quarta-feira, fevereiro 26, 2014

CINEMA: NEBRASKA

NEBRASKA

Belíssimo filme este de Alexander Payne, que regressa ao registo da "road movie" (o que já acontece anteriormente com “Sideways”, 2004) e retoma o cenário da sua terra natal, ele que nasceu em Omaha, no Nebraska, e que aí já rodou alguns filmes, como “As Confissões de Schmidt” ou o anterior “Caminhos Mal Traçados” (Citizen Ruth, 1996). Paine é um cineasta muito particular, procurando protagonistas pouco habituais no cinema dominante norte-americano, misturando humor e um retrato de certa forma angustiante da sociedade actual, o que volta a acontecer em “Nebraska”, mantendo como polo central da acção uma família (tal como noutro sentido o fizera em “Os Descendentes”, seu título anterior que justificou grande sucesso de público e crítica).

Desta feita, tudo roda à volta de Woody Grant (Bruce Dern), um velho casmurro e dado à bebida, que recebe um dia um folheto publicitário a prometer-lhe um milhão de dólares. Resolve então ir cobrar o prémio e viajar da sua cidade, Billings, em Montana, para Lincoln, no Nebraska, caminhando pela berma da estrada. Claro que a família é avisada, ele é forçado a voltar a casa, mas teima em receber o prémio a que tem direito, sem se aperceber das letras mínimas do folheto. Um dos seus filhos, David Grant (Will Forte) resolve então meter-se no carro com o obstinado Woody e levá-lo ao Nebraska, aproveitando para passar pela terra natal do pai, Hawthorne, onde ele é reconhecido e muito aclamado por familiares, velhos amigos e conhecidos depois de lhes ter dito que vai receber um milhão de dólares. Obviamente que alguns deles sonham já colher favores da fortuna do velho.


Velhos rezinguentos, teimosos e dados à bebida, não são casos raros no cinema. Quem não se lembra, por exemplo, do fabuloso “Uma História Simples” (The Straight Story, 1999), de David Lynch, com um inspiradíssimo Richard Farnsworth? O que faz o grande interesse desta nova obra de Alexander Payne é, por um lado, a justeza do tom, mesclando sabiamente dramatismo e humor, sem cair na pieguice nem na caricatura, antes optando por um olhar terno e compreensivo. O que se fica a dever à sensibilidade e pudor do trabalho do realizador, mas igualmente ao do argumentista, Bob Nelson. Por outro lado, o rigor da interpretação de todo o elenco, com particular destaque para Bruce Dern, que nos oferece uma personagem inesquecível, um velho rural, meio careca, de cabelo desalinhado, arrastando persistentemente uma perna trôpega na perseguição de um sonho, alheio a todas as vozes racionais, e não esquecendo nunca a sua cerveja, ao longo de todos os bares por onde vai parando. Claro que a fotografia a preto e branco de Phedon Papamichael desempenha igualmente um papel decisivo para o excelente resultado final, criando uma patine de documento histórico desolador que funciona muito bem, e torna desconcertante esta história metafórica sobre os dias de hoje, na América profunda. A partitura musical de Mark Orton também ajuda.
Mas há um aspecto adicional que é fundamental para a importância do filme e que tem a ver com o retrato de uma sociedade em período de depressão económica e psicológica. A América envelhecida, solitária, reformada, imóvel diante dos aparelhos de televisão, desempregada, ávida e rancorosa, violenta ao menor sinal que a desperte da sua letargia, é inquietante e muito bem transmitida pela câmara atenta do cineasta, que sabe captar esses indícios sem demagogia barata. A abordagem da velhice e de todo o caudal de consequências que acarreta, a relação do casal Grant, e destes com os filhos, a permeabilidade ao embuste e a inocência desta “segunda infância” são aspectos a sublinhar.


Esta viagem de Montana ao Nebraska não acaba em total desespero. A relação pais e filhos cimenta-se e o velho Woody Grant regressa a casa orgulhoso, com o seu boné de milionário, conduzindo um novo jeep e trazendo consigo o compressor com que sempre sonhara. Nem tudo são quimeras na vida e ainda há lugar para alguma esperança. Mesmo que do milhão ambicionado reste somente o boné.
O filme foi nomeado para Melhor Filme do Ano, Melhor Realização, Melhor Actor, Melhor Argumento Original, Melhor Actriz Secundária (June Squibb) e Melhor Fotografia para os Oscars de 2014.  São às dezenas as nomeações para outros prémios e Bruce Dern ganhou alguns deles, em particular o do Festival de Cannes 2013. As referências são todas elas justíssimas e, infelizmente para Alexander Payne, a concorrência este ano é feroz e a delicada fragilidade desta obra belíssima vai sair seguramente relegada para segundo plano. Mas cremos que este é, indiscutivelmente, o melhor trabalho de um cineasta que se acompanha com prazer e de quem muito se deve esperar no futuro.


NEBRASKA
Título original: Nebraska

Realização: Alexander Payne (EUA, 2013); Argumento: Bob Nelson; Produção: Albert Berger, Doug Mankoff, George Parra, Julie M. Thompson, Ron Yerxa; Música: Mark Orton; Fotografia (p/b): Phedon Papamichael; Montagem: Kevin Tent; Casting: John Jackson; Design de produção: J. Dennis Washington; Direcção artística: Sandy Veneziano; Decoração: Fontaine Beauchamp Hebb; Guarda-roupa: Wendy Chuck; Maquilhagem: Gary Archer, Robin Fredriksz, Waldo Sanchez, Melanie Smith; Direcção de produção: Mads Hansen, Valerie Flueger Veras, Sheryl Benko; Assistentes de realização: Scott August, Gregory S. Carr;  Departamento de arte:  Wes Clowers, Jeff Cronin; Som: Frank Gaeta; Efeitos visuais: Scott Dougherty, David Lingenfelser; Companhias de produção: Blue Lake Media Fund, Bona Fide Productions, Echo Lake Productions; Intérpretes: Bruce Dern (Woody Grant), Will Forte (David Grant), June Squibb (Kate Grant), Bob Odenkirk (Ross Grant), Stacy Keach (Ed Pegram), Mary Louise Wilson (Tia Martha), Rance Howard (Tio Ray), Tim Driscoll (Bart), Devin Ratray (Cole), Angela McEwan (Peg Nagy), Glendora Stitt (Tia Betty), Elizabeth Moore, Kevin Kunkel, Dennis McCoig, Ronald Vosta, Missy Doty, John Reynolds, Jeffrey Yosten, Neal Freudenburg, Eula Freudenburg, Ray Stevens, Lois Nemec, Francisco Mendez, Jose Munoz, Catherine Rae Schutz, Terry Lotrous, Dennis McCave, Rachel Lynn Liester, etc. Duração: 115 minutos; Distribuição em Portugal:; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 27 de Fevereiro de 2014.

domingo, fevereiro 23, 2014

CINEMA: A GRANDE BELEZA


A GRANDE BELEZA

“Primeiro estranha-se, depois entranha-se” foi um slogan inventado por Fernando Pessoa para uma bebida e realmente ele nunca poderia ter visto “A Grande Beleza”, mas creio que a frase se aplica bem a este belíssimo filme italiano, de Paolo Sorrentino, com um excelente actor, Toni Servillo, que, qual flaneur, vive com charme e um delicioso diletantismo a figura de Jep Gambardella, um escritor e jornalista cultural romano que há muitos anos escrevera um romance de sucesso e depois se calara criativamente. Por falta de inspiração, reconhece ele. A realidade à sua volta é tão dolorosamente medíocre, cinzenta, mesquinha, tão sem falta de graça e de projecto, que ele desistira de escrever fosse o que fosse.
Deambula como um fantasma vindo de outros tempos por essas festas e jantares, recepções e actos culturais e “artísticos”, encontros amorosos e desencontros sociais, nessa Roma de monumental passado, que as pedras eternizam, mas que os actuais habitantes reduzem a cenários perdulários de grotescas farsas sem sentido.
Paolo Sorrentino tem sobretudo saudades do passado, de “A Doce Vida” de Felliini, obviamente e de todo o feérico universo deste cineasta, mas também de outros mestres italianos, como o aristocrático Visconti (vejam-se essas incursões pelos palácios e os monumentos que são de tal forma de cortar a respiração, que um oriental mais sensível acaba mesmo vítima de uma síncope ao olhar a deslumbrante beleza que o rodeia), ou mesmo, aqui ali, de algumas pinceladas do ”frio” Antonioni, de “A Noite” ou “O Eclipse”. Mas é mesmo o mundo de Fellini que Paolo Sorrentino repisa, as parolas festas das elites que duram até às tantas da madrugada, as majestosas matronas de fartos seios, ou os elegantes modelos e actrizes, com o seu encontro espectral com a vedeta, quer seja Anita Ekberg, quer seja Fanny Ardant, as procissões de clérigos e freiras, o sarcasmo para com a padralhada, e o toque místico de autêntica religiosidade. Neste aspecto, o seu filme é uma homenagem directa e despudoradamente amorosa ao grande cinema italiano da sua época de ouro. “Porque é que se há-se ter medo da nostalgia, quando é apenas o que resta a quem não tem fé no futuro?”, pergunta Jep Gambardella.
Surge também uma “santa” secular, que só come raízes. Porquê? “As raízes são importantes!”

A realidade presente é, pois, confrangedora. Gambardella não tem nada a dizer. Ou não lhe apetece dizer o que poderia querer escrever. Ele passeia-se, meio fascinado pela decadência, meio horrorizado pela mediocridade, o embuste, o vazio, a mentira, a hipocrisia destes tempos, onde não se fala de “milagre económico”, como o poderia fazer Fellini nos anos 60, mas de “austeridade” e de “bancarrota”, com as tróicas com os olhos colados aos mais débeis e as mãos generosamente viradas para os mais ricos e poderosos, que nos oferecem o espectáculo da sua opulência feérica por fora e da sua miséria intelectual e moral. 


Jep Gambardella, tal como o Mastroianni de Fellini, passa por uma girafa e um mágico que afirma que a pode fazer desaparecer. Gambardella pergunta ao mago se “também consegue fazer desaparecer pessoas”, ao que este lhe responde: “Acha que se eu pudesse fazer desaparecer pessoas eu ainda estava aqui?”
Paolo Sorrentino é o mesmo de “Le Conseguenze dell'Amore” (2004), “Il Divo” (2008) e de “This Must Be the Place” (2011), mas “La Grande Bellezza” é definitivamente um filme de outra galáxia. A estrutura é a de uma viagem (iniciática?) pela Roma de hoje, a meio caminho entre a reportagem social e o onirismo, misturando realidade (recriada) e sonho, fantasmas e fantasias, pessoal e colectivo. O espectador é convidado a embarcar neste passeio em que  Jep Gambardella é mais personagem contemplativo e juiz a uma certa distância cínica, do que interveniente ou participante. Ele olha e sorri malicioso perante o espectáculo que se desenrola à sua frente.
Toda a obra é de uma qualidade plástica e gráfica admirável, ao nível dos cenários, dos enquadramentos, da cor, da iluminação, banhada por essa luz fantástica do Mediterrâneo. Toni Servillo é absolutamente fabuloso na forma como interpreta Jep Gambardella. “A Grande Beleza” é isso mesmo. E só ela nos poderá salvar.


A GRANDE BELEZA
Título original: La Grande Bellezza

Realização: Paolo Sorrentino (Itália, França, 2013); Argumento: Paolo Sorrentino, Umberto Contarello; Produção: Francesca Cima, Nicola Giuliano, Jérôme Seydoux, Vivien Aslanian, Carlotta Calori, Fabio Conversi, Gennaro Formisano, Romain Le Grand, Guendalina Ponti, Viola Prestieri, Muriel Sauzay; Música: Lele Marchitelli; Fotografia (cor): Luca Bigazzi; Montagem: Cristiano Travaglioli; Casting: Anna Maria Sambucco; Design de produção: Stefania Cella; Guarda-roupa:  Daniela Ciancio; Maquilhagem: Peter Nicastro, Maurizio Silvi; Direcção de Produção:  Giuseppe Di Gangi, Raffaello Vignoli;  Assistentes de realização: Baladine Ardant Conversi, Andrea Armani, Davide Bertoni, Jacopo Bonvicini, Giulio Cangiano, Domenico Emanuele de Feudis, Serena Lupo, Piero Messina, Fabrizio Provinciali, Giorgio Servillo; Departamento de arte: Stefano Barberi, Giorgio Barullo, Fabio Galvagno, Fabrizio Mucci, Daniele Rossi Espagnet, Angelo Spirito; Som: Emanuele Cecere; Efeitos especiais: Tiberio Angeloni, Franco Galiano, Massimo Giovannetti, Luca Ricci; Efeitos visuais: Enrico Barone, Rodolfo Migliari; Companhias de produção: Indigo Film, Medusa Film, Babe Film, Pathé, France 2 Cinéma, Mediaset, Canal+, Ciné+, France Télévisions, Regione Lazio , Ministero per i Beni e le Attività Culturali (MiBAC), Banca Popolare di Vicenza, Lazio Film Commission, Fonds Eurimages du Conseil de l'Europe, Programme MEDIA de la Communauté Européenne, Biscottificio Verona; Intérpretes: Toni Servillo (Jep Gambardella), Carlo Verdone (Romano), Sabrina Ferilli (Ramona), Carlo Buccirosso (Lello Cava), Iaia Forte (Trumeau), Pamela Villoresi (Viola), Galatea Ranzi (Stefania), Franco Graziosi (Conde Colonna), Giorgio Pasotti (Stefano), Massimo Popolizio (Alfio Bracco), Sonia Gessner (Condessa Colonna), Anna Della Rosa (rapariga na performence), Luca Marinelli (Andrea), Serena Grandi (Lorena), Ivan Franek (Ron Sweet), Vernon Dobtcheff (Arturo), Dario Cantarelli, Pasquale Petrolo, Luciano Virgilio, Aldo Ralli, Giusi Merli, Giovanna Vignola, Anita Kravos, Ludovico Caldarera, Maria Laura Rondanini, Francesca Golia, Silvia Munguia, Massimo De Francovich, Isabella Ferrari, Roberto Herlitzka, Fanny Ardant (não creditada), etc. Duração: 142 minutos; Distribuição em Portugal: Zon-Lusomundo; Classificação etária: M/ 16 anos; Data de estreia em Portugal: 20 de Fevereiro de 2014.

sábado, fevereiro 22, 2014

CINEMA: FILOMENA


FILOMENA

O jornalista inglês Martin Sixsmith (Steve Coogan) foi, durante anos, correspondente da BBC em Moscovo e Washington e, mais tarde, colaborador do primeiro-ministro Tony Blair. Demitido das suas funções, segundo ele de forma injustificada, resolveu dedicar-se ao ensaísmo histórico, escrevendo sobre a História Russa. Mas, entretanto, surge-lhe “um caso humano” que mereceu a sua atenção e o interesse da sua editora, ambos obviamente seduzidos pelo drama e também pelos proveitos que o seu aproveitamento literário poderia justificar. É assim que a filha de Philomena Lee conduz o escritor até junto de sua mãe, que procura há cinquenta anos localizar um filho ilegítimo que tivera e de que não sabe o paradeiro desde que ele fora doado (vendido?) a um casal de americanos que o viera resgatar à Irlanda, de um mosteiro de freiras católicas.
Claro que o caso necessita de investigação jornalística: Philomena Lee (Judi Dench), quando contava apenas quinze anos, fora seduzida por um jovem de passagem, que a engravidou. Nos anos 50, numa Irlanda profundamente católica e fanaticamente puritana, esse percalço era visto como pecado sem remissão. Teve a criança, encerrada no austero convento de Roscrea, onde trabalhava de sol a sol, vendo crescer o filho entre as grades monacais, até que, quando este tinha três ou quatro anos, um casal vindo de carro o levou juntamente com outra miúda de igual idade. Para um destino que desconhecia. Philomena ficou para sempre traumatizada e a angústia desta separação não a abandonou mais. Cinquenta anos depois, resolve aceitar a ajuda de Martin Sixsmith e partir à descoberta do filho perdido.

De inquérito em inquérito, e perante o silêncio das religiosas, acaba por descobrir que a criança havia sido levada (há quem lhe afiance que vendida pelas freiras, que assim conseguiam aumentar o pecúlio da ordem) para os EUA. A pista parece para sempre perdida, mas Martin Sixsmithe tem bons contactos em Washington e consegue localizar uma ponta por onde voltar a pegar no assunto e que o levará a descobrir a verdade.
Steve Coogan e Jeff Pope escreveram o argumento partindo da obra de Martin Sixsmith, "The Lost Child of Philomena Lee", entretanto editada com o consentimento desta última, que se mostrara indecisa quanto a este procedimento, mas que acabou por aceder como reposição da verdade, como acto de justiça para com o filho e igualmente como revolta contra a conduta indecorosa das freiras irlandesas.
O inglês Stephen Frears, que iniciou a sua carreira na televisão, onde assinou um elevado número de trabalhos, antes de se estrear na longa-metragem em meados da década de 80, chamando desde logo a atenção com obras como “A Minha Bela Lavandaria” (85) ou “Ligações Perigosas” (88), dirigiu posteriormente títulos importantes como “O Herói Acidental”, “Mary Reilly”, “A Carrinha”, “Alta Fidelidade”, “Mrs. Henderson” ou “A Rainha”, entre outros. "The Lost Child of Philomena Lee" interessou-o evidentemente pelo lado humano, mas cremos que, sobretudo, pela necessidade de denunciar um comportamento aberrante por parte de uma comunidade católica irlandesa, nos não muito afastados anos 50 do século passado.

O projecto revela-se uma obra particularmente interessante, ainda que possa justificar um ou outro reparo, nomeadamente no tratamento dado à personagem do jornalista que vê, obviamente, neste “caso humano” uma forma de recuperar prestígio perdido e de arrecadar boas recompensas monetárias. Isso mesmo parece ser insinuado através da figura da sua editora, mas passa um pouco ao lado das intenções mais visíveis do projecto. Martin Sixsmith e Philomena Lee são sobretudo olhados como uma dupla que se completa, que parte para a viagem conjunta ignorando quase tudo um do outro, participam de mundos diferentes (as descrições dos romances que Philomena Lee lê são particularmente enternecedoras, mas deixam bem vincada essa diferença), mas vão lentamente aproximando-se, descobrindo-se, envolvendo-se emocionalmente. Nem a fé cega de Philomena, que a leva a desculpar tudo (ou quase tudo), nem o ateísmo militante de Martin Sixsmith são óbices que invalidem essa aproximação.
A partir de determinada altura do filme, Martin Sixsmith vai-se assumindo como o filho que Philomena Lee perdera. Este aspecto é bastante bem dado por Stephen Frears, que consegue manter num muito bom nível um argumento que facilmente poderia resvalar para um melodrama de lágrima fácil e de comprometedor apelo à pieguice barata. Doseando com dignidade o drama e o humor, e servindo-se de óptimos actores (Judi Dench é como sempre magnífica e Steve Coogan de uma convincente sobriedade), o realizador leva a bom porto este filme que a Academia de Hollywood nomeou para quatro categorias, Melhor Filme, Melhor Actriz, Melhor Argumento Adaptado, Melhor Música, depois de ter tido uma excelente passagem pelo último Festival de Veneza e pelos BAFTAS ingleses.  

FILOMENA
Título original: Philomena

Realização: Stephen Frears (Inglaterra, EUA, França, 2013); Argumento: Steve Coogan, Jeff Pope, segundo obra de Martin Sixsmith ("The Lost Child of Philomena Lee"); Produção: Carolyn Marks Blackwood, Steve Coogan, François Ivernel, Christine Langan, Cameron McCracken, Henry Normal, Tracey Seaward, Gabrielle Tana; Música: Alexandre Desplat; Fotografia (cor): Robbie Ryan; Montagem: Valerio Bonelli; Casting: Leo Davis, Lissy Holm; Design de produção: Alan MacDonald; Direcção artística: Leslie McDonald, Rod McLean, Sarah Stuart; Decoração:  Barbara Herman-Skelding; Guarda-roupa:  Consolata Boyle, Naomi Donne, Andrea Finch, Lucy Friend; Direcção de Produção: Phil Brown, Patricia Anne Doherty, Carol Flaisher, Samantha Knox-Johnston, Cathy Mooney; Assistentes de realização: Timothy Bird, Olivia Lloyd, Joseph Quinn, Alison C. Rosa, Deborah Saban, Richard Wilson; Departamento de arte: Laura Conway-Gordon, Dan Crandon, Heather Greenlees, Thomas Martin, Camise Oldfield;  Som:  Terry McDonald, Kate Morath, Jay Price, Len Schmitz, Oliver Tarney, Rachael Tate; Efeitos especiais: Manex Efrem; Efeitos visuais: Adam Gascoyne, Ines Li; Companhias de produção: BBC Films, Baby Cow Productions, British Film Institute (BFI), Magnolia Mae Films, Pathé; Intérpretes: Judi Dench (Philomena), Steve Coogan (Martin Sixsmith), Sophie Kennedy Clark (jovem Philomena), Mare Winningham (Mary), Barbara Jefford (Irmã Hildegarde), Ruth McCabe (Madre Barbara), Peter Hermann (Pete Olsson), Sean Mahon (Michael), Anna Maxwell Martin (Jane), Michelle Fairley (Sally Mitchell), Wunmi Mosaku, Amy McAllister, Charlie Murphy, Cathy Belton, Kate Fleetwood, Charissa Shearer, Nika McGuigan, Rachel Wilcock, Rita Hamill, Tadhg Bowen, Saoirse Bowen, Harrison D'Ampney, D.J. McGrath, Simone Lahbib. Sara Stewart, Gary Lilburn, Charles Edwards, Nicholas Jones, etc. Duração: 98 minutos; Distribuição em Portugal: Zon Lusomundo; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 6 de Fevereiro de 2014.

segunda-feira, fevereiro 17, 2014

CINEMA: HER


UMA HISTÓRIA DE AMOR

“Her” é um triunfo em toda a linha, a começar desde logo pelo clima que cria. Ao pretender-se um história de amor num futuro próximo, a ambiência que o filme suscita é particularmente inquietante, porque tão depressa nos parece estarmos nos nossos dias, como num “futuro próximo”. Na verdade, estamos nos “nossos dias”. Os cenários terão sido aqui e ali retocados, mas no essencial, nos exteriores e interiores, o que vemos é Los Angeles e Xangai, bem enquadrados para nos oferecer alguma estranheza, mas nada mais do que isso. O vestuário e os adereços parecem de hoje, talvez um pouco “casual” demais. Elegantes mas desportivos. Há os telemóveis, que são mais de imagem do que de som, mas ver as pessoas nas ruas passarem agarradas a eles já não é surpresa. Só as funções diferem. Mas a inquietação que transmite ao espectador, ao afirmar-se num futuro próximo e ao nos surgir tão banal, é fortíssima. Tanto mais que o tema é inquietante.
Theodore Twombly (Joaquin Phoenix), um escritor de cartas sentimentais, profissão de futuro (apesar de já ter sido do passado, ainda que de outra forma), acaba de se separar da mulher, vive sozinho, é um indivíduo solitário, que tem amigos no local de trabalho e na vizinhança, mas não é só ele que nos oferece uma imagem de solidão. A solidão é uma tonalidade colectiva, mas os rostos não são de infelicidade. Há sorrisos, uma certa nostalgia nalguns olhares, anda-se só pelas ruas, mas a qualidade de vida aparenta ser boa. Não se vê miséria, não se fala de dificuldades, as ruas estão esmeradamente limpas, estamos longe das imagens catastróficas de certas obras que nos imaginam futuros negros, tipo “Blade Runner”.

O computador é o local de trabalho de Theodore. Um dia, ouve falar num novo sistema operacional para seu computador, o SO1, através do qual pode falar com operadoras virtuais que podem satisfazer os seus desejos. Profissionais, de início. Emocionais logo a seguir.  Nada de muito novo para quem já frequentou chats, blogues, facebooks e quejandos. Com a diferença de que a Samantha (Scarlett Johansson) que responde do outro lado não é real, paira no éter. Nos chats pode não se saber quem está do outro lado, mas em princípio é alguém de carne e osso. Aqui essa materialidade não existe à partida.
Mas, apesar disso, Theodore não resiste ao apelo e apaixona-se pela voz e por tudo quanto ela traz consigo. Ela está sempre disponível, desliga-se quando não é necessária, ajuda-o no que ele necessita, e geme languidamente de prazer nas ocasiões certas. A relação amorosa é um facto, pelo menos do lado de Theodore, mas quem sabe o que sente Samantha?


No mesmo andar de Theodore vive um casal. Amy (Amy Adams) é abandonada pelo marido, e encosta a cabeça no ombro do vizinho, para se sentir reconfortada. Poderia ser uma nova história de amor, esta mais normal, mas o que será a normalidade num “futuro próximo”? O que “Her” nos deixa é a sensação de que tudo será diferente e, apesar de uma certa nostalgia que paira no ar, nada nos diz que o futuro será pior do que o presente, o que é um aspecto  muito inquietante do filme de Spike Jonze. Com um tal argumento, o que se aguarda é um final calamitoso, onde o homem contemporâneo se poderia ver dominado pela tecnologia, onde a solidão tudo corrói até ao suicídio, onde o desespero emocional fosse devastador. Nada disso se sente no filme. Há incomodidade, há alguma ausência de comunicação, há emoções perdidas? Claro, mas sempre houve e “Her” diz-nos que sempre haverá. Não é um filme catástrofe, mesmo que a catástrofe seja sentimental. Muito pelo contrário. No final de “Tempos Modernos”, de Chaplin (1935), Charlot e a companheira partem com alguma esperança, rumo ao desconhecido, vemo-los de costas estrada fora. Aqui, Theodore e Adam, do alto do seu terraço, olham o horizonte. Na companhia um do outro. Vemo-los igualmente de costas e é um “end” que não sabemos se é “happy” ou não, mas é um grande final.
Spike Jonze é um dos mais interessantes cineastas da moderna Hollywood e um dos menos convencionais. Tem uma extensa filmografia, com dezenas e dezenas de curtas metragens e de documentários, muitos experimentais, e algumas longas que mostram bem o seu desalinhamento da produção corrente: “Queres Ser John Malkovich?” (1999), “Inadaptado” (2002), “O Sítio das Coisas Selvagens” (2009) até chegar a esta “Uma História de Amor” (2013) que é um exercício brilhante de um cineasta que manuseia como poucos as subtilezas das emoções e passeia a câmara com a delicadeza e o pudor e um predestinado.
Depois o argumento, do mesmo Spike Jonze, é de uma inteligência e originalidade invulgares, a fotografia de Hoyte Van Hoytema ajusta-se brilhantemente à doçura meiga das tonalidades, a música de Owen Pallett, e dos Arcade Fire, é de uma envolvência absoluta, a montagem de Jeff Buchanan e Eric Zumbrunnen muito boa e a concepção plástica de K.K. Barrett admirável de justeza. Começam a faltar os adjectivos para a interpretação absolutamente extraordinária, de rigor e contenção, de Joaquin Phoenix, muito bem acompanhado por Amy Adams (que belíssima actriz!), Rooney Mara, Olivia Wilde, ou de Scarlett Johansson, a voz de Samantha.
Indispensável, portanto.


UMA HISTÓRIA DE AMOR
Título original: Her

Realização: Spike Jonze (EUA, 2013); Argumento: Spike Jonze; Produção: Ray Angelic, Chelsea Barnard, Megan Ellison, Natalie Farrey, Spike Jonze, Vincent Landay, Daniel Lupi; Música: Owen Pallett, Arcade Fire; Fotografia (cor): Hoyte Van Hoytema; Montagem: Jeff Buchanan, Eric Zumbrunnen; Casting: Cassandra Kulukundis, Ellen Lewis; Design de produção: K.K. Barrett; Direcção artística: Austin Gorg; Decoração: Gene Serdena; Guarda-roupa: Casey Storm; Maquilhagem: Steve Artmont, Kristin Berge, Cydney Cornell, Bo Xian, Nani Velez, Joy Zapata; Direcção de Produção: Randall James Bol, Daniel Lupi, James Masi, Michael McDermott, Hameed Shaukat, Will Weiske; Assistentes de realização: Robert E. Kay, Sylvia Liu, David K. Riebel, Rod Smith, Thomas Patrick Smith, Cecilia Sweatman; Departamento de arte: Allen Coulter, Venessa De Anda, Jane Fitts, Chris Forster, Sonny Gerasimowicz; Som: Ren Klyce; Efeitos especiais: Elia P. Popov; Efeitos visuais: Janelle Croshaw, Doron Kipper, Brice Liesveld, Fredrik Nord, Andrew Wood; Companhias de produção: Annapurna Pictures; Intérpretes: Joaquin Phoenix (Theodore Twombly), Amy Adams (Amy), Rooney Mara (Catherine), Olivia Wilde (mulher em encontro), Scarlett Johansson (voz de Samantha), Chris Pratt (Paul), Matt Letscher (Charles), Sam Jaeger (Dr. Johnson), Luka Jones (Mark Lewman), Kristen Wiig (voz sexy), Bill Hader (amigo em sala de chat), Spike Jonze (voz de criança), Portia Doubleday, Soko, Brian Cox, Lynn Adrianna, Lisa Renee Pitts, Gabe Gomez, Chris Pratt, Artt Butler, May Lindstrom, Rooney Mara, Matt Letscher, David Azar, Dr. Guy Lewis, Melanie Seacat, Pramod Kumar, Evelyn Edwards, Steve Zissis, Dane White, Nicole Grother, James Ozasky, Samantha Sarakanti, Luka Jones, Gracie Prewitt, Claudia Choi, Laura Kai Chen, Portia Doubleday, Wendy Leon, Charles Riley, Robert Benard, etc. Duração: 126 minutos; Distribuição em Portugal: Zon Audiovisuais; Classificação etária: M/ 16 anos; Data de estreia em Portugal: 13 de Fevereiro de 2014.

BAFTAS 2014: OS VENCEDORES



BAFTAS 2014: OS VENCEDORES

Acabaram de ser atribuídos os BAFTAS 2014, os Oscars de Inglaterra. Grande Vencedor "Gravidade", mas também "12 Anos Escravo" e "Golpada Americana". 
Seguem os nomeados em cada categoria e os vencedores assinalados com **.

MELHOR FILME EM LÍNGUA INGLESA
**12 Years a Slave, Anthony Katagas, Brad Pitt, Dede Gardner, Jeremy Kleiner, Steve McQueen
American Hustle, Charles Roven, Richard Suckle, Megan Ellison, Jonathan Gordon
Captain Phillips, Scott Rudin, Dana Brunetti, Michael De Luca
Gravity, Alfonso Cuarón, David Heyman
Philomena, Gabrielle Tana, Steve Coogan, Tracey Seaward

MELHOR FILME INGLÊS
** Gravity, Alfonso Cuarón, David Heyman, Jonás Cuarón
Mandela: Long Walk to Freedom, Justin Chadwick, Anant Singh, David M. Thompson, William Nicholson
Philomena, Stephen Frears, Gabrielle Tana, Steve Coogan, Tracey Seaward, Jeff Pope
Rush, Ron Howard, Andrew Eaton, Peter Morgan
Saving Mr Banks, John Lee Hancock, Alison Owen, Ian Collie, Philip Steuer, Kelly Marcel, Sue Smith
The Selfish Giant, Clio Barnard, Tracy O’Riordan

REVELAÇÂO INGLESA (ARGUMENTISTA, REALIZADOR ou PRODUTOR)
Colin Carberry (Writer), Glenn Patterson (Writer) - Good Vibrations
Kelly Marcel (Writer) - Saving Mr Banks
** Kieran Evans (Director/Writer) - Kelly + Victor
Paul Wright (Director/Writer), Polly Stokes (Producer) -  - Those in Peril
Scott Graham (Director/Writer) – Shell

MELHOR FILME EM LINGUA NÃO INGLESA
The Act of Killing, Joshua Oppenheimer, Signe Byrge Sørensen
Blue is the Warmest Colour, Abdellatif Kechiche, Brahim Chioua, Vincent Maraval
** The Great Beauty, Paolo Sorrentino, Nicola Giuliano, Francesca Cima Metro Manila Sean Ellis, Mathilde Charpentier Wadjda Haifaa Al-Mansour, Gerhard Meixner, Roman Paul

DOCUMENTÁRIO
** The Act of Killing, Joshua Oppenheimer
The Armstrong Lie, Alex Gibney
Blackfish, Gabriela Cowperthwaite
Tim’s Vermeer, Teller, Penn Jillette, Farley Ziegler
We Steal Secrets: The Story of Wikileaks, Alex Gibney

MELHOR ANIMAÇÃO
Despicable Me 2, Chris Renaud, Pierre Coffin
** Frozen, Chris Buck, Jennifer Lee
Monsters University, Dan Scanlon

MELHOR REALIZADOR
Steve McQueen  - 12 Years a Slave
David O Russell  - American Hustle
Paul Greengrass  - Captain Phillips
** Alfonso Cuarón  - Gravity
Martin Scorsese  - The Wolf of Wall Street

MELHOR ARGUMENTO
** Eric Warren Singer, David O. Russell  - American Hustle
Woody Allen  - Blue Jasmine
Alfonso Cuarón, Jonás Cuarón  - Gravity
Joel Coen, Ethan Coen  - Inside Llewyn Davis
Bob Nelson  - Nebraska

MELHOR ARGUMENTO ADAPTADO
John Ridley  - 12 Years a Slave
Richard LaGravenese  - Behind the Candelabra
Billy Ray  - Captain Phillips
** Steve Coogan  - Jeff Pope, Philomena
Terence Winter  - The Wolf of Wall Street

MELHOR ACTOR
Bruce Dern  - Nebraska
** Chiwetel Ejio -  12 Years a Slave
Christian Bale  - American Hustle
Leonardo DiCaprio  - The Wolf of Wall Street
Tom Hanks  - Captain Phillips

MELHOR ACTRIZ
Amy Adams  - American Hustle
** Cate Blanchett  - Blue Jasmine
Emma Thompson  - Saving Mr Banks
Judi Dench  - Philomena
Sandra Bullock  - Gravity

MELHOR ACTOR SECUNDÁRIO
** Barkhad Abdi  - Captain Phillips
Bradley Cooper  - American Hustle
Daniel Brühl  - Rush
Matt Damon  - Behind the Candelabra
Michael Fassbender  - 12 Years a Slave

MELHOR ACTRIZ SECUNDÁRIA
** Jennifer Lawrence  - American Hustle
Julia Roberts  - August: Osage County
Lupita Nyong’o  - 12 Years a Slave
Oprah Winfrey  - The Butler
Sally Hawkins  - Blue Jasmine

MELHOR MÚSICA ORIGINAL
Hans Zimmer  - 12 Years a Slave
John Williams  - The Book Thief
Henry Jackman  - Captain Phillips
** Steven Price  - Gravity
Thomas Newman  - Saving Mr Banks

MELHOR FOTOGRAFIA
Sean Bobbitt  - 12 Years A Slave
Barry Ackroyd  - Captain Phillips
** Emmanuel Lubezki  - Gravity
Bruno Delbonnel  - Inside Llewyn Davis
Phedon Papamichael  - Nebraska

MELHOR MONTAGEM
Joe Walker  - 12 Years a Slave
Christopher Rouse  - Captain Phillips
Alfonso Cuarón, Mark Sanger  - Gravity
** Mike Hill, Dan Hanley  - Rush
Thelma Schoonmaker  - The Wolf of Wall Street

MELHOR DIRECÇÃO ARTISTICA
Adam Stockhausen, Alice Baker  - 12 Years a Slave
Judy Becker, Heather Loeffle  - American Hustle
Howard Cummings  - Behind the Candelabra
Andy Nicholson, Rosie Goodwin, Joanne Woodlard  - Gravity
** Catherine Martin, Beverley Dunn  - The Great Gatsby

MELHOR GUARDA ROUPA
Michael Wilkinson  - American Hustle
Ellen Mirojnick  - Behind the Candelabra
** Catherine Martin  - The Great Gatsby
Michael o’Connor  - The Invisible Woman
Daniel Orlandi  - Saving Mr Banks

MELHOR MAQUILHAGEM
** Evelyne Noraz, Lori Mccoy-Bell  - American Hustle
Kate Biscoe, Marie Larkin  - Behind the Candelabra
Debra Denson, Beverly Jo Pryor, Candace Neal  - The Butler
Maurizio Silvi, Kerry Warn  - The Great Gatsby
Peter Swords King, Richard Taylor, Rick Findlater  - The Hobbit: The Desolation of Smaug,

MELHOR SOM
Richard Hymns, Steve Boeddeker, Brandon Proctor, Micah Bloomberg, Gillian Arthur  - All is Lost
Chris Burdon, Mark Taylor, Mike Prestwood Smith, Chris Munro, Oliver Tarney  - Captain Phillips
** Glenn Freemantle, Skip Lievsay, Christopher Benstead, Niv Adiri, Chris Munro  - Gravity
Peter F. Kurland, Skip Lievsay, Greg Orloff  - Inside Llewyn Davis
Danny Hambrook, Martin Steyer, Stefan Korte, Markus Stemler, Frank Kruse  - Rush

MELHORES EFEITOS VISUAIS
** Tim Webber, Chris Lawrence, David Shirk, Neil Corbould, Nikki Penny  - Gravity
Joe Letteri, Eric Saindon, David Clayton, Eric Reynolds  - The Hobbit: The Desolation of Smaug
Bryan Grill, Christopher Townsend, Guy Williams, Dan Sudick  - Iron Man 3
Hal Hickel, John Knoll, Lindy De Quattro, Nigel Sumner  - Pacific Rim
Ben Grossmann, Burt Dalton, Patrick Tubach, Roger Guyett  - Star Trek Into Darkness

MELHOR CURTA DE ANIMAÇÃO INGLESA
Everything I Can See From Here, Bjorn-Erik Aschim, Friederike Nicolaus, Sam Taylor
I Am Tom Moody, Ainslie Henderson
** Sleeping With The Fishes, James Walker, Sarah Woolner, Yousif Al-Khalifa

MELHOR CURTA-METRAGEM INGLESA
Island Queen, Ben Mallaby, Nat Luurtsema
Keeping Up With The Joneses, Megan Rubens, Michael Pearce, Selina Lim
Orbit Ever After, Chee-Lan Chan, Jamie Stone, Len Rowles
** Room 8, James W. Griffiths, Sophie Venner
Sea View, Anna Duffield, Jane Linfoot

MELHOR ACTOR REVELAÇÃO (votado pelo público)
Dane Dehaan
George Mackay
Lupita Nyong’o
** Will Poulter

Léa Seydoux

sábado, fevereiro 15, 2014

CINEMA: AO ENCONTRO DE MR. BANKS


AO ENCONTRO DE MR. BANKS

Pamela Lyndon Travers, escritora que criou “Mary Poppins” e assinava P.L. Travers para encobrir o facto de ser mulher, fora baptizada com o nome de Helen Lyndon Goff e nascera na Austrália, em Maryborough, Queensland, a 9 de Agosto de 1899, vindo a morrer em Londres, a 23 de Abril de 1996. Quando tinha sete anos, o pai faleceu, um acontecimento que para sempre marcaria a jovem. Desde muito nova que se dedica à poesia, tornando-se escritora, jornalista e passando mesmo pelo teatro, como actriz. Anda pela Austrália e pela Nova Zelândia, em tournée, depois viajou até à Irlanda, onde conheceu vários poetas e escritores, passando a Londres, onde se instala. Publica em 1934 “Mary Poppins”, que rapidamente se tornou um sucesso retumbante.
Em Hollywood, as filhas de Walt Disney lêem o livro e adoram. O pai promete-lhes que o vai adaptar ao cinema. Entra em contacto com a escritora, que nem quer ouvir falar em adaptações, detesta musicais e tem horror a “bonecos animados”. Durante vinte anos, trocam cartas e nem um nem outro desiste dos seus intentos. “Saving Mr. Banks” é, pois, a história de dois teimosos que se enfrentam para cumprir promessas. Ele quer adaptar a cinema o livro para cumprir o que jurara às filhas, ela não quer ceder para se manter fiel à promessa que fizera a si própria.


A determinada altura da vida de P.L. Travers, as receitas literárias começam a diminuir e o seu agente convence-a a viajar até Los Angeles. Isso acontece em 1961. Como se calcula, a escritora começa por detestar a cidade e o encontro com Walt Disney é desastroso. A autora de “Mary Poppins” revela-se uma velhota ácida, fria, distante, agressiva, nada cooperante, mostra que está a fazer um frete insuportável. As reuniões com argumentistas, compositor, letristas, produtores, secretárias and so on, são lendárias. A má disposição e o negativismo de P.L. Travers julgar-se-iam inultrapassáveis. Se o tivessem sido, não haveria agora este filme, nem “Mary Poppins” com pinguins em desenho animado, a dançarem em redor de Dick Van Dyke. Mas, lentamente, vai cedendo aos encantos do lugar e das personagens e talvez também ao cansaço. O filme faz-se, estreia-se em 1964, é um triunfo, mas ela mantém as reservas e não permite a Walt Disney aproveitar nenhuma das quatro sequelas que entretanto escrevera e editara com a sua Mary Poppins como protagonista. Fim de história, que não contém nenhum suspense especial, pois é do conhecimento geral. Faz parte da História. Este é mais um filme que ficciona factos reais.
John Lee Hancock, o realizador, é igualmente um argumentista de algum sucesso, tendo assinado, enquanto tal, algumas obras muito interessantes, como “Um Mundo Perfeito” e “Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal”, ambas rodadas por Clint Eastwood, tendo dirigido como realizador “The Rookie - O Treinador”, “Álamo” e “Um Sonho Possível”, antes de se entregar a este “Ao Encontro de Mr. Banks”. Nada de particularmente excitante, o mesmo acontecendo agora, ainda que neste último caso, a história tenha a sua graça, e os intérpretes sejam excelentes. Emma Thompson compõe um retrato inspirado desta insuportavelmente irritante P.L. Travers; Tom Hanks é um Walt Disney impecável, talvez demasiado “politicamente correcto” (mas que dizer, se a produção é dos seus estúdios e herdeiros?); Annie Rose Buckley é uma miudinha adorável, que as asperezas da vida transformaram na agreste escritora; Colin Farrell é o pai destemperado que morre cedo e deixa um rasto de tristeza na filha; Ruth Wilson é a sacrificada mãe; Paul Giamatti é admirável como motorista particular de Travers, e por aí fora. Só pelas interpretações merece a pena as duas horas de visionamento. Mas a produção é cuidada, os aspectos técnicos estão à altura da casa produtora e o resultado final é mais um daqueles filmes para “toda a família” a que estes estúdios nos habituaram há longas décadas.


Para quem gosta de cinema e de espreitar os bastidores das produções de Hollywood, este é mais um aspecto a ter em conta. O que coloca algumas objecções ao produto, será por um lado o ar muito bem comportado de toda a gente, o que os permite supor que os argumentistas (Kelly Marcel e Sue Smith) adocicaram muito a realidade e, por outro, uma estrutura narrativa, tipo sanduíche, com duas histórias entremeadas a decorrer em simultâneo, por um lado a juventude de P.L. Travers na Austrália, por outro lado o encontro desta com Disney em Hollywood. Obviamente que se percebe o porquê da opção: a história da juventude de P.L. Travers é a base para a compreensão do seu comportamento ao longo da vida. Mas o esquema acaba por ser um pouco enfadonho, por repetitivo.
Globalmente, é um espectáculo que se vê com agrado, mas não muito mais do que isso. O que já não é pouco se lhe acrescentarmos o brilhantismo das representações.


AO ENCONTRO DE MR. BANKS
Título original: Saving Mr. Banks

Realização: John Lee Hancock (EUA, Inglaterra, Austrália, 2013); Argumento: Kelly Marcel, Sue Smith; Produção: Ian Collie, Mark Cooper, K.C. Hodenfield, Christine Langan, Troy Lum, Andrew Mason, Alison Owen, Philip Steuer, Paul Trijbits; Música: Thomas Newman; Fotografia (cor): John Schwartzman; Montagem: Mark Livolsi; Casting: Ronna Kress; Design de produção: Michael Corenblith; Direcção artística: Lauren E. Polizzi; Decoração: Susan Benjamin; Guarda-roupa: Daniel Orlandi, Catherine Childers, Deborah La Mia Denaver, Julie Hewett, Frances Mathias; Direcção de Produção: Andrew C. Keeter, Philip Steuer, Todd London; Assistentes de realização: Paula Case, Clark Credle, K.C. Hodenfield, Jeff Okabayashi, Stuart Renfrew; Departamento de arte: Lorrie Campbell, Martin Charles, Steve Christensen, Mike Piccirillo, Terry Scott, Sally Thornton; Som: Yann Delpuech, Jon Johnson, David M. Roberts; Efeitos especiais: J.D. Schwalm; Efeitos visuais: Vincent Cirelli, Justin Johnson, Lauren Miyake, Simon Mowbray, Luma Pictures; Companhias de produção: Walt Disney Pictures, Ruby Films, Essential Media & Entertainment, BBC Films, Hopscotch Features; Intérpretes: Emma Thompson (P.L. Travers), Tom Hanks (Walt Disney), Annie Rose Buckley (Ginty), Colin Farrell (Travers Goff), Ruth Wilson (Margaret Goff), Paul Giamatti (Ralph), Bradley Whitford (Don DaGradi), B.J. Novak (Robert Sherman), Jason Schwartzman (Richard Sherman), Lily Bigham (Biddy), Kathy Baker (Tommie), Melanie Paxson (Dolly), Andy McPhee (Mr. Belhatchett), Rachel Griffiths (Tia Ellie), Ronan Vibert (Diarmuid Russell), Jerry Hauck, Laura Waddell, Fuschia Sumner, David Ross Paterson, Michelle Arthur, Michael Swinehart, Bob Rusch, Paul Tassone, Luke Baines, Demetrius Grosse, Steven Cabral, Kimberly D'Armond, Mia Serafino, Claire Bocking, Dendrie Taylor, etc. Duração: 125 minutos; Distribuição em Portugal: Zon Lusomundo; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 30 de Janeiro de 2014.

                                                                 A verdadeira P.L. Travers e Emma Thompson, no filme.

sábado, fevereiro 08, 2014

CINEMA: O LOBO DE WALL STREET


O LOBO DE WALL STREET

Conta-se que, em várias épocas, e através de testemunhos diversos, reis e imperadores, generais e chefes de estado, quando recebiam uma má notícia, normalmente das frentes de batalha, mandavam matar o mensageiro. Existe um ditado latino que confirma a história ou a lenda: “Ne nuntium necare”: Não mate o mensageiro. Shakespeare actualizou a mensagem para "Don't shoot the messenger", em “Henry IV”, e igualmente em “Antony and Cleopatra”. Na Antiguidade Clássica, Sófocles, em “Antigona”, não era tão drástico, mas mantinha o essencial: “ninguém gosta do mensageiro que traz más notícias”.
Nos nossos dias, há muita gente que não gosta de “O Lobo de Wall Street”, de Martin Scorsese. Já li um pouco de tudo, da “obra-prima” à “merda”, e parece-me que muitos atacam o filme, não pelo trabalho de Scorcese, mas essencialmente pela “mensagem” que ele transmite. Julgo que há alguns espectadores que detestam não tanto o filme, mas sobretudo o retrato que ele oferece de um certo extracto da sociedade contemporânea. Recusam-se mesmo a acreditar que tal retrato seja autêntico. Na verdade, é demasiado mau para ser verdade. Mas acredito que seja verdade. Vou mais longe: acredito que é por causa do que vimos e ouvimos em “O Lobo de Wall Street” que estamos como estamos, um pouco por todo o lado. O filme fala de Wall Street, mas Walll Street aqui é um símbolo mundial, dos EUA à China, passando por este recanto à beira Atlântico plantado.


Vamos por partes. Este é mais um filme baseado em factos reais. Jordan Belfort, o protagonista, existiu e existe, escreveu um livro que anda nas montras de todas as livrarias do mundo, que conta as suas “aventuras” no universo da alta e da baixa finança. O livro tornou-se um best-seller e percebe-se o que levou Scorsese a interessar-se por ele: é um excelente ponto de partida para um argumento sobre o que se passa, de há umas décadas para cá, com um certo tipo de operações bolsistas, que envolvem toda a finança mundial, os bancos, as bolsas, a corrupção, o arrivismo, impondo um estilo de vida que é a personificação da falta de escrúpulos destes indivíduos medonhos que comandam os destinos da Humanidade.
Os factos remontam aos anos 80. Como poderia deixar de ser, se foi aí que tudo começou, com Reagan e Thatcher, e o aparecimento dos yuppies tão acarinhados pelos poderes públicos, que iriam provocar, através deles, a “revolução” económica, social e política que estamos a viver agora. A ideia central era valorizar o dinheiro e desvalorizar tudo o mais. Não há moral, não há ética, não há amizades ou amor, não há cultura, não há nada que não seja cifrões. A globalização ajudou à festa e a realidade virtual foi a cereja no cimo do bolo. Antigamente, o capitalismo vivia do acumular da riqueza que se extraía do trabalho, trabalho de administradores e gestores, e sobretudo da mão de obra de operários (estes explorados, em noventa por cento dos casos), mas, a partir da economia virtual, da especulação bolsista, o dinheiro multiplica-se de forma mágica. A exploração continua, mas agora não há “rostos”, o que existe é a “financia internacional”.


Jordan Belfort percebeu isso quando entrou para uma empresa de correctores de bolsa e teve um mestre fabuloso, Mark Hanna (um espantoso Matthew McConaughey no filme), que lhe ensina que na vida há três pilares: dinheiro para multiplicar, prostitutas para usar e drogas para consumir e manter a “máquina” alerta. Bater no peito, como os raguebistas neozelandeses também ajuda, mas não é vital. Quando se começa a ambientar e a subir na vida, a empresa vai a falência e Jordan, espertalhaço, segue os ventos da mudança. Em lugar de uma grande empresa que joga com o capital dos tubarões, vai para a uma pequena loja que faz o mesmo, mas com as economias do peixe miúdo. Com uma diferença. Enquanto nas grandes empresas os corretores cobram 10% e dão a ganhar algum aos multimionários, ali cobram 50% e a arraia-miúda que se cuide. O mais certo é não ganhar nada e perder as economias, mas os seus 50% estão garantidos.
Faz fortuna, funda a sua própria empresa e torna-se ele próprio um multimilionário com uma filosofia de vida muito restrita: ganhar o máximo de dinheiro, o mais rapidamente possível (nenhum dos seus empregado está “autorizado” a desligar um telefone sem ter “abatido” o cliente que se encontra do outro lado do fio), enquanto promove grandes bacanais com miúdas “fixes” e drogas a rodos. Uma chamada “lemon”, novidade no meio, é a que está a dar. Enquanto vão arruinando milhares de pequenos (mas gananciosos) especuladores, eles vão-se divertindo com frases que pouco mais dizem do que “fuck” e comportamentos de risco que podem acabar mal para eles e sobretudo para a economia mundial (não a economia da alta finança, mas a dos desgraçados que vivem do seu ordenado ou da sua reforma - vidé o que se passa por aqui, boa amostra).


Claro que a certa altura, o cambalacho chama a atenção das autoridades, o FBI entra na jogada, a maioria vai parar à cadeia, Jordan Belfort cumpre uma pena, três anitos, coisa pouca, mas ironia das ironias, “the show must go on”, sai da cadeia com um livro escrito a contar as suas façanhas, e agora dá conferências, bem pagas, a explicar o seu método de “empreendorismo” (onde é que eu já ouvi falar disto?).
Pois acredito que muita gente não goste de ouvir esta “mensagem”. É a confissão de uma sociedade virada do avesso, que compensa o criminoso e pune a vítima. É uma sociedade do desarincanço, da total falta de valores, de um hedonismo mórbido, de uma ausência de cultura evidente. Vive-se ao nível animalesco mais primário. Sexo já nem sequer é prazer, é mera funcionalidade, droga é entorpecimento até à idiotia, dinheiro é a suprema glorificação da carreira. As orgias relembram Roma, esquecendo-se que a seguir viria a “Queda do Império Romano”.
Martin Scorcese imprime ao seu filme o ritmo de um circo romano, com uma ironia que roça o sarcasmo, e um realismo que só muito a custo poderemos julgar caricatural. Esta é a realidade concentrada em três horas infernais que custam a digerir, é verdade. De resto, a montagem é vulcânica, as interpretações brilhantes (Leonardo Di Caprio é excelente, mas não só ele), a fotografa e a sonoplastia notáveis, e “O Lobo de Wall Street” é um must que sobretudo não deve ser ignorado. Nem sempre quem nos traz más notícias é nosso inimigo. Pode bem ser o único amigo que nos resta e aquele que nos apela ao bom senso e à racionalidade.


O LOBO DE WALL STREET
Título original: The Wolf of Wall Street

Realização: Martin Scorsese (EUA, 2013); Argumento: Terence Winter, segundo obra de Jordan Belfort; Produção: Riza Aziz, Richard Baratta, Leonardo DiCaprio, Danny Dimbort, Georgia Kacandes, Joey McFarland, Alexandra Milchan, Martin Scorsese, Adam Somner, Emma Tillinger Koskoff, Irwin Winkler, Rick Yorn; Fotografia (cor): Rodrigo Prieto; Montagem: Thelma Schoonmaker; Casting: Ellen Lewis; Design de produção: Bob Shaw; Direcção artística: Chris Shriver; Decoração:  Ellen Christiansen; Guarda-roupa:  Sandy Powell; Maquilhagem: Mindy Hall, Michael Marino, Mary Anne Spano, Joseph Whitmeyer; Direcção de Produção:  Richard Baratta, Kelley Cribben, Adrian Harrison, Georgia Kacandes, Francesco Marras; Assistentes de realização: Adam Somner, Scott Bowers, David Fischer, Don H. Julien, Robert Legato, Francisco Ortiz; Departamento de arte: Philip Canfield, David Meyer, Alyssa Motschwiller, Raymond M. Samitz, Sha-Sha Shiau; Som: Frank Graziadei, Heather Gross, James J. Sabat Jr., James Sabat, Philip Stockton; Efeitos especiais: Drew Jiritano, R. Bruce Steinheimer; Efeitos visuais: Joe DeWalt Brown, Bruce Hwang Chen, Justin Ferk, Jason Kolowski, Robert Legato, Ben Record, Mark Russell, Dan Seddon, Lisa Spenc;  Agradecimentos: Luc Besson, Rick Hohmann, James P. Schramm; Filme dedicado a Roger Ebert; Companhias de produção: Red Granite Pictures, Sikelia Productions, Appian Way, EMJAG Productions, TWOWS; Intérpretes:  Leonardo DiCaprio (Jordan Belfort), Jonah Hill (Donnie Azoff), Margot Robbie (Naomi Lapaglia), Matthew McConaughey (Mark Hanna), Kyle Chandler (Agente Patrick Denham), Rob Reiner (Max Belfort), Jon Bernthal (Brad), Jon Favreau (Manny Riskin), Jean Dujardin (Jean Jacques Saurel), Joanna Lumley (Tia Emma), Cristin Milio (Teresa Petrillo), Christine Ebersole (Leah Belfort), Shea Whigham, Katarina Cas, P.J. Byrne, Kenneth Choi, Brian Sacca, Henry Zebrowski, Ethan Suplee, Barry Rothbart, Jake Hoffman, Mackenzie Meehan, Bo Dietl, Jon Spinogatti, Aya Cash, Rizwan Manji, Stephanie Kurtzuba, J.C. MacKenzie, Ashlie Atkinson, Thomas Middleditch, Stephen Kunken, Edward Herrmann, Jordan Belfort, Ted Griffin, Fran Lebowitz, Robert Clohessy, Natasha Newman Thomas, Sandra Nelson, etc. Duração: 180 minutos; Distribuição em Portugal: Zon Lusomundo; Classificação etária: M/ 16 anos; Data de estreia em Portugal: 9 de Janeiro de 2014.