quarta-feira, julho 12, 2006

FUTEBOL E LITERATURA

“O brasileiro é tão bom de bola que o jogo vira bailado –
tão ruim a realidade que um simples jogo vira esperança nacional.
Na partida entre o Homo Sapiens e o Homo Ludens,
o Homo Sapiens perde de goleada.
É pura dança: a trajectória do futebol em nosso país
é espectáculo e “comercindustria”,
glória e frustração nacionais, quando dentro dos estádios,
tragédia e exploração nos bastidores, quando o craque de ontem,
manobrado pelos cartolas e pela imprensa,
vira o pobre esquecido de hoje.”
- Flávio Moreira da Costa.

Acabada a euforia do Mundial 2006 em directo pela TV, restam vestígios dessa euforia que durou mês e meio: alguns livros nas livrarias, por exemplo. No Brasil, os escaparates transbordavam. Em Portugal houve algum interesse e meia dúzia de edições que se justificam. Muitas sobre a História dos Mundiais ou sobre a História do próprio futebol, outras, literariamente mais estimulantes, com textos de escritores que se alimentaram do fenómeno desportivo para ficções ou ensaios interessantes.
Ficam aqui desde já três sugestões de leitura que recomendo:

ONZE EM CAMPO DE CADA VEZ
antologia de ficção brasileira sobre futebol, onde surgem nomes consagrados como João Ubaldo Ribeiro (muito saboroso), Carlos Drumond de Andrade )muito poético), Rubem Fonseca (seco e muito bem escrito), Luís Fernando Veríssimo (como sempre, divertidíssimo), e uns quantos mais, menos conhecidos dos portugueses. Revelação mesmo foi para mim Sérgio Sant’Anna, com o conto “Na Boca o Túnel”. Brilhante. Prefácio de Carlos Daniel.
Ed. Âmbar.

BRASIL
Futebol ao Ritmo do Samba

Entre o romance, o ensaio, a crónica, dezenas de textos, divertidos e muito lúcidos, sobre a relação entre o futebol brasileiro e a cultura popular daquele país. O ritmo do samba a marcar o ritmo da jogada. Uma viagem pela história e a sociologia do espectáculo de eleição dos brasileiros. Levei o livro no avião entre Lisboa e São Paulo, e andei com ele por Goiás, Barsilia, Rio, e fui sempre aprendendo algo da alma de um povo e do significado de uma paixão. Tem a vantagem de ser um testemunho, um olhar estranho: Alex Bellos, a autora, é correspondente dos jornais “The Guardian” e “The Observer” e só vive no Brasil há alguns anos. Mas já deu para radiografar o clima humano.
Ed. Civilização.

FUTEBOL, SOL E SOMBRA
Eduardo Galeano é natural de Montevideu, jornalista, ensaísta, romancista e cronista, como o demostra esta obra dedicada ao futebol, com passagem absorvente pelo futebol brasileiro, e alguma da rivalidade existente entre Brasil e Uruguai. Quem esquece a Copa de 1950, a inaugurar o Maracanã? A II Guerra Mundial tinha acabado há pouco, a taça Jules Rimet tinha fiocado escondida numa caixa de sapatos, debaixo da cama de um dirigente da Fifa, a competição de 1950 estava organizada como uma miniliga, e o Brasil, a Suécia, a Espanha e o Uruguai foram as últimas equipas a jogar. Inaugura-se o majestoso Maracanã, no Rio de Janeiro. No jogo final, contra o Uruguai, o Brasil só precisava de um empate para ganhar a taça, mas perdeu por 2-1 diante de uma multidão de 174.000 torcedores (outros afirma que eram 220.000). Galeano é uruguaio mas gosta sobretudo de futebol, tem verve, humor, ironia, uma escrita com estilo, suave, deslizante, que sabe bem saborear. A não perder. Ed. Livros de Areia. (*)

(*) O NAVIO DOS ESPELHOS (Aveiro). Este livro foi comprado há duas semanas numa simpática livraria de Aveiro, "O Navio de Espelhos", sita na Rua 31 de Janeiro, nº10 3810-192 (mail@onaviodeespelhos.com). Foi a Rosário que lá me levou e me apresentou a Sónia Sequeira, dona da livraria. Trata-se de um projecto pessoal, daqueles furiosamente radicais e exclusivistas. Poético. Aquela mulher vive para aquela livraria (e para a nova extensão no "Mercado Negro") e vive de forma tão apaixonada que impõe admiração, tanto mais que as suas (muito alternativas) escolhas literárias são de muito bom gosto. Não sei se ela gosta que um tipo que lê "O Código Da Vinci" e tem prazer nesse acto, faça publicidade á sua livraria. Calculo que não, mas não me importo. Importa-me o que sinto, não o que os outros pensam sentir acerca do que escrevo. Obvio que não confundo Dan Brown com Paul Auster, mas tenho lugar para tudo. Até tenho lugar para desejar as maiores felicidades á Sónia, timoneira de um barco de navegação dificil na ria de Aveiro. Sónia, eu compro na FNAC, na Bertrand, na papelaria da esquina, aqui e ali, Elaurd e o Record, os anarquistas russos e Sherlock Holmes, mas quando for de novo a Aveiro não deixarei de a visitar.

Pode consultar em:
Soube agora que:
Hoje festejamos: faltam 97 anos para o centenário.
Nem de propósito: Parabéns!
Aqui fica a homenagem
que deu origem ao nome:
O navio de espelhos

O navio de espelhos
não navega cavalga

Seu mar é a floresta
que lhe serve de nível

Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos

Por isso o tempo gosta
de deitar-se com ele

Os armadores não amam
a sua rota clara

(Vista do movimento
dir-se-ia que pára)

Quando chega à cidade
nenhum cais o abriga

O seu porão traz nada
nada leva à partida

Vozes e ar pesado
é tudo o que transporta

(E no mastro espelhado
uma espécie de porta)

Seus dez mil capitães
têm o mesmo rosto

A mesma cinta escura
o mesmo grau e posto

Quando um se revolta
há dez mil insurrectos

(Como os olhos da mosca
reflectem os objectos)

E quando um deles ala
o corpo sobre os mastros
e escruta o mar do fundo

Toda a nave cavalga
(como no espaço os astros)

Do princípio do mundo
até ao fim do mundo

Mário Cesariny

2 comentários:

Anónimo disse...

Arquivo: de "Livros de Areia":
(http://livrosdeareia.blogspot.com/)
Domingo, Julho 16, 2006
Livrarias que resistem
Apesar do fecho de algumas livrarias por aí, outras resistem e cumprem aniversários: a Livro do Dia de Luís Filipe Cristóvão, em Torres Vedras (1 ano) e a O Navio de Espelhos de Sónia Sequeira, em Aveiro (3 anos). Nesta última, soubemos que Lauro António encontrou a nossa edição de Futebol: sol e sombra e gostou. Do livro de Galeano disse ele ter "verve, humor, ironia, uma escrita com estilo, suave, deslizante, que sabe bem saborear. A não perder." Aqui se prova como uma livraria pode ser catalizadora de encontros felizes.
posted by Livros de Areia at 7/16/2006 03:12:00 PM 0 comments

Anónimo disse...

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