terça-feira, fevereiro 24, 2009

BRINCADEIRAS DE CARNAVAL, III

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Recebido por mail, com a indicação expressa de "passar aos amigos" e difundir. Permite uma pequena ideia da noção de cidadania à portuguesa. Destinado sobretudo a quem "cometer infrações graves ou muito graves"

BRNCADEIRAS DE CARNAVAL, II

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Assim se "brincava ao carnaval", em Portugal, sob "frondosasvegetações", corria o ano de 1953. Uns oito ou dez anos depois, fui preso e conduzido a uma esquadra da polícia, nos Restauradores, em Lisboa, não por causa de "aquilo", mas por acender um isqueiro (era necessário uma licença de uso de isqueiro".
Nota: alguém me explica a diferença entre "mão naquilo" e "aquilo na mão"?

BRINCADEIRAS DE CARNAVAL, I

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Braga
PSP apreende livros por considerar
pornográfica capa com quadro de Courbet
23.02.2009 - Lusa

A PSP de Braga apreendeu hoje numa feira de livros de saldo alguns exemplares de um livro sobre pintura. A polícia considerou que o quadro do pintor Gustave Courbet, reproduzido nas capas dos exemplares, era pornográfico, adiantou uma fonte da empresa livreira.António Lopes disse que os três agentes policiais elaboraram um auto no qual afirmam terem apreendido os livros por terem imagens pornográficas expostas publicamente. O quadro do pintor oitocentista - tido como fundador do realismo em pintura - expõe as coxas e o sexo de uma mulher, sendo, por isso, a sua obra mais conhecida. Pintado em 1866, está exposto no Museu D'Orsay em Paris. António Lopes manifestou-se "indignado" com a atitude da PSP: "isto é uma vergonha, um atentado à liberdade", afirmou. O empresário é um dos sócios da distribuidora 'Inovação à Leitura', de Braga, organizadora da Feira do Livro em Saldo e Últimas Edições, que está a decorrer, até ao dia 8 de Março, na Praça da República - vulgo Arcada - no centro de Braga. Segundo os especialistas, Gustave Courbet era já um pintor "conhecido em França pela sua destreza técnica mas sobretudo pela sua atitude crítica e corrosiva em relação à sociedade burguesa, que não perdia ocasião de afrontar". Courbet, um socialista convicto, ao representar frontalmente as coxas e o sexo de uma mulher, com o quadro "A Origem do Mundo" abalou profundamente o meio artístico, tendo a sua exposição pública sido proibida na época.
Como gosto muito do referido quadro e até já o tinha postado neste blogue, há uns tempos atrás, aqui o volto a reproduzir com a devida vénia, e na esperança que a ignorância bracarense não se estenda até à net. Braga, cidade que Luís Pacheco tão bem imortalizou no seu "O Libertino Passeia por Braga, A Idolátrica, O Seu Esplendor", continua a dividir-se entre o puritanismo ostensivo e a libertinagem escondida. E, todavia, o génio de Courbet bem nos avisa que é dali que todos saímos, dessa esplendorosa "origem do mundo".

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

OSCARS 2009

Os vencedores

Primeira conclusão: o que corre na internet é quase sempre boato - não havia carta nenhuma a revelar antecipadamente os vencedores. Tudo uma treta. Esta divertida, ao lado de centenas de outras que enxovalham pessoas e instituições e procuram por todos os meios mostrar que este mundo é uma miséria moral. Não é tanto assim. Só é miséria moral, em grande parte, por causa desses difusores de mentiras e de embustes.
Segunda conclusão/span> nem sempre o que parece certo, está seguro. Havia Oscars já atribuídos que foram parar a outras mãos.

Terceira conclusão: a cerimónia deste ano foi excelente, em ritmo, invenção, espectáculo, dignidade. A América e Hollywood estão de parabéns.

Quarta conclusão: o cinema é arte e espectáculo e muitos críticos portugueses não sabem o que dizem quando afirmam certos disparates monumentais. Mas eles estão obviamente "certos", e o resto do mundo "errado". O "orgulhosamente sós" de Salazar continua a ter inteira propriedade. País de "cérebros iluminados", que poucos lêem e que fazem com que a crítica e o público estejam quase divorciados.

Quinta conclusão: na lista de previsões aqui apresentada, segundo o que se pensava serem os critérios da Academia, houve algumas surpresas. A maioria delas dando-me algum prazer pessoal: os Oscars para Penelope Cruz e Sean Penn fora duas grandes interpretações justamente consagradas (lamento por Mickey Rourke, cujo filme ainda não vi, mas que não terá tão cedo outra tão boa oportunidade).
Sexta conclusão: "Que quer ser Bilionário?" não é o melhor filme do ano, nem é sequer o melhor entre os nomeados, mas é um bom filme. Muito longe da "pornografia miserabilista" que alguns lhe chamam. Muito longe do retrato viciado da Índia que (alguns) indianos insistem em ver nele.

Best Picture (Filme)
The Curious Case of Benjamin Button
Frost/Nixon
Milk
The Reader
Slumdog Millionaire

Best Director (Realizador)
Danny Boyle - 'Slumdog Millionaire'
Stephen Daldry - 'The Reader'
David Fincher - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Ron Howard - 'Frost/Nixon'
Gus Van Sant - 'Milk'

Best Actor (Actor)
Richard Jenkins - 'The Visitor'
Frank Langella - 'Frost/Nixon'
Sean Penn - 'Milk'
Brad Pitt - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Mickey Rourke - 'The Wrestler'

Best Actress (Actriz)
Anne Hathaway - 'Rachel Getting Married'
Angelina Jolie - 'Changeling'
Melissa Leo - 'Frozen River'
Meryl Streep - 'Doubt'
Kate Winslet - 'The Reader'

Best Supporting Actor (Actor secundário)
Josh Brolin - 'Milk'
Robert Downey Jr. - 'Tropic Thunder'
Philip Seymour Hoffman - 'Doubt'
Heath Ledger - 'The Dark Knight'
Michael Shannon - ' Revolutionary Road'

Best Supporting Actress (Actriz secundária)
Amy Adams – ‘Doubt’
Penélope Cruz – ‘Vicky Cristina Barcelona’
Viola Davis – ‘Doubt’
Marisa Tomei – ‘The Wrestler’
Taraji P. Henson – ‘The Curious Case of Benjamin Button’


Best Animated Feature Film (Animação)
Bolt
Kung Fu Panda

Wall-E

Best Foreign Film (Filme em língua não inglesa)
'The Baader Meinhof Complex' (Germany)
'The Class' (France)
'Departures'(Japan)
'Revanche' (Austria)
'Waltz With Bashir' (Israel)

Best Original Screenplay (Argumento original)
Dustin Lance Black - 'Milk'
Courtney Hunt - 'Frozen River'
Mike Leigh - 'Happy-Go-Lucky'

Martin McDonagh - 'In Bruges'
Andrew Stanton, Jim Reardon, Pete Docter - 'WALL-E'

Best Adapted Screenplay (Argumento adaptado)
Eric Roth, Robin Swicord - 'The Curious Case of Benjamin Button'
John Patrick Shanley - 'Doubt'
Peter Morgan - 'Frost/Nixon'
David Hare - 'The Reader'

Simon Beaufoy - 'Slumdog Millionaire'

Best Original Score (Paritura musical)
The Curious Case of Benjamin Button
Defiance'
Milk

Slumdog Millionaire
WALL-E

Best Original Song (Canção)
‘Down to Earth - ' WALL-E
‘Jai Ho' - ‘Slumdog Millionaire'
‘O Saya' - ‘Slumdog Millionaire'

Best Film Editing (Montagem)
Kirk Baxter, Angus Wall - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Lee Smith - 'The Dark Knight'
Mike Hill, Dan Hanley - 'Frost/Nixon'
Elliot Graham - 'Milk'

Chris Dickens, 'Slumdog Millionaire'

Best Cinematography (Fotografia)
Tom Stern - 'Changeling'
Claudio Miranda - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Wally Pfister - 'The Dark Knight'
Chris Menges, Roger Deakins - 'The Reader'
Anthony Dod Mantle – ‘Slumdog Millionaire'

Best Costume Design (Guarda-Roupa)
Catherine Martin - 'Australia'
Jacqueline West - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Michael O'Connor - 'The Duchess'
Danny Glicker - 'Milk'
Albert Wolsky - 'Revolutionary Road'


Best Sound Mixing (Som)
David Parker, Michael Semanick, Ren Klyce, Mark Weingarten - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Lora Hirschberg, Gary Rizzo, Ed Novick - 'The Dark Knight'
Ian Tapp, Richard Pryke, Resul Pookutty - 'Slumdog Millionaire'
Tom Myers, Michael Semanick, Ben Burtt - 'WALL-E'
Chris Jenkins, Frank A. Montaño, Petr Forejt - 'Wanted'

Best Sound Editing (Edição de Som)
Richard King - 'The Dark Knight'
Frank Eulner, Christopher Boye - ‘Iron Man'
Tom Sayers - ‘Slumdog Millionaire'
Ben Burtt, Matthew Wood - 'WALL-E'
Wylie Stateman - 'Wanted'


Best Makeup (Caracterização)
Greg Cannom - 'The Curious Case of Benjamin Button'
John Caglione, Jr., Conor O'Sullivan - 'The Dark Knight'
Mike Elizalde, Thom Flout - 'Hellboy II: The Golden Army'


Best Art Direction (Direcção artística)
James J. Murakami, Gary Fettis - 'Changeling'
Donald Graham Burt, Victor J. Zolfo - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Nathan Crowley, Peter Lando - 'The Dark Knight'
Michael Carlin, Rebecca Alleway - 'The Duchess'
Kristi Zea, Debra Schutt - 'Revolutionary Road'


Best Special Efects (Efeitos Especiais)
Eric Barba, Steve Preeg, Burt Dalton, Craig Barron - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Nick Davis, Chris Corbould, Tim Webber, Paul Franklin - ‘The Dark Knight'
John Nelson, Ben Snow, Dan Sudick, Shane Mahan - ‘Iron Man'

(a verde, as nossas previsões confirmadas; a dourado, os Oscars que diferiram).

sexta-feira, fevereiro 20, 2009

OS OSCARS, EM PRIMEIRA MÃO

JÁ SE SABEM OS RESULTADOS?

No blogue da minha amiga Vanessa, "Quando Tudo Arde", surge esta carta com a pergunta "Será?" Será que será verdade? Que o segredo mais bem guardado veio parar a mãos portuguesas? Que a carta e os resultados nela anunciados têm alguma lógica, não deixa de ser verdade. Se for aldrabice, é bem feita, por especialistas.
(para ler melhor a carta, aceder ao blogue "Quando Tudo Arde")

OSCARS 2009


Antecipando vencedores
Há dois tipos de previsões para o que vai acontecer na Cerimónia dos Oscars. Uma, é escolher, entre os nomeados, o nosso eleito. Outra é prever o que a Academia vai premiar.
Hoje vamos tentar fazer futurologia quanto à intenção de voto da Academia, deixando de lados certas categorias que, por total desconhecimento dos nomeados, não nos poderemos pronunciar.
Aqui vai o que pensamos serem os Oscars de 2009 (repete-se: não são os nossos preferidos, mas aqueles que julgamos vir a serem preferidos pela Academia).

Best Picture (Filme)
The Curious Case of Benjamin Button
Frost/Nixon
Milk
The Reader
Slumdog Millionaire

Best Director (Realizador)
Danny Boyle - 'Slumdog Millionaire'
Stephen Daldry - 'The Reader'
David Fincher - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Ron Howard - 'Frost/Nixon'
Gus Van Sant - 'Milk'

Best Actor (Actor)
Richard Jenkins - 'The Visitor'
Frank Langella - 'Frost/Nixon'
Sean Penn - 'Milk'
Brad Pitt - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Mickey Rourke - 'The Wrestler'

Best Actress (Actriz)
Anne Hathaway - 'Rachel Getting Married'
Angelina Jolie - 'Changeling'
Melissa Leo - 'Frozen River'
Meryl Streep - 'Doubt'
Kate Winslet - 'The Reader'

Best Supporting Actor (Actor secundário)
Josh Brolin - 'Milk'
Robert Downey Jr. - 'Tropic Thunder'
Philip Seymour Hoffman - 'Doubt'
Heath Ledger - 'The Dark Knight'
Michael Shannon - ' Revolutionary Road'

Best Supporting Actress (Actriz secundária)
Amy Adams – ‘Doubt’
Penélope Cruz – ‘Vicky Cristina Barcelona’
Viola Davis – ‘Doubt’
Marisa Tomei – ‘The Wrestler’
Taraji P. Henson – ‘The Curious Case of Benjamin Button’


Best Animated Feature Film (Animação)
Bolt
Kung Fu Panda

Wall-E

Best Foreign Film (Filme em língua não inglesa)
'The Baader Meinhof Complex' (Germany)
'The Class' (France)
'Departures'(Japan)
'Revanche' (Austria)
'Waltz With Bashir' (Israel)

Best Original Screenplay (Argumento original)
Dustin Lance Black - 'Milk'
Courtney Hunt - 'Frozen River'
Mike Leigh - 'Happy-Go-Lucky'

Martin McDonagh - 'In Bruges'
Andrew Stanton, Jim Reardon, Pete Docter - 'WALL-E'

Best Adapted Screenplay (Argumento adaptado)
Eric Roth, Robin Swicord - 'The Curious Case of Benjamin Button'
John Patrick Shanley - 'Doubt'
Peter Morgan - 'Frost/Nixon'
David Hare - 'The Reader'

Simon Beaufoy - 'Slumdog Millionaire'

Best Original Score (Paritura musical)
The Curious Case of Benjamin Button
Defiance'
Milk

Slumdog Millionaire
WALL-E

Best Original Song (Canção)
‘Down to Earth - ' WALL-E
‘Jai Ho' - ‘Slumdog Millionaire'
‘O Saya' - ‘Slumdog Millionaire'

Best Film Editing (Montagem)
Kirk Baxter, Angus Wall - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Lee Smith - 'The Dark Knight'
Mike Hill, Dan Hanley - 'Frost/Nixon'
Elliot Graham - 'Milk'

Chris Dickens, 'Slumdog Millionaire'

Best Cinematography (Fotografia)
Tom Stern - 'Changeling'
Claudio Miranda - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Wally Pfister - 'The Dark Knight'
Chris Menges, Roger Deakins - 'The Reader'
Anthony Dod Mantle – ‘Slumdog Millionaire'

Best Costume Design (Guarda-Roupa)
Catherine Martin - 'Australia'
Jacqueline West - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Michael O'Connor - 'The Duchess'
Danny Glicker - 'Milk'
Albert Wolsky - 'Revolutionary Road'


Best Sound Mixing (Som)
David Parker, Michael Semanick, Ren Klyce, Mark Weingarten - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Lora Hirschberg, Gary Rizzo, Ed Novick - 'The Dark Knight'
Ian Tapp, Richard Pryke, Resul Pookutty - 'Slumdog Millionaire'
Tom Myers, Michael Semanick, Ben Burtt - 'WALL-E'
Chris Jenkins, Frank A. Montaño, Petr Forejt - 'Wanted'

Best Sound Editing (Edição de Som)
Richard King - 'The Dark Knight'
Frank Eulner, Christopher Boye - ‘Iron Man'
Tom Sayers - ‘Slumdog Millionaire'
Ben Burtt, Matthew Wood - 'WALL-E'
Wylie Stateman - 'Wanted'


Best Makeup (Caracterização)
Greg Cannom - 'The Curious Case of Benjamin Button'
John Caglione, Jr., Conor O'Sullivan - 'The Dark Knight'
Mike Elizalde, Thom Flout - 'Hellboy II: The Golden Army'


Best Art Direction (Direcção artística)
James J. Murakami, Gary Fettis - 'Changeling'
Donald Graham Burt, Victor J. Zolfo - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Nathan Crowley, Peter Lando - 'The Dark Knight'
Michael Carlin, Rebecca Alleway - 'The Duchess'
Kristi Zea, Debra Schutt - 'Revolutionary Road'


Best Special Efects (Efeitos Especiais)
Eric Barba, Steve Preeg, Burt Dalton, Craig Barron - 'The Curious Case of Benjamin Button'
Nick Davis, Chris Corbould, Tim Webber, Paul Franklin - ‘The Dark Knight'
John Nelson, Ben Snow, Dan Sudick, Shane Mahan - ‘Iron Man'

(a verde os nossos vencedores).

VAVADIANDO COM JOSÉ MANUEL ANES

Esoterismo, Maçonaria e Fernando Pessoa
Uma sala cheia para ouvir falar José Manuel Anes

quarta-feira, fevereiro 18, 2009

OSCARS 2009. NOMEAÇÕES

PREPARANDO A NOITE DOS OSCARS
Recordando os nomeados
fonte: Site oficial dos Oscars

terça-feira, fevereiro 17, 2009

CINEMA: REVOLUTIONARY ROAD

REVOLUTIONARY ROAD
América, meados dos anos 50: numa festa de jovens, um homem e uma mulher olham-se, aproximam-se, falam, confessam sonhos. Paris, onde ele já esteve mobilizado, durante a II Guerra Mundial. Os anos passam, casaram, são os Wheelers, Frank (Leonardo DiCaprio) e April (Kate Winslet), vivem numa agradável casa nos subúrbios de Connecticut, dois filhos, ele empregado num escritório de uma grande empresa, ela dona de casa com aspirações a actriz que falham rotundamente na noite de estreia do grupo teatral local. A simpática senhora que lhes vendeu a casa (Kathy Bates), em Revolutionary Road, acha-os “especiais”, eles também se acham, mas começam a sentir a terra a fugir-lhes debaixo dos pés. Os sonhos vão ficando para trás, as promessas de felicidade restringem-se ao mínimo. A vida dos subúrbios asfixia-os, lentamente. O sonho de Paris regressa. Vender a casa, largar o emprego, pegar nos miúdos, viajar até à Europa (como os sonhos se cruzam: na Europa, por essa altura, alimenta-se o sonho de viajar até à América, “a terra das possibilidades para todos”). Ela promete que trabalha como secretária da OTAN, ele pode cumprir o destino que traçara para si, e que não sabe muito bem qual é, mas não é de certeza estar fechado o dia todo num escritório “open space”, com jaulas envidraçadas onde se multiplicam as vendas de electrodomésticos. Por isso se impõe o sonho de partir, a miragem da aventura, de viver perigosamente (na frente da batalha, Frank confessa que sentiu medo, mas acrescenta que foi nesse momento que soube o que era a vida e April olha-o fascinada, apaixonada). Frank recorda o pai e os “sábios” conselhos que este lhe dava e lembra como o detestava nesse seu sentir sem horizontes. Nunca seria como o pai a servir fielmente durante 20 anos a mesma empresa, jura.
Mas o homem sonha, e a obra quase nunca nasce. A vida, a vidinha de todos os dias, as promoções no emprego, os filhos, a comodidade do adquirido, os preconceitos do ambiente mesquinho destas aldeias em jeito de cidades satélites, muito convencionais, muito patéticas na sua arrumação (cidades que Tim Burton tão bem caricatura, nalguns dos seus filmes, cidades que Sam Mendes tão subtil e violentamente escalpelizara já em “Beleza Americana”), vão minando a resistência de uns e o equilíbrio emocional de outros. As frustrações instalam-se. A neurose progride. Até à loucura, como no caso do matemático, que os choques eléctricos, no hospital psiquiátrico, já limitaram a meras recordações. Ele faz seus os sonhos dos Wheelers, ele é o único que os compreende plenamente, será portanto o que menos compreende a sua renúncia. Ele que está preso, anseia voar. Os Wheelers que podiam voar e já tinham os bilhetes na mão, recusam o sonho. Não ela, April, mas sobretudo Frank. Porque há a possibilidade da promoção, e a promessa de um novo lugar, a anunciada chegada de outro filho, a vida de todos os dias que às vezes é madrasta para os sonhos. De quem os pressente, porque há muitos que vivem (ou parecem viver) felizes com o que têm. Tomem-se como exemplo alguns colegas de escritório de Frank, e alguns vizinhos, onde, todavia, há sempre dramas, o filho no psiquiatra, ou o desejo refreado do vizinho do lado, que explode uma noite, no interior de um carro, para continuar domesticado e bem comportado, no seu lar, deixando, no entanto, os olhos vaguear dolorosamente pelo horizonte. Que não existe.
Este é um retrato magoado e confrangedor de uma América que abafa a felicidade em casinhas modelares e electrodomésticos? Claro que é. Estes bairros higienizados de subúrbios só existem assim nos EUA, e tanto Richard Yates no seu magnífico romance, tanto Sam Mendes no seu belíssimo filme, falam essencialmente da América. Mas, este é um problema próprio da condição humana, mais do que de um só país. É próprio do homem desejar o que não tem. Procurar sempre mais. Há os que se adaptam, há os que sofrem a cada revés, há os que se acomodam e os que explodem, há os raros que partem para Paris, e lá chegados descobrem que afinal a vida está além, porque a vida está sempre além para os insatisfeitos. E não se trata sequer de uma questão de classe social.
Ao ver a progressiva erosão dos sentimentos nesta família de bairro dos arredores, veio-me à lembrança uma genial sequência de Orson Welles, em “Citizen Kane”, vários pequenos-almoços ao longo de anos, ligados por “travellings” laterais que vão, de movimento em movimento, mostrando o gradual afastamento, a distância, o alheamento total de um casal, ele um dos homens mais ricos e poderosos dos EUA, ela a sobrinha do Presidente. O desgaste é algo que ataca os sentimentos como a ferrugem os metais. E fica sempre a sensação de que tudo poderia ter sido de outra maneira, que o presente e o futuro poderiam ter sido diferentes, que houve sempre o erro original da deficiente avaliação das causas e o fracasso assumido, ou não, das consequências não calculadas. Por isso, entre os americanos das cidades satélites, ou ingleses, os franceses, os portugueses, os chineses ou os brasileiros, os problemas são os mesmos, ainda que os cenários variem.
E depois há ainda os que não conseguem “perceber” sequer os problemas que estes romances e estes filmes abordam, e que são esses deserdados da terra, para quem o sonho é ter comida para os filhos e para si todos os dias, ter água corrente e luz eléctrica, ou mais grave ainda não estarem sujeitos a torturas diárias numa qualquer prisão miserável, ou não assistirem diariamente ao massacre de milhares de inocentes. Sem se compreender por quê.
É, todavia, a insatisfação constante e o sonho do impossível que faz mover o Homem, por muito diferentes (por vezes contraditórios) que sejam esses sonhos. Um exemplo de colheita pessoal: em 1974, em Portugal, nos muros das ruas e nos quartos dos jovens, estavam afixados cartazes de Marx, Lenine e Che Guevara. Numa viagem que fiz à Hungria, nas paredes das ruas, nada se via, a não ser propaganda estatal, e nas camaratas dos estudantes, cartazes da Coca-Cola e de Jeans. De cada lado do muro, os sonhos eram não só diferentes, como antagónicos. Cada um sonhava com o que não tinha, e quando passaram a ter, nenhum dos lados ficou feliz. Muito pelo contrário. Cada homem e mulher, quando sonha, se sonha, sonha com um Paris diferente.
Leonardo DiCaprio e Kate Winslet, que já se tinham encontrado a bordo de “Titanic”, voltam a reunir-se numa nova aventura sentimental num cenário onde tudo se afunda à sua volta. Julgo que ambos são absolutamente notáveis, mais ela, que aqui tem uma interpretação perfeita, controlada, rigorosa, interiorizada. A forma como “sente” a solidão do tigre enjaulado, e a transmite de forma tão contida nos processos, e tão profunda nos resultados é simplesmente brilhante. Muito acima do seu trabalho em “O Leitor”, onde tudo é mais estereotipado.
Depois há um conjunto de secundários notáveis, desde logo Michael Shannon, é certo, na composição de John Givings, o revoltado matemático que é, na sua loucura, um dos mais lúcidos arautos do inconformismo, mas também todos os outros companheiros de cárcere dourado. Kathy Bates é brilhante, na figura dessa mulher que aluga sonhos de apartamentos “muito especiais”, para casais “muito especiais”, que rapidamente o deixam de ser. Mas o marido dela é igualmente notável, tão notável que o filme dá-lhe a honra de terminar sobre ele, desligando o aparelho auditivo, para mais facilmente suportar o ruído que o rodeia. Há ainda o casal vizinho, a mulher que se aconchega na vida como no sofá da sala, e o marido, que concretizou o sonho de uma vida nuns minutos de felicidade sexual num banco de carro, para voltar depois ao cinzentismo de sempre (diga-se que as cenas dele com April, a dançarem num bar e a fazerem amor no carro, são das imagens mais violentamente eróticas do cinema nos últimos anos). Saliente-se ainda a jovem secretária, que é desviada uma tarde para uma tórrida cama onde transpirou o seu sonho de sexo e amor impossível. Tudo fragilidades da condição humana, que a tornam tão fugazmente feliz e tão intensamente desditosa.
A fotografia é deslumbrante na forma como descreve ambientes e os filtra em solidões deserdadas, a direcção artística brilhante a restituir os anos 50, e a partitura musical (por vezes um pouco excessiva, na sua omnipresença) igualmente muito inspirada. Um grande filme, ternamente emocionado sobre a vacuidade da vida, sobre a tortura dos sonhos, sobre a fatalidade de existir, numa constante busca de amor e felicidade. Própria do Homem.

REVOLUTIONARY ROAD
Título original: Revolutionary Road
Realização: Sam Mendes (EUA, Inglaterra, 2008); Argumento: Justin Haythe, segundo romance de Richard Yates; Produção: Gina Amoroso, Bobby Cohen, Henry Fernaine, Karen Gehres, Pippa Harris, John Hart, Peter Kalmbach, Sam Mendes, Marion Rosenberg, Scott Rudin, David M. Thompson, Nina Wolarsky; Música: Thomas Newman; Fotografia (cor): Roger Deakins; Montagem: Tariq Anwar; Casting: Ellen Lewis, Debra Zane; Design de produção: Kristi Zea; Direcção artística: Teresa Carriker-Thayer, John Kasarda, Nicholas Lundy; Decoração: Debra Schutt; Guarda-roupa: Albert Wolsky; Maquilhagem: Alan D'Angerio, Linda Melazzo; Direcção de Produção: Meryl Emmerton, Jennifer Lane; Assistentes de realização: Amy Lauritsen, Joseph P. Reidy, John Silvestri, Christian Vendetti; Departamento de arte: Derrick Kardos, Tina Khayat, Erik Knight; Som: Jacob Ribicoff, Warren Shaw; Efeitos especiais: John Stifanich; Efeitos visuais: Randall Balsmeyer, J. John Corbett, Adrienne Winterhalter; Companhias de produção: DreamWorks SKG, BBC Films, Evamere Entertainment, Neal Street Productions, Goldcrest Pictures, Scott Rudin Productions; Intérpretes: Leonardo DiCaprio (Frank Wheeler), Kate Winslet (April Wheeler), Michael Shannon (John Givings), Ryan Simpkins (Jennifer Wheeler), Ty Simpkins (Michael Wheeler), Kathy Bates (Mrs. Helen Givings), Richard Easton (Mr. Howard Givings), Sam Rosen, Maria Rusolo, Gena Oppenheim, Kathryn Dunn, Joe Komara, Allison Twyford, David Harbour (Shep Campbell), John Ottavino, Adam Mucci, Jo Twiss, Frank Girardeau, Catherine Curtin, Jonathan Roumie, Samantha Soule, Heidi Armbruster, Kathryn Hahn (Milly Campbell), Zoe Kazan (Maureen Grube), Dan Da Silva, Dylan Baker (Jack Ordway), Keith Reddin (Ted Bandy), Neal Bledsoe, Marin Ireland, Max Casella, Max Baker (Vince Lathrop), Jon Sampson, Peter Barton, Kevin Barton, Evan Covey, Dylan Clark Marshall, Jay O. Sanders (Bart Pollack), Christopher Fitzgerald, Chandler Vinton, Kelsey Robinson, Duffy Jackson, Dan Zanes, Vince Giordano, Jon-Erik Kellso, Andrew Burton, Will Sanderson, Alex Hoffman, Kristen Connolly (Mrs. Brace), John Behlmann (Mr. Brace), David Campbell, Michael Ciesla, Mary DeBellis, Jay Ferraro, Zoe Hartman, Cristina Marie, Chris Miskiewicz, Jared Morrison, Joel Ney, Ted Yudain, Jonathan Yvon, etc. Duração: 119 minutos; Distribuição em Portugal: Lusomundo; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 29 de Janeiro de 2009.
Nota: Sobre este filme será interessante ler "Os críticos que odeiam cinema", no blogue "Delito de Opinião". Leia Aqui.

segunda-feira, fevereiro 16, 2009

FAMAFEST 2009 - HOMENAGENS


HOMENAGENS DO FAMAFEST 2009

Dia 14:
LAURA SOVERAL
MÁRO CLAUDIO
SUSANA BORGES
Dia 16:
LUIS MIGUEL CINTRA
URBANO TAVARES RODRIGUES

sábado, fevereiro 14, 2009

POPULARIDADE NA WEB


LA LISTA WIP
Mão amiga fez-me chegar resultados de um curioso site espanhol, que mede a popularidade na web (número de referências) de nomes, entre outras categorias, ligados ao cinema.
O site chama-se La Lista WIP (Wep Important People), pode consultar-se a nível mundial, a nível nacional, a nível de categorias (cine, por exemplo).
Os resultados são interessantes. Veja-se a posição (e demais elementos), retirados hoje, dia 14 de Fevereiro de 2009:

Lista de los personajes más citados en Internet: Portugal - Cine
Posición Nombre - Cargo (Nacionalidad) N° referencias Dif. ayer*
1 Joaquim de Almeida 230.717 - 1% Actor (Portugal) >
2 Maria de Medeiros 216.550 -2% Actriz (Portugal) >
3 Christopher Hampton 164.050 -2% Director de Cine (Portugal) >
4 Pedro Costa 106.755 -4% Director de Cine (Portugal) >
5 Lauro António 88.359 -2% Director de Cine (Portugal) >
6 Nuno Lopes 75.532 -2% Actor (Portugal) >
7 Paulo Pires 74.648 - 4% Actor (Portugal) >
8 João Monteiro 66.809 - 0% Director de Cine (Portugal) >
9 Alexandra Lencastre 56.885 -2% Actriz (Portugal) >
10 Isabel de Castro 43.804 -2% Actriz (Portugal) >
11 João Botelho 43.129 - 0% Director de Cine (Portugal) >
12 Rui de Carvalho 35.541 -2% Actor (Portugal) >
13 Liliana Santos 29.969 -2% Actriz (Portugal) >
14 Joaquim Leitão 28.747 -4% Director de Cine (Portugal) >
15 Eduardo Guedes 27.657 -2% Director de Cine (Portugal) >

Nombre completo: Lauro António - Portugal - 66 años - Director de Cine
Biografía en Wikipedia
12778 Posición TopWip Mundial
47 TopWip Portugal
104.327 - Referencias en la web

Posición en TopWip
A nivel Mundial
Hombre 10185
Cine 4862
Director de Cine 767
A nivel de Portugal
Hombre 46
Cine 5
Director de Cine 3
Origen/nacimiento
Lugar nacim.
Lisboa (10)
Lisboa e Vale do Tejo (12)
Portugal (47)
Día / Año • 18 agosto (30) 1942 • (171) Horóscopo • Leo (807)
(os resultados diários podem ver-se no quadro inscrito neste blogue, na coluna da esquerda)

SAINT VALENTINE'S DAY?

DIA DOS NAMORADOS?
Não há dia dos namorados. Há namorados com dias.
Aqui ficam alguns exemplos de "dias de namorados" sem dias marcados.
E viva o amor sem horário fixo!

As meninas e senhoras que descobrirem o nome dos quatro filmes, ganham um beijo no dia dos namorados. (este concurso é puramente virtual. inflizmente.) Os senhores um abraço de parabéns!

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

CINEMA: O LEITOR


O LEITOR
"The Reader", de Stephen Daldry (que nos dera anteriormente dois filmes bastante interessantes, “Billy Elliot” e “As Horas”), parte de um excelente romance de Bernhard Schlink, de grande sucesso na Alemanha e no mundo (mais de quarenta traduções) que aborda, de forma um tanto invulgar, o traumatismo provocado nas gerações seguintes pela ascensão de Hitler e do III Reich e a tragédia do Holocausto.
Uma história amorosa está no cerne desta análise com muito de simbólica ou metafórica. História que se recria em três tempos: em 1958, Michael (David Kross), um jovem estudante de 15 anos, inicia uma relação sexual e depois também amorosa, com (Kate Winslet), uma cobradora de bilhetes de eléctricos. A ligação é explosiva, arrebatada. Tem de surpreendente um facto: Hanna, antes ou depois das relações sexuais, pede a Michael para este lhe ler livros, os livros que anda a estudar ou a ler.
Alguns anos depois, o mesmo Michael, agora estudante de Direito, assiste ao julgamento de umas quantas alemãs acusadas de serem responsáveis por mortes sistemáticas de mulheres judias em campos de concentração, nomeadamente durante um incêndio numa igreja depois de um bombardeamento. Elas controlavam o grupo como elementos das SS. Foram denunciadas pela publicação de um livro, escrito por uma das raras sobreviventes. Uma dessas alemãs acusadas é Hanna, que, não querendo confessar que é analfabeta, prefere assumir a mais pesada pena como autora de um ofício altamente comprometedor. Michael poderia intervir, mas não o faz. Por respeito para com a vontade de Hanna? Por vergonha de confessar a sua relação clandestina com aquela mulher? Ou seria pelo “embotamento” (como se lhe refere Bernhard Schlink) em que se encontravam os herdeiros desse pesadelo?
Hanna cumpre, pois, pena de muitos anos, durante os quais vai aprendendo a ler sozinha, ouvindo as cassetes que Michael lhe envia de livros que lê e grava para ela. Quando se reencontram, tempos depois, Michael pergunta-lhe: “Tens pensado muito no teu passado?”, ao que Hanna responde, primeiro com uma pergunta (“No nosso tempo?”), depois com uma conclusão (“Não importa o que penso, não importa o que sinto. Os mortos estão mortos e nada os fará regressar”).
O romance, adaptado ao cinema de forma muito fiel pelo dramaturgo inglês David Hare, procura julgar a responsabilidade pessoal nos crimes do nazismo, adiantando uma explicação para muito do que aconteceu: o comum das pessoas era pouco mais de analfabeta e, por falta de cultura e da ausência de uma consciência de si e dos outros que ela traz, não teve a percepção dos seus actos. Hanna parte do sexo puramente físico para a descoberta do amor, Hanna começa a tomar conhecimento de si e do mundo que a rodeia, primeiro ouvindo ler, depois lendo e escrevendo. Mas, como sempre, todos preferem o silêncio e o segredo.
O romance, como já o disse, é excelente. De grande densidade psicológica e filosófica (o pai de Michael é professor de filosofia e, apesar de muito “ausente”, introduz uma componente filosófica interessante, porque também ela anestesiada e cansada). O livro tem uma consistência e uma profundidade que o filme raramente atinge. Como enunciado poderia, portanto, ser muito interessante esta reflexão. No livro, toda a estrutura é particularmente robusta. O facto de ser narrado cronologicamente também ajuda. A fragmentação histórica do filme, com idas e regressos ao passado, não traz nada de novo, a não ser malabarismos gratuitos. No filme, esta desarrumação deixa muitas perplexidades em aberto. Claro que a falta de cultura desculpabiliza, mas será que o iletrado está isento de julgamento de ética de comportamento? As SS sem saber ler desconheciam a extensão do crime que cometiam? Enfim, questões que “O Leitor” coloca, entre outras, e que resolve de forma insatisfatória. Razão para que o filme não mereça a minha total adesão. A primeira.
A segunda, e mais visível, é a forma como o filme se estrutura, numa toada de melodrama lamechas que se torna para o fim insustentável. O que no romance nunca acontece, escrito com uma sobriedade e austeridade notáveis. Não está em causa o melodrama, nem o melodrama social (“A Troca” é-o de forma brilhante), está em causa este tipo de melodrama sem densidade, de rodriguinho, de estereótipo, de situações sem a grandeza humana que justificam o drama. A realização é culpada do parcial falhanço, mas a interpretação é-o igualmente. Sobretudo a personagem de Michael, desde que atinge a idade adulta (e passa a ser representado por Ralph Fiennes, aqui estranhamente insuportável).
Na verdade, o filme aguenta-se muito bem no primeiro terço, em tudo quanto toca ao encontro de Michael e Hanna, de forte conotação erótica, e à descrição da Alemanha do pós-guerra, em reconstrução dolorosa, e de que a aproximação desses seres é um reflexo, ambos carentes de companhia, herdeiros de um mundo devastado, sobretudo devastado emocionalmente naquela altura. Percebe-se o prazer que brota de duas peles que se tocam, dos suores que se trocam, das solidões que se extinguem uma na outra. Mas depois o filme torna-se aborrecido, empastelado, rodando sobre si próprio, sem destino aparente. A ida de Michael a Nova Iorque encontrar-se com uma judia, autora do livro incriminatório, para lhe entregar um legado de Hanna, é mesmo dolorosa de se acompanhar. Lena Olin é desastrosa, Ralph Fiennes atinge o auge de inexpressividade, e o frente a frente dos emplastros é digno de um museu de máscaras de cera.
Tecnicamente, “The Reader” tem bons apontamentos (nomeadamente a fotografia), mas as interpretações são muito desiguais, inclusive no próprio registo de um mesmo actor, caso de Kate Winslet, que é brilhante de início, e depois se vulgariza, com uma caracterização de velhice que não se coaduna com o nível do filme, ou do já citado Ralph Fiennes, normalmente muito bem (quem não o recorda dirigido por Cronenberg?), aqui muito frio e apagado. “Embotado”? David Kross, o jovem, esse sim é uma revelação certamente a acompanhar de futuro.
Curiosidade final: Este ano, os Golden Globes deram dois prémios a Kate Winslet, melhor actriz protagonista (em “Revolutionary Road”) e melhor actriz secundária.(em “The Reader”). Não se percebe muito bem como Kate Winslet foi nomeada e depois premiada como actriz “num papel secundário”, num filme que se passa todo em seu redor. Ela é obviamente protagonista, a menos que só levem em linha de conta os primeiros quarenta minutos do filme. Porque só durante esses minutos ela merece ser nomeada. Posto isto, “O Leitor” não é um mau filme, mas também só é um bom filme parcialmente.

O LEITOR
Título original: The Reader ou Der Vorleser
Realização: Stephen Daldry (EUA, Alemanha, 2008); Argumento: David Hare, segundo romance de Bernhard Schlink ("Der Vorleser"); Produção: Jason Blum, Donna Gigliotti, Anthony Minghella, Henning Molfenter, Redmond Morris, Arno Neubauer, Sydney Pollack, Michael Simon de Normier, Nora Skinner, Bob Weinstein, Harvey Weinstein, Charlie Woebcken; Música: Nico Muhly; Fotografia (cor): Roger Deakins, Chris Menges; Montagem: Claire Simpson; Casting: Simone Bär, Jina Jay; Design de produção: Brigitte Broch; Direcção artística: Christian M. Goldbeck, Erwin Prib; Decoração: Eva Stiebler; Guarda-roupa: Donna Maloney, Ann Roth; Maquilhagem: Ivana Primorac; Direcção de Produção: Jan Enderlein, Jennifer Lane, Aaron Levine, Jeff Maynard, Arno Neubauer; Assistentes de realização: David Blazina, Carlos Fidel, Mara Fiedler, Tarik Karam, Josh Newport, Miguel Pate, Tonja Schürmann, Richard Styles; Departamento de arte: Susann Belaval, Katja Clos, Gabriele Roß, Anu Schwartz; Som: Blake Leyh; Efeitos especiais: Michael Apling, Adolf Wojtinek; Efeitos visuais: Peter Chiang, Paulina Kuszta, Jim Rider; Companhias de produção: Mirage Enterprises, Neunte Babelsberg Film, The Weinstein Company; Intérpretes: Kate Winslet (Hanna Schmitz), Ralph Fiennes (Michael Berg), Bruno Ganz (Professor Rohl), Lena Olin (Rose Mather / Ilana Mather), Vijessna Ferkic (Sophie), Jeanette Hain (Brigitte), David Kross (Michael Berg, em jovem), Susanne Lothar (Carla Berg), Alissa Wilms (Emily Berg), Florian Bartholomäi (Thomas Berg), Friederike Becht (Angela Berg), Matthias Habich (Peter Berg), Frieder Vénus, Marie-Anne Fliegel, Hendrik Arnst, Rainer Sellien, Torsten Michaelis, Moritz Grove, Joachim Tomaschewsky, Barbara Philipp, Hans Hohlbein, Jürgen Tarrach, Kirsten Block, Vanessa Berthold, Benjamin Trinks, Fritz Roth, Hannah Herzsprung, Jacqueline Macaulay, Volker Bruch, Karoline Herfurth, Max Mauff, Ludwig Blochberger, Jonas Jägermeyr, Alexander Kasprik, Burghart Klaußner, Sylvester Groth, Fabian Busch, Margarita Broich, Marie Gruber, Lena Lessing, Merelina Kendall, Hildegard Schroedter, Alexandra Maria Lara, Martin Brambach, Michael Schenk, Ava Eusepi-Harris, Nadja Engel, Anne-Kathrin Gummich, Carmen-Maja Antoni, Petra Hartung, Linda Bassett, Beata Lehmann, Heike Hanold, Bettina Scheuritzel, Robin Gooch, Rich Odell, Sam Luca Scollin, etc. Duração: 124minutos; Distribuição em Portugal: Zon Lusomundo; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 12 de Fevereiro de 2009;

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

+ PRÉMIOS PARA OS MESMOS

BAFTA 2009
Os suspeitos do costume, com "Quem quer ser Milionário?" à cabeça, prosseguem a sua rota imparável em direcção aos Oscars. Nos BAFTA de 2009, a lógica permaneceu. Veja a lista dos "Orange British Academy Film Awards" AQUI.

terça-feira, fevereiro 10, 2009

CINEMA: MILK

MILK
“Milk”, de Gus Van Sant, é indiscutivelmente um dos grandes filmes de 2008 e um dos mais sedutores objectos de arte cinematográfica presentemente em exibição em salas de estreia de Lisboa. O motivo central desta obra é a figura de Harvey Milk, o primeiro e talvez ainda o mais conhecido activista e político gay de toda a recente história norte-americana.
Harvey Milk, que nasceu em 1930, em Long Island, Nova Iorque, filho de judeus de origem leste-europeia, era um conservador nato, antigo combatente da guerra da Coreia, empregado na tradicionalista Wall Street e que, em 1964, fez campanha pelo republicano Barry Goldwater, que foi um dos mais radicais e extremistas candidatos reaccionários a presidente dos EUA que este País conheceu. Posteriormente, porém, as posições políticas e sociais de Milk foram-se atenuando e transferindo para o campo da “contra-cultura”, sobretudo a partir do momento em que resolveu assumir as suas orientações sexuais, mudando-se de Nova Iorque para São Francisco, cidade onde a percentagem de gays era então a maior dos EUA, e onde a vida boémia e intelectual era muito mais estimulante. Abriu consultório de advogado, entrou na vida política, concorreu a vários lugares públicos, foi eleito em 1977 para o Conselho de Supervisores da Cidade de São Francisco, e, em 27 de Novembro de 1978, ele e o Presidente da Câmara, George Moscone, foram assassinados por um colega supervisor, polícia tresloucado e fanatizado. O argumento de Dustin Lance Black parte dos últimos dez anos de vida de Harvey Milk para nos restituir um panorama histórico, político e social dessa época conturbada, e nos esboçar um retrato individual que com ela se cruza.
O filme começa mesmo em tom de “actualidades”, documentando com imagens a preto e branco, do ano de 1969, os conflitos que se produziram em N.Y, durante a violenta repressão aos homossexuais, presos em bares e conduzidos às esquadras em minúsculas carrinhas, espancados e injuriados publicamente. São imagens hoje estranhas, aquelas de gays algemados, e escoltados, rostos tapados por chapéus ou jornais, escondendo o opróbrio da situação, ou furtando-se à identificação pública que poderia ter graves consequências na família, no emprego, na rua. Ser gay nesses tempos, não tão recuados assim, era comportamento considerado ilícito e é isso mesmo que Harvey Milk recorda, ao longo do filme, quando, de gravador em punho, rememora aspectos da sua vida passada, perante a ameaça de morte que pairava sobre si. São esses registos que se vão intercalando na acção do filme e introduzindo novos capítulos. Como por exemplo, decorria o ano de 1970, o seu encontro com Scott Smith (James Franco) que se torna seu amante e uma personagem de forte impacto na sua vida. É com ele que deixa N.Y. em 1972, a caminho de São Francisco, onde abrem uma loja de fotografia na chamada área Castro, uma rua, ou um bairro, inteiramente dominada pela comunidade gay. É também aí que, anos mais tarde, conhece Cleve Jones (Emile Hirsch), um prostituto de Phoenix, com quem mantém uma relação, que terminará de forma trágica, é aí que inicia a sua acção de activista, sobretudo através de uma actuação junto do sindicato dos camionistas, impondo o emprego de gays, e oferecendo, em contrapartida, o apoio dos bares gays ao boicote a uma marca de cerveja.
Os seus discursos, que se iniciavam na rua, em cima de um pequeno caixote, começavam invariavelmente por uma frase que o tornou célebre: "My name is Harvey Milk and I want to recruit you," (“O meu nome é Harvey Milk e quero recrutar-te”). É também por essa altura que se associa à “leader” lésbica Anne Kronenberg (Alison Pill) que se torna igualmente pessoa influente na sua “entourage”. Com a chegada ao poder do Mayor Moscone (Victor Garber), Milk consegue ascender a Supervisor da Câmara, iniciando aí a sua principal campanha, em 1978, para contrariar a “Proposta 6”, que pretendia aprovar legislação que descriminava a liberdade sexual e impedia o acesso de gays ao ensino público, campanha que contava com apoios tão diversos como são os de Ronald Reagan e Jimmy Carter, e de uma popular cantora, Anita Bryant, que desencadeou violentos ataques aos homossexuais, baseando-se em princípios fundamentalistas de uma Convenção Baptista de Sul a que pertencia. Ao seu lado, o senador John Briggs (Denis O'Hare), foi outra força de bloqueio importante, que, aliás, se iria confrontar com Harvey Milk num debate no Estado da Califórnia, no conhecido “Orange County”, onde uma tirada de Milk entraria na História: “Se é verdade que as crianças imitam os seus professores, então deveria existir um número muito maior de freiras andando por aí.” (“If it were true that children mimicked their teachers, you'd sure have a helluva lot more nuns running around."). A proposta seria derrotada, o que foi considerado uma grande vitória de Milk e do seu movimento. Mas o fim de Milk estava à vista, quando o vacilante polícia Dan White (Josh Brolin), católico de ascendência irlandesa, e que chegara mesmo a ser considerado “um dos nossos” pelos gays, resolve tomar uma atitude drástica, subir as escadarias da City Hall de São Francisco e esvaziar um revólver nos corpos do “mayor” e do supervisor Milk. Seguiu-se uma das maiores vigílias de que há memória em São Francisco, com milhares de pessoas descendo as avenidas com velas nas mãos, partindo de “The Castro” em direcção ao City Hall.
“Milk”, quer pela estrutura narrativa, quer pela tonalidade da fotografia, procura inscrever-se num género a que se costuma chamar o docdrama, uma ligação entre a ficção e o documentário, onde se tenta reconstituir uma realidade, usando para isso a representação dramatizada de certos aspectos dessa realidade. No tom difere de uma biografia romanceada normal, onde a ficção se impõe desde início, mesmo que respeitando aspectos da verdade histórica. Normalmente o docdrama dá uma importância maior às imagens de arquivo do que acontece em “Milk”, mas realmente a organização geral do projecto, a cor das imagens, saturadas, e o próprio rigor da reconstituição encaminham-nos para o registo do docdrama, que resulta magnificamente – há uma “verdade” insofismável no que se vê, um dos aspectos mais interessantes desta obra que, por outro lado, radica numa certa tradição de cinema vanguardista ou alternativo, não fosse o tema a homossexualidade. Tecnicamente, portanto, e artisticamente, “Milk” é uma completa “reussite”.
Por outro lado, a interpretação de Sean Penn é perfeita. Diria, mais que perfeita, assombrosa. Foram vários os candidatos ou actores sondados para este papel. Sean Penn acabaria por ser eleito, sendo ele definitivamente um “não gay” (o que até levantou, na altura da rodagem, algumas objecções da comunidade gay). Mas o resultado final é brilhante, pela forma como o actor se investe na personagem, sem um excesso, sem nunca cair na caricatura, representando com a voz, com o rosto, mas igualmente com todo o corpo, cada músculo, cada gesto, cada olhar. Sean Penn é Harvey Milk no sorriso, mas também no andar, na forma de beijar, na pose, na manifestação de rua ou nos momentos mais íntimos passados com namorados. Uma atenção notável ao pormenor. Perfeito, uma invulgar lição de representar. A seu lado, todos os outros actores são excelentes.
Obra de uma delicadeza e pudor total, muito embora seja ostensiva nalgumas cenas de amor, “Milk” é seguramente um dos mais surpreendentes filmes deste início de ano, e um fortíssimo candidato aos Oscars, se estes não estivessem desde há muito atribuídos a outro aspirante. Sean Penn, porém, só por uma grande injustiça deixará fugir a atribuição do Oscar de “melhor actor”. (Atenção: não vi ainda o Mickey Rourke de "The Wrestler").Gus van Sant, o realizador, nascido nos EUA, em 1952, é autor de uma vasta obra, muito pessoal, onde a homossexualidade ocupa destacado lugar (o cineasta é assumidamente gay). Entre os seus títulos mais conhecidos contam-se “Mala Noche” (1985), “Drugstore Cowboy” (1989), “My Own Private” Idaho (1991), “Even Cowgirls Get the Blues” (1993), “To Die For” (1995) “Good Will Hunting” (1997), “Psycho” (1998), “Finding Forrester” (2000), “Gerry (2002), “Elephant” (2003), “Last Days” (2005), “Paris, je t' Aime” (episódio "Le Marais") (2005), “Paranoid Park” (2007) ou “Milk”). Em 1984, já havia sido realizado um filme documental sobre o mesmo período e a mesma personagem. “The Times of Harvey Milk”, dirigido por Rob Epstein, ganharia o Oscar de melhor documentário de longa-metragem de 85. Escrito por Harvey Fierstein e o próprio Rob Epstein, tinha narração de Judith Coburn e apresentava imagens autênticas de arquivo onde se podiam ver Harvey Milk, Anne Kronenberg, Tory Hartmann, Tom Ammiano, Jim Elliot, Henry Der, Jeannine Yeomans, Bill Kraus, Sally M. Gearhart, John Briggs, Jerry Brown, Jimmy Carter, Dianne Feinstein, David Fowler, Joseph Freitas, Terence Hallinan, George Moscone ou Dan White.
MILK
Título original: Milk
Realização: Gus Van Sant (EUA, 2008); Argumento: Dustin Lance Black; Produção: Dustin Lance Black, Bruce Cohen, Barbara A. Hall, William Horberg, Dan Jinks, Michael London, Bruna Papandrea; Música: Danny Elfman; Fotografia (cor): Harris Savides; Montagem: Elliot Graham; Casting: Francine Maisler; Design de produção: Bill Groom; Direcção artística: Charley Beal; Decoração: Barbara Munch; Guarda-roupa: Danny Glicker; Maquilhagem: Steven E. Anderson, Sterfon Demings, Stephan Dupuis, Gregory Nicotero, Michael White; Direcção de Produção: Robert Hackl, Barbara A. Hall, Michelle Lankwarden; Assistentes de realização: Ian Calip, Neil Lewis, John R. Saunders, David J. Webb; Departamento de arte: Chad Owens; Som: Robert Jackson; Efeitos especiais: Tom Sindicich; Efeitos visuais: Tsui Ling Toomer, Chel White; Companhias de produção: Focus Features, Axon Films, Groundswell Productions, Jinks/Cohen Company; Intérpretes: Sean Penn (Harvey Milk), Emile Hirsch (Cleve Jones), Josh Brolin (Dan White), Diego Luna (Jack Lira), James Franco (Scott Smith), Alison Pill (Anne Kronenberg), Victor Garber (Mayor George Moscone) Denis O'Hare (Senador John Briggs), Joseph Cross (Dick Pabich), Stephen Spinella (Rick Stokes), Lucas Grabeel (Danny Nicoletta), Brandon Boyce (Jim Rivaldo), Howard Rosenman, Kelvin Yu, Jeff Koons, Ted Jan Roberts, Boyd Holbrook, Frank M. Robinson, Allan Baird, Tom Ammiano, Carol Ruth Silver, Hope Tuck, Steven Wiig, Ashlee Temple, Wendy Tremont King, Kelvin Han Yee, Robert Chimento, Ginabel Machado, Daniel Landroche, Trace Webb, Velina Brown, Scott Patrick Green, Mary Dilts, Roman Alcides, Robert George Nelson, Brian Danker, Richard Gross, Borzin Mottaghian, Brian Yates Sharber, Camron Palmer, Cully Fredricksen, Mark Martinez, Danny Glicker, Catherine Cook, Joe Meyers, Dominic Sahagun, William McElroy, Joey Hoeber, Mark E. Stanger, Christopher Greene, Jesse Caldwell, Lynn McRee, Cleve Jones, John Parson, Jay Kerzner, Kristen Marie Holly, Sandi Ippolito, Roger Groh, Maggie Weiland, Dustin Lance Black, Drew Kuhse, Eric Cook, Roger Mudd, John Douglas Ayers, Tom Brokaw, Anita Bryant, Greg Cala, Jimmy Carter, Cabran E. Chamberlain, John Clerkin, Walter Cronkite, Zachary Culbertson, Harvey Milk, John Prudhont, Ronald Reagan, Corbett Redford, Jeff Redlick, Timothy Roberts, Lin Shukla, Serene Sidher, Christopher Sugarman, Jeremiah Turner, Brian Vowell, Cindy Warner, etc. Duração: 128 minutos; Distribuição em Portugal: Filmes Castello Lopes; Classificação etária: M/ 16 anos; Estreia em Portugal: 29 de Janeiro de 2009.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

NOS 100 ANOS DE CARMEN MIRANDA

HOMENAGEM A CARMEN MIRANDA
A 5 de Agosto de 1955, morre Carmen Miranda em sua casa (Los Angeles, Beverly Hills, Bedford Drive, 616), aos 46 anos de idade, vítima de um colapso cardíaco, após filmar com Jimmy Durante um programa para a televisão. A 12 de Agosto, o corpo embalsamado chega ao Brasil, para ser velado na antiga Câmara de Vereadores do Rio. Das 13 horas desse dia até às 13 horas do dia 13, mais de 60.000 pessoas desfilaram em preito de gratidão e homenagem. No dia seguinte, Carmen Miranda seria sepultada no Cemitério de São João Batista, num lote cedido pela Santa Casa de Misericórdia. Fala-se que entre 500.000 e um milhão de pessoas acompanhou o enterro, que foi considerado o mais concorrido de toda a história do Rio de Janeiro. O Brasil chorava a diva que Portugal tinha oferecido ao mundo.
Foi a 9 de Fevereiro de 1909 que nasceu na Freguesia da Várzea da Ovelha, Conselho de Marco de Canavezes, antiga São Martinho da Aliviada, no Distrito do Porto, em Portugal, uma menina de nome Maria do Carmo Miranda da Cunha. Filha de José Maria Pinto da Cunha (17-2-1887 / 21-6-1938) e de Maria Emilia Miranda da Cunha (10-3-1886 / 9-11-1971), foi baptizada na Igreja de São Martinho da Aliviada. Logo no ano seguinte a família parte ara o Brasil, primeiro o pai, depois a mãe e a irmã Olinda. O pai estabeleceu-se como barbeiro, no "Salão Sacadura", à Rua da Misericórdia nº 70, no Rio. Em 1919, matricula-se na Escola Santa Tereza, à Rua da Lapa nº 24, no Rio. Em 1925, mudam-se para o nº 13 da Travessa do Comércio, no centro comercial do Rio, onde instalaram uma pensão, para fazer face às despesas com o tratamento pulmonar de Olinda em Portugal, num sanatório do Caramulo. Cármen Miranda, com 14 anos, deixa a escola e emprega-se numa loja de gravatas. Em 26 de Setembro de 1926, a revista "Selecta" publica o retrato de CM, na secção de cinema do jornalista Pedro Lima, sem citação de seu nome. Três anos depois canta num festival, organizado pelo baiano Aníbal Duarte, no Instituto Nacional de Música no centro do Rio. Josué de Barros, compositor e violonista baiano, interessa-se por esta voz e promove-a junto de estações de rádio, clubes e discográficas. No mesmo ano, canta na Rádio Educadora e na Rádio Sociedade. Em Setembro, grava o seu primeiro disco na Brunswick (Lado A: "Não Vá Sim'bora", samba, Lado B: "Se O Samba É Moda", chôro), lançado no fim do ano, e, em Dezembro, volta a gravar, pela etiqueta Víctor, com "Triste Jandaia" e "Dona Balbina".
Em Fevereiro de 1930, o lançamento de "Tá hi", consagra-a durante o ano. Participa em vários espectáculos, "Noite Brasileira de Francisco Alves", "Monroe", "Tarde da Alma Brasileira", "Miss Rio de Janeiro", "Tarde do Folclore Brasileiro", até organizar o seu próprio, Festival Carmen Miranda, no Teatro Lírico. "O Pais" publica uma entrevista com CM, considerando-a a maior cantora popular brasileira. De 13 a 21 de Setembro, canta na revista musical "Vai Dar o que Falar", no Teatro João Caetano. É um fenómeno de popularidade. Requisitada internacionalmente: Em Outubro de 1931 embarca com Francisco Alves e Mário Reis, e outros artistas, para Buenos Aires, com contrato de um mês no Cine Broadway. Voltam pelo "Astúrias" a 8-11-1931. Continua a gravar com êxito redobrado pela “Victor”. Sucedem-se espectáculos por todo o Brasil. Em 1933, estreia-se no cinema com "A Voz do Carnaval", no Cine Odeon. Em Agosto, assina contrato de 2 anos com a Rádio Mayrink Veiga, ganhando 2 contos de réis mensais. Foi a primeira cantora de rádio a merecer contrato. César Ladeira, director desta rádio, chamou-a de "Cantora do It", e depois de "Ditadora Risonha do Samba" e, em 1934 ou 1935, de "Pequena Notável".
Embarca para Buenos Aires com outros artistas, para cantar na L.R.-5. Volta a 5 de dezembro de 1933. Começa a ser conhecida como a "Embaixatriz do Samba". É eleita "Rainha do Broadcasting Carioca", em concurso do jornal "A Hora". Em Julho de 1934, de visita ao Brasil, para promoção do filme "Voando para o Rio", Ramon Novarro encontra CM numa recepção. Começa a falar-se na sua provável ida para Hollywood. Passa por São Paulo com sucesso louco, embarca para Buenos Aires, com Aurora Miranda, sua irmã, e o "Bando da Lua", contratados por Jaime Yankelevisch, da Rádio Belgrano, para uma temporada de um mês. Em 1935, estreia "Alô, Alô Brasil", primeiro filme brasileiro com som directo na película. Inicia asgravações na Odeon, com contratos milionários. Estréia novo filme, "Estudantes", no Cine Alhambra. Em 1936, actua no Cassino Copacabana, estreia "Alô, Alô Carnaval" no Cine Alhambra, exibe-se no Teatro Coliseu de Santos e nesse ano fala-se na vinda das irmãs Miranda para Portugal. CM recusa outro vantajoso contrato da Rádio El Mundo, de Buenos Aires, e rejeita a participação num filme argentino em que faria o segundo papel. Surge na Rádio Tupi, que a roubou à rádio Mayrink Veiga, mercê um fabuloso contrato de 5 contos de réis por mês, para 4 horas mensais, isto é, dois programas semanais de meia hora. Triunfa no Cassino da Urca.
Viagens e sucessivos êxitos no Brasil e no mundo. A 21 de Junho de 1938, morre o pai. Em Dezembro, Tyrone Power e a noiva Annabella visitam o Rio e tornam-se amigos de CM, a quem convencem num triunfo em Hollywood. 1939, de novo no ecran, com "Banana da Terra", onde assume a personagem de "baiana". Grava com Dorival Caymmí "O Que É Que a Baiana Tem". A 3 de Maio de 1939, parte para os Estados Unidos, onde á chega afirma: "Vocês verão principalmente que sou cantora e tenho ritmo". Estreia-se na revista "Streets of Paris", em Boston, com êxito estrondoso. Depois, em Nova York, com o "Bando da Lua", revoluciona Broadway, a "Feira Mundial" e toda Nova York. Grava os seus primeiros discos na Decca. Em Fevereiro de 1940, canta nas filmagens de "Serenata Tropical". Volta ao Brasil, triunfal. Mas, entre 2 e 27 de Setembro de 1940, grava suas últimas músicas no Brasil, tentando reagir às críticas que a viam “americanizada”. A 3 de Outubro de 1940, regressa aos Estados Unidos. No ano seguinte, suprema honra: Imprime mãos e sapatos no cimento dos passeios do Teatro Chinês de Los Angeles, até aí primeira e única sul-americana a receber tal honraria. Integra o elenco da revista de Schubert "Sons O' Fun", no Teatro Winter Garden de Nova York.
Entre 1941 a 1953, intervém em 13 filmes em Hollywood, para lá de se tornar preseça assídua nos mais importantes programas de rádio, televisão, "night-clubs", cassinos e teatros. Em 1946 é tida como a mulher que mais impostos paga nos E.U.A. Casa-se com o americano David Sebastian. Em Abril de 1948, estreia-se no Teatro Palladium, de Londres, onde esperava fazer 4 semanas, e teve de ficar 6, ganhando 100.000 dólares. Em Agosto de 1948, perde um filho que esperava. Em 1951, é a artista de show que mais dinheiro ganha nos E.U.A. Visita o Havai. Excursão por vários países da Europa. Em Dezembro de 1954, depois de 14 anos de ausência, volta ao Brasil, traz consigo um profundo esgotamento nervoso. Matou saudades, compareceu a homenagens em teatros e festas, e a 4 de Abril de 1955, aparentemente restabelecida, volta aos E.U.A. Trabalha em Las Vegas, Havana em Cuba e na televisão. Não dura muito.
A 5 de Dezembro de 1956, o prefeito Negrão de Lima assina a Lei nº 886, que cria o Museu Carmen Miranda, para guardar, conservar e expor o acervo da artista, doado pelo marido, e constante de sapatos, roupas, jóias e troféus. A 5 de Agosto de 1976, é inaugurado o "Museu Carmen Miranda", em frente ao número 560 da Avenida Rui Barbosa, no Aterro do Flamengo, Rio de Janeiro.
NO BRASIL
1932 - O Carnaval Cantado no Rio, de Ademar Gonzaga e Humberto Mauro
1933 - A Voz do Carnaval, de Ademar Gonzaga e Humberto Mauro
1935 - Alô, Alô Brasil!, de Wallance Downey, João de Barro e Alberto Ribeiro
1935 – Estudantes, de Wallace Downey
1936 - Alo, Alo Carnaval, de Adhemar Gonzaga
1939 - Banana da Terra, de João de Barro

NOS EUA:
1940 – Sinfonia dos Trópicos (Pt) Serenata Tropical (Br) (Down Argentine Way)
1941 – Uma Noite no Rio (Pt e Br) (That Night In Rio)
1941 – Férias em Havana (Pt) Aconteceu em Havana (Br) (Weekend In Havana)
1942 – Primavera nas Montanhas (Pt) Minha Secretária Brasileira (Br) (Springtime In The Rockies)
1943 – Sinfonia de estrelas (Pt) Entre a Loira e Morena (Br) (The Gang´S All Here)
1944 – Quatro Raparigas Encantadoras (Pt) Quatro Moças num Jeep (Br) (Four Jills In A Jeep)
1944 – Serenata Boemia (Pt e Br) (Greenwich Village)
1944 – Alegria Rapazes! (Pt e Br) (Something For The Boys)
1945 – A Canção da Felicidade (Pt) Sonhe eu Fosse Feliz (Br) (If I´M Lucky)
1947 – Copacabana
1948 – A Professora de Rumba (Pt) O Principe Encantado (Br) (A Date With Judy)
1950 – Festa no Brasil (Pt) Romance Carioca (Br.) (Nancy Goes To Rio)
1953 – O Castelo das surpresas (Pt) Morrendo de Medo (Br) (Scared Stiff)

Carmen Miranda: "Nasci em Portugal, mas me criei no Brasil e, portanto, considero-me brasileira. O local do nascimento não importa, nem sequer o sangue. O que importa é o que os americanos chamam de "environment", a influência do país e dos costumes em que vivemos, se bem que sempre existe um grau de gratidão e fidelidade aos pais que nos geraram. Da minha parte, sou mais carioca, mais sambista de favela, mais carnavalesca do que cantora de fados. O sangue tem uma certa importância, mas só no temperamento, não na maneira de sentir as coisas."
Heitor Villa Lobos, compositor: "Nenhum brasileiro pode ignorar o que Carmen fez por nós lá fora. Ela espalhou nossa língua, ensinou pessoas que nunca ouviram falar da gente a cantar nossas músicas e a amar nossos ritmos. Ela irá sempre significar muito para nós."
Kevin Stayton, vice - director do Brooklyn Museum: “Carmen Miranda era uma portuguesa que virou brasileira e levou a sua música e as suas fantasias - temperadas com elementos e ritmos dos escravos - para os Estados Unidos, e ainda conquistou a América através do cinema. E tudo isso em plena Segunda Guerra Mundial.”