A PANTERA COR-DE-ROSA
Digamos que a desilusão não é tão grande como esperávamos. Ninguém no seu juízo perfeito pode pensar que jamais algum actor fará do “Inspector Closeau” um Inspector Closeau à altura daquele que nos deram, nos seus primeiros filmes, Blake Edwards e Peter Seller. Estamos no início da década de 60, e essa série de comédias elevou-se rapidamente à categoria de culto (culto que pode hoje em dia ser reavivado em edição DVD). Depois, morto Peter Seller, muitos tentaram re-editar o sucesso. Imagine-se, caso quase único na história do cinema, que Blake Edwards rodou um filme com Seller já cadáver, aproveitando cenas que tinham sido retiradas de outros filmes. O resultado não foi brilhante. Depois surgiram Alan Arkin, Roger Moore e Robert Begnino a tentarem ser o que nunca poderiam ser. Passaram-se mais umas décadas e eis que voltam a tentar ressuscitar a personagem, não retirando do túmulo o inigualável Peter Seller, mas colocando no seu lugar outro actor de igual envergadura, o norte-americano Steve Martin.
Steve Martin é um óptimo intérprete, já o sabíamos, mas não consegue fazer esquecer Peter Seller. Kevin Kline, na figura de outro imortal (o inspector- chefe Dreyfuss), também não faz esquecer Herbert Lom. Defeitos ou virtudes de quem tem memória. “Last, but not least”, o realizador Shawn Levy não faz esquecer Blake Edwards. A visão deste “A Pantera Cor-de-Rosa” parece assim uma romagem de saudade. Vemos este filme, e recordamos outros. Quase vemos este e rimo-nos do que não esquecemos dos antigos, dos genuínos. Estranho fenómeno, tanto mais que esta “Pantera” versão 2006 tem algumas qualidades: bons actores, já o dissemos (mas falta acrescentar um excelente Jean Reno e ainda as belas e talentosas Beyoncé Knowles e Emily Mortimer), uma realização escorreita e tecnicamente apurada, uma boa fotografia de Paris e Nova Iorque, e alguns “gags” à altura da hereditariedade. Petter Sellers era desastrado a brincar com o globo terrestre, Steve Martin não o é menos, e o seu globo metálico que desce escadarias e escorrega pelas ruas parisienses, é um bom gag Os encontros de Steve Martin com a secretária Emily Mortimer não são só prometedores, mas mais do que isso. A fúria destruidora de Clouseau não desarma (toda a sequência que começa com o “viagra” saltitante é excelente), e há cenas que vão beber a clássicos, como “Serenata à Chuva” (a lição de dicção) ou “Jerry, Enfermeiro sem Diploma” (a cama de hospital que se desloca sozinha com um doente lá dentro), que funcionam muito bem.
Ao contrário de uma sequela, esta “Pantera” de 2006 vai rebuscar o primeiro caso de Clouseau. Tal como a série “Guerra das Estrelas”, regressa ao passado. Vai desenterrar Clouseau, antes dele ser o Clouseau que já conhecemos. A história começa num campo de futebol, durante um jogo do campeonato de mundo, França-China. O treinador de França, uma pedante vedeta de “jet set”, que tem como namorada uma célebre cantora, é assassinado em plena euforia da vitória e o seu valioso anel, que ostenta o famoso diamante “Pantera Cor-de-Rosa”, desaparece. Enquanto o Inspector-chefe Dreyfuss faz tudo para colher pessoalmente os louros, chama o incompetente Inspector Clouseau para tapar os olhos dos media, e assim poder investigar na sombra e no silencio. Mas as contas saem-lhe furadas, como acontece quase sempre nas comédias.
Não sendo uma comédia genial, esta nova “A Pantera Cor-de-Rosa” consegue ser divertida, mesmo para um espectador que entra na sala de pé atrás. O genérico de animação adoça as expectativas. O que vem a seguir é o que de mais aproximado se viu até hoje do verdadeiro Clouseau. Chega? É pouco? É muito? Steve Martin tem a vantagem de não procurar imitar, decalcando, Peter Seller. Recria a personagem, imprimindo-lhe novos traços e mantendo alguns. Esperemos por novas aventuras deste Clouseau.
A PANTERA COR-DE-ROSA (The Pink Panther), de Shawn Levy (EUA, 2006), com Steve Martin, Kevin Kline, Beyoncé Knowles, Jean Reno, Emily Mortimer, etc. 93 min; M/ 12 anos.
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