TIMÃO DE ATENAS
"Timão de Atenas" foi o último espectáculo encenado pelo Joaquim
Benite", para a sua Companhia de Teatro de Almada (CTA), onde estreou duas
semanas depois da sua morte. A seu lado esteve sempre Rodrigo Francisco que aprendeu
com ele, o ajudou no que pode e ocupou o seu lugar posteriormente à frente da
companhia e do seu célebre Festival de Teatro, cuja 30ª edição, a primeira sem
Benite, se inaugurou no passado dia 4 de Julho.
A peça regressou em Junho ao palco do Teatro Nacional D. Maria II. Só nessa
altura a fui ver, pois custou-me ir a Almada, sem Benite. Fomos companheiros de
lides durante anos, no “Diário de Lisboa”, ele como crítico de teatro, eu de
cinema, e acompanhei com amizade e estima o seu percurso. Sei que o mesmo aconteceu
com ele em relação a mim. Por vezes podíamos estar anos sem nos vermos, mas a
amizade era real e durável. Acompanhei a sua luta contra a doença e admirei a
sua tenacidade, a sua persistência no seu amor ao teatro. No último Festival de
Almada seguiu as representações e foi orientando o certame numa cadeira de
rodas, nunca abandonando o cigarro que, vá-se lá saber se o consumia ou não,
mas lhe dava um evidente prazer.
Escrita no início do século XVII, "Timão de Atenas" parece ter
uma autoria polémica. Há quem afirme que se trata de uma obra escrita a quatro
mãos, por Shakespeare e pelo poeta e dramaturgo seu contemporâneo Thomas
Middleton (1580–1627). Nunca representada anteriormente em Portuga, já havia
sido encenada por Joaquim Benite, em 2008, para uma apresentação no Festival de
Teatro de Mérida, mas numa versão diferente da actual. Esta é mais económica em
meios, mais atenta se possível ao texto e à sua importância crítica.
Benite era um apreciador compulsivo do grande teatro e dos textos eternos
que ele respeitava escrupulosamente. A palavra tinha uma importância decisiva para
ele. A encenação devia colocar-se ao seu serviço. À palavra e às ideias que a
mesma desenvolve em palco. O texto de Shakespeare é rico e pertinaz na crítica:
Timão é um grande senhor de Atenas que gosta de dispersar a sua fortuna entre
amigos e necessitados. Por isso é bajulado e muito apreciado. Até ao dia em que
se descobre falido, passando a eremita no deserto da sua solidão. Todos o
abandonam, mas a vingança está para vir, quando descobre ouro debaixo de uma
pedra que ocasionalmente levanta no seu percurso. E a roda da sorte volta ao inicio,
mostrando que o vil metal amaldiçoa quem o detém, por muito que possa parecer
que o ilumina.
Com apenas um longo estrado em cena e meia dúzia de adereços, Joaquim
Benite ergueu um espectáculo bastante interessante, a começar pela excelente
tradução de Ivette Centeno, desenvolvida especialmente para esta encenação, cuja
interpretação, infelizmente, é bastante desigual, destacando-se, todavia, Luís
Vicente, Marques D"Arede, Paulo Matos, Ivo Alexandre e André Gomes, nos
principais papéis.
“Timão de Atenas”, de William Shakespeare; Tradução Yvette K. Centeno; Cenário
Jean-Guy Lecat; Figurinos Sónia Benite; Luz José Carlos Nascimento; Voz e
elocução Luís Madureira; Movimento Jean-Paul Bucchieri; Consultoria musical
Fernando Fontes; Intérpretes: Luís Vicente, Marques D"Arede, Paulo Matos,
Ivo Alexandre, André Gomes, Alberto Quaresma, Manuel Mendonça, Miguel Martins,
João Farraia, Pedro Walter, Celestino Silva, Ana Cris, Joana Francampos, Jeff
de Oliveira.
A peça esteve em cena de 20 a 22 de Dezembro de 2012 e de 9 de Janeiro a 3
de Fevereiro de 2013, no Teatro Municipal de Almada, tendo sido reposta em
Junho de 2013 no Teatro nacional D. Maria II, em Lisboa.
O trabalho de Joaquim Benite para esta peça deu ainda origem a um
documentário da jornalista Catarina Neves, que será estreado durante o 30º
Festival de Teatro de Almada.
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