“A VIDA SECRETA
“La Vida Secreta de las Palabras”, de Isabel Coixet, que a escreveu e dirigiu, é uma obra interessante com alguns bons momentos de cinema, uma cena para recordar de futuro, duas interpretações acima da média, e meia dúzias de excessos, ou de inevitabilidades retóricas da narrativa que retiram ao filme o peso que poderia ter, se fosse mais seco e austero. De todas as formas, um filme a ter em conta, uma boa continuação de trajecto para esta jovem barcelonesa que um dia encontrei em Setúbal, com quem falei demoradamente sobre um filme seu, “Cosas Que Nunca Te Dije” (1995), surpreendente estreia na longa-metragem de ficção que, desde logo, augurava uma autora de recursos e futuro. O futuro aí está. Depois sucederam-se “A Los Que Aman” (1998), “Mi Vida Sin Mi” (2003) até chegar a este “La Vida Secreta de las Palabras” (2005). Um bom percurso, com reconhecimento internacional, várias presenças e prémios em Festivais, actores de certa nomeada e prestígio (como Tim Robbins) a aceitarem colaborar e impulsionar a carreira de Isabel Coixet. Ela merece-o.
“A Vida Secreta das Palavras” é um filme sobre cicatrizes e silêncios. O melhor do filme encerra-se neste casulo secreto. Numa plataforma petrolífera no norte da Europa, um acidente, um incêndio, uma morte e um ferido que tem de ser cuidado no interior dessa ilha metálica, antes de ser transferido para um hospital. Não muito longe, Hanna, enigmática, fechada, cumpridora operária de uma fábrica, come frango, arroz branco e meia maçã, em frugais refeições. Jovem, miúda, metida consigo, surda (por vezes por opção), é bem vista pela administração, mas segregada pelos companheiros que não a entendem. Nem aos silêncios. Nem à distância. Uns olhos perdidos no passado, sabe-se depois, quando, em vez de ferias que lhe recomendam, aceita ser enfermeira na plataforma petrolífera e tratar de Josef, um queimado grave, que ainda por cima tem uma perna e um braço partidos, e uma cegueira temporária.
Única mulher entre sete homens, Hanna mantém-se de poucas falas e de grande eficácia e dedicação. Sombra de Josef, a quem de inicio nada diz, ou apenas mentiras sem significado, vai lentamente despertando para uma nova vida, à medida que aceita desvendar dores antigas e segredos antes indizíveis. Para o horror não há palavras, ou há palavras a mais. Quando Hanna, depois de ouvir as revelações de Josef, e enquanto lhe limpa as cicatrizes de um acidente (que afinal não foi acidente), revolve abrir-se para o homem cego que tem diante de si, não há palavras que resistam: Hanaa abre a sua camisa e orienta as mãos de Josef num peito de pele fina e branca, feito mapa também ele de cicatrizes de horror, de vergonha. Essa é uma cena que fica para a recordação do espectador. Uma cena de uma beleza dilacerante, de uma força e nobreza invulgares. Está tudo dito, e quando, vinte minutos mais tarde, Julie Christie vem contar por palavras o que já estava dito e redito, reforça a retórica, entra num terreno de manipulação fácil, que o filme até aí não merecia. Digamos que
A VIDA SECRETA DAS PALAVRAS (La Vida Secreta de las Palabras), Isabel Coixet (Espanha, 2005), com Sarah Polley, Tim Robbins, Javier Câmara, Eddie Marsan, Steven Mackintosh, Julie Christie, Danny Cunningham, Emmanuel Idowu, Dean Lennox Kelly, Daniel Mays, Sverre Anker Ousdal, Leonor Watling, Reg Wilson, Peter Wright, etc. 114 min; M/ 12 anos.
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