A GAIOLA DAS LOUCAS
no RIVOLI (Porto)
“A Gaiola das Loucas”, que agora estreou em Portugal, no Rivoli, do Porto, pela mão de Filipe La Féria, é um dos grandes musicais das últimas décadas, tendo um historial muito interessante, mas idêntico a quase todos os fenómenos deste tipo, que vão passando do teatro para o cinema, deste para o musical, ou vice versa.
Tudo começou na noite de 1 de Fevereiro de 1973, em Paris, no Théâtre du Palais-Royal, com a estreia da peça teatral de Jean Poiret, “La Cage aux Folles”, na sua versão original francesa, com um elenco composto por Jean Poiret, Michel Serrault e Pierre Mondy, nos principais papéis. O sucesso foi imediato, cinco anos no Palais-Royal, seguido de mais dois no Variétés. 1800 representações, para mais de um milhão de espectadores.
Compreende-se, pois, que, em 1978, Édouard Molinaro, um bom realizador francês de comédias, tenha assumido a tarefa de transpor para o ecrã as aventuras emocionais de Zaza Napoli. O elenco era de peso e o êxito foi total. Não só em França. Nos EUA (onde se chamou "Birds of a Feather"), esteve anos em estreia e foi durante muito tempo o filme estrangeiro que conseguiu maiores receitas. Ugo Tognazzi (Renato Baldi), Michel Serrault (Albin Mougeotte/'Zaza Napoli'), Michel Galabru (Simon Charrier), Claire Maurier (Simone), Rémi Laurent (Laurent Baldi), Carmen Scarpitta (Louise Charrier), Benny Luke (Jacob) e Luisa Maneri (Andrea Charrier) eram os actores, sublinhando-se o facto de Michel Serrault voltar a criar o papel que o notabilizara em teatro. A partitura era de Ennio Morricone. O sucesso impôs continuação e as sequelas não se fizeram esperar: Em 1980, de novo Édouard Molinaro assina “Cage aux folles, II”, e , em 1985, foi a vez de outro experimentado autor de comédias, Georges Lautner, nos dar “La Cage aux Folles 3 - 'Elles' se Marient”. Mas o cinema não ficaria por aqui. Em 1996, surge um remake americano, dirigido por Mike Nichols, “The Birdcage”, que transfere a acção para South Beach, Miami, tendo como actores principais Robin Williams e Nathan Lane. Entretanto, em 1983, a peça foi adaptada a musical, na Broadway. “La Cage aux Folles”, o musical, com libretto de Harvey Fierstein e música de Jerry Herman, teve depois várias versões, e regressos aos principais palcos mundiais. Recentemente, em Londres, reapareceu no Menier Chocolate Factory, passando depois para o Playhouse Theatre, com Graham Norton no papel de Zaza.Tudo começou na noite de 1 de Fevereiro de 1973, em Paris, no Théâtre du Palais-Royal, com a estreia da peça teatral de Jean Poiret, “La Cage aux Folles”, na sua versão original francesa, com um elenco composto por Jean Poiret, Michel Serrault e Pierre Mondy, nos principais papéis. O sucesso foi imediato, cinco anos no Palais-Royal, seguido de mais dois no Variétés. 1800 representações, para mais de um milhão de espectadores.
Na peça original, tudo se passa em França, em St. Tropez, onde existe um night club gay, “La Cage aux Folles”, onde actua o travesti 'Zaza Napoli' (nome de guerra de Albin Mougeotte), que vive com o empresário da casa de espectáculos, Renato Baldi. Tudo corre bem, apesar de alguns periódicos ataques de vedetismo e de ciúmes da “diva”, até que o filho deste (de um casamento anterior com Simone), resolve regressar a casa dos “pais”, para lhes apresentar a noiva, e a ultraconservadora família desta. Óbvio que nem tudo vai correr bem, por muito que todos se esforcem para parecerem uma “família exemplar”. Mas a “normalidade” não é o mais aparenta esta família.
Posto isto passemos ao espectáculo do La Féria. A abrir, este é seguramente um dos seus mais logrados trabalhos, num registo um pouco diferente dos demais musicais até agora por ele erguidos, quer em Lisboa quer no Porto. A grande maioria dos musicais alicerça-se numa história que é entrecortada por números musicais (cantados e/ou dançados). Mas esses números integram-se na história, fazem-na avançar (muito ou pouco, mas avança, depende do conceito de musical). Aqui há uma história por um lado, e por vezes entradas no cabaret “La Cage aux Folles” onde surgem números de music hall nítidos. Portanto o musical equilibra-se, habilmente, diga-se, entre a estrutura narrativa de uma comédia e momentos de relax, que derivam directamente desse outro universo, o music hall.
Por outro lado, Filipe La Féria adaptou o texto ao cenário português, entre a praia de Cascais e o Porto, donde desce a família tradicionalista, receoso do que os mouros do Sul lhe reservam. O que resulta bem, e traz um colorido muito especial aos diálogos, que relembram “O Leão da Estrela” e outras comédias desse tempo. No caso português, portanto, Armando del Carlo e Carlos Alberto são proprietários de uma discoteca em Cascais, “A Gaiola das Loucas”. Carlos Alberto é o mais prestigiado transformista português rivalizando com todas as “vedetas” marginais da cidade. Ricardo, filho de Armando Del Carlo, estudante universitário, está apaixonado por Barbara Alarcão, filha do deputado portuense Arnaldo Alarcão, vice-presidente do Futebol Clube do Porto. Bárbara convence o seu conservador pai que Ricardo é filho de um adido cultural na Grécia. Resolvem ir a Lisboa conhecer a família do futuro genro, o que obriga Armando del Carlo e o seu companheiro a passar por uma família tradicional e conservadora. Finalmente, a encenação de La Féria é realmente esplendorosa, com um guarda-roupa sumptuoso, de muito bom gosto, coreografias certas e divertidas, cenários belíssimos, e uma marcação de ritmo endiabrado. Os actores são excelentes, a começar pela dupla de “gays”, que José Raposo (impagável na sua desconcertante Zazá) e Carlos Quintas compõem de forma muito divertida, mas sem rebaixar ou aviltar as figuras. Rita Ribeiro (pequena contribuição, mas em grande dama), Joel Branco (o deputado do Norte, de imaculada postura, postiça), Helena Rocha (a matrona nortista), Filipe Albuquerque (um tresloucado mordomo), Hugo Rendas (o jovem noivo, a crescer de papel para papel) e Sara Lima (a noiva) são outros nomes que ajudam a brilhar a homogeneidade de elenco de 68 actores, cantores, bailarinos, músicos, contando ainda com a participação especial de alguns inesperados nomes do espectáculo, como Herman José, Ana Bola, Fernando Mendes, Maria Rueff e Maria João Abreu.
Considerações finais: sendo uma comédia sobre a homossexualidade e o transformismo, “A Gaiola das Loucas” poderia facilmente resvalar para terrenos perigosos, de grotesca caricatura. Nada disso acontece e, no final, o resultado é um estimulante espectáculo sobre a tolerância e a afirmação da liberdade de cada um viver a sua vida conforme os seus valores, desde que não interfira nos valores dos demais. É tudo quanto é preciso, quer se fale de gays ou heteros, de brancos ou negros, de direita ou esquerda, de tinto ou branco. A diversidade é que é a nossa maior grandeza que urge preservar.
A Gaiola das Loucas Texto e música de Jerry Herman – Harvey Fiersten, segundo a comédia de Jean Poiret; Direcção Artística, Encenação Cenografia - Filipe La Féria; Coreografia - Inna Lisniak; Figurinos - João Rolo; Direcção Musical e Produção Musical - Artur Guimarães; Direcção Vocal - Carlos Meireles; Direcção de Produção - Irene de Sousa, Carlos Gonçalves; Direcção de Cena - Helena Rocha; Mestre de Guarda-Roupa - Helena Brandão; Desenho de Luz - Filipe La Féria, João Fontes; Desenho de Som - Felício Fialho, Tiago Pinto; Produção - Todos ao Palco, Maria João Neves, Alexandre Cunha, Diana Moreira; Músicos: Maestro/Piano - Artur Guimarães; Maestro/Piano - Carlos Meireles; Violino - Flávio Azevedo; Violino - Carlos Pinto da Costa; Guitarra - Miguel Azevedo; Guitarra - António Pedro Neves; Bateria/Percussão - Emanuel Monteiro / Hugo Vieira; Baixo - Pedro Cravinho/Pedro Ferreira/André Vilar; Trompete - António Silva; Trompa - Hélder Vales; Trombone - Daniel Dias; Acordeão - Pedro Cunha; Acordeão - Ricardo Miguel.
Personagens e intérpretes: Carlos Alberto/Zazá Napoli - José Raposo; Armando Del Carlo - Carlos Quintas; Simone - Rita Ribeiro; Arnaldo Alarcão - Joel Branco; Maria do Céu Alarcão - Helena Rocha; Jacob - Filipe Albuquerque; Ricardo Del Carlo - Hugo Rendas; Bárbara Alarcão - Sara Lima; Francis - Alexandre Falcão; Mercedes Cristal - Rogério Costa; Maurício/Fedra/Belle Dominique - Pedro Xavier; Gaiolete/Jornalista/Guida Scarlatti - Ivo Dias; Gaiolete/ Lídia Barloff - Pedro Simões; Gaiolete/Ruth Briden - Aleksandr Aleksandrov; Gaiolete - Aleksandr Karpets; Gaiolete - Augusto Gonçalves; Gaiolete - Constantino Dias; Gaiolete - Daniel Santos; Gaiolete - Gilberto Neto; Gaiolete - Kleber Cândido; Gaiolete/Emp.Mesa/Jornalista - Luís David; Ass. Camarim/Cantora - Carla Oliveira; Dolly/Secretária/Jornalista - Mirró Pereira; Dolly/Jornalista/Ass.Camarim - Ana Isabel; Emp.Mesa/Jornalista/Ass. Palco - Pedro Pires. Teatro Rivoli (Porto).
Por outro lado, Filipe La Féria adaptou o texto ao cenário português, entre a praia de Cascais e o Porto, donde desce a família tradicionalista, receoso do que os mouros do Sul lhe reservam. O que resulta bem, e traz um colorido muito especial aos diálogos, que relembram “O Leão da Estrela” e outras comédias desse tempo. No caso português, portanto, Armando del Carlo e Carlos Alberto são proprietários de uma discoteca em Cascais, “A Gaiola das Loucas”. Carlos Alberto é o mais prestigiado transformista português rivalizando com todas as “vedetas” marginais da cidade. Ricardo, filho de Armando Del Carlo, estudante universitário, está apaixonado por Barbara Alarcão, filha do deputado portuense Arnaldo Alarcão, vice-presidente do Futebol Clube do Porto. Bárbara convence o seu conservador pai que Ricardo é filho de um adido cultural na Grécia. Resolvem ir a Lisboa conhecer a família do futuro genro, o que obriga Armando del Carlo e o seu companheiro a passar por uma família tradicional e conservadora. Finalmente, a encenação de La Féria é realmente esplendorosa, com um guarda-roupa sumptuoso, de muito bom gosto, coreografias certas e divertidas, cenários belíssimos, e uma marcação de ritmo endiabrado. Os actores são excelentes, a começar pela dupla de “gays”, que José Raposo (impagável na sua desconcertante Zazá) e Carlos Quintas compõem de forma muito divertida, mas sem rebaixar ou aviltar as figuras. Rita Ribeiro (pequena contribuição, mas em grande dama), Joel Branco (o deputado do Norte, de imaculada postura, postiça), Helena Rocha (a matrona nortista), Filipe Albuquerque (um tresloucado mordomo), Hugo Rendas (o jovem noivo, a crescer de papel para papel) e Sara Lima (a noiva) são outros nomes que ajudam a brilhar a homogeneidade de elenco de 68 actores, cantores, bailarinos, músicos, contando ainda com a participação especial de alguns inesperados nomes do espectáculo, como Herman José, Ana Bola, Fernando Mendes, Maria Rueff e Maria João Abreu.
Considerações finais: sendo uma comédia sobre a homossexualidade e o transformismo, “A Gaiola das Loucas” poderia facilmente resvalar para terrenos perigosos, de grotesca caricatura. Nada disso acontece e, no final, o resultado é um estimulante espectáculo sobre a tolerância e a afirmação da liberdade de cada um viver a sua vida conforme os seus valores, desde que não interfira nos valores dos demais. É tudo quanto é preciso, quer se fale de gays ou heteros, de brancos ou negros, de direita ou esquerda, de tinto ou branco. A diversidade é que é a nossa maior grandeza que urge preservar.
A Gaiola das Loucas Texto e música de Jerry Herman – Harvey Fiersten, segundo a comédia de Jean Poiret; Direcção Artística, Encenação Cenografia - Filipe La Féria; Coreografia - Inna Lisniak; Figurinos - João Rolo; Direcção Musical e Produção Musical - Artur Guimarães; Direcção Vocal - Carlos Meireles; Direcção de Produção - Irene de Sousa, Carlos Gonçalves; Direcção de Cena - Helena Rocha; Mestre de Guarda-Roupa - Helena Brandão; Desenho de Luz - Filipe La Féria, João Fontes; Desenho de Som - Felício Fialho, Tiago Pinto; Produção - Todos ao Palco, Maria João Neves, Alexandre Cunha, Diana Moreira; Músicos: Maestro/Piano - Artur Guimarães; Maestro/Piano - Carlos Meireles; Violino - Flávio Azevedo; Violino - Carlos Pinto da Costa; Guitarra - Miguel Azevedo; Guitarra - António Pedro Neves; Bateria/Percussão - Emanuel Monteiro / Hugo Vieira; Baixo - Pedro Cravinho/Pedro Ferreira/André Vilar; Trompete - António Silva; Trompa - Hélder Vales; Trombone - Daniel Dias; Acordeão - Pedro Cunha; Acordeão - Ricardo Miguel.
Personagens e intérpretes: Carlos Alberto/Zazá Napoli - José Raposo; Armando Del Carlo - Carlos Quintas; Simone - Rita Ribeiro; Arnaldo Alarcão - Joel Branco; Maria do Céu Alarcão - Helena Rocha; Jacob - Filipe Albuquerque; Ricardo Del Carlo - Hugo Rendas; Bárbara Alarcão - Sara Lima; Francis - Alexandre Falcão; Mercedes Cristal - Rogério Costa; Maurício/Fedra/Belle Dominique - Pedro Xavier; Gaiolete/Jornalista/Guida Scarlatti - Ivo Dias; Gaiolete/ Lídia Barloff - Pedro Simões; Gaiolete/Ruth Briden - Aleksandr Aleksandrov; Gaiolete - Aleksandr Karpets; Gaiolete - Augusto Gonçalves; Gaiolete - Constantino Dias; Gaiolete - Daniel Santos; Gaiolete - Gilberto Neto; Gaiolete - Kleber Cândido; Gaiolete/Emp.Mesa/Jornalista - Luís David; Ass. Camarim/Cantora - Carla Oliveira; Dolly/Secretária/Jornalista - Mirró Pereira; Dolly/Jornalista/Ass.Camarim - Ana Isabel; Emp.Mesa/Jornalista/Ass. Palco - Pedro Pires. Teatro Rivoli (Porto).
1 comentário:
Obrigado por este tão simpático texto! É bom haver quem escreva sobre os palcos portugueses... Um grande bravo para sí!
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