A noite do Festival começou com uma homenagem a Ruy de Carvalho, um actor que é uma lenda viva no teatro, na televisão, no cinema, mas não só, na dignidade de uma vida e na paixão por uma arte. Laborinho Lúcio leu um magnífico texto de exaltação do actor, Diogo Infante elogiou-lhe as virtudes e anunciou o seu regresso ao Teatro de D. Maria II (na peça “O Camareiro”, que Laurence Olivier tão bem fez em cinema!), Joaquim Benite fez as honras da casa, bem como a Presidente da Câmara de Almada. Justíssima homenagem para alguém que muito admiro e a quem o Famafest há alguns anos prestou idêntica homenagem. É bom saber que há quem homenageie em vida aqueles que amamos.
Fotos: aspectos da Exposicisão dedicada a Ruy de Carvalho
AULLIDOS (UIVOS)
encenação de Jesus Peña
O que se vê então são sangrentos diabos e sequiosos lobisomens, depravadas damas de corte e feiticeiras amaldiçoadas, brutais ogres, e irritantes diabinhos de riso convulsivo, carrascos da Inquisição e libertinos cavaleiros de um inesgotável desejo sexual, e uma menina pobre que os ricos exploram, que vai viver para debaixo do mar, na companhia das sereias, e que é despertada (ou nem isso) da letargia mortal em que caiu, nua e de pernas bem abertas, quando é descoberta pelo lobisomem de serviço, numa fornicação com inúmeros prolegómenos, de que resulta um sedento bebé. Enfim, um deboche completo, para edificação de um público que vibra com o que vê e assim exorcisa os fantasmas que lhe vão na alma. São efectivamente “Uivos” que se libertam do mais secreto da natureza humana. Com a poesia rara da arte que sabe transfigurar mesmo os “uivos” mais animalescos.
Com uma tonalidade poética e uma construção de quadros que relembra o cinema mágico de Méliès, “Uivos” fica seguramente como um dos grandes momentos deste Festival. São mais de 20 bonecos, de tamanho quase humano (alguns de tamanho mesmo sobre-humano), manipulados com maestria pelos seus criadores, que lhes incutem à nossa frente o sopro da vida, que mescla tudo o que esta comporta, amor e tragédia, crueldade e erotismo, magia e realismo (poética), amor e desejo, homens e figurões, imaginário e fantasia dos sonhos.
O “Times”, de Londres, descreveu-o como “um espectáculo de extraordinária habilidade e energia diabólica”. O “El Mundo” afirmou que se trata de uma produção de “altíssimo nível, liberdade, provocação e diversão, um trabalho magistral”. É, na verdade, como se lia no “ABC”, um “terrorífico e divertido conto de fadas. Um trabalho extraordinário”. Várias vezes premiado em Festivais: Prémio para Melhor Espectáculo para Adultos, do Festival de Valência, Prémio da União Polaca de Artistas de Teatro, e Prémio pela “magistral técnica de animação” do Festival de Lleida. Quem não viu, não sabe o que perdeu.
UIVOS (AULLIDOS) – criação e encenação de JESÚS PEÑA; Intérpretes /manipuladores: Teresa Lázaro, Olga Mansilla, Sergio Reques; Fantoches e cenário: Teatro Corsário; Desenho de luz Javier Martín; Música original: Juan Carlos Martín; Desenho de som: Juan Arteagabeitia, Javier Garcia; Maquinista / manipulador: Borja Zamorano, Iñaki Zaldua; Duração 1h05; Classificação M12.
1 comentário:
Já agora, partilho a minha opinião, diferente. Não gostei. Comparando com as peças de marionetas que têm aparecido noutras edições do festival - essas sim, verdadeiramente mágicas, como o Gulliver ou outra que vi no ano passado e de que lamentavelmente não me lembro do nome (exibida na sala de ensaios do TMA) - achei esta particularmente fraca, não só pelo facto de realmente parecer que volta e meia e a propósito de tudo e de nada (talvez por falta de ideias?) se punham os bonecos a «confraternizar» uns com os outros, mas também pelo som, de escolha desinteressante e em volume muito alto. Achei tudo isto uma fórmula demasiado fácil, de um tipo de teatro mais para os lados do entretenimento (ampliando-se a escala da coisa poderia servir para um Casino Estoril!)e sem grande sumo. Não me intrigou, e é essa a sensação que gosto de ter quando acabo de ver uma peça.
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