domingo, janeiro 09, 2011

NA MORTE DE CARLOS CASTRO

:
À PROCURA DE UM SONHO

O Carlos Castro que eu conheci foi sempre uma pessoa extremamente simpática, afável, com quem mantive excelente convívio quase sempre ditado por algumas paixões comuns: o cinema, como é obvio, mas sobretudo duas paixões específicas: o musical, tanto em cinema, como nos palcos dos teatros, e a actriz Romy Schneider, que ambos muito admirávamos. Sempre que nos encontrávamos por essas andanças de estreias de teatro ou de cinema ou lançamentos de livros, ele me falava dela ou dos diferentes musicais que tinha visto nas muitas viagens que fazia ao estrangeiro (Nova Iorque e Londres, sobretudo). Quando eu estava na TVI, onde tinha um programa de cinema, ele intercedia sempre para eu organizar um ciclo dedicado a Romy Schneider, o que nunca aconteceu, pois nunca consegui reunir um número significativo de bons filmes da actriz, mas tarefa que muito gostaria de ter realizado. A última vez que o vi, e com ele estive um bom tempo de cavaqueira, foi numa sala dos estúdios da RTP, onde ambos esperávamos para ser entrevistados para um programa. Os musicais de Nova Iorque e Londres e as tentativas portuguesas nesse campo foram o tema da conversa. Reconfirmei que Carlos Castro era um homem de paixões intensas.
Tenho alguns livros dele, generosamente autografados, admirava a persistência no seu trabalho e a forma quase obsessiva como defendia os seus gostos. Era intransigente na amizade, protegia com ardor quem admirava, e atacava sem piedade quem não cabia nas suas escalas de valores. Era frontal, não ocultava nada. Criou amizades e inimizades. Vivia intensamente as suas paixões e, pelo que tenho lido, morreu na cidade que amava, por entre idas ao teatro, vendo e revendo musicais, hospedado num requintado quarto de hotel bem no centro de Manhattan e tudo indica que vai ver cumprida uma das suas ambições mais queridas: morrer em N.Y. e ver as suas cinzas lançadas por sobre a cidade. Parece ainda que, segundo testemunhos, vivia em afortunado sobressalto amoroso. Teria sido um final feliz, não fossem as condições trágicas desta sua última viagem. Que encerram duas ou três questões a merecer certamente um olhar mais atento.
Algumas delas prendem-se com o jovem com quem Carlos Castro dividia o quarto do hotel nova-iorquino e que surge agora como principal suspeito do crime. A história desta vida de 21 anos, que se arrisca a prisão perpétua nas celas norte americanas, é sintomática: pacato, tímido e bem comportado em Cantanhede, sua terra natal, desportista e temente a Deus, à beira de terminar um curso universitário, deixa-se atrair por um concurso televisivo da SIC para pretendentes a modelos: “À Procura de Um Sonho”. E parte à procura de um sonho, deixa de ver telenovelas à noite com a família, sente necessidade de voos mais altos, um dia escreve no Facebook a Carlos Castro, pedindo-lhe apoio para a sua carreira. Foi assim que se conheceram. Foi assim que tudo começou e continuou depois com viagens a Paris, Madrid, Londres, agora Nova Iorque. Os colegas da equipa de basquetebol de Cantanhede afirmam que nada nele denunciava outra coisa senão “gostar de mulheres”, “como todos nós”, acrescentam, não vá haver alguma confusão. Mas amigos de Carlos Castro afirmam que este vivia “em plena lua-de-mel, num grande amor”.
A vida de todos nós é uma constante busca da felicidade. Uma verdade insofismável e plenamente justificada. “À Procura de Um Sonho”? É difícil viver algumas semanas de brilho intenso, num programa de tv, e depois desmaiar numa agência de modelos, onde raramente era chamado a trabalhar. A glória incendeia os sonhos, a glória efémera causa estragos irreversíveis. Basta olhar para o que se sabe de muitos concorrentes de alguns desses programas que, de um dia para o outro, catapultam para a fama um desconhecido que nada fez para a merecer, e um dia depois de sair de cena é projectado na escuridão mais negra (escuridão que antes nunca tinham conhecido, porque nunca tinham conhecido a luz intensa).
Cronista do cor-de-rosa, mas homem de cultura e gostos sensíveis, Carlos Castro acaba vítima de um “sonho” que se transformou em “pesadelo”, facto que se está a tornar moeda corrente nas sociedades actuais, onde se trituram jovens a uma velocidade insustentável. Eles são apenas a lenha que alimenta a fogueira das audiências. Do cor-de-rosa às cinzas, é umpasso. Ou um passe. De magia. Com champanhe. Lantejoulas e plumas. Como num musical de Bob Fosse: “Sweet Charity” ou “Cabaret”.

13 comentários:

MJ disse...

Beautiful!!
And the show must go on... :-(

Anónimo disse...

Excelente texto que nos impõe uma oportuna, necessária e actual reflexão.

Carlos Paulo

Pedro SC disse...

Se tiverem coragem publicam este! Isto é sério e deveria ser desde já levado a uma discussão profunda por todos. A culpa não é das televisões, mas sim de quem legisla e de quem vota na aprovação institucional destas anormalidades inconsequentes para a prevalência da raça Humana.
O que eu acho é que deveriamos começar seriamente a pensar, em que é que estas Leis sobre os homosexuais recentemente aprovadas pelos Socialistas e pela Esquerda na sua generalidade, começam a fazer às cabeças de jovens em formação de personalidade e muitas vezes perdidos nas mesmas,dando-lhes o sinal errado que tudo é aceitável na sociedade, até a prostituição com figuras publicas com o fim da fama fácil. Se o próprio Estado aprova estes comportamentos, porque não fazer o que nos dá na bolha? O Estado deveria ser a ultima fronteira, na defesa da existência humana e do propósito e finalidade da mesma.Sem auto-controlo somos iguais a um qualquer animal irracional! Temos de saber controlar os nossos impulsos para que nos tornemos mais racionais e possamos, compreendendo os outros e os seus problemas, fazer com que o ser Humano se desenvolva e evolua no sentido da sua prevalência na Terra. Tudo o resto é muito bonito e até parece de uma compreensão e sensibilidade incriveis mas os resultados da aprovação institucional estão à vista e os primeiros corpos começam a "dar à costa". Não nos esqueçamos à quanto tempo foram aprovadas estas Leis ! Para baixo todos os santos ajudam e o que demorou tantos séculos a construir, baseado na cultura Judaico-Cristã e que nos trouxe até este ponto de conforto e desenvolvimento, pode ser agora destruido em 3 tempos, por esta sensibilidade de Esquerda, que parecendo compreensiva e vivendo ao cheiro de insensos e misticismos egoístas, não é mais que a utopía a tomar forma.

Lauro António disse...

Não é preciso ter coragem para publicar este texto. Só me recuso a publicar textos gratuitamente ofensivos. Também não aprecio anónimos, como é o seu caso, apesar do Pedro.
Mas este texto é apenas reflexo de uma ideologia, de um espírito que, não sendo os meus, aceito ver discutidos, como bom democrata que aprecia a liberdade de pensamento.
Julgo, porém, que a sua posição é preconceituosa e por isso mesmo se cinge apenas a um aspecto do problema: a “prostituição”, como lhe chama, e bem, por ser masculina é pior que a feminina que vem desde tempos imemoriais?
Aliás, se for apenas uma questão de tempo, a masculina também não lhe fica a atrás. Mesmo a prostituição homossexual, sobretudo durante toda a vigência desta nossa civilização judaico-cristã. Tem um longo historial, e não surge apenas por inspiração “socialista e de esquerda”. A homossexualidade é transversal.
As suas posições aproximam-se mais do radicalismo islâmico. Mas aqui fica registada o seu posicionamento.

Anónimo disse...

Não posso estar mais em desacordo com o que Pedro SC diz no seu comentário quando aponta responsabilidades às leis sobre os homossexuais. Desculpe, mas parece-me algo conservador esse seu discurso, pois na realidade "a prostituição com figuras públicas com o fim de fama fácil" tanto acontece com homossexuais como com heterosexuais, um exemplo flagrante dessa realidade é os "namoricos" que o Sr. Pinto da Costa vai arranjando e ostentando, este é um exemplo entre muitos. A outra questão e talvez a mais importante, é que este foi um caso que envolveu gay(s)mas todos os dias hà mulheres que morrem às mãos de maridos ou namorados bárbaros, mas desses infelizmente não se falam porque tristemente vão sendo uma banalidade!
Garanto-lhe que não sou homossexual mas tenho muitos amigos/as que o são e aplaudo a coragem deles e de todos aqueles que se recusam a viver oprimidos e reivindicam o direito de viverem a sua sexualidade como muito bem entenderem.

Graça Martins disse...

Gostei imenso das suas palavras. Um olhar tão sensível.
LINDO!!!
Graça Martins

Graça Martins disse...

Gostei imenso das suas palavras.
Falou deste caso através de um olhar tão sensível.
LINDO!!!
Graça Martins

Hugo Nofx disse...

Este é o melhor texto que li sobre a morte do Carlos.

Milocas disse...

Lauro António,

Sempre o segui, simpatizei consigo, com a forma com as palavras sensatas nos foram sempre apresentadas por si.

Este texto,é simplemente "real", escrito com amizade, amor e tristeza.

Parabéns pela sua escrita, pela sua honestidade e frontalidade.

Continue...

Luanda,10 de Fevereiro de 2011

Graça Martins disse...

O Lauro António foi super educado porque, comentários como o do Pedro SC são precisamente os que contribuem para uma sociedade HOMOFÓBICA e HIPÓCRITA. E,é precisamente por existirem pessoas que ainda pensam dessa maneira no séc.XXI, que surgem jovens frágeis, que num gesto bordarline destroem duas vidas. Tudo por causa de relações padronizadas e comportamentos formatados em função da procriação. Já ultrapassámos o tempo da República. O FUTURO é outro e absorve a pluralidade. Pelo menos, uma parte do mundo pensa assim...
LINKEI o seu blog no meu e ainda agora, depois de tantas notícias sobre o assunto, continuo a achar as suas palavras as mais sensíveis.
Lindas.
Graça Martins

Pedro SC disse...

Muito obrigado pelas suas observações em relação ao meu comentário. O que deve ser no entanto sublinhado no meu comentário e reflectido, não é a prostituição, mas sim as Leis aprovadas recentemente pelo parlamento do nosso País, e que abrem caminho a situações que pela sua aprovação institucional levarão concerteza à confusão na cabeça de jovens em formação e lhes dará sinais errados de conduta, aprovando comportamentos que não podem ser considerados normais por uma sociedade civilizada. Por muito amigo que fosse do Carlos Castro e trabalhando o senhor na area artistíca, não acredito que não saiba como é que os e homosexuais especialmente os mais velhos actuam em relação às suas "paixões". Não podemos branquear as situações por mais amigos que sejamos das pessoas envolvidas. Não podemos perder a noção da decência ou a história da Roma Antiga irá repetir-se! Todos os amigos do Carlos Castro têm o direito de estarem tristes e eu respeito isso, mas apelo mais uma vez à decencia intelectual e moral, para aceitarem que aquela relação deveria ter sido evitada pelo elemento mais velho da mesma! Isto se tivessemos a falar de pessoas normais, mas como bem sabe quando se trata de amores, os homosexuais são completamente desiquilibrados!!!Quem disser o contrário está a ser tendencioso e a comprometer sériamente o futuro da nossa civilização. Os meus sentimentos pela perda do seu amigo.

Filipe Macedo disse...

As duas pessoas envolvidas nesta história são-me desconhecidas. De maior ou menor notoriedade, ambos são para a maioria das pessoas personagens ficcionais dos media; lamento ambos: um porque perdeu a vida, outro porque se perdeu na vida. Contudo, um caso que merece pesar está, como infelizmente expectável, transformado num circo nas redes socias e nos media. Há contudo oásis como este texto do Lauro António: lúcido e reflexivo. No entanto, não resisto a comentar as palavras do Sr. Pedro SC: as leis não criam realidades, são uma projecção das mesmas; os crimes passionais (assumo a abrangência do conceito) não são um exclusivo de nenhuma orientação sexual [e bem o diz as estatísticas sobre a violência doméstica]; alguns (muitos)Srs. hetero mais entrados na idade saem, amiúde, com raparigas no limite da puberdade; os homossexuais não detém, para o bem e para o mal, os direitos exclusivos dos 'desequilibrios emocionais'. Meu caro Sr. Pedro SC, há pessoas. E as pessoas fazem coisas boas, coisas más; acertam e erram; enfim, vivem! Quando no lugar das etiquetas pensarmos em 'pessoas',as coisas ganham mais verdade. Além do mais, dá a ideia de que vive numa realidade paralela. Ainda que o possa desgostar, o mundo é um lugar mais vasto de que o nosso pensamento individual. Há os 'Outros' (e nesses 'outros' cabem visões diferentes das nossas; nem melhores, nem piores: diferentes). Nesta história, como nas demais, a simplificação derroga(ainda que talvez de maneira inadvertida)o fulcro da natureza humana: a diversidade. E a sua religião, que é a mesma que a minha, fala doutra coisa completamente diferente do que deixa entrever. E ainda bem que assim é! Tenhamos todos a noção de que saberemos pela rama todo este caso. Saibamos respeitar o homem que partiu e, não menos importante, o rapaz que ficou
Obrigado Sr. Lauro António pelo seu 'oásis'.
Luís Macedo
Lisboa

Filipe Macedo disse...

As duas pessoas envolvidas nesta história são-me desconhecidas. De maior ou menor notoriedade, ambos são para a maioria das pessoas personagens ficcionais dos media; lamento ambos: um porque perdeu a vida, outro porque se perdeu na vida. Contudo, um caso que merece pesar está, como infelizmente expectável, transformado num circo nas redes socias e nos media. Há contudo oásis como este texto do Lauro António: lúcido e reflexivo. No entanto, não resisto a comentar as palavras do Sr. Pedro SC: as leis não criam realidades, são uma projecção das mesmas; os crimes passionais (assumo a abrangência do conceito) não são um exclusivo de nenhuma orientação sexual [e bem o diz as estatísticas sobre a violência doméstica]; alguns (muitos)Srs. hetero mais entrados na idade saem, amiúde, com raparigas no limite da puberdade; os homossexuais não detém, para o bem e para o mal, os direitos exclusivos dos 'desequilibrios emocionais'. Meu caro Sr. Pedro SC, há pessoas. E as pessoas fazem coisas boas, coisas más; acertam e erram; enfim, vivem! Quando no lugar das etiquetas pensarmos em 'pessoas',as coisas ganham mais verdade. Além do mais, dá a ideia de que vive numa realidade paralela. Ainda que o possa desgostar, o mundo é um lugar mais vasto de que o nosso pensamento individual. Há os 'Outros' (e nesses 'outros' cabem visões diferentes das nossas; nem melhores, nem piores: diferentes). Nesta história, como nas demais, a simplificação derroga(ainda que talvez de maneira inadvertida)o fulcro da natureza humana: a diversidade. E a sua religião, que é a mesma que a minha, fala doutra coisa completamente diferente do que deixa entrever. E ainda bem que assim é! Tenhamos todos a noção de que saberemos pela rama todo este caso. Saibamos respeitar o homem que partiu e, não menos importante, o rapaz que ficou
Obrigado Sr. Lauro António pelo seu 'oásis'.
Luís Macedo
Lisboa