SALA VIP
“Sala Vip” é um texto de Jorge Silva Melo, encenado por
Pedro Gil. A peça é uma notável declaração de amor à vida, ao teatro, ao amor.
A encenação é magnífica de sensibilidade, de criatividade, numa ligação entre o
trágico e o humor, trespassada por um lirismo ácido.
Seis personagens numa sala de espera de um aeroporto.
Pertencem todas a uma companhia de ópera. Perderam um voo, uma ligação, o que
quer que seja. Perderam um contacto com quem tentam desesperadamente
estabelecer uma ligação telefónica. Esperam. Perderam. “Sala Vip” é um lamento
sobre a perda, a perda do amor, da juventude, da voz, das ilusões, alguém não
volta a encontrar aquelas “deliciosas bolinhas de chocolate com Ovomaltine
dentro”. ”Oh, baby, baby, it’s a wild world”, canta-se repetidamente. Perdeu-se
o teatro. Perdeu-se a ópera. Perde-se a vida. ”Oh, baby, baby, it’s a wild
world”. A sensação de perda avoluma-se, à medida que as personagens mudam de
espaço, mas não alteram o desespero. O medo. Medo de tudo. De azeitonas,
também.
Escreveu Pedro Gil: “Depois faremos das palavras do Jorge
as nossas perguntas: e depois do sucesso? do dinheiro? do orgasmo? do amor? da
juventude? E depois do teatro?”. Um mundo desaparece, “desaparece-me”, diz
Jorge da Silva Melo.
Neste panorama negro de desespero é, todavia, possível
encontrar essa envolvente declaração de amor à vida, ao teatro, ao amor. Porque
a peça é isso mesmo que transmite, porque a encenação é isso mesmo que
sublinha, porque os actores é isso mesmo que encarnam. Num mundo em perda
constante, temos ali à nossa frente a prova perfeita de que o teatro existe, o
amor existe, a vida existe. E tenhamos esperança, haverá algures essas “deliciosas
bolinhas de chocolate com Ovomaltine dentro.”
Se o texto é forte, intenso, poético, brutal por vezes,
sensível sempre, a encenação é uma demonstração perfeita de maturidade, marcada
no ritmo certo, com uma soberba direcção de actores, brilhante no pormenor. Jorge
Silva Melo conseguiu encontrar em Pedro Gil o cúmplice perfeito. A mescla de
trágico lirismo e de ironia prolonga-se por situações e citações invulgarmente
bem conseguidas, desde à invocação do Dr. House à citação “actualizada” do mais
célebre diálogo de “Johnny Guitar”. Aliás, as referências cinematográficas são
contínuas e como me lembrei de “Violência e Paixão”, de Visconti, ao assistir à
representação.
Do elenco fazem parte Andreia Bento, Maria João Falcão,
Elmano Sancho, António Simão e João Pedro Mamede, todos eles brilhantes na sua
apaixonante fragilidade, construída com uma força, um nervo, uma entrega
notáveis. Quantos e tão bons actores há hoje em dia em Portugal!
Não errarei muito se disser que este será seguramente um
dos melhores espectáculos de teatro levados à cena este ano em Portugal.
SALA VIP
Texto Jorge Silva Melo; Encenação Pedro Gil; Cenografia e
Figurinos Rita Lopes Alves; Músico João Aboim; Luz Pedro Domingos; Com Andreia
Bento, Maria João Falcão, Elmano Sancho, António Simão e João Pedro Mamede; Uma
produção Pedro Gil, Artistas Unidos e Culturgest. Na Culturgest, de 6 a 9 de
Julho. M / 16 anos.
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