A GUERRA DAS ESTRELAS
Agora que se anuncia a estreia de mais um episódio da saga "A Guerra das Estrelas", recorde-se o que escrevi, em 1977, na estreia, e depois 1981, na reposição, quando era crítico no "Diário de Noticias".
GEORGE LUCAS: A GUERRA DAS ESTRELAS
Possivelmente os mesmos que, em 1963, torceram o nariz aquando da estreia
de “2001” (nessa altura a ficção científica não era um valor cultural
solidariamente implantado), olham agora de soslaio esta “A Guerra das Estrelas”.
E para diminuir o filme de George Lucas estabelecem comparações, servindo-se já
do “2001”. Como se fosse possível atacar “Fanfan la Tulipe”, em nome de “O
Mundo e Seus Pés”.
“A Guerra das Estrelas” pretende ser uma maravilhosa aventura no espaço. E
consegue-o. De que maneira! Uma galáxia dominada por um despótico tirano
assiste à insurreição. A revolta é o tema do filme de George Lucas, que se
inscreve na melhor tradição do cinema de aventuras norte-americano, de Errol
Flynn a “O Comboio Apitou Três Vezes”.
As trucagens são brilhantes, mas o menos importante nesta obra-prima da
aventura, da audácia, do arrojo, do humor. Mesmo num plano filosófico, o filme
se revela de grande riqueza e complexidade, permitindo-se inovações de certa
monta, como por exemplo o lugar ocupado pelo Homem neste universo povoado por
seres das mais diversas configurações e origens. Temos assim, finalmente, o
Homem a viver com outros seres, sentindo-se um entre vários habitantes do
espaço. O que até agora o cinema não nos tinha dado com a clareza e
exemplaridade deste “Star War”.
Ao lado do Homem, androides que relembram Bucha e Estica e “saloons”
espaciais onde o “Muppet Show” marca “rendez vous”. A banda sonora recorda os “cartoons”
do «Buq's Bunny» e o Cavalo de Troia recolhe “robots” usados para revenda.
Peter Cushing e Alec Guiness defrontam-se ainda nesta luta pelo poder e pela
liberdade com espadas de raio Laser, enquanto a “princesa” e Luke tentam a
destruição da estação de guerra. Emocionante.
(D. N.) - 1977
A GUERRA DAS ESTRELAS DE GEORGE LUCAS (REVISÃO)
A década de 70, quando a aventura épica e generosa que fizera a lenda do
cinema americano, parecia desaparecer, sob uma onda de violência descompassada,
de mercenarismo e hipocrisia, eis que George Lucas descobre que afinal os
heróis resistem nas suas brancas indumentárias e Tom Mix, o cavaleiro íntegro, poderia
continua a sua gesta, agora nas estrelas.
“Star Wars”, com a data de 1977, é isso mesmo, um regresso à idade da
inocência do cinema americano, repescando aqui e ali influências de uma
adolescência dourada passada no interior de salas escuras, povoadas pelo ruído
das lanças dos torneios do príncipe Valente, os saltos de Tarzan, as naves
espaciais de Buck Rodgers e Flash Gordon em “serials” de dezenas de parte, ou as
cavalgadas de Gary Cooper ou John Wayne nas pradarias do Oeste. Entre dezenas
de outras referências possíveis, crescem as personagens desta “A Guerra das
Estrelas”, onde os bons são mesmo bons e os maus intrinsecamente mau. Não há complexidades
psicológicas nesta obra de uma linearidade gratificante, porque inteiramente
assumida enquanto tal e por isso mesmo defendida. Luke Skywalker, a quem os tiranos
mataram os pais, vive uma aventura que comporta apenas as cores puras da
armadura de um cavaleiro da corte do rei Artur, aqui em busca da suprema “força”.
A princesa Leia Organa apenas se distingue das virginais damas medievais, por
quem se terçavam lanças em mortais duelos de honra desagravada, por uma ou
outra réplica mais ousada, um outro gesto mais intempestivo. Mas Darth Vader é
obviamente a personificação do Mal, simbolicamente assinalado por uma máscara e
uma silhueta que impedem toda a identificação com o espectador.
A única figura de contornos mais imprecisos será o oportunista Hans Solo, que,
todavia, deixa falar o coração no momento derradeiro e regressa à luta e ao
campo da honra em defesa dos fracos e dos oprimidos. Desesperando de qualquer
retribuição monetária ou honraria. Ben Kenobi, por seu turno, é o ideal
arquétipo que se persegue, a fonte de inspiração que se tenta continuar, depois
de se ter provado merecê-la. Do burlesco, uma dupla de “robots”, C3PO e R2D2,
prolongam desajustamento Bucha e Estica e o seu discreto humor, invadido pela ternura.
Chewbacca, “esse enorme tapete rolante mal cheiroso”, como lhe chamava a
princesa, introduziu-nos no entanto num universo onde tudo é possível de
acontecer, onde os humanos perderam o centro do mundo, sendo uns entre vários, princípio
de cooperação cósmica cuja lição é depois continuada, por exemplo nos “Encontros
Imediatos”, de Spielberg.
Aventura pela aventura, A Guerra das Estrelas é a afirmação lúcida de uma
arte que se alimenta do movimento, da acção, do ritmo e de uma imaginação feérica
de contos de fadas, onde, para valorizar devidamente o Bem, são imprescindíveis
os muito maus. Há um maniqueísmo que nunca se procura encobrir sob falsas
roupagens de intelectualismo ou filosofice. A pretensão está ausente desta
movimentada aventura que restitui ao espectador um prazer quase perdido: num
sofisticado reino interplanetário, povoado por robots e seres estranhos (de
antologia a sequência do “saloon” onde, lado a lado, coexistindo sem qualquer
estranheza, se descobrem as figuras mais inconcebíveis, os heróis do “western”
voltam a cavalgar, por sua dama e por el-rei. Ao público resta embarcar nesta
nave espacial de direcção à distância, e percorrer nela o quarto de brinquedos mágicos
de um feiticeiro chamado George Lucas.
(D. N.) - 1981
1 comentário:
É uma grande série de filmes.
E o mais curioso, é que poderiam tornar-se "estúpidos", passados todos estes anos, pela evolução natural das coisas, inclusive os efeitos especiais, e continuam a ver-se bem.
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