domingo, julho 07, 2013

FESTIVAL DE ALMADA: SALA VIP



SALA VIP

“Sala Vip” é um texto de Jorge Silva Melo, encenado por Pedro Gil. A peça é uma notável declaração de amor à vida, ao teatro, ao amor. A encenação é magnífica de sensibilidade, de criatividade, numa ligação entre o trágico e o humor, trespassada por um lirismo ácido.
Seis personagens numa sala de espera de um aeroporto. Pertencem todas a uma companhia de ópera. Perderam um voo, uma ligação, o que quer que seja. Perderam um contacto com quem tentam desesperadamente estabelecer uma ligação telefónica. Esperam. Perderam. “Sala Vip” é um lamento sobre a perda, a perda do amor, da juventude, da voz, das ilusões, alguém não volta a encontrar aquelas “deliciosas bolinhas de chocolate com Ovomaltine dentro”. ”Oh, baby, baby, it’s a wild world”, canta-se repetidamente. Perdeu-se o teatro. Perdeu-se a ópera. Perde-se a vida. ”Oh, baby, baby, it’s a wild world”. A sensação de perda avoluma-se, à medida que as personagens mudam de espaço, mas não alteram o desespero. O medo. Medo de tudo. De azeitonas, também.
Escreveu Pedro Gil: “Depois faremos das palavras do Jorge as nossas perguntas: e depois do sucesso? do dinheiro? do orgasmo? do amor? da juventude? E depois do teatro?”. Um mundo desaparece, “desaparece-me”, diz Jorge da Silva Melo. 
Neste panorama negro de desespero é, todavia, possível encontrar essa envolvente declaração de amor à vida, ao teatro, ao amor. Porque a peça é isso mesmo que transmite, porque a encenação é isso mesmo que sublinha, porque os actores é isso mesmo que encarnam. Num mundo em perda constante, temos ali à nossa frente a prova perfeita de que o teatro existe, o amor existe, a vida existe. E tenhamos esperança, haverá algures essas “deliciosas bolinhas de chocolate com Ovomaltine dentro.”
Se o texto é forte, intenso, poético, brutal por vezes, sensível sempre, a encenação é uma demonstração perfeita de maturidade, marcada no ritmo certo, com uma soberba direcção de actores, brilhante no pormenor. Jorge Silva Melo conseguiu encontrar em Pedro Gil o cúmplice perfeito. A mescla de trágico lirismo e de ironia prolonga-se por situações e citações invulgarmente bem conseguidas, desde à invocação do Dr. House à citação “actualizada” do mais célebre diálogo de “Johnny Guitar”. Aliás, as referências cinematográficas são contínuas e como me lembrei de “Violência e Paixão”, de Visconti, ao assistir à representação.
Do elenco fazem parte Andreia Bento, Maria João Falcão, Elmano Sancho, António Simão e João Pedro Mamede, todos eles brilhantes na sua apaixonante fragilidade, construída com uma força, um nervo, uma entrega notáveis. Quantos e tão bons actores há hoje em dia em Portugal!
Não errarei muito se disser que este será seguramente um dos melhores espectáculos de teatro levados à cena este ano em Portugal.

SALA VIP

Texto Jorge Silva Melo; Encenação Pedro Gil; Cenografia e Figurinos Rita Lopes Alves; Músico João Aboim; Luz Pedro Domingos; Com Andreia Bento, Maria João Falcão, Elmano Sancho, António Simão e João Pedro Mamede; Uma produção Pedro Gil, Artistas Unidos e Culturgest. Na Culturgest, de 6 a 9 de Julho. M / 16 anos. 

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