metáfora do Senhor Ministro. Eu até não a levaria a mal. Mas a verdade é que  os portugueses que trabalham (ou querem trabalhar e estão no desemprego!), alguns já estão há mais de um ano sem comer e sem utilizar transportes, outros já só comem metade e viajam muito menos do que deviam e a dívida continua a crescer. O que quer dizer que ou o governo é incompetente, ou então há alguns portugueses, quer trabalhem ou não, que estão a “comer” muito mais do que deviam. Porque, na verdade, a fome de alguns milhares não tem pesado na balança de todos.
Mas já percebi onde nos querem fazer chegar: “um ano sem comer para pagar a dívida”. “Coragem, portugueses!, mais um esforço e os nossos esqueletos chegarão lá!”.


1 comentário:

Rui Gonçalves disse...

Infelizmente, parece que esta é a «receita» única dos nossos governantes.