“AMÁLIA”,
LA FÉRIA, (OPUS 2)
“Amália” regressou e
voltei a emocionar-me muito com este espectáculo de Felipe La Fèria. Deve haver
algo errado em mim (ou se calhar não), mas confesso que me emociono com a sobriedade
e o rigor constantes no antigo Teatro da Cornucópia, com tantas das criações
dos “Artistas Unidos”, com fabulosas encenações dos maiores criadores do mundo,
como com alguns dos grandes espectáculos do La Féria. São concepções
completamente diferentes, eu sei, apelam por vezes a públicos diversos (quando
não antagónicos), mas, que querem?, sou assim e, o que é mais grave, é que
gosto de ser assim.
Posto isto, falemos um
pouco deste “Amália” que sendo muito semelhante à versão de 1999, traz muitas
novidades e algumas diferenças. O elenco
é muito semelhante, Alexandra e Anabela (que eu vi, mas que divide o papel de
Amália jovem com Liana e Carolina) à cabeça de um grupo muito homogéneo e de boa
qualidade. Dotes vocais a pedir meças, um verdadeiro desafio de pulmão, com
garra e sentimento. Filipa Ferreira e Madalena Gil (que alternam, eu vi a
última), são Amália em criança a cantar pelas ruas e a ganhar rebuçados e os
aplausos do público, o de então, nas ruas, o de agora, na sala do Politeama.
Carlos Quintas
(Frederico Valério), Alberto Villar (vários pequenos papeis), Francisco Sobral
(Alfredo Marceneiro), Carlos Veríssimo (Ricardo Espírito Santo), Filipe de
Moura (Alberto Ribeiro), Cristina Oliveira (Berta Cardoso), Patrícia Resende
(Celeste Rodrigues), Eduardo Ricciardi (Hugo Rendas), Tiago Diogo (Alain
Oulman), Mafalda Drummond (a secretária de Amália), e Paula Marcelo (a costureira Lili) são
alguns dos cerca de 50 fadistas, atores, bailarinos e músicos que vão surgindo
neste compacto de vida e obra de Amália. É difícil destacar nomes, mas não quero
deixar de sublinhar Francisco Sobral Filipe de Moura, Cristina Oliveira, Hugo
Rendas e Tiago Diogo, muito pela importância das suas personagens
particularmente marcantes e pela forma como as defendem.
Quanto à encenação há que
dizer que ganhou ritmo, foi encurtada (desapareceram algumas cenas da infância de
Amália, e, que me recorde, uma cena no Café Luso, onde surgia António Ferro e
algumas personalidades do Estado Novo, que me parece fazer falta para se
perceber por que razão era Amália acusada de ser “fascista” depois de 74). Não
foi só quanto aos cortes, porém, que “Amália” encurtou. Isso também de fica a dever ao ritmo imposto
por La Féria, galopante. O espectador não ganha fôlego neste desdobrar de
cenas, nesta verdadeira cavalgada em tom de epopeia de uma vida. Será por vezes
um pouco excessivo? Talvez, mas a verdade é que a emoção brota, o público comove-se,
a lágrima que Amália pedia aí está. Logo que o pano de boca sobe e surge Amália
escoltada por todo o elenco, o fado parte à desfilada levando consigo a emoção
mais pura. Eu pecador me confesso: gosto muito de fado. E de Amália Rodrigues,
uma voz única.
Quantos aos vídeos que acompanham
e definem as situações, o tempo histórico, mesmo as emoções, seguem o figurino
da versão de 1999, mas vivem agora das possibilidades técnicas que, de então
para cá, foram surgindo. Quase sempre certos e imaginativos, aqui e ali talvez
excessivos. As janelas da Maluda que se abrem umas sobre as outras começam por
ser bonitas e significativas, depois caem no exagero e perdem intenção; a
animação do quadro de Malhoa é divertida, mas creio que abafa a canção e a
acção; e podem citar-se um ou outro exemplo).
De resto, um belíssimo espectáculo,
popular sem ser popularucho, que certamente vai permanecer em cartaz muitos
meses (anos?) na Rua das Portas de Santo Antão. Longa vida à Rainha!
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