ESCÂNDALO
NAS NOTÍCIAS DA NOITE
“Escândalo nas Notícias da Noite” parte de uma peça teatral
americana, de 1928, assinada pela dupla Charles MacArthur e Ben Hecht, que tem
tido uma carreira brilhante no teatro, no cinema e na televisão (ver texto
abaixo). Agora Frederico Corado adaptou-a à actualidade e a Portugal, mantendo
toda a estrutura, sobretudo da sua última versão cinematográfica, “Linhas
Cruzadas”. Um canal de televisão português debate-se com alguns problemas,
sobretudo ditados pelo auto afastamento da sua repórter principal, ex-mulher do
director da estação, e que se prepara para partir em viagem de núpcias para
Angola com um milionário empresário de artigos de desporto. Mas a jornalista
sente o apelo da notícia quando descobre que um preso condenado a pesada pena,
e que ela julga inocente (e depois vem mesmo a saber estar inocente), precisa
dela e de tornar visível perante a opinião pública a manobra política e
judicial de que está a ser vítima. Às autoridades interessa sobretudo
solucionar um caso rapidamente, sem olhar a outros interesses. Assim, ela adia
a viagem para a paradisíaca ilha do Mussulo e atira-se de cabeça à tarefa de
resgatar a verdade. O que pressupõe muitas peripécias, algumas divertidas,
outras dramáticas, mas sempre críticas para com alguns poderes instituídos.
A produção é da equipa “Área de Serviço”, com adaptação da
peça, encenação e cenários de Frederico Corado (que também interpreta um dos
principais papéis), grupo que já encenou anteriormente as peças “Um Marido
Ideal”, “O Crime de Aldeia Velha”, “As Alegres Comadres de Windsor”, “Nápoles
Milionária”, “Pânico”, “Trisavó de Pistola à Cinta”, “O Inspector Geral”, “Oito
Mulheres” e “O Dinheiro Não é Tudo na Vida”.
A encenação, movimentada e cheia de bons achados de humor,
funciona num cenário relativamente simples, com adereços que apenas indicam e
sugerem. O ritmo conseguido surpreende, tratando-se de uma companhia
comunitária, logo de actores amadores (que, de peça para peça apuram qualidades
e limam deficiências). Há mesmo alguns actores com capacidades que merecem ser
dilatadas noutros trabalhos. Mas, fundamentalmente, há que sublinhar o esforço
desta iniciativa muito bem orientada para textos de qualidade inequívoca,
fomentando o gosto pelo teatro, quer praticando-o no palco, quer assistindo a
ele na plateia do Centro Cultural do Cartaxo. O espectáculo tem novas
representações a 24 e 25 de Abril, às 21 horas.
Escândalo nas Notícias da Noite / um
espectáculo de Frederico Corado, no Centro Cultural do Cartaxo /24 e 25
de Abril às 21.30h
Texto e Encenação: Frederico Corado |
Concepção e Execução Cenográfica: Frederico Corado e Mário Júlio | Produção
CCC: Marco Guerra e Carlos Ouro | Produção Área de Serviço: Frederico Corado,
Florbela Silva e Vânia Calado com a assistência de Pedro Ouro, Carolina Viana,
Rita Correia Alves | Grafismo: Cátia Garcia | Assistente de Encenação: Florbela
Silva, Cláudia Antunes, Maria Ramalho, Pedro Ouro, Rita Correia Alves | Desenho
de Luz: Ricardo Campos | Assistência Técnica: Miguel Sena | Direcção de Cena:
Mário Júlio| Contra-Regra: Amélia Martins | Fotografia: Vitor Neno | Montagem:
Mário Júlio e Vitor Lima| Uma Produção da Área de Serviço com o Centro Cultural
do Cartaxo; Intérpretes: Vânia Parente Calado,
Frederico Corado, Carlos Ramos, Vasco Casimiro, João Nunes, Mário Júlio, Ana
Ribeiro, Virgínia Teófilo, Helena Montez, Mónica Coelho, João Paulo, Carolina
Viana, Ana Patrícia Jorge, Mauro Cebolo, Susana Condinho, Pedro Ouro, Pedro
Lino, Luis Rosa Mendes, Paulo Cabral, Rosário Narciso, Amélia Martins, Rita
Oliveira, Ana Catarina Casimiro, Daniel Mateus, Pedro Magalhães, Aureliana
Campanacho, Jeanine Steuve, Catarina Carmo, Maria José Cerqueira, Andréa Silva,
João Pedro Sousa, Joana Pinheiro, Beatriz Pinho, José Miguel Ribeiro, Inês
Nunes, André Vieira, Joana Condinho Pais, Miguel Carias, etc.Centro Cultural do
Cartaxo / Rua 5 de Outubro | 2070-059 Cartaxo, Portugal /Teatro . M6 /Bilhetes:
5€
2. “A PRIMEIRA PÁGINA” (THE FRONT PAGE) NO CINEMA
No conturbado e agitado período de final dos anos 20, a
América inteira pode dizer-se que se transforma num vulcão em permanente
ebulição. Estava-se no pós-guerra, os soldados do Tio Sam tinham, pela primeira
vez, experimentado os amargos e os sucessos de um gigantesco conflito militar
que se desenrola a muitos quilómetros da sua Pátria, numa Europa
simultaneamente distante e aliciante, local de origem da maior parte dos ancestrais
dos jovens combatentes, mas terra de outros costumes e outro ritmo de vida. Nos
EUA germinava o Crash que iria rebentar
em 1929 e progredir assustadoramente pela Grande Depressão dos anos 30. A
instabilidade que parecia apostar fortíssimo em tal época era bem demonstrativa
de que as armas não se haviam calado de vez, mas antes se encontravam em
repouso quase forçado, à espera de que novo holocausto se viesse a verificar,
sem grandes alternativas nem esperanças fundadas.
Nessa altura, um jovem jornalista de Chicago, de parceria
com outro colega também pouco acomodatício, deu à estampa uma obra que
intitulou “The Front Page”. Estava-se em 1928, o autor principal chamava-se
Charles MacArthur e o seu comparsa Ben Hecht. De ambos ainda surgiriam
“Twentieth Century” (1932) e “Ladies and Gentlemen” (1939). No entanto, a
primeira das obras seria aquela que daria notoriedade a MacArthur que, casado
com a actriz Helen Hayes, se dedicaria também a escrever para o cinema. Esta peça teria uma encenação portuguesa no Teatro "A Barraca", em 1994, com encenação de Helder Costa, com interpretação de Maria do Céu Guerra, Francisco Nicholson e João d'Ávila, entre outros.
“The Front Page” foi objecto de várias adaptações
cinematográficas, a primeira das quais realizada por Lewis Milestone, logo em
1931. Entre os actores, Adolphe Menjou, Pat O'Brien e Mary Brian. Mas em 1940,
Howard Hawks voltaria ao tema, realizando “O Grande Escândalo” (His Girl
Friend) com um elenco de nomes sonantes à frente do qual se encontravam
Rosalind Russel, Cary Grant e Ralph Bellamy. Posteriormente outra gente
retomaria o tema. Foram algumas as versões de TV, logo na década de 40: Ed
Sobol dirigiu uma em 1945, com Vinton Hayworth, Matt Crowley e Howard Smith; o
produtor Joel O’Brien lançou outra, em Inglaterra, em 1948, com Basil Appleby,
Harold Ayer e Michael Balfour; entre 1949 e 1950 apareceu uma mini série, com
direcção de Franklin Heller, e interpretação de John Daly, Mark Roberts e Richard
Boone; finalmente em 1970, nova incursão televisiva, desta feira assinada por
Alan Handley, com Robert Ryan, George Grizzard e Helen Hayes (como já vimos a
mulher de MacArthur).
Os tempos mudaram, a imprensa escrita cedeu o seu lugar
prioritário à televisão, por isso se compreende que, em 1988, “The Front Page”
se passe a chamar “Linhas Trocadas” (Switching Channels), numa versão
cinematográfica de Ted Kotcheff, com um novo elenco de luxo, Kathleen Turner,
Burt Reynolds e Christopher Reeve.
Desconhecendo a obra de 1931 e as adaptações televisivas,
vamos recuperar algumas curtas impressões críticas das restantes, escritas na
época em que inicialmente as vi.
Começando pelo filme de Howard Hawks:
Numa redacção de um jornal reúne-se um grupo heterogéneo,
constituído pelo próprio director do jornal, um cronista de casos de polícia e
de tribunais, uma prostituta e um condenado à morte que se havia conseguido
evadir da prisão em que se encontrava aguardando a execução. Com eles e outros
comparsas menores se constrói uma história em que o dramático alterna com o
burlesco, daí resultando uma comédia brilhante e de tal modo atractiva que,
como se disse já, motivou por várias vezes o interesse dos realizadores e
produtores e a consequente atenção das câmaras.
Há que referir que esta versão tem uma realização realmente
brilhante de Howard Hawks e, reforçando o afirmado, de entre os intérpretes
salienta-se o talento de comediante de Rosaline Russel, que aqui regista uma
das suas mais significativas actuações perante as objectivas. Alguns
saudosistas relembram, a propósito de “O Grande Escândalo”, “The Front Page”,
de 1931, rodado num único cenário, em que o realizador Lewis Milestone utilizou
com toda a propriedade os travelling que tinham sido relativamente descurados
com o advento do sonoro. Voltando a “His Girl Friend” um outro termo de
comparação é possível de estabelecer com a obra precedente: enquanto Milestone
realizara uma fita com 101 minutos de duração, Hawks reduz o tempo de projecção
para 92 minutos. E por isso que esta velha glória do cinema debruçado sobre a
informação é considerada por muitos como tendo um ritmo mais dinâmico do que a
primeira versão d “The Front Page”. Dir-se-ia, antes, que são duas concepções
diferentes, com quase dez anos a separá-las. Vale, porém, a pena recordar-se um
e outro destes filmes que ficaram na História da Sétima Arte.
Depois de
Lewis
Milestone e de Howard Hawks, “The Front Page” é já uma obra teatral consagrada,
esta que Billy Wilder retoma para a marcar com o seu espírito sarcástico, o seu
humor corrosivo, o rigor do seu trabalho de encenação, e a magnifica direcção
de actores, onde sobressaem Jack Lemmon, Walter Matthau e Carol Burnet.
Com um condenado à morte à espera da hora final, é nos
bastidores de certa imprensa sensacionalista, que manipula pessoas e
acontecimentos, que se irá centrar a análise de Wilder. O prestígio político,
os interesses criados, o lucro fácil, são algumas das peças de uma engrenagem
desmontada pelo cineasta que, desde início, se coloca do lado do condenado à
morte e de uma prostituta que o procura ajudar, tendo em seu redor uma matilha
que os tenta devorar com intuitos diversos, mas sempre com igual barbaridade,
em nome de um qualquer lucro.
“Linhas
Trocadas”, de Ted Kotcheff, versão mais recente (1987), actualizada, da peça
teatral de Hecht e MacArthur, acusa alguma banalização de processos, tendentes
a um riso burlesco e algo inconsequente, que lhe retira um pouco da sua força,
agressividade e poder corrosivo.
Christy
Collerau (a belíssirna Kathleen Turner) é uma jornalista, vedeta de uma cadeia
de televisão norte americana, onde trabalha também o seu ex-marido, John
Sullivan (um turbulento Burt Reynolds). Em férias, conhece um empresário
aprumadinho, Blaine Brighaam (Christopher Reeves, aqui atraiçoando a sua
predilecção por papeis de jornalista), com quem resolve casar-se e abandonar a
TV. Mas John Sullivan joga o mais sujo que sabe para não perder nem a
colaboradora nem a mulher e oferece-lhe uma reportagem irrecusável: entrevistar
Ike Roscoe, um condenado à morte na cadeira eléctrica, que tudo aponta estar
inocente. Christy não é capaz de renunciar a este desafio. Mas Roscoe consegue
fugir, Christy e Sullivan conseguem escondê-lo, mas o filme não consegue
comparar-se aos outros extraídos da mesma base, muito embora atinja momentos
hilariantes, sobretudo nas perseguições derradeiras e na descrição tumultuosa
do ambiente dos estúdios de televisão.
Uma
comédia divertida, mas um filme relativamente falhado nos seus propósitos,
enquanto obra cinematográfica.
O GRANDE ESCÂNDALO (His Girl Friday) -
R: Howard Hawks (EUA, 1939); A: Charles Lederer, segundo «The Front Page», peça
de Charles MaeArthur e Ben Heeht; F (preto e branco): Joseph Walker; M: Morris
Stoloff; I: Rossalind Russell, Cary Grant, Ralph Bellamy, Gene Loekhart, Porter
Hall, Ernest Truex, etc.; D: 92 m; CI: xxxxx (M/12 anos).
PRIMEIRA PÁGINA (Front Page) - R: BiIly
Wilder (EUA, 1974); A: BiIly Wilder e I.A.L.Diamond, segundo peça teatral de
Ben Heeht e Charles MaeArthur; F (cor): Jordan S. Cronenweth; M: BilIy May;
Mont: Ralph E.Winters; Dir.art.: Henry Bumstead; P: Paul Monash/ MA C/
Universal; I: Jack Lemmon, Walter Matthau, Carol Burnett, Susan Sarandon,
Vineent Gardenia, David Wayne, Allen Garfield, Austin Pendleton, Charles Durning,
Herbert Edelman, etc.; D: 105 m; CI: xxxx (M/12 anos).
LINHAS TROCADAS (Switching Channels) -
R: Ted Kotcheff (EUA, 1987); A: Jonathan Reynolds, segundo «The Front Page»,
peça teatral de Ben Hecht e Charles MacArthur; F (cor): François Protat; M:
Michel Legrand; Mont: Thom Noble; Dir. Art.: Charles Dunlop; P: Martin
Ransohoff; I: Kathleen Turner, Burt Reynolds, Christopher Reeves, Ned Beatty,
Henry Gibson,etc. D: 110 m; CL: xxx (M/12 anos).