Mostrar mensagens com a etiqueta Clint Eastwood. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Clint Eastwood. Mostrar todas as mensagens

domingo, julho 01, 2012

INVICTA FILMES: NOVA TEMPORADA 2012


HOMENAGEM AO ACTOR
CLINT EASTWOOD / HUMPHREY BOGART
BETTE DAVIS / JOAN CRAWFORD
ERROL FLYNN / JOHNNY WEISSMULLER

No Auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett, numa organização da Câmara Municipal do Porto, com direcção do realizador e crítico de cinema Lauro António, iniciou-se no passado dia 26 de Junho a III temporada de “Invicta Filmes”, uma iniciativa que pretende oferecer ao público do Porto a oportunidade de ver, ou rever, alguns grandes clássicos da história do cinema. Este ano a “Invicta Filmes” vai dedicar a sua programação ao “Actor”, projectando vários ciclos, de colaboração com a Warner Bros. Poderão ser vistas obras de Clint Eastwood (Harry, o Detective em Acção, de Ted Post, O Implacável, de James Fargo, Harry, Impacto Súbito, de Clint Eastwood, Na Lista do Assassino, de Buddy Van Horn, A Última Canção, Um Mundo Perfeito e Caçador Branco, Coração Negro, todos de Clint Eastwood) de Johnny Weissmuller/ Tarzan (Tarzan, O Homem Macaco, de W.S. Van Dyke, Tarzan e a Companheira, de Cedric Gibbons e Jack Conway, A Fuga de Tarzan, Tarzan Encontra um Filho e O Tesouro Secreto de Tarzan, todos de Richard Thorpe) de Errol Flynn (Todos Morreram Calçados, de Raoul Walsh, Capitão Blood, Gavião dos Mares e Feridas de Guerra, todos de Michael Curtiz) de Bette Davis e Joan Crawford (Isabel de Inglaterra, de Michael Curtiz, Loucura de Amor, de Curtis Bernhardt, A Estranha Passageira, de Irving Rapper, A Vaidosa, de Vincent Sherman, Fascinação, de Jean Negulesco e Que Teria Acontecido a Baby Jane?, de Robert Aldrich) e finalmente do imortal Humphrey Bogart (Casablanca, de Michael Curtiz, Prisioneiro do Passado, de Delmer Daves, O Tesouro de Sierra Madre, de John Huston, Vidas Nocturnas (Paixão Cega), de Raoul Walsh, O Último Refúgio, de Raoul Walsh, Paixões em Fúria, de John Huston e  À Beira do Abismo, de  Howard Hawks).
Todas as sessões são de entrada livre, e iniciam-se às 18, 30 horas. 
 
CICLO CLINT EASTWOOD

26.06.2012
HARRY, O DETECTIVE EM ACÇÃO / Magnum Force / Ted Post /1973 / 124’

27.06
O IMPLACÁVEL / The Enforcer / James Fargo / 1976 / 96’

03.07
HARRY, IMPACTO SÚBITO /Sudden Impact / Clint Eastwood / 1983 / 117’
 Com apresentação de Lauro António

11.07
NA LISTA DO ASSASSINO / The Dead Pool / Buddy Van Horn / 1988 / 91’

12.07
A ÚLTIMA CANÇÃO / Honkytonk Man / Clint Eastwood / 1982 / 122’

17.07
UM MUNDO PERFEITO / A Perfect World / Clint Eastwood / 1993 / 138’

18.07
CAÇADOR BRANCO, CORAÇÃO NEGRO / White Hunter, Black Heat / 
Clint Eastwood / 1990 / 112’

 CICLO TARZAN / JOHNNY WEISSMULLER

25.07
TARZAN, O HOMEM MACACO / Tarzan the Ape Man / W.S. Van Dyke´/ 1932 / 100’

26.07
TARZAN E A COMPANHEIRA / Tarzan and His Mate / Cedric Gibbons e Jack Conway  / 1934 / 104’

01.08
A FUGA DE TARZAN / Tarzan Escapes / Richard Thorpe / 1936 / 89’

02.08
TARZAN ENCONTRA UM FILHO / Tarzan Finds a Son! / Richard Thorpe  / 1939 / 82’

08.08
O TESOURO SECRETO DE TARZAN / Tarzan’s Secret Treasure / 
Richard Thorpe / 1941 / 81’

 CICLO ERROL FLYNN

09.08
CAPITÃO BLOOD / Captain Blood / Michael Curtiz / 1935 / 119’
Com apresentação de Lauro António 

16.08
GAVIÃO DOS MARES / The Sea Hawk / Michael Curtiz / 1940 / 127’

22.08
TODOS MORRERAM CALÇADOS / They Died with They Boots On / Raoul Walsh / 1941 / 140’

28.08
         FERIDAS DE GUERRA / Dive Bomber / Michael Curtiz / 1941 / 132’

 CICLO BETTE DAVIS / JOAN CRAWFORD

29.08
ISABEL DE INGLATERRA / The Private Lifes of Elizabeth and Essex /
Michael Curtiz / 1939 / 106’ (2)
Com apresentação de Lauro António 
05.09
         LOUCURA DE AMOR / Possessed / Curtis Bernhardt / 1947 / 108’
19.09
A ESTRANHA PASSAGEIRA / Now, Voyager / Irving Rapper         / 1942 / 117’
25.09
         A VAIDOSA / Mr. Skeffington / Vincent Sherman / 1944 / 145’
03.10
FASCINAÇÃO / Humoresque / Jean Negulesco / 1946 / 125’
08.10
QUE TERIA ACONTECIDO A BABY JANE? / What ever Happened to Baby Jane /
Robert Aldrich / 1962 / 135’

 CICLO HUMPHREY BOGART

22.10
CASABLANCA / Michael Curtiz / 1942 / 102’
Com apresentação de Lauro António 

29.10
PRISIONEIRO DO PASSADO / Dark Passage / Delmer Daves / 1947 / 106’

13.11
O TESOURO DE SIERRA MADRE / The Treasure of Sierra Madre / John Huston / 1948 / 126’

14.11
VIDAS NOCTURNAS  (PAIXÃO CEGA) / They Drive by Night / Raoul Walsh / 1940 / 97’

22.11
O ÚLTIMO REFÚGIO / High Sierra / Raoul Walsh / 1941 / 100’

29.11
PAIXÕES EM FÚRIA / Key Largo / John Huston / 1948 / 100’

05.12
À BEIRA DO ABISMO / The Big Sleep / Howard Hawks / 1946 / 114’

(1) Titulo português / Título original / Realizador /Ano de produção / Duração
(2) Este filme termina o Ciclo Errol Flynn e inicia o de Bette Davis.

quarta-feira, janeiro 26, 2011

CINEMA: HEREAFTER

:
HEREAFTER - OUTRA VIDA


Aos oitenta anos, Clint Eastwood assina uma obra-prima e um dos seus filmes mais perfeitos. A idade aqui parece ter ajudado, dando-lhe uma clarividência e uma proximidade do tema que aborda que muito terão contribuído para o sucesso deste melodrama contido e sofrido sobre a morte e o que estará para lá dela.
“Hereafter - Outra Vida” parte de um argumento de Peter Morgan, o mesmo que estivera por detrás de “A Rainha”, “Frost/Nixon” ou “Maldito United”, inspirado escritor que aqui aborda um assunto novo de uma forma até aqui não experimentada por si. Parece que quem teve primeiramente nas mãos o argumento foi Steven Spielberg, que o terá aconselhado a Clint, aproveitado por ele e por Kathleen Kennedy para se colocaram na condição de produtores. Clint leu e gostou, sobretudo da forma como se entrelaçavam três histórias, e como se abordava um tema que é da sua especial predilecção, a morte.
Quem afirma que esta questão da morte e do que sobrevém depois dela não é tema de Clint Eastwood não deve ter visto nada deste autor, desde “Um Mundo Perfeito” a “Million Dollar Baby”, de “Imperdoável” a “Gran Torino”, de “Mystic River” a “A Troca”, não esquecendo o díptico sobre Iwo Jima. Estes sempre foram temas que abasteceram o universo de Clint Eastwood e o enformaram. Com o avançar da idade e a proximidade dessa viagem para o desconhecido é seguro que mais o preocupam e inquietam, provocando obras de uma serenidade e de um rigor que não deixam de ser surpreendentes.
Clint Eastwood é um cineasta de um classicismo fulgurante, desde que o conhecemos. Uma lição que vem certamente de David W. Griffith e John Ford e passa por mestres pessoais como Donald Siegel ou Sergio Leone. Mas que assume nele uma voz muito própria. “Hereafter - Outra Vida” demonstra tudo isso de forma sublime, confirmando, se necessário fosse, que ele é indiscutivelmente um dos maiores realizadores vivos. E um dos maiores da História do Cinema das últimas décadas.
“Hereafter - Outra Vida” parte de três histórias que se iniciam em três pontos de diferentes continentes e que acabam por reunir-se em Londres. Marie LeLay (Cécile De France), jornalista francesa, a passar férias numa paradisíaca praia do Índico, salva-se miraculosamente de morrer afogada no tsunami de 2004 que varreu as costas da Indonésia e da Tailândia, entre muitos outros países, provocando milhares de mortos. Ela atravessou o limbo entre a vida e a morte e recorda esse momento quando regressa ao trabalho no canal de televisão onde trabalha. Mas a perturbação é muita e a sua actividade profissional ressente-se. Irá tirar uns meses de folga e procurar esquecer escrevendo um livro sobre Mitterand. Mas o livro acaba por ser sobre fenómenos para-psicológicos, sobretudo relatando experiencias de quem conviveu de perto com o Além. Seja ele o que for.
Na América, George Lonegan (Matt Damon) foi um médium muito requisitado, que poderia fazer choruda carreira de vidente, explorando as suas potencialidades. Mas um médium autêntico vive atormentado pelos poderes que possui. A sua vida é um tormento e por isso abandona tudo e torna-se operário. Uma vez por outra, o seu irmão, que não perde a esperança de poder voltar a explorar o filão, obriga-o a aceitar um caso. Lonegan prefere, porém, aprender culinária. Nessas aulas encontra Melanie (Bryce Dallas Howard), por quem se começa a apaixonar, até que os seus dotes o voltam a atraiçoar. Melanie desaparece da sua vida quando este aceita revelar aspectos secretos da sua antiga existência. Lonegan volta a sentir a solidão e, inspirado pelo seu autor de eleição, Charles Dickens, viaja até Londres e visita a casa do escritor, onde um quadro famoso retém a sua atenção: os sonhos de Dickens, uma gravura povoada pelas personagens dos seus romances. Esta referência a Dickens parece-me essencial para a compreensão do filme, que se coloca sob o seu signo. Curiosamente, Dickens era o escritor de eleição de David W.Griffith.
Entretanto, em Londres, dois gémeos adolescentes, resistem a uma vida de desespero, com uma mãe drogada e alcoólica (Lyndsey Marshal), que pouca atenção lhes dá. Digamos que é uma actualização do universo londrino de Dickens e das suas personagens mais frágeis, as crianças e as mulheres. Marcus (Frankie McLaren) tem uma enorme admiração pelo irmão Jason (George McLaren), mais velho que ele alguns minutos, e não consegue suportar bem a acidental morte deste. Não mais irá abandonar o boné de Jason e procura por todas as formas saber o que se passa depois da morte. Na internet vasculha tudo o que encontra sobre o tema e descobre como as religiões o procuram manipular e os ditos videntes do oportunismo o tentam explorar. O Além é um bom negócio.
Será numa feira do livro em Londres que o destino destas três personagens se irá cruzar. Inquieto quanto ao que virá depois da morte, se depois da morte algo virá, Clint Eastwood não toma partido, não resolve o enigma, não indica soluções, mas transforma este pesadelo de uma Humanidade perdida em solidões e angústias num hino à esperança da solidariedade. O melodrama quase roça o cor-de-rosa mas Clint Eastwood é mestre a controlar emoções e a narrativa.
O filme é um exemplo de narrativa escorreita e enxuta de efeitos. Nada está ali a mais, nem a brutalidade da reconstituição do tsunami, que ostenta dos melhores efeitos visuais vistos até hoje no cinema, mas que cumprem uma função e rapidamente cedem lugar a uma progressão intimista e secreta. O mesmo se passa com a breve evocação do atentado terrorista do Metro de Londres em 2006. Ambos assinalam a violência natural e a brutalidade humana, mas não passam de sinais que marcam a progressão da narrativa, sem serem explorados abusivamente. De resto, a delicadeza do olhar de Eastwood é infinita, a sua emoção contida pode ver-se na maneira como enquadra cada plano, como os encadeia de forma seca, como dirige os actores com segurança e rigor. O seu olhar é sempre pessoal e original, seja a enquadrar um avião a levantar voo, seja a segurar um diálogo entre Lonegan e Marcus (veja-se a subtileza como o médium aceita mentir, para salvar o futuro de uma criança, que tem de se libertar do fantasma do irmão). Seja a conseguir de Cécile De France, Bryce Dallas Howard, Lyndsey Marshal ou Marthe Keller desempenhos sublimes. Cécile De France é absolutamente deslumbrante. Matt Damon é extraordinário numa composição aparentemente rígida mas, no fundo, possuidora das pequenas nuances que fazem um grande actor.
Um filme comovente e excepcional que entra directamente para a minha lista de eleitos. Raras vezes se viu falar de algo tão difícil de localizar como esse abismo negro donde ninguém regressou para contar como é, com imagens de tal forma materializadas e sensíveis como o faz Clint Eastwood. Sem entrar na exploração do sensacionalismo, sem cair no pecado de apontar saídas, apenas colocando o problema e confrontando-o com o espectador. Uma obra de génio.
Um filme que transcendeu obviamente as nomeações para os Oscars. Ficará ao lado de outros que marcaram a História do Cinema.

HEREAFTER - OUTRA VIDA
Título original: Hereafter
Realização: Clint Eastwood (EUA, 2010); Argumento: Peter Morgan; Produção: Clint Eastwood, Kathleen Kennedy, Robert Lorenz, Frank Marshall, Tim Moore, Peter Morgan, Steven Spielberg; Música: Clint Eastwood; Fotografia (cor): Tom Stern; Montagem: Joel Cox, Gary Roach; Casting: Fiona Weir; Design de produção: James J. Murakami; Direcção artística: Tom Brown, Dean Clegg, Anne Seibel, Patrick M. Sullivan Jr., Frank Walsh; Decoração: Lisa Chugg, Hélène Dubreuil, Gary Fettis; Guarda-roupa: Deborah Hopper; Maquilhagem: Frédérique Arguello, Paul Engelen; Direcção de Produção: Gilles Castera, Jeremy Johns, Tim Moore; Assistentes de realização: David M. Bernstein, Ryan Craig, Vanessa Djian, Robert Karn; Departamento de arte:Katie Gabriel, Chris Kitisakkul, Laura Whitehead; Som: Bub Asman, Alan Robert Murray; Efeitos especiais: Steve Riley; Efeitos visuais: Charley Carlat, Chad Finnerty, Craig Kief, Michael Owens; Companhias de produção: Amblin Entertainment, The Kennedy/Marshall Company, Malpaso Productions; Intérpretes: Matt Damon (George Lonegan), Cécile De France (Marie LeLay), Bryce Dallas Howard (Melanie), Frankie McLaren (Marcus / Jason), George McLaren (Marcus / Jason), Lyndsey Marshal (Jackie), Marthe Keller (Dr. Rousseau), Derek Jacobi (ele próprio), Thierry Neuvic (Didier), Steve Schirripa (professor de culinária), Cyndi Mayo Davis, Lisa Griffiths, Jessica Griffiths, Ferguson Reid, Derek Sakakura, Jay Mohr, Richard Kind, Charlie Creed-Miles, Rebekah Staton, Declan Conlon, Marcus Boyea, Franz Drameh, Tex Jacks, Taylor Doherty, Mylène Jampanoï, Stéphane Freiss, Laurent Bateau, Calum Grant, Joe Bellan, Jenifer Lewis, Tom Beard, Andy Gathergood, Helen Elizabeth, Jean-Yves Berteloot, Niamh Cusack, George Costigan, Claire Price, Surinder Duhra, Sean Buckley, Paul Antony-Barber, Selina Cadell, Céline Sallette, Joanna Croll, Jack Bence, Tim Fitzhigham, etc. Duração: 129 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia TriStar Warner Filmes de Portugal; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 20 de Janeiro de 2011.

quinta-feira, abril 09, 2009

CINEMA: GRAN TORINO

:
UMA (QUASE) OBRA-PRIMA
Clint Eastwood teve, nos seus tempos de actor iniciado, dois belíssimos mestres, Don Siegel e Sergio Leone. Depois começou o seu próprio percurso como realizador, herdando de um e outros certas características, mas criando um caminho muito pessoal. Homem de visão conservadora e de estilo clássico, enveredou por um tipo de cinema que, oscilando entre o policial e o western, se podia colocar entre o mais reaccionário americanismo, algo racista e mesmo um pouco afascistizado, sobretudo nas aventuras do “justiceiro” “Dirty Harry”. Já então, todavia, excelente realizador e brilhante actor. Conservador continua, americano até à medula também, excelente realizador e brilhante actor igualmente, refinando com o passar dos anos. Insurgi-me (e insurjo-me hoje em dia) com a mentalidade Dirty Harry, mas este cineasta conquistou-me completamente.
“Gran Torino” não sei se será uma obra-prima ou não, sei que é um dos grandes filmes que vi recentemente (acrescentando que não há muito também vira “A Troca”, que me deixara igualmente emudecido pela grandeza do porte ético deste homem que sabe lidar como poucos com as emoções extremadas e com o que de mais profundo e secreto existe na alma humana).
Com argumento de Nick Schenk, sobre história sua e de Dave Johannson, “Gran Torino” tem como protagonista Walt Kowalski (Clint Eastwood), veterano da Guerra da Coreia, que nos é apresentado de forma magistral no velório da mulher, onde grunhe de desaprovação perante os piercings e o telemóvel da neta e os impropérios de um outro neto. Kowalski, assim mesmo para os que não são seus amigos, é homem de outros tempos e de outras maneiras. Não gosta do comportamento dos filhos e demais família, no que tem razão, diga-se em abono da verdade, não é preciso ser conservador, racista e reaccionário, vive sozinho numa vivenda de um bairro de Detroit invadido por orientais e latino americanos, infestado por bandos de jovens violentos e desbragados. Não tolera que os americanos actuais comprem carros japoneses, ele que trabalhou na Ford e conserva como relíquia o “Gran Torino”, modelo de 1972, que ele próprio ajudou a montar. Não conserva só o carro, símbolo que dá o nome ao filme, conserva também armas e relíquias da guerra da Coreia, onde matou e viu morrer, em nome da pátria e da sobrevivência.
Kowalski é um duro, daqueles de antes quebrar que torcer. O espírito de Dirty Harry anda por ali e pensamos mesmo que pode ir até ao fim, mas o fim será outro, e com esta obra Clint Eastwood parece ter assinado o seu testamento (ainda que não tenha arrumado as botas, já está na África do Sul a filmar “The Human Factor”, com argumento de Anthony Peckham, segundo romance de John Carlin, que fala de Nelson Mandela e da forma como este lutou contra o “apartheid” e conseguiu unir o seu país, durante o campeonato do mundo de rugby de 1995). Um testamento que reforça o que acha justo e contrapõe algumas ideias à sua imagem de justiceiro por conta própria ou de proto-racista. O que o leva mesmo a dizer como é possível gostar mais destes “hmongs” (refugiados vietnamitas de uma etnia do sudeste da Ásia, que combateu no Vietname ao lado dos americanos) do que da própria família. Mas a verdade é que se não escolhe a família, mas se pode escolher quem nos trate por Walt. Portanto, o filme é uma longa (ou rápida) aprendizagem da vida e dos seus valores, que tanto pode ser levada a cabo por um duro americano de 78 anos, como por um adolescente “hmong”.
A personagem de Kowalski é admiravelmente composta por Clint Eastwood, num misto de herói solitário e de velho marreta (o humor está sempre presente neste retrato de amargo ressentimento e de apego à vida) que oscila entre a figura enraivecida de uma desencantada ruína dos anos 70 que aponta uma arma à cabeça de um gang de facínoras e a desenvolta personagem de um familiar cliente de barbeiro, com quem troca insultos de fraterna cumplicidade (a iniciação do jovem “hmong”, que deve entrar na barbearia como um “homem”, é divertidíssima, e mostra bem a faceta de humor deste cineasta).
De resto, “Gran Torino” é uma lição de cinema, sereno, vigoroso, profundo, dramático, angustiante, perverso e inocente, maduro, clássico e moderno. Cinema que apetece ver e ficar a apreciar durante dias, sonhando recordá-lo anos depois.
O que faz a grandeza de certos Homens que nos fazem ultrapassar todas as barreiras? 53 anos como actor, 37 como realizador, vários Oscars, dezenas de prémios nos maiores festivais, alguns dos melhores filmes do mundo, uma silhueta inesquecível e inimitável, um nome que se venera – Clint Eastwood!
GRAN TORINO
Título original: Gran Torino
Realização: Clint Eastwood (EUA, Austrália, 2008); Argumento: Nick Schenk, Dave Johannson; Produção: Clint Eastwood, Bill Gerber, Jenette Kahn, Robert Lorenz, Tim Moore, Adam Richman; Música: Kyle Eastwood, Michael Stevens; Fotografia (cor): Tom Stern; Montagem: Joel Cox, Gary Roach; Casting: Ellen Chenoweth; Design de produção: James J. Murakami; Direcção artística: John Warnke; Decoração: Gary Fettis; Guarda-roupa: Deborah Hopper; Maquilhagem: Tania McComas; Direcção de Produção: Tim Moore; Assistentes de realização: Peter Dress Michael Judd, Donald Murphy; Departamento de arte: Kai Blomberg, Steven Ladish, Scott Schutzki; Som: Bub Asman, Walt Martin, Alan Robert Murray; Efeitos especiais: Hank Atterbury, Steve Riley; Efeitos visuais: Kelly Port; Companhias de produção: Matten Productions, Double Nickel Entertainment, Gerber Pictures, Malpaso Productions, Media Magik Entertainment, Village Roadshow Pictures, Warner Bros.;
Intérpretes: Clint Eastwood (Walt Kowalski), Christopher Carley (padre Janovich), Bee Vang (Thao Vang Lor), Ahney Her (Sue Lor), Brian Haley (Mitch Kowalski), Geraldine Hughes (Karen Kowalski), Dreama Walker (Ashley Kowalski), Brian Howe (Steve Kowalski), John Carroll Lynch (barbeiro Martin), William Hill (Tim Kennedy), Brooke Chia Thao (Vu), Chee Thao (avó), Choua Kue (Youa), Scott Eastwood (Trey), Xia Soua Chang, Sonny Vue, Doua Moua, Greg Trzaskoma, John Johns, Davis Gloff, Thomas D. Mahard, Cory Hardrict, Nana Gbewonyo, Arthur Cartwright, Austin Douglas Smith, Conor Liam Callaghan, Michael E. Kurowski, Julia Ho, Maykao K. Lytongpao, Carlos Guadarrama, Andrew Tamez-Hull, Ramon Camacho, Antonio Mireles, Ia Vue Yang, Zoua Kue, Elvis Thao, Jerry Lee, Lee Mong Vang, Tru Hang, Alice Lor, Tong Pao Kue, Douacha Ly, Parng D. Yarng, Nelly Yang Sao Yia, Marty Bufalini, etc.
Duração: 116 minutos; Distribuição em Portugal: Zon Lusomundo; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 12 de Março de 2009.

domingo, janeiro 18, 2009

CINEMA: A TROCA

A TROCA
Há verdades que já se sabem de há muito: Clint Eastwood filma a tragédia da condição humana como poucos. Penetra-lhe no lado mais sórdido e violento com o mesmo olhar com que filma mais adiante a pureza e a bondade de um gesto, e diz-nos, com o conhecimento de vida que só a idade confere, que uns e outros são autênticos, genuínos, humanos e que nada há a fazer para alterar essa condição que se abate sobre nós como uma tragédia, senão não capitular, lutar até ao fim, procurar fazer deste mundo um mundo melhor, sem ilusões de que a vilania seja erradicada, mas que a mesma pode ser circunscrita. O terrível é que todos sabemos que, aqui ou ali, neste preciso momento, se manda para hospícios quem não agrada aos poderosos que ande solto, que se mata com requintes de malvadez crianças sabe-se lá com que justificação traumática, que há garotos desaparecidos que nunca regressam (e outros que felizmente voltam aos pais), que há polícias corruptos e políticos que só pensam na próxima eleição e no poder absoluto, que há médicos comprados pelo sistema para assinarem o que for preciso, todos sabemos pois que tudo isto acontece hoje, neste preciso momento, menos em sociedades mais controladas pelos direitos e deveres dos cidadãos, é verdade, mais nas despoticamente governadas por tiranos sem escrúpulos (e há-os para todas as cores e bandeiras!). Não tenhamos ilusões que nada disto mudará nunca. Basta o rastilho para a pólvora explodir. Por isso o melhor mesmo é afastar o rastilho da pólvora e esperar que a civilização vá cada vez mais controlando a barbárie, com leis justas e educações privilegiadas, sem esquecer o cutelo da lei sempre atento ao violador.
Clint Eastwood é um conservador que aposta nos valores e deles não sai. Sabe-se que muitas vezes é difícil distinguir o Bem do Mal, mas há momentos em que o maniqueísmo do juízo vingará para sempre. Por exemplo, quer seja em Belém de Judá, quer seja nos campos de concentração nazis ou nos “goulags” estalinistas, quer seja em Guantánamo ou nas guerras “justas” de palestinianos (que se imolam com bombas e fazem ir pelos ares crianças inocentes de todos os credos) e israelitas (que bombardeiam sem cessar população civil), quer seja às mãos de “serial killers” isolados em qualquer país do mundo sabe-se, de ciência certa, que a morte de inocentes, sejam crianças ou adolescentes, nunca irá parar. E isso é o Mal, qualquer que seja a justificação. Haverá sempre, em qualquer parte do mundo, um tarado (ou dezenas, ou centenas de tarados, às vezes formando governos!) que acham justo matar crianças. Mas nada nos fará vacilar no juízo: é um crime, venha ele com que justificação, política ou religiosa, um exemplo bárbaro do exercício do Mal. Por isso, Clint Eastwood não vacila. Há utopias em que ninguém deve acreditar. Não haverá “homem novo” nunca. O que temos é o que há, é com este “homem” que teremos viver até ao fim. É com esta natureza humana que há que lidar, que aprender a domesticar, sem retirar a identidade e a diferença, a brandamente civilizar, a tornar mais habitável o planeta. Lentamente, sem grandes ilusões. Mas vagarosamente o caminho vai sendo feito, e, sem euforias, podemos dizer, que para cada “serial killer” privado ou militarizado, há milhões de gente boa que só quer viver bem e ser feliz, de harmonia com o vizinho, sem raivas nem ódios demenciais.
Antigamente, quando era “Dirty Harry” (e muitos o acusavam de um comportamento fascista, porque era polícia e fazia justiça pelas próprias mãos, eu próprio o escrevi e não retiro uma vírgula), empunhava a Magnum e disparava a matar. Agora, com o avançar da idade, segura a câmara de filmar e atira certeiramente no alvo. Curiosamente nos tais polícias que primeiro atiram e depois fazem perguntas. “A Troca” é um ajuste de contas com a corrupta polícia de Los Angeles no final dos idos anos 20, à beira da Grande Depressão, denúncia de tal forma vigorosa que deixa alguns a duvidar se esta “história real” não será antes ficcionada. Mas não, não é na essência, parece que o argumentista J. Michael Straczynski ao descobrir o caso de Christine Collins, através de uma qualquer fonte do “Los Angeles City Hall”, se deixou por tal forma obcecar pelo tema que removeu céus e terra, e sobretudo arquivos policiais e jurídicos, para reconstituir a tragédia e recuperar igualmente o que ficou conhecido como o “Wineville Chicken Coop Murders” ou “Wineville Chicken Murders”, uma série de raptos e de assassinatos de crianças, ocorridos em Los Angeles, durante o final da década de 20 do século XX, praticados por um canadiano de nome Gordon Stewart Northcott, conjuntamente com Sanford Clark, um sobrinho de 14 anos (e diz o registo oficial que com a cumplicidade da afirmada mãe de Gordon, o que no filme é elidido).
Entre as crianças mortas (ou desaparecidas) estaria Walter Collins, filho de Christina Collins, que, a 10 de Março de 1928, havia relatado o desaparecimento da criança à polícia de Los Angeles. É este caso que dá origem a “A Troca”: alguns meses depois da polícia iniciar as buscas, Walter é dado como aparecido em DeKalb, Illinois, e trazido para Los Angeles, para junto da mãe. Esta não reconhece o filho, mas a policia insiste que o deve receber “à experiência”. O que faz, mas o miúdo não é definitivamente o seu filho, o dentista confirma-o, a professora assegura-o, a altura do corpo não bate certo, e uma mãe sabe sempre quem é o seu filho. Excepto se estiver “louca”, o que parece ser uma boa solução para a polícia que, querendo resolver rapidamente a questão e aquietar os ânimos, envia Christine Collins para o “Los Angeles County Hospital”, com uma indicação, assinada pelo capitão J.J Jones, dela ser internada ao abrigo de um celebrado "Code 12", código esse que servia para afastar de cena arbitrariamente mulheres indesejáveis para a tranquilidade das autoridades locais, por essa altura a atravessar um dos períodos de maior corrupção e venalidade, associada a uma brutalidade policial impressionante. O filme mostra-a rapidamente. O caso apaixonou a opinião pública, subiu aos jornais e à rádio, sobretudo pela intensa actividade de um sacerdote, o reverendo Gustav Briegleb, que fez de Christina Collins bandeira para a sua cruzada contra a polícia do Estado. Segundo se apurou, quase todo o argumento escrito por Straczynski é de uma consistência factual total, obedecendo a recolha exaustiva de situações, frases de interrogatórios, de crónicas de jornais, de testemunhos da época, com uma excepção apenas e que se prende com a estadia de Christine Collins no hospício, onde a lenda é mais forte que os dados recolhidos. Como já dizia John Ford, mestre confessado de Clint Eastwood, “quando a lenda é mais forte que a realidade, imprime-se a lenda” (em “O Homem que Matou Liberty Valance”).
Filme sombrio, duro, agreste, paredes-meias entre o melodrama e o negro “thriller” de ressonância social, “A Troca” é uma daquelas obras donde se sai com um sintoma de KO na alma, muito embora o pragmatismo de Clint Eastwood não seja de molde a destruir toda a esperança na condição humana. Muito pelo contrário, como bom americano, no final as instâncias judiciais acabam por funcionar, a opinião pública não desarmou e a mãe não deixou a sua tarefa a meio.
Para nos dar este drama intenso, Clint Eastwood não falha um plano e aponta a câmara com mestria invulgar. Se querem saber o cinema que mais me agrada, é este, sólido, clássico, austero, sem rodriguinhos de nenhuma espécie, direito ao que quer contar, sem efeitos nem floreados, não vivendo de uma montagem habilidosa, mas sim de uma encenação (“mise-en-scéne” lhe chamam os franceses) rigorosa. Aquelas frases célebres que relembram que “só há um local para colocar a câmara” e que esta deve estar “à altura dos olhos do realizador” são aqui paradigmas de verdade. A câmara não anda à deriva, está quase sempre fixa, movimentos só os essenciais, para acompanhar uma personagem, para percorrer um friso de rostos que fazem ligações telefónicas, e nada mais. O enquadramento não mentem. Esta lição de cinema clássico é uma demonstração inequívoca de que as modas passam, mas o essencial permanece imutável. De Griffith a Eastwood. Aqui o cinema é narrativo e poético, porque é sincero e leal. É o grande cinema que faz oscilar corações e verter lágrimas da mesma forma que agita consciências e introduz dúvidas.
Depois há ainda os actores, todos eles admiráveis, desde a fulgurante Angelina Jolie ao radical John Malkovich a roçar o fanatismo, passando por todos os polícias, os políticos, os algozes e as vítimas (que brilhante é o miúdo que confessa a sua ligação aos crimes!). Pode dizer-se que este é um filme de intérpretes, genialmente dirigidos, porque este é seguramente um filme de personagens, de pessoas, que só se poderia erguer se estas possuíssem a densidade e a autenticidade requeridas. Neste aspecto, “Changeling” é também uma lição. De resto, tudo parece perfeito nesta obra de uma sublime opacidade, de uma contagiante angústia e de um desespero eterno. Como eterna é a esperança, não numa utópica redenção que nunca virá, mas numa progressiva regeneração da condição humana.
A TROCA
Título original: Changeling
Realização: Clint Eastwood (EUA, 2008); Argumento: J. Michael Straczynski; Produção: Clint Eastwood, Brian Grazer, Ron Howard, Geyer Kosinski, Robert Lorenz, Tim Moorem, James Whitaker; Música: Clint Eastwood; Fotografia (cor): Tom Stern; Montagem: Joel Cox, Gary Roach; Casting: Ellen Chenoweth; Design de produção: James J. Murakami; Direcção artística: Patrick M. Sullivan Jr.; Direcção artística: Gary Fettis; Guarda-roupa: Deborah Hopper; Maquilhagem: Tania McComas, Carol A. O'Connell; Direcção de Produção: Tim Moore; Assistentes de realização: Katie Carroll, Efrain Cortes, Peter Dress, Donald Murphy, Ruby Stillwater; Departamento de arte: Adrian Gorton, Hugo Santiago, Dianne Wager; Som: Bub Asman, Alan Robert Murray; Efeitos especiais: David A. Poole, Steve Riley, Dominic V. Ruiz, George Zamora; Efeitos visuais: Geoffrey Hancock, Claudia Meglin, Michael Owens; Companhias de produção: Imagine Entertainment, Malpaso Productions, Relativity Media; Intérpretes: Angelina Jolie (Christine Collins), Gattlin Griffith (Walter Collins), Michelle Martin, Jan Devereaux, Michael Kelly (Detective Lester Ybarra), Erica Grant, Antonia Bennett, Kerri Randles, Frank Wood (Ben Harris), Morgan Eastwood, Madison Hodges, John Malkovich (Rev. Gustav Briegleb), Colm Feore (Chefe James E. Davis), Devon Conti (Arthur Hutchins), J.P. Bumstead, Jeffrey Donovan (Capt. J.J. Jones), Debra Christofferson, Russell Edge, Stephen W. Alvarez, Peter Gerety, Pete Rockwell, John Harrington Bland (Dr. John Montgomery), Pamela Dunlap, Roger Hewlett, Jim Cantafio, Maria J. Rockwell, Wendy Worthington, Riki Lindhome, Dawn Flood, Dale Dickey, Jason Butler Harner (Gordon Northcott), Eddie Alderson (Sanford Clark), Sterling Wolfe, Michael McCafferty, Amy Ryan (Carol Dexter), David Goldman (Administrador), Denis O'Hare (Dr. Jonathan Steele), Anthony De Marco, Joshua Logan Moore, Joe Kaprielian, Ric Sarabia, Muriel Minot, Kevin Glikmann, Drew Richards, Hope Shapiro, Caleb Campbell, Jeff Cockey, Zach Mills, Kelly Lynn Warren, Colby French, Scott Leva, Richard King, Clint Ward, Geoffrey Pierson, Reed Birney (Mayor Cryer), Michael Dempsey, Peter Breitmayer, Phil Van Tee, Jim Nieb, Lily Knight (Mrs. Leanne Clay), Jeffrey Hutchinson (Mr. Clay), Brian Prescott, Ryan Cutrona (Juiz), Mary Stein (Janet Hutchins), Gregg Binkley, William Charlton, Cooper Thornton, Asher Axe, Devon Gearhart, Dalton Stumbo, Austin Mensch, Richard Hansen, Jen Lilley, Gabriel Schwalenstocker, Billy Unger, Marissa Welsh, Araksi Willebrand, etc. Duração: 141 minutos; Distribuição em Portugal: Lusomundo; Classificação etária: M/ 16 anos; Estreia em Portugal: 8 de Janeiro de 2009.