A abrir, dia 14 de Março, 21,30 horas:
CARLOS DO CARMO
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CARLOS DO CARMO
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A fechar, dia 21 de Março, 21, 30 horas
CORVOS
 E se Obama fosse africano?
 E se Obama fosse africano?  “Frost/Nixon” assemelha-se muito a um combate de boxe entre duas personagens com real existência física: o apresentador de televisão David Paradine Frost (nascido a 7 de Abril de 1939), que ainda há pouco mantinha na televisão inglesa um programa de entrevistas, “Frost Over The World”, na “Al Jazeera English”, e Richard Milhous Nixon (nascido em Yorba Linda, Califórnia, a 9 de Janeiro de 1913 e falecido a 12 de Abril de 1994), que foi o 37º Presidente dos Estados Unidos da América, entre 1969 e 1974, ano em que resignou, depois de se ver envolvido no caso Watergate. Nixon foi o único Presidente dos EUA até hoje a ser obrigado a afastar-se do cargo, em virtude de ter cometido graves irregularidades durante a sua administração. Republicano, tinha atrás de si uma carreira repleta de duvidosos casos políticos, desde a sua activa e decisiva contribuição para o período da “Caça às Bruxas”, durante o Machartismo, tendo depois sido Vice-presidente de Dwight D. Eisenhower (entre 1953 e 1961). Em 1960 perdeu as eleições presidenciais para John F. Kennedy, e em 1962 para governador da Califórnia. Mas, em 1968, seria eleito Presidente e reeleito em 1972. A sua Presidência seria tumultuosa, com graves questões internas e externas (guerra do Vietname, a que curiosamente pôs termo, depois de uma escalada fatídica, e de ter a aceite uma má dissimulada rendição, relações com a China e a URSS, com as quais logrou alguma contenção, guerra com o Cambodja, o Laos, crise económica e caos social nos EUA). A 14 de Agosto de 1974 demitia-se de Presidente, com uma curta declaração, e o seu sucessor, Gerald Ford, anunciava, pouco depois, um perdão para todos os “crimes federais” por si cometidos. Assim se retirou para a sua residência “La Casa Pacifica”, em San Clemente, Califórnia, onde escreveu, em 1978, as mil páginas “The Memoirs of Richard Nixon”, a que se seguiram nove outros volumes (todos muito bem remunerados).
“Frost/Nixon” assemelha-se muito a um combate de boxe entre duas personagens com real existência física: o apresentador de televisão David Paradine Frost (nascido a 7 de Abril de 1939), que ainda há pouco mantinha na televisão inglesa um programa de entrevistas, “Frost Over The World”, na “Al Jazeera English”, e Richard Milhous Nixon (nascido em Yorba Linda, Califórnia, a 9 de Janeiro de 1913 e falecido a 12 de Abril de 1994), que foi o 37º Presidente dos Estados Unidos da América, entre 1969 e 1974, ano em que resignou, depois de se ver envolvido no caso Watergate. Nixon foi o único Presidente dos EUA até hoje a ser obrigado a afastar-se do cargo, em virtude de ter cometido graves irregularidades durante a sua administração. Republicano, tinha atrás de si uma carreira repleta de duvidosos casos políticos, desde a sua activa e decisiva contribuição para o período da “Caça às Bruxas”, durante o Machartismo, tendo depois sido Vice-presidente de Dwight D. Eisenhower (entre 1953 e 1961). Em 1960 perdeu as eleições presidenciais para John F. Kennedy, e em 1962 para governador da Califórnia. Mas, em 1968, seria eleito Presidente e reeleito em 1972. A sua Presidência seria tumultuosa, com graves questões internas e externas (guerra do Vietname, a que curiosamente pôs termo, depois de uma escalada fatídica, e de ter a aceite uma má dissimulada rendição, relações com a China e a URSS, com as quais logrou alguma contenção, guerra com o Cambodja, o Laos, crise económica e caos social nos EUA). A 14 de Agosto de 1974 demitia-se de Presidente, com uma curta declaração, e o seu sucessor, Gerald Ford, anunciava, pouco depois, um perdão para todos os “crimes federais” por si cometidos. Assim se retirou para a sua residência “La Casa Pacifica”, em San Clemente, Califórnia, onde escreveu, em 1978, as mil páginas “The Memoirs of Richard Nixon”, a que se seguiram nove outros volumes (todos muito bem remunerados). As primeiras gravações das entrevistas não foram brilhantes para Frost, que se mostrava demasiado retraído, dando todos os pontos a Nixon, mas, quando chegou a ocasião de abordar o caso Watergate, tudo mudou de figura. Nixon acabaria por confessar publicamente alguns erros e ilegalidades (que, quando cometidas por um presidente, “não eram ilegalidades”, explicou perante a incredibilidade do país). As entrevistas que até aí não tinham motivado grande interesse por parte das cadeias de tv americanas, acabaram por ser um sucesso televisivo, com mais de 45 milhões (há quem fale em 50 milhões) de espectadores em todo o mundo, o que as tornou no maior êxito de sempre no campo das entrevistas políticas televisionadas.
As primeiras gravações das entrevistas não foram brilhantes para Frost, que se mostrava demasiado retraído, dando todos os pontos a Nixon, mas, quando chegou a ocasião de abordar o caso Watergate, tudo mudou de figura. Nixon acabaria por confessar publicamente alguns erros e ilegalidades (que, quando cometidas por um presidente, “não eram ilegalidades”, explicou perante a incredibilidade do país). As entrevistas que até aí não tinham motivado grande interesse por parte das cadeias de tv americanas, acabaram por ser um sucesso televisivo, com mais de 45 milhões (há quem fale em 50 milhões) de espectadores em todo o mundo, o que as tornou no maior êxito de sempre no campo das entrevistas políticas televisionadas.  Enquadrado historicamente o acontecimento, e o seu inequívoco interesse, cremos não andar muito longe da verdade se dissermos que o verdadeiro protagonista deste filme de Ron Howard é, no entanto, George W. Bush. E porquê? Porque muitas vezes ouvimos Frost, no filme, fazer perguntas a Nixon e quem ouvimos a responder é Bush, tal a sobreposição de questões. De certa forma as entrevistas de Frost constituíram uma espécie de julgamento público de um presidente que levou os EUA para a guerra com falsas questões, com mentiras organizadas a seu favor, acabando por desencadear uma das piores crises militares, políticas, económicas, financeiras e sociais da história daquele país e do mundo. Estamos portanto a ouvir perguntas que poderiam ser endereçadas a George W. Bush, e a julgá-lo publicamente por interposta pessoa. O resultado é confrangedor para um e outro. O filme adquire o estatuto de requisitório indiscutível.
Enquadrado historicamente o acontecimento, e o seu inequívoco interesse, cremos não andar muito longe da verdade se dissermos que o verdadeiro protagonista deste filme de Ron Howard é, no entanto, George W. Bush. E porquê? Porque muitas vezes ouvimos Frost, no filme, fazer perguntas a Nixon e quem ouvimos a responder é Bush, tal a sobreposição de questões. De certa forma as entrevistas de Frost constituíram uma espécie de julgamento público de um presidente que levou os EUA para a guerra com falsas questões, com mentiras organizadas a seu favor, acabando por desencadear uma das piores crises militares, políticas, económicas, financeiras e sociais da história daquele país e do mundo. Estamos portanto a ouvir perguntas que poderiam ser endereçadas a George W. Bush, e a julgá-lo publicamente por interposta pessoa. O resultado é confrangedor para um e outro. O filme adquire o estatuto de requisitório indiscutível. Ao olharmos, porém, para estes dois homens em confronto, não nos restam muitas dúvidas de que ambos se equivalem. O duelo é de morte, mas o que está em causa será a reposição da verdade e o julgamento público de um Presidente crápula? Ou será antes os 600 mil dólares que fascinaram Nixon e saíram do bolso de Frost? Ou será o futuro profissional de cada um deles e da rede de colaboradores que os mantêm em exercício? Há algum quixotismo em Frost? Há algum arrependimento em Nixon? Não estarão ambos a investir ao mais alto nível nos seus futuros? Um a querer regressar à ribalta da TV de Inglaterra, outro a querer rentabilizar, o melhor possível, as suas memórias, impondo a comiseração por um lado e o branqueamento, limitado é certo, da sua imagem pública? Afinal o resultado foi o julgamento de Nixon, é uma realidade, mas com um perdão para todos os “crimes federais” e a nova imagem do homem que, apesar dos crimes cometidos, se tinha humilhado, confessando num acto de contrição que todo o país (e o mundo) iria compreender (e perdoar), continuando a comprar “as memórias” que iria futuramente publicar e tanto jeito lhe fariam à contabilidade pessoal.
Ao olharmos, porém, para estes dois homens em confronto, não nos restam muitas dúvidas de que ambos se equivalem. O duelo é de morte, mas o que está em causa será a reposição da verdade e o julgamento público de um Presidente crápula? Ou será antes os 600 mil dólares que fascinaram Nixon e saíram do bolso de Frost? Ou será o futuro profissional de cada um deles e da rede de colaboradores que os mantêm em exercício? Há algum quixotismo em Frost? Há algum arrependimento em Nixon? Não estarão ambos a investir ao mais alto nível nos seus futuros? Um a querer regressar à ribalta da TV de Inglaterra, outro a querer rentabilizar, o melhor possível, as suas memórias, impondo a comiseração por um lado e o branqueamento, limitado é certo, da sua imagem pública? Afinal o resultado foi o julgamento de Nixon, é uma realidade, mas com um perdão para todos os “crimes federais” e a nova imagem do homem que, apesar dos crimes cometidos, se tinha humilhado, confessando num acto de contrição que todo o país (e o mundo) iria compreender (e perdoar), continuando a comprar “as memórias” que iria futuramente publicar e tanto jeito lhe fariam à contabilidade pessoal. Claro que Ron Howard, não sendo um cineasta particularmente criativo e um “autor” de primeiro plano, é um realizador atento e eficaz. O filme movimenta-se bem em interiores cerrados, as cenas das entrevistas conseguem justificar o tom de quase “thriller” psicológico, adensando o clímax com habilidade. Há um momento, absolutamente ficcionado no filme, que funciona muito bem, quando Nixon, embriagado (apenas um plano de copos e garrafa, anterior, prenuncia o desenlace), telefona a meio da noite a Frost. No dia seguinte, Frost evoca esse telefonema a Nixon, este não o recorda, mas essa confidência do entrevistador irá retirar ao ex-presidente toda a segurança, fragilizá-lo e viabilizar a confissão. Também aqui as comparações com Bush não deixam de se estabelecer.
Claro que Ron Howard, não sendo um cineasta particularmente criativo e um “autor” de primeiro plano, é um realizador atento e eficaz. O filme movimenta-se bem em interiores cerrados, as cenas das entrevistas conseguem justificar o tom de quase “thriller” psicológico, adensando o clímax com habilidade. Há um momento, absolutamente ficcionado no filme, que funciona muito bem, quando Nixon, embriagado (apenas um plano de copos e garrafa, anterior, prenuncia o desenlace), telefona a meio da noite a Frost. No dia seguinte, Frost evoca esse telefonema a Nixon, este não o recorda, mas essa confidência do entrevistador irá retirar ao ex-presidente toda a segurança, fragilizá-lo e viabilizar a confissão. Também aqui as comparações com Bush não deixam de se estabelecer. Vamos, pois, e finalmente, ao diálogo de actores. Frank Langella (Richard Nixon) e Michael Sheen (David Frost) são dois bons actores, particularmente o primeiro. Deve sublinhar-se o trabalho de ambos, na assimilação de características e de pormenores de gestos, olhares, entoações, mas se o desempenho é minucioso, e por vezes brilhante, há algo que nos afasta dos verdadeiros protagonistas. Percebe-se que a intenção não foi mimar ao extremo o físico de Nixon ou Frost, mas construir essas figuras sobre a aparência física dos actores que lhe acrescentaram apenas certos tiques ou particularidades. O resultado, não afectando demasiado o filme, acaba por nos distanciar. Não sabemos mesmo se não haverá algo de propositado neste distanciamento (um Nixon que não é totalmente o Nixon das actualidades e dos telejornais da época, para o filme se centrar mais na figura de um Presidente dos EUA, pouco escrupuloso, dado à bebida, prepotente e ardiloso, populista e atávico – será só Nixon que corresponde ao retrato, quando o filme de Ron Howard se estreia em plena campanha de Barack Obama?).
Vamos, pois, e finalmente, ao diálogo de actores. Frank Langella (Richard Nixon) e Michael Sheen (David Frost) são dois bons actores, particularmente o primeiro. Deve sublinhar-se o trabalho de ambos, na assimilação de características e de pormenores de gestos, olhares, entoações, mas se o desempenho é minucioso, e por vezes brilhante, há algo que nos afasta dos verdadeiros protagonistas. Percebe-se que a intenção não foi mimar ao extremo o físico de Nixon ou Frost, mas construir essas figuras sobre a aparência física dos actores que lhe acrescentaram apenas certos tiques ou particularidades. O resultado, não afectando demasiado o filme, acaba por nos distanciar. Não sabemos mesmo se não haverá algo de propositado neste distanciamento (um Nixon que não é totalmente o Nixon das actualidades e dos telejornais da época, para o filme se centrar mais na figura de um Presidente dos EUA, pouco escrupuloso, dado à bebida, prepotente e ardiloso, populista e atávico – será só Nixon que corresponde ao retrato, quando o filme de Ron Howard se estreia em plena campanha de Barack Obama?).
 
 
 VICKY CRISTINA BARCELONA
 VICKY CRISTINA BARCELONA 
  
  Este o início de “Vicky Cristina Barcelona”, uma deliciosa comédia de costumes que Woody Allen escreveu e foi rodar a Barcelona, cidade que se afirma igualmente como personagem nesta trama de amores lícitos e ilícitos. O mais divertido neste filme é que parece que estamos a assistir a uma obra concebida a quatro mãos: Vicky e Cristina são personagens de Woody Allen; José António e a sua fogosa e fatal ex-mulher Maria Elena (Penélope Cruz) são personagens de Almodóvar; o diálogo tem o brilhantismo próprio de um certo humor judeu nova-iorquino, que Woody Allen tão bem desenvolve, numa ironia fina e numa inequívoca ternura pelos seres humanos, as suas fraquezas e as suas forças, mas o cenário, de Barcelona a Oviedo, parece o “décor” de uma obra de Almodóvar.
 Este o início de “Vicky Cristina Barcelona”, uma deliciosa comédia de costumes que Woody Allen escreveu e foi rodar a Barcelona, cidade que se afirma igualmente como personagem nesta trama de amores lícitos e ilícitos. O mais divertido neste filme é que parece que estamos a assistir a uma obra concebida a quatro mãos: Vicky e Cristina são personagens de Woody Allen; José António e a sua fogosa e fatal ex-mulher Maria Elena (Penélope Cruz) são personagens de Almodóvar; o diálogo tem o brilhantismo próprio de um certo humor judeu nova-iorquino, que Woody Allen tão bem desenvolve, numa ironia fina e numa inequívoca ternura pelos seres humanos, as suas fraquezas e as suas forças, mas o cenário, de Barcelona a Oviedo, parece o “décor” de uma obra de Almodóvar. Inteligentemente escrito, na narrativa em off, bem como nos diálogos, inventivo nas situações, subtil no humor, magnificamente encenado em cenários que percorrem os lugares essenciais de Barcelona, sem cair no rodriguinho do bilhete postal turístico, “Vicky Cristina Barcelona” impõe-se ainda pela qualidade do trabalho dos actores Javiem Bardem é o fulgurante artista romântico por excelência (a ex-mulher tem a teoria, quem sabe se certa?, de que só são românticos os amores impossíveis ou condenados ao fracasso, no caso dela, aos sucessivos fracassos, porque volta sempre ao lugar do crime, repetindo a dose); Penélope Cruz, é uma espanhola que gosta de “touros de morte” e avança de faca ou pistola em punho para qualquer ajuste de contas emocional; Scarlett Johansson mantém o nível a que nos habituou ultimamente, mas continua a desiludir um pouco, e Rebecca Hall torna-se a grande surpresa do filme, ela que se impõe nos últimos anos de título em título (em exibição igualmente em “Frost/Nixon”).
Inteligentemente escrito, na narrativa em off, bem como nos diálogos, inventivo nas situações, subtil no humor, magnificamente encenado em cenários que percorrem os lugares essenciais de Barcelona, sem cair no rodriguinho do bilhete postal turístico, “Vicky Cristina Barcelona” impõe-se ainda pela qualidade do trabalho dos actores Javiem Bardem é o fulgurante artista romântico por excelência (a ex-mulher tem a teoria, quem sabe se certa?, de que só são românticos os amores impossíveis ou condenados ao fracasso, no caso dela, aos sucessivos fracassos, porque volta sempre ao lugar do crime, repetindo a dose); Penélope Cruz, é uma espanhola que gosta de “touros de morte” e avança de faca ou pistola em punho para qualquer ajuste de contas emocional; Scarlett Johansson mantém o nível a que nos habituou ultimamente, mas continua a desiludir um pouco, e Rebecca Hall torna-se a grande surpresa do filme, ela que se impõe nos últimos anos de título em título (em exibição igualmente em “Frost/Nixon”). Vicky Cristina Barcelona
Vicky Cristina Barcelona 
 
...acabou assim.
 Em relação a este filme, arrume-se de início o caso da “influência” de F. Scott Fitzgerald. Este foi, sem margem para grandes dúvidas, um dos maiores escritores americanos da primeira metade do século XX, um autor pertencente à “geração perdida” (Ernest Hemingway, John Dos Passos, Ezra Pound, Sherwood Anderson, Waldo Peirce, Dorothy Parker,T. S. Eliot, ou Gertrud Stein, que, dizem criou o termo, depois vulgarizado por Hemingway), que se afirmou durante os “loucos anos 20” ou os “roaring twenties”, e que consolidou a sua celebridade, sobretudo com dois ou três romances que ajudaram a construir a moderna narrativa norte-americana, como “O Grande Gatsby", “Terna é a Noite” ou “Este Lado do Paraíso” (os seus romances são “This Side of Paradise”, 1920; “The Beautiful and Damned”, 1922; “The Great Gatsby, 1925; “Tender is the Night”, 1934 e “The Last Tycoon”, 1940). Mas F. Scott Fitzgerald cultivou igualmente o conto, sobretudo como forma de sustento diário, publicando-o em revistas literárias e depois reunindo-os em antologias várias. “Flappers and Philosophers” (1920), “Tales of the Jazz Age” (1922), “All the Sad Young Men” (1926) e “Taps at Reveille” (1935) são as principais, agrupadas em 1989 num volume, "The Short Stories of F. Scott Fitzgerald".
Em relação a este filme, arrume-se de início o caso da “influência” de F. Scott Fitzgerald. Este foi, sem margem para grandes dúvidas, um dos maiores escritores americanos da primeira metade do século XX, um autor pertencente à “geração perdida” (Ernest Hemingway, John Dos Passos, Ezra Pound, Sherwood Anderson, Waldo Peirce, Dorothy Parker,T. S. Eliot, ou Gertrud Stein, que, dizem criou o termo, depois vulgarizado por Hemingway), que se afirmou durante os “loucos anos 20” ou os “roaring twenties”, e que consolidou a sua celebridade, sobretudo com dois ou três romances que ajudaram a construir a moderna narrativa norte-americana, como “O Grande Gatsby", “Terna é a Noite” ou “Este Lado do Paraíso” (os seus romances são “This Side of Paradise”, 1920; “The Beautiful and Damned”, 1922; “The Great Gatsby, 1925; “Tender is the Night”, 1934 e “The Last Tycoon”, 1940). Mas F. Scott Fitzgerald cultivou igualmente o conto, sobretudo como forma de sustento diário, publicando-o em revistas literárias e depois reunindo-os em antologias várias. “Flappers and Philosophers” (1920), “Tales of the Jazz Age” (1922), “All the Sad Young Men” (1926) e “Taps at Reveille” (1935) são as principais, agrupadas em 1989 num volume, "The Short Stories of F. Scott Fitzgerald".  “The Curious Case of Benjamin Button” aparece incluído na antologia de 1922, “Tales of the Jazz Age”, e é um divertimento muito saboroso, extremamente bem escrito, numa linguagem solta e livre, que dá muito bem o tom da época, e que, segundo confissão do próprio Scott Fitzgerald, parece ter sido sugerido por uma frase, ou um pensamento, de Mark Twain que se lamentava que “os melhores tempos de uma vida fossem no início e os piores quando se chega ao fim, na velhice.” Pegando nesta sugestão, F. Scott Fitzgerald construiu uma metáfora curiosa, sobre as idades da vida e a possibilidade da sua intermutação: assim Benjamin Button nasce encarquilhado e às portas da morte com setenta anos e inicia a sua cavalgada para a maturidade, depois a adolescência, até chegar a bebé e finar-se durante o sono. A perspectiva não é tanto metafísica ou filosófica, afirmando-se mais como uma diversão escrita com o sabor algo snobe e diletante de um frequentador do “jet-set” nova-iorquino, do champanhe embriagador da Hollywood da altura ou da boémia de Paris ou de Saint Tropez. Finou-se, apenas com 44 anos, e um coração arrasado pelo álcool, os amores, o stress emocional e uma propensão evidente para o suicídio, igualmente muito em moda nesses tempos de vida intensa e morte súbita.
“The Curious Case of Benjamin Button” aparece incluído na antologia de 1922, “Tales of the Jazz Age”, e é um divertimento muito saboroso, extremamente bem escrito, numa linguagem solta e livre, que dá muito bem o tom da época, e que, segundo confissão do próprio Scott Fitzgerald, parece ter sido sugerido por uma frase, ou um pensamento, de Mark Twain que se lamentava que “os melhores tempos de uma vida fossem no início e os piores quando se chega ao fim, na velhice.” Pegando nesta sugestão, F. Scott Fitzgerald construiu uma metáfora curiosa, sobre as idades da vida e a possibilidade da sua intermutação: assim Benjamin Button nasce encarquilhado e às portas da morte com setenta anos e inicia a sua cavalgada para a maturidade, depois a adolescência, até chegar a bebé e finar-se durante o sono. A perspectiva não é tanto metafísica ou filosófica, afirmando-se mais como uma diversão escrita com o sabor algo snobe e diletante de um frequentador do “jet-set” nova-iorquino, do champanhe embriagador da Hollywood da altura ou da boémia de Paris ou de Saint Tropez. Finou-se, apenas com 44 anos, e um coração arrasado pelo álcool, os amores, o stress emocional e uma propensão evidente para o suicídio, igualmente muito em moda nesses tempos de vida intensa e morte súbita. 
 Foi este citado conto que serviu de base ao filme de David Fincher com igual nome, mas falar de inspiração é já dizer muito. Quase nada do conto de F. Scott Fitzgerald passa para o filme a não ser a ideia central de nascer velho e morrer bebé. Esta inversão de ciclo de vida, que já viera de Mark Twain, passara por F. Scott Fitzgerald, toma nova forma no filme de David Fincher, que se afasta do cinema que até agora o caracterizara para se entregar a uma obra que, se continua a ser extremamente pessoal, não deixa de representar uma ruptura com o estilo de filmes da sua anterior filmografia (onde sobressaem títulos como “Alien 3, a Desforra”, “7 Pecados Mortais”, “Clube de Combate”, “O Jogo”, “Sala de Pânico” ou “Zodíaco”). Este universo “negro” que penetra no mais profundo da alma humana e também no que de mais sinistro nela existe parece afastar-se de uma obra aparentemente romântica e com alguma esperança no futuro, como temos visto por aí escrito. Mas será que é assim? Um dos aspectos que me deixa algo confuso em relação a “O Estranho Caso de Benjamin Button”, é precisamente a opacidade da obra que não se deixa penetrar tão facilmente quanto se pensa. Há uma leitura extremamente críptica e cerrada do filme que parece escapar a uma primeira leitura. A mais óbvia é tão evidente e pueril que não pode ser só isso. David Fincher não ia realizar um filme sobre um homem que nasce velho e morre bebé sem ter por detrás uma interpretação metafórica para este facto inusitado. O que se pode desde logo concluir é que os homens estão condenados, qualquer que seja a cronologia da sua vida, quer nasçam bebés quer nasçam velhos, o ciclo é idêntico e intermutável. Tanto se morre novo como velho. Mas a verdade é que o ciclo não é semelhante. Senão vejamos.
Foi este citado conto que serviu de base ao filme de David Fincher com igual nome, mas falar de inspiração é já dizer muito. Quase nada do conto de F. Scott Fitzgerald passa para o filme a não ser a ideia central de nascer velho e morrer bebé. Esta inversão de ciclo de vida, que já viera de Mark Twain, passara por F. Scott Fitzgerald, toma nova forma no filme de David Fincher, que se afasta do cinema que até agora o caracterizara para se entregar a uma obra que, se continua a ser extremamente pessoal, não deixa de representar uma ruptura com o estilo de filmes da sua anterior filmografia (onde sobressaem títulos como “Alien 3, a Desforra”, “7 Pecados Mortais”, “Clube de Combate”, “O Jogo”, “Sala de Pânico” ou “Zodíaco”). Este universo “negro” que penetra no mais profundo da alma humana e também no que de mais sinistro nela existe parece afastar-se de uma obra aparentemente romântica e com alguma esperança no futuro, como temos visto por aí escrito. Mas será que é assim? Um dos aspectos que me deixa algo confuso em relação a “O Estranho Caso de Benjamin Button”, é precisamente a opacidade da obra que não se deixa penetrar tão facilmente quanto se pensa. Há uma leitura extremamente críptica e cerrada do filme que parece escapar a uma primeira leitura. A mais óbvia é tão evidente e pueril que não pode ser só isso. David Fincher não ia realizar um filme sobre um homem que nasce velho e morre bebé sem ter por detrás uma interpretação metafórica para este facto inusitado. O que se pode desde logo concluir é que os homens estão condenados, qualquer que seja a cronologia da sua vida, quer nasçam bebés quer nasçam velhos, o ciclo é idêntico e intermutável. Tanto se morre novo como velho. Mas a verdade é que o ciclo não é semelhante. Senão vejamos. Em lugar de depositar o bebé envelhecido à porta de um lar de idosos, o que acontece no filme, o pai vai “à baixa comprar roupa” para o velho que lhe apareceu no berçário. “E uma bengala, não se esqueça, pai. Preciso de uma bengala!”, relembra o rebento ao senhor Button. Óbvio que estamos no domínio da farsa. No conto. No filme o tom, ainda que aqui e ali permita um sorriso, é mais pesado. Um bebé (mais ou menos parecido com Brad Pitt quando ele tiver 80 anos) é depositado na escadaria de um lar de terceira idade, dirigido por uma generosa negra de nome Queenie. Ela irá adoptá-lo, tratá-lo como um filho que se habitua a ver regredir na idade. Enquanto os velhos do lar vão murchando e morrendo, Benjamin vai transformando-se num ser cada vez mais novo. Ainda velhote descobre uma miúda, Daisy, que se irá tornar o grande amor da sua vida. Aqui ocorre o grande paradoxo do filme: no ciclo habitual da vida, Benjamin e Daisy nunca se encontrariam como casal normal. Ele tinha 60 anos, ela 9, quando ela tivesse 18 ele teria 69, coisa estranha para um casal (ainda que não de todo impossível, já se sabe, ele há casos). E se ele vivesse até aos cem anos (o que não é normal, mas todos nós sabemos muito possível) poderiam coexistir apaixonados ainda 31 anos. Uma pequena vida, muito pouco provável, mas possível.
Em lugar de depositar o bebé envelhecido à porta de um lar de idosos, o que acontece no filme, o pai vai “à baixa comprar roupa” para o velho que lhe apareceu no berçário. “E uma bengala, não se esqueça, pai. Preciso de uma bengala!”, relembra o rebento ao senhor Button. Óbvio que estamos no domínio da farsa. No conto. No filme o tom, ainda que aqui e ali permita um sorriso, é mais pesado. Um bebé (mais ou menos parecido com Brad Pitt quando ele tiver 80 anos) é depositado na escadaria de um lar de terceira idade, dirigido por uma generosa negra de nome Queenie. Ela irá adoptá-lo, tratá-lo como um filho que se habitua a ver regredir na idade. Enquanto os velhos do lar vão murchando e morrendo, Benjamin vai transformando-se num ser cada vez mais novo. Ainda velhote descobre uma miúda, Daisy, que se irá tornar o grande amor da sua vida. Aqui ocorre o grande paradoxo do filme: no ciclo habitual da vida, Benjamin e Daisy nunca se encontrariam como casal normal. Ele tinha 60 anos, ela 9, quando ela tivesse 18 ele teria 69, coisa estranha para um casal (ainda que não de todo impossível, já se sabe, ele há casos). E se ele vivesse até aos cem anos (o que não é normal, mas todos nós sabemos muito possível) poderiam coexistir apaixonados ainda 31 anos. Uma pequena vida, muito pouco provável, mas possível.  Mas se acontecer o ciclo inverso da vida, que o filme de David Fincher documenta, se ele tiver 60 e ela 9 quando se encontram pela vez primeira, irão reencontrar-se um dia com a mesma idade (qualquer coisa como ele 35, ela 34). Não é um encontro que permita uma vida “tranquila” de mais vinte anos sequer (quando ela tiver 54, ele tem 15!). Quando se vive lado a lado, no mesmo sentido dos ponteiros de um relógio que ande para a frente, o que vemos é futuro. Quando o ponteiro do relógio desanda para o passado num dos parceiros, o resultado não é um encontro com futuro, mas um quase desencontro. Por isso, a tese que alguns apontam para o filme não me parece certa: viva-se de início para o fim ou do termo para o princípio, o importante é viver bem a vida e aproveitar o que fica no meio, isto é os anos de vida plena. Esta interpretação pode ser correcta para o conto. Mas não é exacta no filme, que, aliás, o exemplifica. Benjamin afasta-se do seu grande amor, afasta-se da filha que será perfilhada por outro, quando se aproxima da adolescência. A existência que se vive em comum, e que em comum evolui num mesmo sentido, permite o usufruto conjunto do amor, do nascimento dos filhos, do progressivo envelhecimento, da fruição dos netos… Em Benjamin Button nada disso acontece. O que parece apontar a intenção do filme numa outra direcção: aproveitem bem o que têm, pois, como aqui vêem demonstrado por absurdo, se fosse de outra maneira não seria tão agradável. Aliás, a corroborar esta interpretação está o facto de Benjamin viver a sua “velha meninice” num lar de velhos onde tudo acontece com uma absoluta calma e nenhuma intranquilidade. Ali se cumpre a última etapa da vida, aceitando-a com uma certa bonomia e sem grande tragédia. Como quem diz: “A vida é assim, nasce-se e morre-se e não há nada a fazer em contrário, senão aceitar o destino e aproveitar este instante de existência para se ser feliz”.
Mas se acontecer o ciclo inverso da vida, que o filme de David Fincher documenta, se ele tiver 60 e ela 9 quando se encontram pela vez primeira, irão reencontrar-se um dia com a mesma idade (qualquer coisa como ele 35, ela 34). Não é um encontro que permita uma vida “tranquila” de mais vinte anos sequer (quando ela tiver 54, ele tem 15!). Quando se vive lado a lado, no mesmo sentido dos ponteiros de um relógio que ande para a frente, o que vemos é futuro. Quando o ponteiro do relógio desanda para o passado num dos parceiros, o resultado não é um encontro com futuro, mas um quase desencontro. Por isso, a tese que alguns apontam para o filme não me parece certa: viva-se de início para o fim ou do termo para o princípio, o importante é viver bem a vida e aproveitar o que fica no meio, isto é os anos de vida plena. Esta interpretação pode ser correcta para o conto. Mas não é exacta no filme, que, aliás, o exemplifica. Benjamin afasta-se do seu grande amor, afasta-se da filha que será perfilhada por outro, quando se aproxima da adolescência. A existência que se vive em comum, e que em comum evolui num mesmo sentido, permite o usufruto conjunto do amor, do nascimento dos filhos, do progressivo envelhecimento, da fruição dos netos… Em Benjamin Button nada disso acontece. O que parece apontar a intenção do filme numa outra direcção: aproveitem bem o que têm, pois, como aqui vêem demonstrado por absurdo, se fosse de outra maneira não seria tão agradável. Aliás, a corroborar esta interpretação está o facto de Benjamin viver a sua “velha meninice” num lar de velhos onde tudo acontece com uma absoluta calma e nenhuma intranquilidade. Ali se cumpre a última etapa da vida, aceitando-a com uma certa bonomia e sem grande tragédia. Como quem diz: “A vida é assim, nasce-se e morre-se e não há nada a fazer em contrário, senão aceitar o destino e aproveitar este instante de existência para se ser feliz”.  Mas “O Estranho Caso de Benjamin Button” vai mais longe nas suas implicações. O filme inicia-se num hospital de Nova Orleans em véspera do furacão Katrina (29 de Agosto de 2005). Uma velha senhora, às portas da morte, pede à filha que esta lhe leia um misterioso diário que ela conserva religiosamente guardado até aquele dia. A filha inicia a leitura que recorda a invulgar vida de Benjamin Button, desde o seu nascimento. A leitura evoca o passado e introduz um “flashback” (“regresso ao passado” em “gíria” cinematográfica) e a imagem da filha lendo este diário à mãe transforma-se num refrão que regularmente interrompe a narrativa. Cada nova leitura reintegra uma nova fase da vida de Benjamin. É muito curioso este processo num filme que trabalha sobretudo com o tempo, a passagem do tempo, as intermitências do tempo, o aparecimento do tempo (o nascimento), a paragem no tempo (a morte) ou a História como a dilatação do tempo (interessante comparar este filme com “Forrest Gump”, também ele escrito pelo mesmo argumentista, Eric Roth).
Mas “O Estranho Caso de Benjamin Button” vai mais longe nas suas implicações. O filme inicia-se num hospital de Nova Orleans em véspera do furacão Katrina (29 de Agosto de 2005). Uma velha senhora, às portas da morte, pede à filha que esta lhe leia um misterioso diário que ela conserva religiosamente guardado até aquele dia. A filha inicia a leitura que recorda a invulgar vida de Benjamin Button, desde o seu nascimento. A leitura evoca o passado e introduz um “flashback” (“regresso ao passado” em “gíria” cinematográfica) e a imagem da filha lendo este diário à mãe transforma-se num refrão que regularmente interrompe a narrativa. Cada nova leitura reintegra uma nova fase da vida de Benjamin. É muito curioso este processo num filme que trabalha sobretudo com o tempo, a passagem do tempo, as intermitências do tempo, o aparecimento do tempo (o nascimento), a paragem no tempo (a morte) ou a História como a dilatação do tempo (interessante comparar este filme com “Forrest Gump”, também ele escrito pelo mesmo argumentista, Eric Roth).  Se se analisar bem a obra, esta estrutura-se como um encadeado de “flashbacks” (na actualidade, a filha lê o diário; no interior do diário existem novos “flashbacks” e bizarras anomalias de tempo, como o episódio em que Daisy é atropelada, onde se assinalam os artifícios do acaso com uma sequência rodada cronologicamente, que é depois invertida e relançada de novo, mas agora obedecendo a uma lei de imponderabilidade na existência humana). De resto, estas “evocações” da vida de Benjamin são pretexto para invocações mais amplas de momentos da História da América e da Humanidade (a II Guerra Mundial, o Flower Power e os Beatnicks, etc.). Ao ver “O Estranho Caso de Benjamin Button” é quase impossível não estabelecer algumas comparações com a obra de um escritor como Paul Auster, onde o acaso e as coincidências ocupam igualmente um importante lugar no decorrer da vida das suas personagens.
Se se analisar bem a obra, esta estrutura-se como um encadeado de “flashbacks” (na actualidade, a filha lê o diário; no interior do diário existem novos “flashbacks” e bizarras anomalias de tempo, como o episódio em que Daisy é atropelada, onde se assinalam os artifícios do acaso com uma sequência rodada cronologicamente, que é depois invertida e relançada de novo, mas agora obedecendo a uma lei de imponderabilidade na existência humana). De resto, estas “evocações” da vida de Benjamin são pretexto para invocações mais amplas de momentos da História da América e da Humanidade (a II Guerra Mundial, o Flower Power e os Beatnicks, etc.). Ao ver “O Estranho Caso de Benjamin Button” é quase impossível não estabelecer algumas comparações com a obra de um escritor como Paul Auster, onde o acaso e as coincidências ocupam igualmente um importante lugar no decorrer da vida das suas personagens.  Este “trabalhar do tempo” no cinema remeta para outras obras cinematográficas, como por exemplo “Intolerância”, de David W. Griffith, na qual uma mãe vai cantando e embalando o berço onde se encontra a filha, enquanto vários episódios da eclosão da intolerância ao longa da História do homem vão sendo ilustrados. Aqui invertem-se os papéis, é a filha que lê à mãe moribunda (inversão total: filha - mãe, nascimento – morte), mas o efeito é idêntico (ainda que superior em Griffith, mais contido, sendo talvez excessivo em Fincher – há demasiadas interferências deste refrão no decorrer da obra). Mas o tempo é um fascínio para o cinema, com as suas viagens (os vários “Regressos ao Futuro”, de Rober Zemeckis; “O Efeito Borboleta”, de Eric Bress e J. Mackye Gruber, “Deja Vu”, de Tony Scott, “Donnie Darko”, de Richard Kelly, “The Final Countdown”, de Don Taylor, “Groundhog Day”, de Harold Ramis, “It's A Wonderful Life”, de Frank Capra, “Je t'aime, je t'aime”, de Alain Resnais, “Melinda and Melinda”, de Woody Allen, “Peggy Sue Got Married” , de Francis Ford Coppola, “The Philadelphia Experiment”, de Stewart Raffill, “Planet of the Apes” de Franklin J. Schnaffner ou de Tim Burton, “Slaughterhouse Five”, de George Roy Hill, “Time After Time”, de Nicholas Meyers, “Time Bandits”, de Terry Gilliam, “Timeline 2003”, de Richard Donner, “The Time Machine”, de Pal George ou “Time Machine”, de Simon Wells, para só citar alguns dos casos mais evidentes e mais interessantes.
Este “trabalhar do tempo” no cinema remeta para outras obras cinematográficas, como por exemplo “Intolerância”, de David W. Griffith, na qual uma mãe vai cantando e embalando o berço onde se encontra a filha, enquanto vários episódios da eclosão da intolerância ao longa da História do homem vão sendo ilustrados. Aqui invertem-se os papéis, é a filha que lê à mãe moribunda (inversão total: filha - mãe, nascimento – morte), mas o efeito é idêntico (ainda que superior em Griffith, mais contido, sendo talvez excessivo em Fincher – há demasiadas interferências deste refrão no decorrer da obra). Mas o tempo é um fascínio para o cinema, com as suas viagens (os vários “Regressos ao Futuro”, de Rober Zemeckis; “O Efeito Borboleta”, de Eric Bress e J. Mackye Gruber, “Deja Vu”, de Tony Scott, “Donnie Darko”, de Richard Kelly, “The Final Countdown”, de Don Taylor, “Groundhog Day”, de Harold Ramis, “It's A Wonderful Life”, de Frank Capra, “Je t'aime, je t'aime”, de Alain Resnais, “Melinda and Melinda”, de Woody Allen, “Peggy Sue Got Married” , de Francis Ford Coppola, “The Philadelphia Experiment”, de Stewart Raffill, “Planet of the Apes” de Franklin J. Schnaffner ou de Tim Burton, “Slaughterhouse Five”, de George Roy Hill, “Time After Time”, de Nicholas Meyers, “Time Bandits”, de Terry Gilliam, “Timeline 2003”, de Richard Donner, “The Time Machine”, de Pal George ou “Time Machine”, de Simon Wells, para só citar alguns dos casos mais evidentes e mais interessantes. O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON
O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON

 
  MEU CARO BARACK OBAMA: BOA SORTE!
 MEU CARO BARACK OBAMA: BOA SORTE! OPINIÕES
 OPINIÕES A VALSA COM BASHIR
 A VALSA COM BASHIR  
  Esse amigo confessa a Ari Folman que não percebe o significado dos cães com que sonha e não recorda nada da guerra. Ari Folman também não se lembra da guerra por onde passara há vinte anos atrás e que ficou conhecida como Guerra do Líbano. O filme será uma procura dessa memória, invocando testemunhos de outros combatentes que tinham estado ao lado de Ari nesse conflito, sobretudo quando as tropas israelitas invadiram o Líbano e chegaram a Beirute, passando de caminho pelos massacres de Sabra e Chatila, que se tornaram tristemente célebres na altura e agora serviram de base de apoio para esta magnífica película de animação (que não é para crianças, mas sim “para adultos”, sem que a designação contenha qualquer referência a “sexo explicito”).
Esse amigo confessa a Ari Folman que não percebe o significado dos cães com que sonha e não recorda nada da guerra. Ari Folman também não se lembra da guerra por onde passara há vinte anos atrás e que ficou conhecida como Guerra do Líbano. O filme será uma procura dessa memória, invocando testemunhos de outros combatentes que tinham estado ao lado de Ari nesse conflito, sobretudo quando as tropas israelitas invadiram o Líbano e chegaram a Beirute, passando de caminho pelos massacres de Sabra e Chatila, que se tornaram tristemente célebres na altura e agora serviram de base de apoio para esta magnífica película de animação (que não é para crianças, mas sim “para adultos”, sem que a designação contenha qualquer referência a “sexo explicito”). Convém, no entanto, recuar um pouco e situar historicamente os acontecimentos de que falamos. O Líbano tinha-se tornado, a partir de 1948, um país em constante estado de guerra civil, dado que possuía uma população muito heterogénea, composta por cristãos maronitas e muçulmanos, com entrada no conflito de países como a Síria ou Israel e a OLP, de Yasser Arafat. Cada um com ideias definidas sobre quem devia governar, e com os palestinianos furiosos pela sua expulsão da Jordânia, às ordens de Hussein. As alianças faziam-se e desfaziam-se, tão depressa era a Síria a aliada, como Israel, e no meio desta onda de violência descontrolada, que causava massacres de inocentes dos dois lados das barricadas, o próprio país se viu dividido em áreas de influência delimitadas. A luta levou a que a OLP se instalasse no sul do Líbano. Pode considerar-se que a guerra teve quatro momentos decisivos: entre 1975 e 1977, com combates e massacres entre as comunidades religiosas, e uma intervenção síria, a pedido do Parlamento Libanês; entre 1977 e 1982, caracterizada por uma intervenção de Israel no sul do Líbano, através do que ficou conhecido como “Operação Litani”; entre 1982 e 1984, com a invasão de Israel, a tomada de Beirute e a posterior intervenção das Nações Unidas; e entre 1984 e 1990, culminando com os Acordos de Taif, assinados na Arábia Saudita, onde foram criadas condições para o cessar-fogo em 1990.
Convém, no entanto, recuar um pouco e situar historicamente os acontecimentos de que falamos. O Líbano tinha-se tornado, a partir de 1948, um país em constante estado de guerra civil, dado que possuía uma população muito heterogénea, composta por cristãos maronitas e muçulmanos, com entrada no conflito de países como a Síria ou Israel e a OLP, de Yasser Arafat. Cada um com ideias definidas sobre quem devia governar, e com os palestinianos furiosos pela sua expulsão da Jordânia, às ordens de Hussein. As alianças faziam-se e desfaziam-se, tão depressa era a Síria a aliada, como Israel, e no meio desta onda de violência descontrolada, que causava massacres de inocentes dos dois lados das barricadas, o próprio país se viu dividido em áreas de influência delimitadas. A luta levou a que a OLP se instalasse no sul do Líbano. Pode considerar-se que a guerra teve quatro momentos decisivos: entre 1975 e 1977, com combates e massacres entre as comunidades religiosas, e uma intervenção síria, a pedido do Parlamento Libanês; entre 1977 e 1982, caracterizada por uma intervenção de Israel no sul do Líbano, através do que ficou conhecido como “Operação Litani”; entre 1982 e 1984, com a invasão de Israel, a tomada de Beirute e a posterior intervenção das Nações Unidas; e entre 1984 e 1990, culminando com os Acordos de Taif, assinados na Arábia Saudita, onde foram criadas condições para o cessar-fogo em 1990.  Massacres de católicos e de muçulmanos foi acontecimento que se tornou infelizmente banal, e poucos sabem quem começou esta guerra de guerrilha e de terrorismo insano. Cada facção aponta o inimigo como principal culpado e um observador isento tem dificuldade em julgar. Mas isso pouco importa para a análise do filme de Ari Folman, que é sobretudo um olhar retrospectivo sobre a entrada das tropas israelitas no Líbano, em 1982, e os massacres do sul da capital libanesa, entre 16 e 18 de Setembro. O massacre de Sabra e Shatila imolou centenas ou milhares (os números vão de 300 a 3.500, consoante o quadrante) de refugiados civis palestinos, numa acção perpetrada por milicianos cristãos maronitas, nos campos de Sabra e Shatila, então sob protecção de Israel. A opinião mundial voltou-se mais uma vez contra Israel e culpou o então ministro da defesa, Ariel Sharon, de ser pessoalmente responsável pela chacina, tendo falhado na protecção aos refugiados.
Massacres de católicos e de muçulmanos foi acontecimento que se tornou infelizmente banal, e poucos sabem quem começou esta guerra de guerrilha e de terrorismo insano. Cada facção aponta o inimigo como principal culpado e um observador isento tem dificuldade em julgar. Mas isso pouco importa para a análise do filme de Ari Folman, que é sobretudo um olhar retrospectivo sobre a entrada das tropas israelitas no Líbano, em 1982, e os massacres do sul da capital libanesa, entre 16 e 18 de Setembro. O massacre de Sabra e Shatila imolou centenas ou milhares (os números vão de 300 a 3.500, consoante o quadrante) de refugiados civis palestinos, numa acção perpetrada por milicianos cristãos maronitas, nos campos de Sabra e Shatila, então sob protecção de Israel. A opinião mundial voltou-se mais uma vez contra Israel e culpou o então ministro da defesa, Ariel Sharon, de ser pessoalmente responsável pela chacina, tendo falhado na protecção aos refugiados.
 Neste processo de recuperação de memória, Ari Folman, conhecido documentarista israelita, entrevista nove pessoas, sete das quais aceitam dar a cara, sendo que as duas restantes deram os seus depoimentos a ler a actores. A animação parte então da imagem real, trabalhada como desenho por uma equipa de técnicos de animação. Há quem precipitadamente afirme que se trata de um documentário em animação. Nada de mais errado, não pela técnica, mas pela pesquisa que o filme encerra. Não há nada de mais subjectivo do que a memória, logo não há nada que possa ser mais ficcionado do que esta obra. O que vemos e ouvimos são recordações traumáticas, muitas vezes recalcadas, logo possivelmente distorcidas, de experiências pessoais que não têm nada de comum e de objectivo. Esse possivelmente um os fascínios desta experiência, essa procura de uma objectividade possível, esse ressuscitar da história pessoal num quadro de História colectiva que se processa através de depoimentos que nem sempre coincidem, mas que lentamente se vão ajustando na memória de Ari Folman. A memória deste homem é reavivada por testemunhos exteriores a si, filtrados por experiências privadas diversas, que ele, todavia, vai de certa forma assimilando, fazendo suas. A recordação da chegada a uma praia, por exemplo, num oceano juncado de cadáveres, vai sendo progressivamente reavivada. Mas nada nos diz que se trate de uma reconstituição histórica correcta, mas sim de um puzzle cujas peças se vão ajustando com base em palavras ouvidas que encontram eco no subconsciente de Ari Folman. Nada de mais pessoal e intimista, nada de menos documental. Mas esse é seguramente um dos aspectos mais estimulantes desta pesquisa. Sobre essa cena da praia, que funciona como um “leit motiv”, o próprio realizador afirmou (ao “Sight & Sound”): "It should be hallucinatory but also realistic," e mais adiante, "We wanted to make a realistic scene in a very dreamy way, so that you would be confused until the very end about whether it really happened." "Waltz With Bashir'" é, por isso mesmo, um trágico documento “pessoal” sobre o horror da guerra, que um israelita assume com invulgar coragem e desassombro. Coragem que vai até final, quando, na derradeira sequência, a animação cede perante as imagens reais do brutal massacre. Da incansável procura do passado ressurge finalmente o passado.
Neste processo de recuperação de memória, Ari Folman, conhecido documentarista israelita, entrevista nove pessoas, sete das quais aceitam dar a cara, sendo que as duas restantes deram os seus depoimentos a ler a actores. A animação parte então da imagem real, trabalhada como desenho por uma equipa de técnicos de animação. Há quem precipitadamente afirme que se trata de um documentário em animação. Nada de mais errado, não pela técnica, mas pela pesquisa que o filme encerra. Não há nada de mais subjectivo do que a memória, logo não há nada que possa ser mais ficcionado do que esta obra. O que vemos e ouvimos são recordações traumáticas, muitas vezes recalcadas, logo possivelmente distorcidas, de experiências pessoais que não têm nada de comum e de objectivo. Esse possivelmente um os fascínios desta experiência, essa procura de uma objectividade possível, esse ressuscitar da história pessoal num quadro de História colectiva que se processa através de depoimentos que nem sempre coincidem, mas que lentamente se vão ajustando na memória de Ari Folman. A memória deste homem é reavivada por testemunhos exteriores a si, filtrados por experiências privadas diversas, que ele, todavia, vai de certa forma assimilando, fazendo suas. A recordação da chegada a uma praia, por exemplo, num oceano juncado de cadáveres, vai sendo progressivamente reavivada. Mas nada nos diz que se trate de uma reconstituição histórica correcta, mas sim de um puzzle cujas peças se vão ajustando com base em palavras ouvidas que encontram eco no subconsciente de Ari Folman. Nada de mais pessoal e intimista, nada de menos documental. Mas esse é seguramente um dos aspectos mais estimulantes desta pesquisa. Sobre essa cena da praia, que funciona como um “leit motiv”, o próprio realizador afirmou (ao “Sight & Sound”): "It should be hallucinatory but also realistic," e mais adiante, "We wanted to make a realistic scene in a very dreamy way, so that you would be confused until the very end about whether it really happened." "Waltz With Bashir'" é, por isso mesmo, um trágico documento “pessoal” sobre o horror da guerra, que um israelita assume com invulgar coragem e desassombro. Coragem que vai até final, quando, na derradeira sequência, a animação cede perante as imagens reais do brutal massacre. Da incansável procura do passado ressurge finalmente o passado.  Um belíssimo filme de uma actualidade gritante. Quem nos dera que os palestinianos tivessem do seu lado a oportunidade, ou o desejo, de criarem obra idêntica. Razões não lhes faltarão certamente. E só da assunção das culpas por ambas as partes se poderá chegar a um entendimento possível, que reponha a paz na região. Que o cinema pode ser uma arma, “Valsa com Bashir” atesta-o.
Um belíssimo filme de uma actualidade gritante. Quem nos dera que os palestinianos tivessem do seu lado a oportunidade, ou o desejo, de criarem obra idêntica. Razões não lhes faltarão certamente. E só da assunção das culpas por ambas as partes se poderá chegar a um entendimento possível, que reponha a paz na região. Que o cinema pode ser uma arma, “Valsa com Bashir” atesta-o. A VALSA COM BASHIR
A VALSA COM BASHIR 
 
 
 
 
 
 
 
 
