HITCHCOCK
“Hitchcock” não é uma biografia de Alfred Hitchcock, mas
o relato de um momento da sua vida, precisamente o que antecede a estreia de
“Psyco”, um dos seus filmes de maior sucesso, reunindo elogios da crítica e as
benesses da bilheteira. O cineasta acabara de estrear “Intriga Internacional” e
fica impressionado com um caso que ocupou as páginas dos jornais e que levou o
romancista Robert Bloch a escrever “Psycho”: Ed Gein, um serial killer,
atormentado pela imagem da mãe, com quem aliás dormia, não sendo já esta mais
do que um cadáver ressequido. Estamos em 1959, Hitch (como gostava de ser
tratado, “esqueçam o “cock”, costumava acrescentar) inicia a preparação de um
filme algo raro na sua filmografia que o tornara conhecido como o “mestre do
suspense”. “Psico” manterá as características de suspense, levando-as mesmo a
limites invulgares, mas entra abertamente do terreno do filme de terror. A
Paramount, sua produtora na altura, apesar do prestígio do cineasta, não está
muito convencida a alinhar nesta aventura demasiado chocante para a época e
para os rigores da comissão de censura (apesar de tudo nessa altura já a perder
a força de outros tempos). Mas Hitch acredita profundamente nas virtualidades
do projecto, abalança-se na realização, mesmo hipotecando casa e piscina,
sempre apoiado na sua grande colaboradora de sempre, a mulher Alma Reville, sua
secretária, montadora, co-autora de argumentos e inspiradora.
Claro que para um cinéfilo admirador de Hitchcock, este
filme de Sasha Gervasi não deixa de ser interessante, apesar de nada trazer de
novo. Vai repescar alguns episódios e frases que tornaram o cineasta mítico,
reconstitui com alguma fidelidade o ambiente dos estúdios durante o final da
década de 50, mas não vai muito além disso, tanto mais que um dos factores em
que apostou deliberadamente, a caracterização das personagens, fica aquém dos
resultados pretendidos. Anthony Hopkins, no protagonista, é como sempre um
actor excelente, consegue a postura física e o tom de voz do modelo original,
mas parece-se muito mais, sobretudo de perfil, com Nicolau Breyner do que com
Hitchcock. A magnífica Helen Mirren ergue uma figura interessante, sobretudo na
sua disputa de ciúmes com o marido, ele olhando com suspeição a relação da
mulher com o escritor Whitfield Cook, ela tendo a certeza das lúbricas
intenções do marido para com as suas louras de estimação. Mas as honras da casa
vão para Scarlett Johansson (Janet Leigh) e James D'Arcy (Anthony Perkins), que
conseguem compor figuras que se aproximam muito dos originais.
Há situações que julgamos mal resolvidas (a presença
obcecante de Ed Gein, como fantasma inspirador, é uma delas), há curiosidades
que são interessantes de conhecer (para lá de todo o seu prestígio, Hitch não
consegue levar a Paramount a investir capital neste seu novo projecto; Hitch
lutando pelo “final cut” apesar de o financiamento da obra ser seu e a
Paramount apenas distribuir o filme; “Psico” estreia nos EUA somente em duas
salas; a campanha de marketing preparada pelo cineasta, com destacamentos de
policias à porta dos cinemas e alarmantes avisos dirigidos aos espectadores,
etc.).
Não sendo o grande filme que poderia ser, “Hitchcock”
justifica alguma atenção, sobretudo por parte daqueles que gostam de ver o
outro lado do cinema, de Hollywood, e dessa fábrica de sonhos. Mas para se
conhecer o mestre, o melhor mesmo é ver “Psico” ou “Vertigo”, cuja reposição em
cópia nova, remasterizada, anda por aí anunciada, agora que a revista inglesa
“Sight and Sound” o considera o melhor filme de sempre, após consulta a algumas
dezenas de críticos e cineastas de todo o mundo.
Sacha Gervasi, inglês de nascimento, é talvez mais
conhecido como argumentista do que realizador (escreveu, entre outros, “The Big
Tease”, 1999, “Terminal de Aeroporto”, 2004, ou “O Crime de Henry”, (2010).
Como realizador, é autor de um documentário bem recebido, “Anvil: The Story of
Anvil”, antes deste “Hitchcock”. Prepara “My Dinner with Herve”.
Título
original: Hitchcock
Director: Sacha Gervasi (EUA, 2012); Argumento: John J.
McLaughlin, segundo obra de Stephen Rebello ("Alfred Hitchcock and the
Making of Psycho"); Produção: Alan Barnette, Ali Bell, Joe Medjuck,
Richard Middleton, Tom Pollock, Ivan Reitman, John Schneider, Tom ThayerM ;
Música: Danny Elfman; Fotografia (cor): Jeff Cronenweth; Montagem: Pamela Martin; Casting: Terri Taylor; Design
de produção: Judy Becker; Direcção artística: Alexander Wei; Decoração: Robert
Gould; Guarda-roupa: Julie Weiss; Maquilhagem: Julie Hewett, Maha, Martin
Samuel, Kimberley Spiteri; Direcção de Produção: Beverley Ward; Assistentes de
realização: Peter Kohn, Brandon Lambdin, Lauren Pasternack; Departamento de
arte: Andrew Birdzell, Susannah Carradine, Cristina Colissimo, Kevin Kalaba,
Thomas Machan, Daniel Turk; Som: Mildred Iatrou, Jason Johnston, Ai-Ling Lee;
Efeitos especiais: Josh Hakian, David Waine; Efeitos visuais: Erik Courtney,
Andrew Lewitin, Ken Locsmandi, Kevin London, Bhavini Ashwinkumar Shah, Amir
Shahinsha; Companhias de produção: Fox Searchlight Pictures, Cold Spring
Pictures, The Montecito Picture Company; Intérpretes:
Anthony Hopkins (Alfred Hitchcock), Helen Mirren (Alma Reville), Scarlett
Johansson (Janet Leigh), Danny Huston (Whitfield Cook), Toni Collette (Peggy
Robertson), Michael Stuhlbarg (Lew Wasserman), Michael Wincott (Ed Gein),
Jessica Biel (Vera Miles), James D'Arcy (Anthony Perkins), Richard Portnow,
Kurtwood Smith, Ralph Macchio, Kai Lennox, Rita Riggs, Wallace Langham, Paul
Schackman, Currie Graham, Spencer Garrett, Terry Rhoads, Tom Virtue, Karina
Deyko, Steven Lee Allen, Richard Chassler, Frank Collison, Melinda Chilton,
Mary Anne McGarry, Jon Abrahams, Gil McKinney, Emma Jacobs, Spencer Leigh, Sean
MacPherson, Gerald V. Casale, Tara Arroyave, Judith Hoag, Josh Yeo, Danielle
Burgio, etc. Duração: 98 minutos;
Distribuição em Portugal: Big Picture 2 Films; Classificação etária: M/ 12
anos; Estreia em Portugal: 7 de Fevereiro de 2013.
1 comentário:
Admirando Hitchcock e tendo visto todos os seus filmes ainda não percebi porque é que não estou curiosa a respeito deste filme. Dantes gostava deste actor, depois tornou-se-me um pouco aborrecido, não sei se será por isso que tenho pouco interesse na fita...
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