EM DIRECÇÃO AOS CÉUS
“Em
Direcção aos Céus”, escrita por Ödön von Horváth (1901–1938), é, no entender do
autor, “uma comédia sem truques de magia: dado o momento que vivemos, creio que
este tipo de teatro pode ser bastante útil, uma vez que nos permite abordar
temas de que não nos seria possível falar de outra forma”. Datada de 1934, a
peça ressente-se já do ambiente vivido na Alemanha (e na Áustria, onde seria
estreada). Edmund Josef von Horváth nascera em Sušak, Rijeka, no então Império
Austro-húngaro (hoje Croácia) e viria a falecer novo, com 37 anos, em Paris.
Para assinar os seus trabalhos teatrais e literários assumiu o seu nome
húngaro, Ödön von Horváth, dado que habitou Budapeste durante alguns anos da
sua juventude. Com um pai diplomata, viajou muito, passando por Belgrado
(1902-1908), Budapeste (1908–1913), Munique (1913-1916), Bratislava
(1916-1918), Viena (1919) e de novo Munique, onde começou os estudos literários
na Universidade. Começou a escrever cedo, raros romances e um número avultado
de peças de teatro, que os seus estudiosos dividem em duas fases: uma até 1933,
altura em que foge da Alemanha em crescente nazificação, outra a partir dai,
com obras escritas quer em Viena de Áustria, quer em Paris. Inicialmente,
dir-se-ia um autor mais directamente politizado e crítico, depois seria lido
como um dramaturgo metafórico e algo metafísico. Terá sido a forma por si
encontrada para “abordar temas de que não nos seria possível falar de outra
forma”. Mas permanece popular e crítico, efabulador e satírico.
Da
primeira fase são as obras mais conhecidas do público português: "Casimiro
e Carolina", encenada por Luís Miguel Cintra, Cristina Reis e Jorge Silva
Melo, na Cornucópia, em 1977, "A Noite Italiana", dirigida por Mário
Barradas, em Évora, em 1995, ou "Histórias do Bosque de Viena",
prémio Kleist, da República de Weimar, em 1931, encenada pelo colectivo Truta.
“Em
Direcção aos Céus” fala de teatro, de uma jovem cantora que permanece várias
semanas à porta de um teatro, à espera de uma audição, quando a mãe morre e vai
para o Céu, e o pai morre e vai para o Inferno. O palco divide-se em três
zonas, no centro o teatro (exterior), na direita a entrada do Céu, na esquerda
a descida ao Inferno. De um lado, São Pedro, do outro, o Diabo, ambos
transaccionando almas. Para ser uma grande diva, Luísa Steinthaler aceita
vender a alma ao director da companhia, que por sua vez a revende ao Diabo,
para ter uma vida de sucesso. O resto decorre daqui, é divertido e instrutivo,
tendo as canções da época e as áreas das óperas cantadas por Luísa como banda
sonora.
A
escolha da peça para o reportório do Teatro Municipal Joaquim Benite, de
Almada, parece-me feliz, por ser uma obra simultaneamente popular e exigente, e
conta com uma encenação segura, sóbria e inventiva de Rodrigo Francisco. A cenografia de Jean-Guy Lecat é
particularmente feliz, e os figurinos de Ana Paula Rocha muito sugestivos.
Globalmente, a representação é toda ela muito homogénea, mas há que sublinhar o
trabalho de Ana Cris, André Alves, André Gomes, Joana Francampos, Luís Vicente,
Marques d'Arede ou Teresa Gafeira.
EM DIRECÇÃO AOS CÉUS
Texto
de Ödön von Horváth; Tradução Maria Gabriela Fragoso; Encenação: Rodrigo
Francisco; Cenografia Jean-Guy Lecat; Figurinos Ana Paula Rocha; Luz Guilherme
Frazão; Voz e elocução Luís Madureira; Som Miguel Laureano; Movimento Catarina
Câmara; Intérpretes Ana Cris, André Alves, André Gomes, Carlos Pereira,
Catarina Reis, Celestino Silva, Duarte Guimarães, Joana Francampos, João
Farraia, Luís Vicente, Manuel Mendonça, Marques D’Arede, Miguel Martins, Paulo
Guerreiro, Pedro Walter e Teresa Gafeira e os estagiários Alexandre Silva, Ana
Rita Trino e Rute Guerreiro; Sala Principal, de 2 a 30 de Novembro; de quarta a
sábado, às 21H30, domingo, às 16H00; Duração: 2H00 com Intervalo; M/12 anos.