A MELHOR OFERTA
Perdi-o
aquando da estreia em salas. Recuperei-o agora, em DVD. Um dos melhores filmes
de 2013, seguramente. Giuseppe Tornatore, o autor de “Cinema Paraíso”, seu
grande triunfo internacional, parece ter sido amaldiçoado em terras nacionais,
pois nunca mais um filme seu teve um notório sucesso crítico, e mesmo de
público. No entanto, depois de 1988 (data de "Nuovo Cinema Paradiso")
ele dirigiu um significativo número de obras dignas de referência, como “Estão
Todos Bem”, “Uma Simples Formalidade”, “O Homem das Estrelas”, “A Lenda de
1900”, “Malèna”, “A Desconhecida” ou “Baarìa”.
De
todas as formas, “A Melhor Oferta” é um belíssimo filme, original no tema,
elegante no estilo, tenso no ritmo. Fascinante na forma metafórica como aborda
uma história de amor invulgar. Não por acaso o protagonista chama-se Oldman, é
um antiquário e avaliador de objectos de arte, director de uma das mais
conceituadas casa de leilões da Europa, situada em Viena. Frio, distante,
solitário, este homem que conserva as mãos sempre envolvidas em luvas e
comemora os aniversários nos melhores restaurantes, mas sempre só, ignora
aparentemente os sentimentos. Nunca conheceu mulher ou o amor e as emoções,
encerra-as numa sala cofre da sua casa, onde colecciona retratos de mulheres de
todas as épocas da história da arte. Esta galeria privada, de valor incalculável,
e adquirida ao longo de toda uma vida, com a colaboração de um amigo que vai
licitando as peças desejadas, é o seu local de repouso do guerreiro, afastado
do mundo, resguardado, defendido do exterior por uma porta blindada.
Um dia,
porém, esta calma é perturbada pela aparição de um fantasma que desencadeia a
sua curiosidade. Uma mulher jovem, Claire, vive sozinha num velho palacete
quase em ruínas, recusando-se a sair à rua, negando-se a qualquer contacto com
outras pessoas. Aparentemente trata-se de um caso de agorafobia. Mas Claire
possuiu uma vasta colecção de obras de arte e quer desfazer-se delas. Chama
Oldman para preparar o leilão, sem todavia nunca se mostrar. O que começa por
uma questão incómoda passa a curiosidade, depois a obsessão, finalmente a
paixão. Oldman vive obcecado por aquela mulher misteriosa, que ele começa por
espiar e que, finalmente, se desvenda a seus olhos. Senhor de uma fortuna
imensa e de uma honorabilidade profissional inquestionável, acaba por descuidar
a vida privada e o trabalho, procurando a cumplicidade de um jovem restaurador
de objectos de arte, que se entretém a recuperar um robot metálico do século
XIX, com peças que Oldman vai descobrindo na cave da mansão de Claire.
Por
aqui nos temos que deter, mas há que sublinhar que toda esta intriga serve para
estabelecer curiosas afinidades entre o amor e arte, a verdade e a mentira, a
falsificação e o original. Oldman é um obstinado coleccionador de originais,
mas declara que existe sempre algo de autêntico, “mesmo numa falsificação”. Em
Claire, ele encontra um duplo de si próprio: ela vive afastada de todos, com
terror das multidões, ele vive fechado sobre si próprio, com medo da mulher
(excepto daquelas que ele consegue aprisionar no seu cofre forte). O tema do
velho sábio ou artista que se deixa seduzir pela “femme fatal” é velho e
repetitivo na história da literatura (e do cinema, claro), mas Tornatore
consegue torná-lo novo, refrescando-o com sugestivas ideias e imagens. Um homem
que quase não se engana a descobrir uma obra de arte autêntica e a identificar
uma falsificação, como se desembaraça quando se depara com idênticas opções na
vida real? Sim, porque como lhe diz o seu amigo e cúmplice, “os sentimentos
humanos são como as obras de arte, podem também ser o resultado de uma
simulação.”
Extremamente
bem conduzido, com elegância e eficácia narrativa, criando um ambiente de
crescente tensão psicológica, “A Melhor Oferta” renova o tema do velho “filme
negro” de inspiração sentimental, para o que conta com uma fabulosa
interpretação de Geoffrey Rush (em Virgil Oldman), bem acompanhado por Donald
Sutherland (o cúmplice e amigo Billy Whistler), e a quase desconhecida Sylvia
Hoeks (uma misteriosa e sedutora Claire, que relembra Simone Simon, de “Cat
People”). A partitura musical de Ennio Morricone é magnífica e belíssima a
fotografia de Fabio Zamarion. Finalmente, há que referir as escolhas dos
cenários. O velho palacete onde decorre grande parte do filme é um décor
absolutamente deslumbrante, que muito contribui para o sucesso desta bela obra
de suspense psicológico que volta a trazer à ribalta o nome de Tornatore.
A MELHOR OFERTA
Título original: La Migliore
Offerta
Realização: Giuseppe Tornatore (Itália,
2013); Argumento: Giuseppe Tornatore; Produção: Isabella Cocuzza, Arturo
Paglia, Guido De Laurentiis, Enzo Sisti; Música: Ennio Morricone; Fotografia
(cor): Fabio Zamarion; Montagem: Massimo Quaglia; Casting: Reg
Poerscout-Edgerton; Design de produção: Maurizio Sabatini; Direcção artística:
Andrea Di Palma; Decoração: Raffaella Giovannetti; Guarda-roupa: Maurizio
Millenotti; Maquilhagem: Stefano Ceccarelli, Santoro Domingo, Luigi Rocchetti,
Matteo Silvi; Direcção de produção: Alice Marchitelli, Daniela Masciale, Erik
Paoletti, Andrea Tavani; Assistentes de realização: Livio Bordone, Alberto
Mangiante, Barbara Pastrovich; Departamento de arte: Silvia Fontana; Som:
Gilberto Martinelli; Efeitos especiais: Stefano Corridori; Efeitos visuais:
Francesca Baiardi, Mario Zanot; Intérpretes:
Geoffrey Rush (Virgil Oldman), Jim Sturgess (Robert), Sylvia Hoeks (Claire),
Donald Sutherland (Billy Whistler), Philip Jackson (Fred), Dermot Crowley
(Lambert), Kiruna Stamell, Liya Kebede, Caterina Capodilista, Gen Seto, Klaus
Tauber, Maximilian Dirr, Laurence Belgrave, Sean Buchanan, John Benfield, Miles
Richardson, James Patrick Conway, Brigitte Christensen, Jacqueline Hopkins,
Amanda Walker, Sylvia De Fanti, Victoria Chapman, etc. Duração: 124 minutos; Classificação etária: M/ 12 anos;
Distribuição em Portugal: Pris Audiovisuais; Data de estreia em Portugal: 11 de
Abril de 2013.
2 comentários:
Apesar de todos os excelentes comentários sobre esta obra, não se compreende por que razão este filme continua indisponível no mercado. São publicados e distribuídos tantos filmes de duvidoso interesse e este continua adiado. Agradeço que reconsiderem o seu estado de congelamento no mercado nacional e que rapidamente o coloquem à disposição. Eu, por exemplo, gostava imenso de o ver.
Obrigado
Atentamente
Armando
Excelente.
Mas, porque razão não se encontra disponível este filme?
Outros mereceram essa atenção e «A MELHOR OFERTA», não!
Alguém poderá explicar este estranho(?) fenómeno?
Ou será que alguém poderá fazer o favor de dizer como o encontrar?
Obrigado
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